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Paternidade socioafetiva pressupõe vínculo registral

A paternidade socioafetiva não se cogita quando não houve reconhecimento, por meio de adoção ou de instrumento público. Sob esse fundamento, a 7ª Câmara Cível do TJRS confirmou, de forma unânime, sentença da Comarca de Palmeira das Missões que julgou improcedente ação de investigação de paternidade, cumulada com petição de herança.

O autor da ação alegou ter relação paterno-filial com seu irmão de criação, já falecido, por quem era tratado como verdadeiro filho. Sustentou mais de 30 anos de convivência, desde os dois anos de idade.

Segundo o relator da apelação, Desembargador Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, a ação de investigação de paternidade compreende o reconhecimento forçado do estado de filiação, buscando definição de relação jurídica a partir da demonstração de laços biológicos. Por sua vez, elucidou, a paternidade socioafetiva tem como pressuposto a existência de vínculo registral, além da relação social e afetiva.

“É um ato personalíssimo e irrevogável, que pode ser feito tanto através do registro no próprio Cartório do Registro Civil de Pessoas Naturais, como através da escritura pública ou escrito particular arquivado no Cartório, ou através de disposição testamentária ou, ainda, perante a autoridade judicial”, detalhou o magistrado.

Analisando o caso em questão, apontou existência de ação trabalhista do recorrente contra o suposto pai, narrando que este o teria explorado “sob o domínio escravista” desde os 12 anos. Salientou ter sido inexitosa a conciliação, “o que deixa transparecer certo grau de animosidade” entre ambos. “Ora, em sendo a filiação socioafetiva caracterizada pelo estreito laço de amor e respeito que une os indivíduos que não possuem laços de sangue, não há se falar na hipótese em relação parental!” Acrescentou que, na mesma reclamatória, foi reconhecido o vínculo afetivo, com desacolhimento do pleito no âmbito da Justiça do trabalho, ficando caracterizada a criação como irmão.

No mesmo sentido apontou a prova testemunhal, de que nunca houve reconhecimento como pai. O próprio autor, ao depor em Juízo, afirmou que o falecido nunca disse que iria adotá-lo ou registrá-lo como pai.

Ao finalizar o voto, citou obra do Juiz Luciano André Losekann (“Paternidade: elo biológico ou afetivo?”), que estabelece três pressupostos para a posse do estado de filho: nominatio, utilização do patronímico do suposto pai; tractatio, demonstração do afeto do postulante pelo apontado pai; e reputatio, notoriedade da situação socioafetiva. “E, não sendo reconhecida a paternidade, não se pode cogitar de direito de herança”, concluiu.

Acompanharam o relator a Desembargadora Maria Berenice Dias e o Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos. O julgamento ocorreu no dia 26/4, durante a sessão didática realizada pela Câmara para mais de 400 acadêmicos de Direito, nas dependências do TJRS.