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“A insegurança jurídica tem custo imprevisível”, diz ministro Vidigal

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal, disse em palestra proferida na noite da última quinta-feira (3), nesta capital, que “a insegurança jurídica tem custo imprevisível”. O ministro lamentou que a morosidade do Poder Judiciário nacional, segundo estudos internacionais, custa ao Brasil o equivalente a 20% do Produto Interno Bruto (PIB).

O ministro Vidigal esteve em Vitória, onde fez uma palestra para os associados do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (IBEF), seção do Estado do Espírito Santo. Na mesma ocasião, ocorreu a posse da nova diretoria do IBEF-ES, que passa a ser presidida pelo empresário Evandro Barreira Milet. Durante a palestra, pontuada por histórias sobre política e busca da auto-estima, o presidente do STJ apresentou um cenário no qual buscou mostrar a competência do STJ e de outros Tribunais.

O presidente Vidigal também apresentou números: “No ano passado, o STJ julgou 241.309 processos, 11% a mais que em 2003. Ou seja, 7.312 processos por ministro. Levando-se em conta que o Tribunal funciona dez meses por ano, 20 dias por mês e oito horas por dia, obtemos aí uma média de 4,57 processos por hora para cada ministro. Ou seja, um processo a cada 13 minutos.”

E continuou: “Claro que nem tudo é verdade. Estamos, no caso aqui, diante de uma mentirinha. É possível afirmar-se que mais da metade dos processos cuidam de questões já resolvidas antes em outros processos. Portanto o trabalho do ministro aqui é de mera formalidade. Ele não precisou pensar muito. Sua assessoria já aferiu e montou o lote de idênticos para os quais são juntadas decisões idênticas, já anteriormente tomadas, mas que precisam, ainda assim, ser levadas à confirmação ou não do colegiado.”

A seguir o texto que serviu de apoio para a palestra proferida por ocasião da posse da nova diretoria do Ibef-ES:

Senhoras,Senhores:

O direito que se opera no Brasil é o nacional federal. A Constituição da República reserva para a União Federal, ou seja, para o Congresso Nacional, competência exclusiva para legislar sobre tudo o que tem a ver com a vida das pessoas no Brasil.

Esse direito nacional federal é operado por duas vertentes judiciárias – a Justiça dos estados e a Justiça Federal. O que se resolver em qualquer dessas vertentes, estadual ou federal, pode ensejar recurso para o Superior Tribunal de Justiça.

O Superior Tribunal de Justiça é, portanto, a Corte onde devem terminar as demandas instauradas com base no direito nacional federal. Sendo, assim, o Tribunal da Federação, é sua função unificar a interpretação da lei federal.

Isso quer dizer que não pode haver, quanto à lei federal, interpretação divergente entre os Tribunais. O Superior Tribunal de Justiça é quem dá a palavra final.

No ano passado,em 2004, o STJ julgou 241.309 processos; 11% a mais que em 2003. Ou seja, 7.312 processos por ministro. Levando-se em conta que o Tribunal funciona 10 meses por ano, 20 dias por mês e 8 horas por dia, obtemos aí uma média de 4,57 processos por hora para cada ministro. Ou seja, 1 processo a cada 13 minutos.Claro que nem tudo é verdade. Estamos, no caso aqui, diante de uma mentirinha. É possível afirmar-se que mais da metade dos processos cuidam de questões já resolvidas antes em outros processos.

Portanto o trabalho do Ministro aqui é de mera formalidade. Ele não precisou pensar muito. Sua assessoria já aferiu e montou o lote de idênticos para os quais são juntadas decisões idênticas, já anteriormente tomadas, mas que precisam, ainda assim, ser levadas à confirmação ou não do colegiado.

Houvesse a súmula vinculante para o STJ, como hoje há no STF, o Supremo, os processos iguais demorariam menos. Não haveria necessidade do teatrinho de julgamento. O relator resolveria tudo por despacho.

Da instalação do STJ, há 15 anos, até agosto de 2004, a União Federal foi ré em 202.676 processos. Numa relação dos 20 mais processados, empresas privadas ou instituições públicas, que respondem, nesse quadro, por 401.079 ações, a União Federal comparece com 50,53%.

Noutra lista, entre os que mais demandam, aparece a Caixa Econômica Federal, que, no mesmo período, ajuizou 346.799 ações, ou seja 45,55 % dos 761.273 processos chegados ao STJ. Depois da União e da CEF vem o INSS. E a lista cresce com os bancos, estados, municípios.

Maior parte do tempo e dos esforços do Judiciário, como se depreende, é com entes estatais ou com grandes corporações. Quase não há espaços para as pequenas ou médias empresas e tampouco para o povo em geral.

A reforma constitucional ou infra-constitucional do Judiciário, portanto não vai gerar efeitos especiais em favor do Brasil se nos limitarmos às fronteiras das formalidades legais. Precisamos investir na busca das vocações para a magistratura e para o ministério público. Não basta ter talento, brilho, reputação ilibada e notável saber jurídico. É preciso ter vocação. E vocação é sacerdócio, é desprendimento, é espírito público.A sociedade não compreende mais o juiz distante, quase alheio ao mundo circundante. Sendo um agente público para o serviço da paz, o juiz hoje precisa estar antenado com as ruas, envolvido com as realidades sociais. Não pode ficar à mercê apenas do que lhe dizem nos autos do processo.

Compreendendo, assim, é do seu dever refletir sobre as questões sociais, políticas e econômicas. Sendo o Estado composto por três Poderes e ele, juiz, no caso, é parte de um deles, o Judiciário, é importante que entenda a natureza política da sua função.

Realizar a paz quer dizer buscar, antes, a conciliação, promover a mediação. Quantas demandas que se arrastam há décadas no Judiciário que não já estariam superadas através da mediação, de um acordo entre as partes, sob a homologação de um Juiz ? Quanto não se economizaria em tempo e em dinheiro se as partes da contenda fossem induzidas à realização de acordos que resultassem na desistência da via judicial ?

Creio que é para esse rumo que vamos caminhar – para a estrada da conciliação, do acordo, da mediação. E assim todos resultarão vencedores. Vencerá o bom senso, a razão. Ganhará o País, vencerá a Justiça.

Para isso precisamos consolidar a segurança jurídica. Isto tem a ver com jurisprudência consolidada, imutável, decisões previsíveis. Tem a ver com garantia judicial para que se respeitem os contratos. Ninguém pode ser surpreendido com novas regras em meio a um contrato em vigor. Nenhuma cláusula pode ser alterada nem mesmo pela lei se o contrato está em sua plena vigência.

Os capitais que andam soltos pelo mundo são atraídos pelas possibilidades de melhores rendimentos dos seus investimentos. Eles sondam o terreno, procuram se sentir seguros, estudam as regras do mercado, a estabilidade política do País, aferem a segurança jurídica. Convictos de tudo que precisam em sua proteção, aportam. Transmudam-se em ações, em investimentos. Mas logo vão embora ante alguma ruptura de alguma regra pactuada.

Se a morosidade judicial custa ao País o equivalente a 20% do PIB nacional, a insegurança jurídica tem um custo imprevisível. Dependendo das respostas do Judiciário às questões inerentes à economia, os capitais aumentam em aportes ou vão embora, disseminando mundo afora a informação negativa de que o Brasil ainda não é o melhor lugar para grandes investimentos.”