A Caixa Econômica Federal (CEF) não conseguiu responsabilizar cliente que teve sacados indevidamente R$ 2 mil de sua caderneta de poupança no banco, nem diminuir o valor das indenizações por danos morais e materiais decorrentes do fato, definidas pelas instâncias ordinárias em R$ 2 mil cada. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que não admitiu o recurso especial da Caixa.
A decisão do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF-1) havia reconhecido a possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) às operações bancárias e considerado que, apesar de não haver comprovação da participação da Caixa nas retiradas dos valores da conta da cliente, não seria razoável exigir que a poupadora fizesse prova de não ter utilizado, de forma indevida, seu cartão magnético e senha pessoal. Para o TRF-1, a instituição bancária é que deveria provar a segurança e inviolabilidade de seu sistema.
O recurso da CEF sustentou-se na necessidade de o autor da ação provar a culpa do banco, já que a senha é pessoal e intransferível e seu mau uso decorreria da falha do cliente em guardar e vigiar o cartão e a senha. A poupadora afirmou em contra-razões que a Caixa confessou não ser possível recuperar o histórico das transações devido a falha no sistema de processamento, havendo indícios de clonagem do cartão.
Ambas as retiradas aconteceram em 31 de outubro de 2001. A autora afirmou ter ouvido de um gerente da CEF que as operações foram realizadas em São Paulo e no Rio Grande do Sul, o que, para o TRF-1, levaria a supor que não teriam sido efetuadas pela titular da conta, residente em Contagem (MG), no domicílio onde presta serviços domésticos. A afirmação não foi desmentida pela Caixa.
Uma comunicação interna entre funcionários da CEF também traria indícios de clonagem do cartão. “Não foi possível recuperar o histórico das transações, pois não estão mais gravadas no sistema. Há indícios de clonagem do cartão, já que houve dois lançamentos, sendo que a possibilidade de golpe usualmente aplicado permite apenas a transferência, embora na época (outubro/2001) o sistema de automação não tinha os mesmos dispositivos de segurança que possui hoje (liberação do numerário somente com inserção do cartão magnético, digitação de dados pessoais), o que possibilitava uma variedade de golpes aplicados aos clientes”, afirma o documento.
O relator no STJ, ministro Aldir Passarinho Junior, destacou que o entendimento da Quarta Turma não abrange de forma genérica a fundamentação do TRF-1 no sentido de que cabe sempre ao banco comprovar a segurança do sistema, devendo-se atentar para as peculiaridades de cada caso concreto. No entanto, como a decisão do tribunal local baseia-se nos fatos que revelam a disparidade entre as localidades onde se deram os saques, no mesmo e ainda em Estado diferente do domicílio da cliente, e pela indicação da precariedade da segurança do sistema de saque, o relator entendeu cabível a aplicação da inversão do ônus da prova.
O recurso especial não foi conhecido, já que a análise dos fatos que levaram o TRF-1 à conclusão de aplicar o CDC não é possível no âmbito do STJ, e os acórdãos apontados pela Caixa como paradigma não possuem a similaridade factual necessária.
Em um deles, também de relatoria do ministro Aldir Passarinho Junior, no qual se isentou o banco de responsabilidade, o próprio ministro ressalvou expressamente a possibilidade de, em certos casos, o entendimento ser diverso. “Ressalvo, no entanto, situações peculiares, em que haja indício de saques por terceiros, como naquelas situações em que as retiradas são feitas em valores sucessivos, em caixas eletrônicos distintos, ou procedimentos que indiquem, com clareza, padrão inusual, que merecesse, após reiteração, também algum zelo do banco em certificar-se sobre o efetivo uso do cartão pelo correntista”, afirmou o ministro no Acórdão citado.
O valor da indenização também não foi considerado excessivo pela Turma, o que tornaria injustificada a intervenção do STJ pretendida pela Caixa Econômica Federal.