O projeto “Dez Medidas contra a corrupção”, criado para receber apoio popular e assinaturas para todas as medidas elencadas nessa sugestão legislativa, tem em seu item 7, chamado de Medida 7 (#medida7) pelo próprio site, o seguinte conteúdo:
7. Ajustes nas nulidades penais
10 medidas contra a corrupção
[…]
Além disso, sugere-se a inserção de dois novos parágrafos no art. 157, para introduzir a ponderação dos direitos e interesses em jogo na avaliação da exclusão da prova, o que está em harmonia com a legislação de diversos países democráticos, inclusive a norte-americana, de onde foi importada a regra da exclusão da prova ilícita e da prova derivada da prova ilícita.
[…]
Essa medida, de uma forma bem objetiva, visa criar uma regra subjetiva de “direitos e interesses” para validação de uma prova que, em regras atuais, seria totalmente descartada devido a forma pela qual foi colhida.
A justificativa é a de que a informação deveria ter muito mais valor do que a ilicitude de sua coleta. O exemplo que comumente se utilizava pelos criadores deste projeto (Procuradores Federais e Juízes Federais, muitos envolvidos na Operação Lava-Jato) se dá da seguinte forma:
Há um furto em uma residência. O ladrão invade a casa/apto e furta um notebook, um desktop ou mesmo um celular. Sua intenção é a do simples furto. Mas… ao ligar os equipamentos o criminoso identifica fotos que incriminavam o residente do imóvel ao crime de pedofilia, por exemplo. O ladrão levaria o computador furtado à delegacia e faria a queixa-crime contra o residente e proprietário dos equipamentos.
Hoje, por terem sido fruto de um furto, crime tipificado no código penal, essas provas não teriam validade alguma. Mas essa história do exemplo passou a ser o argumento principal para aprovação dessa medida 7.
Mas as críticas, dessa forma subjetiva que se pretende implantar, indicam a possibilidade de se criar, seguindo o mesmo exemplo, uma categoria de “ladrões profissionais” que, criminosamente, poderiam ser contratados para invadir casas de inimigos pessoais, adversários políticos, com o objetivo de realizar roubo/furto de equipamentos pessoais, documentos, objetos para serem usados como prova. Sendo o furto um crime com pena muito menor, este compensaria dado os “ganhos” de se entregar o material comprometedor à polícia (e, quem sabe, receber um perdão judicial). O objetivo real seria mascarado pelo furto. Até caso o objetivo real seja o de revenda, no fim poderá ser transformado em material para chantagens, extorsões diante do conteúdo encontrado nos equipamentos furtados. Ou mesmo que partes contrárias interessadas possam ter essas informações para apresentá-las diretamente à polícia para posterior uso como prova de algum crime que por lá possa existir. Mesmo que não tenham sido solicitadas judicialmente e nem que haja algum Inquérito aberto, investigação ou um processo em andamento. O Crime compensaria.
Aplicando aos novos acontecimentos, da divulgação de diálogos pelo site The Intercept, hoje, as provas ( documentos e diálogos vazados por “hackers”) são ilegais e não podem ser usadas em nenhuma ação ou processo administrativo contra seus agentes. Seus efeitos ficam apenas no ambiente político. O que não é pouco. Mas juridicamente, inúteis sua utilização direta para incriminar os procuradores e juízes envolvidos.
As conversas vazadas, neste caso, podem ser desmentidas caso os alvos demonstrem seus logs de chats, ou até mesmo que outros participantes de grupos do Telegram em questão mostrem seus logs para análise. Só assim essas provas ilegais seriam validadas mediante apresentação voluntária e/ou requisição judicial.
Só que mesmo essa ideia de aproveitamento das provas obtidas de forma ilegal, tem sido inclusive debatida pelos integrantes do Supremo Tribunal Federal. O Ministro Alexandre de Moraes, em seu livro “Direito Constitucional” possui uma passagem:
As condutas dos agentes públicos devem pautar-se pela transparência e publicidade, não podendo a invocação de inviolabilidade constitucional constituir instrumento de salvaguardas de práticas ilícitas, que permitam a utilização de seus cargos e funções ou empregos públicos como verdadeira cláusula de irresponsabilidade por seus atos ilícitos(…).
Alexandre de Moraes em seu livro Direito Constitucional
Ou seja, o princípio da inviolabilidade da intimidade não pode ser usado pelo servidor público para esconder atos ilícitos, segundo o ministro.
Mas caso a Medida 7 tivesse já sido implantada como lei no Brasil, esse caso mudaria totalmente de rumo, pois caberia (caso de um processo judicial aberto) aos Juízes e Promotores do caso a decisão de receber de forma legal todas esses informações, seguindo com a ideia da “ponderação de direitos e interesses”, mesmo que tenham sido fruto de um “furto” realizado por Hackers em uma propriedade privada (smartphones e computadores).
Nota do MPF e respostas de Deltan Dalagnol e Sérgio Moro
A nota oficial do MPF dá ênfase exatamente na ilegalidade da forma que se conseguiram todos os dados que estão sendo aos poucos publicados pelo The Intercept. O próprio Procurador da Lava-Jato Deltan Dallagnol em suas redes sociais enfatiza exatamente ilegalidade dessas provas. O que é verdade, nas atuais condições legislativas e jurisprudência.
Mas fica como uma curiosidade porque o procurador Dallagnol e o próprio atual Ministro da Justiça Sérgio Moro focam em suas respostas públicas naquilo que eles mesmos, em diversas entrevistas, declaram que são contra o descarte de provas se o conteúdo é valioso para o processo, independente do meio em que foram conseguidas.
Com informações do site Dez medidas contra a corrupção.
Livro Direito Constitucional de Alexandre de Moraes