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Direito de pleitear dano moral é intransmissível

A pessoa que tenha sofrido danos morais é a única que pode entrar com um processo pleiteando uma indenização para amenizar o dano à sua honra. Essa foi a conclusão, por maioria, da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. De acordo com a decisão, o direito de solicitar danos morais é personalíssimo e intransmissível, não sendo permitido nem aos herdeiros diretos do ofendido.

Rosana e Rosemary Sad da Cruz, filhas do ex-servidor da Justiça do Rio de Janeiro Waldemiro Cruz, entraram com uma ação contra o advogado Sylvio Kelner exigindo uma indenização por danos morais sofridos pelo pai. As filhas de Waldemiro, falecido em junho de 1995, tomaram conhecimento de uma sindicância instaurada contra o pai para investigar uma denúncia, feita por Kelner, considerada pelas herdeiras como uma calúnia.

De acordo com a denúncia que resultou em sindicância, Waldemiro Cruz, servidor da Justiça estadual por cerca de 30 anos, teria pedido a Sylvio Kelner o pagamento de propinas para a tramitação dos processos judiciais sob a responsabilidade do advogado. Segundo Rosana e Rosemary, o relatório final da sindicância teria concluído pela “absoluta inexistência de fato delituoso” praticado por Waldemiro Cruz. E, mesmo tendo notícia do constrangimento sofrido pelo genitor apenas dois anos após sua morte, as filhas, como únicas herdeiras e sucessoras do pai, decidiram exigir os danos morais causados pelo ato do advogado.

O Juízo de primeiro grau extinguiu o processo sem o julgamento de seu mérito. A sentença entendeu que as filhas de Waldemiro Cruz não seriam legítimas para propor uma ação por danos morais que não as teria atingido diretamente. Rosana e Rosemary apelaram, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro confirmou a decisão de primeiro grau. De acordo com o TJ/RJ, o direito de defender a honra seria personalíssimo, sendo “impossível seu exercício por terceiro, ainda que herdeiros diretos (filhos)”. Inconformadas com as decisões desfavoráveis, as filhas de Waldemiro recorreram ao STJ. No recurso, afirmaram que o artigo 1526 do Código Civil reconheceria o direito ao ressarcimento por danos morais como transmissível aos herdeiros da vítima, “por ser de natureza patrimonial”.

A ministra Nancy Andrighi rejeitou o recurso das filhas de Waldemiro mantendo as decisões anteriores. “Não se justifica que aquele que não sofreu qualquer dano, seja direto ou indireto, venha pleitear indenização, pois não se atingiu qualquer bem jurídico, patrimonial ou moral, a ele pertencente”. Para a relatora, se fosse admitida a legitimidade dos herdeiros em uma ação de danos morais, se estaria, apenas, “prestigiando o caráter penal da indenização,” contra o agressor. Porém, o efeito compensatório da indenização não seria atingido, “tendo em vista que a prestação pecuniária não mais poderia proporcionar à vítima uma satisfação material e sentimental de forma a atenuar os danos morais sofridos”.

Nancy Andrighi também destacou o fato de não se poder considerar o dano moral como de natureza patrimonial, pois se estaria igualando a ofensa à honra ao dano material. E fez, ainda, um alerta: “Ao se permitir que aqueles que não sofreram qualquer dano moral, seja direto ou indireto, venham a pleitear indenização pelo simples caráter patrimonial desta, estar-se-á, em verdade, admitindo que se mercadeje com os danos morais, o que se revela inadmissível e reprovável”.

O ministro Pádua Ribeiro acolheu o pedido das irmãs, divergindo da relatora. Já o ministro Ari Pargendler entendeu que, em princípio, “o direito à indenização pelo dano moral se transmite hereditariamente”, mas rejeitou o recurso de Rosana e Rosemary. Segundo Pargendler, seria preciso que a vítima tivesse, em vida, demonstrado ter sentido “o dano moral que os herdeiros querem ver reparado”, o que não ocorreu no caso em questão. Para o ministro, por ter Waldemiro entendido a sindicância como um aborrecimento inerente às suas funções, não tendo manifestado, nem aos parentes, o sentimento de ter sido atingido na sua honra, “os herdeiros não podem transformá-lo em vítima da prática de crime de calúnia para reivindicar, como sucessores, a indenização do dano moral correspondente”. O entendimento da relatora também foi acompanhado pelo ministro Carlos Alberto Menezes Direito.