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Limites ao princípio da continuidade do serviço público

Para Hely Lopes Meirelles serviço público é “todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado”. Entende-se como necessidades essenciais, as indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, ou seja, das necessidades que coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população.

Visto o conceito, se faz necessário destacar um dos princípios norteadores do serviço público, o princípio da continuidade do serviço público.

A grande discussão concernente a este princípio é se é possível a suspensão do fornecimento de um serviço público essencial em caso de inadimplemento do consumidor com a fornecedora, como por exemplo o fornecimento de água ou energia elétrica. O posicionamento da doutrina a este respeito é dividida, pois uma parte defende que não é possível a suspensão em hipótese alguma, enquanto a outra parte defende que em alguns casos como o de inadimplemento é possível a suspensão.

Os que defendem que não é possível a suspensão do fornecimento do serviço público baseiam-se na Lei 8.078/90, artigos 22 e 42, e na CF/88 artigo 5º LV e LIV. Alegam também que há meios próprios de cobrar a falta de pagamento (ação judicial), e por ser um serviço essencial não se pode ficar condicionada ao pagamento de contraprestação, sendo a interrupção inconstitucional e arbitrária. Neste sentido há jurisprudência do STJ contida no RESP 122.812/ES, onde diz que “É ilegal a interrupção no fornecimento de energia elétrica, mesmo que inadimplente o consumidor, à vista das disposições do Código de Defesa do Consumidor que impedem seja o usuário exposto ao ridículo. 2. Deve a concessionária de serviço público utilizar-se dos meios próprios para receber os pagamentos em atrasos.”

Maria Sylvia Zanello di Pietro entende que “o usuário tem direito à prestação do serviço; se este lhe for indevidamente negado, pode exigir judicialmente o cumprimento da obrigação pelo concessionário; é comum ocorrerem casos de interrupção na prestação de serviços como os de luz, água e gás, quando o usuário interrompe o pagamento; mesmo nessas circunstâncias, existe jurisprudência no sentido de que o serviço, sendo essencial, não pode ser suspenso, cabendo ao concessionário cobrar do usuário as prestações devidas, usando das ações judiciais cabíveis”. (Direito Administrativo – São Paulo – Ed. Atlas, 2001)

Os doutrinadores que defendem ser possível a interrupção do fornecimento do serviço público em casos de inadimplemento dos consumidores, alegam que o princípio da continuidade do serviço não pode ser tratado como absoluto e incondicional, pois se estimularia a inadimplência, já que não se interromperia o fornecimento do serviço em caso de falta de pagamento pelo serviço. Posto que este princípio garantiria o fornecimento do serviço público em qualquer hipótese, foi submetido à Corte Especial do STJ o RESP nº 363.943, onde se decidiu que “a distribuição de energia é feita, em sua grande maioria, por empresas privadas que não estão obrigadas a fazer benemerência em favor de pessoas desempregadas. A circunstância de elas prestarem serviços de primeira necessidade não as obriga ao fornecimento gratuito… O corte é doloroso, mas não acarreta vexame. Vergonha maior é o desemprego e a miséria que ele acarreta… é lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica, se, após aviso prévio, o consumidor de energia elétrica mantém inadimplência no pagamento da respectiva conta.”O objetivo desta discussão é saber se há limites ao princípio da continuidade do serviço público, que ao meu entender tem que ter um limite, pois tudo que é feito sem limites acaba-se perdendo o controle, e no fornecimento de serviço público tem que ter um controle, um limite, para que não acabe tendo uma inadimplência em massa da população, que amparada ao princípio da continuidade do serviço público alegaria possuir o direito de ter o seu fornecimento mesmo não pagando a contraprestação devida.Lógico que cada caso concreto tem que ser analisado, pois as situações são diferentes de caso para caso, e a interrupção do fornecimento do serviço público não pode ser uma sanção ou uma forma de cobrança imposta pelo fornecedor do serviço, e sim uma forma de limitar a inadimplência descontrolada, pois o meio próprio de se cobrar a falta de pagamento, é a ação judicial, e somente o Poder Judiciário pode impor sanções à população.