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“Súmula vinculante é um remédio necessário”, diz ministro Vidigal na Câmara

A súmula vinculante para todos os tribunais superiores, o juizado de conciliação, a criação de mais varas federais e novas comarcas no interior do País e a manutenção do modelo de escolha dos presidentes dos tribunais superiores foram os temas principais da audiência pública ocorrida nesta quinta-feira, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. Durante a audiência com parlamentares, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal, defendeu que se busquem acordos prévios para evitar o recurso ao Poder Judiciário.

O ministro Vidigal compareceu à CCJC para debater a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 358, de 2005, junto com o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Vantuil Abdala, e com o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), juiz Rodrigo Collaço. A audiência durou quase quatro horas e contou com intervenções do relator da PEC, deputado Roberto Magalhães (PFL-PE), e dos parlamentares Darci Coelho (PP-TO), Zulaiê Cobra (PSDB-SP), Vicente Arruda (PSDB-CE), ACM Neto (PFL-BA), Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), Alceu Collares (PDT-RS) e Fernando Coruja (PPS-SC).

A audiência foi aberta pelo presidente da CCJC, deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), que, após apresentar os debatedores, solicitou ao relator da matéria, deputado Roberto Magalhães, que iniciasse a intervenção. O parlamentar pernambucano levantou algumas questões, como, por exemplo, a proposta de lista de promoção dos juízes, os conselhos de conciliação, o juízo arbitral e a súmula vinculante.

O ministro Vidigal foi o primeiro debatedor. De início, o presidente do STJ ressaltou que a audiência pública da CCJC estava proporcionando “um momento raro”, o encontro entre o Judiciário e o Legislativo.

“Nunca devemos perder de vista o que está acontecendo lá fora”, disse o ministro para chamar a atenção de todos sobre a mobilização da população em defesa dos interesses da coletividade.

Em seguida, o ministro Vidigal alertou para o cenário do Poder Judiciário do Estado de São Paulo. Destacou que o julgamento de um habeas-corpus demora meses. Citou também a quantidade de processos no TJ-SP. Ele surpreendeu os parlamentares ao informar que a sede do Tribunal de Justiça está “afundando” em função do excesso de papel.

Por esse motivo, assinalou, é importante que se permita a súmula vinculante para todos os tribunais superiores. “Sempre me posicionei a favor da súmula para todos os tribunais”, atacou.

E, para reforçar a defesa desse modelo, o ministro revelou dados repassados recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Esse balanço comprova que existem mais processos do que causas, ou seja, são ações repetidas. Um dos momentos mais surpreendentes para os parlamentares foi quando o presidente do STJ informou que, de 1989, quando o Tribunal entrou em funcionamento por força da Constituição Federal de 1988, aos dias de hoje, a quantidade de processos julgados passou de 3.711 para 241.309 ações.

O ministro também divulgou quadro sobre as demandas no STJ. Um levantamento feito apontou que a União é um das maiores demandadores, tanto como ré quanto como autora. “Isso não é sério. Temos de resolver a questão por atacado. Somente a súmula vinculante pode permitir uma ‘lipoaspiração’”, destacou.

O ministro lamentou fato de ter arquivado provisoriamente a proposta de instituir o ministro-adjunto. Ou seja, um desembargador ou juiz de Tribunal Regional Federal indicado pelo ministro titular seria convocado para trabalhar no STJ por período determinado para que se reduzisse a quantidade de processos nos gabinetes. Como houve uma divisão entre os ministros, o presidente do STJ disse que o projeto saiu de pauta. Segundo o ministro Vidigal, o modelo seria idêntico ao do TST, que convoca juízes para o julgamento de processos da Justiça trabalhista.

Em seguida, o ministro comentou a proposta de promoção para os magistrados, a qual asseguraria uma espécie de reserva de mercado para os juízes. De acordo com o presidente Vidigal, é inconstitucional, corporativista e excludente. O ministro também discordou da proposição de eleição direta para os presidentes dos Tribunais. Segundo o ministro, isso torna inviável o Poder Judiciário brasileiro. Para ilustrar sua posição sobre o tema, o presidente Vidigal detalhou para os parlamentares o périplo que os candidatos ao posto de ministro do STJ passam até a efetiva confirmação no cargo.

Se o candidato for advogado, por exemplo, terá de passar por uma seleção nacional junto às seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Cabe àentidade produzir uma lista com seis nomes que em seguida é reduzida a três indicados pelos ministros do STJ. Essas indicações são encaminhadas à Presidência da República, que, por fim, encaminha a escolha ao Senado. Em todas as fases, ocorre um jogo de bastidor no qual os postulantes buscam se valer de todos os meios para conseguir o voto do eleitor.

O mesmo procedimento se dá quando o ocupante da cadeira de ministro é proveniente da Justiça Federal, estadual ou do Ministério Público Federal. A proposta do ministro foi rebatida pela deputada Zulaiê Cobra e demais parlamentares que defendem a eleição. A deputada paulista acha válida a chamada “politização do Judiciário”.

Conciliação

A função de conciliação para o Poder Judiciário foi um tema que demandou boa parte da audiência. O ministro Vidigal lembrou que, no passado, manteve contatos com a direção da Caixa Econômica Federal (CEF). Naquela ocasião, havia uma enxurrada de processos cujos autores buscavam corrigir as contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Segundo afirmou, existia um milhão de processos nas instâncias inferiores e 35 mil no STJ. Um acordo permitiu à CEF desistir de continuar a recorrer.

Mais recentemente, o ministro foi procurado pelos executivos das companhias aéreas que demandam na Justiça contra a União. Na ocasião, a Varig havia obtido na Primeira Turma do STJ o reconhecimento de uma dívida estimada em R$ 2,5 bilhões. Como o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia decidido questão idêntica em favor da Transbrasil, ou seja, se o processo da Varig chegasse ao STF obteria a mesma sentença, o presidente do STJ defendeu uma conciliação entre as empresas do setor aéreo e a União.

O ministro disse que levou o assunto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, num primeiro instante, mostrou-se contra o acordo; mais adiante, destacou o vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, para representar o governo federal à mesa de conciliação. “O papel do juiz é mediar. Temos que atuar assim para evitar que o problema se torne maior. E o encontro de contas foi o melhor caminho”, explicou.

O obstáculo para o acordo tem sido a Advocacia-Geral da União (AGU). Durante a audiência, a AGU recebeu críticas dos parlamentares. “Não me conformo com a política da AGU em protelar a execução de sentenças decididas sem nenhuma controvérsia”, alfinetou o deputado Greenhalgh.

O parlamentar lamentou também o excesso de recursos propostos pela União para perpetuar as ações. Segundo ele, o Estado brasileiro, ao agir dessa forma, torna a Justiça inviável. O deputado mostrou-se a favor do juízo arbitral, mecanismo que tem sido bem-sucedido no exterior.

O deputado ACM Neto acha fundamental a súmula vinculante para o STJ e TST. Ele defendeu a reforma processual como forma de assegurar à população o acesso ao Poder Judiciário. O deputado Vicente Arruda afirmou que o modelo de súmula seria ideal para o Judiciário. O deputado Collares elogiou a atuação do ministro no sentido de assegurar o encontro de contas entre a União e as companhias aéreas.

A audiência foi concluída no meio da tarde. O deputado Roberto Magalhães afirmou que usará todas as contribuições apresentadas no momento em que for preparar o texto final da PEC nº 358. Até lá ocorrerão outras audiências na CCJC.