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Pátrio poder pode ser restringido se for para preservar “verdadeiro interesse” da criança

Não existindo razões que justifiquem a retirada do menor da companhia de seus avós, detentores de sua guarda provisória, é possível restringir os direitos decorrentes do pátrio poder. Com o entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça não conheceu, por unanimidade, do recurso especial do comerciante H.J.M.F., que pretendia que seu filho, P. T.G, dez anos, passasse a viver com ele, apesar de o garoto ter vivido com os avós maternos desde os seis meses de vida.

Em 1990, H.J. se separou da mulher, que voltou a morar, junto com o filho do casal, na casa dos pais dela . Pouco tempo depois, a mãe do garoto morreu em um acidente de carro e a guarda provisória de P.T.G. foi delegada aos avós, pois H.J. não apresentava, naquele momento, situação financeira estável. Após quase dez anos, o comerciante entrou na Justiça para revogar a guarda da criança, alegando que não tinha boa convivência com a avó de P.T.G., o que dificultava o cumprimento de seu direito de visitas. Mesmo admitindo que o menino foi “muito bem acolhido pelos avós, que souberam educá-lo e amá-lo”, H.J. ingressou com uma ação de revogação da guarda do menor, argumentando que tinha a intenção de “exercer na plenitude o pátrio poder que a lei lhe deferia”.

O Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba negou provimento ao recurso do comerciante, alegando não haver motivação “plausível” para retirar a criança do convívio de seus avós, “que o assistem devida e condignamente”. Além disso, uma avaliação psicopedagógica do menor atestou que a manutenção da guarda com os atuais responsáveis pela criança seria a decisão mais indicada, uma vez que, durante o processo de entrevista, P.T.G. “não falou ou projetou a figura paterna em nenhum momento”.

Inconformado, o pai do garoto recorreu ao STJ afirmando que seu filho estava sendo vítima de uma “sugestão emocional”, o que invalidaria o resultado da avaliação psicopedagógica. “O fato do menor ter preferencialmente escolhido morar com os avós não causa espécie. Além da sugestão emocional, P.T.G. não convive com o pai”. H.J. também ressaltou: “Avô não é pai, e avó não é mãe. Por mais zelo que dispensem ao seu neto, jamais eles irão suprir a carência afetiva de pai que o menor sentirá para o resto da vida”.

O ministro Ruy Rosado de Aguiar, relator do processo , debateu a dificuldade de julgar casos envolvendo guarda de crianças. “Ora brigam os cônjuges, ora os pais ou um deles com outros parentes, ou com terceiros, ora entre terceiros que lutam pela guarda etc. De modo geral, os adultos todos têm suas razões, ora por egoísmo ou para agredir, ora por elevados propósitos em favor da criança”. Em face do cenário sempre complexo desse tipo de causa, Ruy Rosado afirmou que o “verdadeiro interesse do menor” deve prevalecer sobre todos os outros valores.

Desse modo, o ministro concluiu: “As instâncias ordinárias reconheceram que o interesse do menor está em permanecer onde se encontra e não vejo razão para desfazer essa conclusão. Contrária à lei ela não é, pois o sistema permite ao juiz deferir a guarda a quem melhor possa satisfazer o interesse da criança, ainda que para isso tenha que restringir os direitos que decorrem do pátrio poder. A retirada do menor do ambiente onde viveu praticamente toda sua existência será causa certa de transtornos e dificuldades, talvez insuperáveis para a sua formação, que somente se justificaria na presença de razão muito forte, não apenas as apresentadas pelo pai da criança”.

Obs: O caso em questão tramita em segredo de Justiça e por isso não divulgamos o número do recurso e os nomes das partes.

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