O governo dinamarquês apresentou proposta de emenda à sua Lei de Direitos Autorais com o objetivo de proteger indivíduos contra o uso não autorizado de suas características pessoais — como rosto, voz e expressões — em conteúdos gerados por inteligência artificial, notadamente os chamados deepfakes.
A proposta legislativa, inédita no contexto europeu, atribui direitos autorais sobre a própria imagem, permitindo que qualquer pessoa possa controlar e, se necessário, impedir o uso digital realista de sua identidade por terceiros, especialmente em situações que envolvam manipulação ou desinformação.
Nova Seção na Lei de Direitos Autorais
A emenda prevê a introdução do artigo § 73a, que tipifica como infração a reprodução, difusão ou uso público de simulações digitais realistas das características físicas ou vocais de uma pessoa sem o seu consentimento prévio e expresso.
A proteção estende-se por um período de cinquenta anos após a morte do titular da imagem ou voz utilizada. A norma visa tanto a proteção da dignidade dos vivos quanto da memória dos falecidos — especialmente figuras públicas que frequentemente são alvo de manipulações digitais.
Exceções e Limites
A proposta inclui exceções legítimas, resguardando o uso paródico, satírico, crítico ou artístico, desde que o conteúdo não configure desinformação ou cause dano relevante à reputação da pessoa retratada. Dessa forma, busca-se um equilíbrio entre a liberdade de expressão e o direito à identidade pessoal.
Aplicação e Responsabilização
Caso aprovado, o novo dispositivo permitirá que vítimas de deepfakes solicitem a remoção imediata de tais conteúdos, sem necessidade de ajuizar ação judicial em primeira instância. O ônus da prova quanto ao consentimento caberá ao responsável pela publicação ou difusão do material.
As plataformas digitais, como redes sociais e serviços de compartilhamento de vídeo, também poderão ser responsabilizadas civilmente caso não atendam aos pedidos de retirada de conteúdo — estando sujeitas a multas administrativas e sanções por omissão.
Embora a proposta não preveja sanções penais, vítimas poderão pleitear reparação por danos morais e materiais com base na legislação civil vigente.
Reflexos Internacionais e no Direito Comparado
A proposta dinamarquesa surge em meio a crescente preocupação global com o uso malicioso de inteligência artificial e conteúdos sintéticos para fins de fraude, difamação, chantagem ou manipulação eleitoral.
Ao assumir a presidência rotativa do Conselho da União Europeia no segundo semestre de 2025, a Dinamarca pretende usar sua posição diplomática para estimular outros países membros a adotarem medidas semelhantes, ampliando a proteção jurídica da imagem pessoal em toda a UE.
No Brasil, embora o Código Civil (arts. 11 a 21) e o Marco Civil da Internet reconheçam o direito à imagem e à honra, ainda não há legislação específica voltada à proteção contra deepfakes ou simulações digitais por IA. A iniciativa dinamarquesa, portanto, pode servir como paradigma para futuras reformas normativas no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente no âmbito da proteção de dados pessoais e da personalidade digital.
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