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Busato: fim do Exame de Ordem seria catastrófico para Justiça

O Brasil vai chegar ao final do ano com mais de 600 mil advogados e quase um mil (1.000) cursos jurídicos que formam, por ano, cerca de 120 mil novos bacharéis, mas somente cerca de 30% desse total conseguem aprovação no Exame de Ordem. O percentual de aprovação é ainda muito menor quando se trata de exames de que participam bacharéis Direito em concursos para juízes e membros do Ministério Público em todo o país. Para o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, a maioria das faculdades de Direito existentes no país, em virtude da má qualidade, está formando na verdade “analfabetos jurídicos”. A saída, portanto, na opinião do principal dirigente da OAB, é melhorar a qualidade do ensino jurídico, restringindo-se a abertura de faculdades caça-níqueis. E não a extinção do Exame de Ordem, como pretendem algumas vozes da magistratura e inclusive projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional.

O presidente nacional da OAB condena o fato de que há em funcionamento no País cursos que são “verdadeiros estelionatos educacionais”. Essa má qualidade vem sendo comprovada não só pelo elevado nível de reprovação no Exame de Ordem – hoje, em média, em torno de 70% dos candidatos. “É bom que isso fique bem claro para a população: a má qualidade do ensino jurídico tem sido demonstrada também pelo baixíssimo, ridículo e extraordinário índice negativo de aprovação nos exames que habilitam bacharéis para o exercício de funções na magistratura e no Ministério Público, por exemplo”, sustentou Busato.

Para ele, a extinção do Exame de Ordem poderia ter “efeitos catastróficos” para a Justiça, de vez que representaria a vitória da péssima qualidade do ensino jurídico e dos cursos de Direito sem qualquer preocupação social ou com a boa formação de seus alunos. “Teríamos (num futuro próximo) um Poder Judiciário totalmente capenga, sem condições de cumprir sua função social, dada a falta de condições para o exercício profissional por uma boa parte daqueles que hoje saem de faculdades onde entraram praticamente sem prestar vestibular, que passaram todos os anos praticamente sem prova ou aferição dos conhecimentos”, afirma ele, numa entrevista sobre o tema.

A seguir, a íntegra da entrevista do presidente nacional da OAB, Roberto Busato, sobre o Exame de Ordem:

P – Quais seriam os efeitos do fim do Exame de Ordem para a advocacia brasileira, como alguns parlamentares vêm defendendo?R – Os efeitos seriam catastróficos. A OAB tem a noção exata de que, perdendo o Exame de Ordem, perde-se a instituição e perde-se a própria advocacia. Não há condições da manutenção de uma advocacia organizada no país com essa quantidade de advogados. Não pelo seu número, mas pela sua má formação, pela má qualidade do ensino que os bacharéis em Direito vêm recebendo. Essa má qualidade vem sendo demonstrada não só pelo Exame de Ordem, é bom que fique claro para a população. Tem sido demonstrada também pelo baixíssimo, ridículo e extraordinário índice negativo de aprovação nos exames que habilitam bacharéis para o exercício de funções na magistratura e no Ministério Público, por exemplo. O ministro Raphael Barros Monteiro, que presidirá o STJ, já está totalmente consciente desse fato e temos visto uma verdadeira preocupação por parte de todos os membros do Poder Judiciário, já que as poucas vagas destinadas à magistratura sequer conseguem ser providas. E não conseguem ser preenchidas dentro de um país que vem formando, aproximadamente, 120 mil bacharéis em Direito por ano.

P – Diante desse volume, em condições normais, não deveríamos ter uma enorme quantidade de candidatos aptos a preencher as vagas abertas em concursos para magistrados?R – Sim, mas mesmo diante desse volume, não conseguimos prover os cargos vagos na magistratura porque os candidatos não são considerados aptos, não conseguem nota mínima nas provas, assim como tem acontecido no Exame de Ordem. Portanto, a situação da qualidade do ensino jurídico no país é bastante grave. Se houver um eventual não cabimento do Exame de Ordem, veremos realmente uma afronta ao Estado Democrático de Direito porque não haverá qualquer controle da qualidade da advocacia atuante no país, uma profissão que está alçada ao nível constitucional, conforme o artigo 133 da Constituição, e que participa ativamente do Poder Judiciário.

P – Há projetos de lei de parlamentares que aventam o fim do Exame de Ordem. Eles têm fundamento?R – Tenho a absoluta certeza de que nenhum desses projetos que visa a extinguir o Exame de Ordem tem algum fundo científico. Independente disso, a OAB está totalmente aberta ao Congresso Nacional, especificamente aos deputados que têm interesse na matéria e que estão apresentando projetos de lei neste sentido. A OAB, entidade aberta à sociedade e que tanto fez pela cidadania brasileira em seus 76 anos, está de portas abertas para mostrar seus números e trabalhar cientificamente em favor da cidadania brasileira. É necessário que se saiba que quem os prejudicados e as vítimas desse cruel problema envolvendo a má qualificação dos advogados e magistrados são, sem dúvida nenhuma, os jovens brasileiros.

P – Presidente, acabando o Exame de Ordem, o que acontece? R – Num primeiro momento, a OAB ficará uma instituição muito mais fortalecida. Aumentará bastante o seu número de inscritos, teremos uma base de advogados muito grande e, em pouco tempo, seremos a maior organização mundial dessa categoria profissional. Hoje, já somos a segunda, um pouco atrás dos Estados Unidos. Isso num primeiro momento. Num segundo momento, começaria o caos e, num terceiro, teríamos um Poder Judiciário totalmente capenga, sem condições de cumprir sua função social dada a falta de condições para o exercício profissional por uma boa parte daqueles que hoje saem de faculdades onde entraram praticamente sem prestar vestibular, que passaram todos os anos praticamente sem prova ou aferição dos conhecimentos. Além disso, não teriam mais o Exame para se tornarem advogados. Os concursos públicos continuariam reprovando quase todo mundo e teríamos uma situação inteiramente caótica.