A determinação pela Justiça de “culpa recíproca” dos cônjuges quando da separação não extingue o dever de prestar alimentos proviosionais, ou seja, não isenta do pagamento de alimentos devidos ao ex-cônjuge até o trânsito em julgado da sentença da separação (quando não cabe mais recurso). A conclusão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). De acordo com os ministros, os alimentos devem ser pagos durante o processamento da ação e estendidos até o trânsito em julgado da decisão que definir a separação e suas conseqüências para os ex-cônjuges. Porém, o dever de prestar alimentos não se estende até a efetiva partilha dos bens do casal.
“A” entrou com uma ação de separação judicial litigiosa contra sua esposa, “B”, com quem estava casado desde 1969, sob o regime de comunhão universal de bens. Para justificar seu pedido de separação, “A” destacou a notícia-crime feita por “B”, em 1994, na qual a mulher afirmou ter sido agredida pelo marido. Para “A”, esta foi “a gota que faltava no copo d’água da desunião conjugal”, pois seria uma calúnia. “B” contestou a ação movida pelo marido afirmando que seria seu o direito de exigir a separação, como vítima das agressões físicas por parte de “A” ao longo da vida conjugal. Além da contestação, B entrou com uma ação exigindo do marido o pagamento de alimentos provisionais. Por sua vez, “A” contestou o pedido de alimentos destacando que a mulher trabalha, possuindo renda própria, e ainda registrou uma queixa-crime contra “B” reiterando suas afirmações de calúnia e difamação.
O Juízo de primeiro grau acolheu parcialmente a ação movida por “A” decretando a separação do casal. A sentença reconheceu a culpa de ambos pelo fim do matrimônio. Com relação ao pedido de alimentos feito pela mulher, o Juízo condenou “A” a pagar os alimentos a “B” até a efetiva partilha dos bens e o trânsito em julgado da sentença que decretou a separação. “A” e “B” apelaram. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES) confirmou a sentença concluindo pela culpa recíproca dos cônjuges pela separação. E, por esse motivo, o Tribunal isentou “A” de pagar os alimentos provisionais a “B”, entendendo que reconhecida a culpa recíproca “inexiste a obrigação alimentar de um para o outro”.
Tentando modificar a decisão do TJ-ES e receber os alimentos provisionais, “B” recorreu ao STJ. No recurso, “B” destacou que a partilha ainda não teria sido realizada estando os bens do casal na posse do ex-marido. Por isso, para a recorrente, seria “indispensável a continuidade da prestação dos alimentos”. Segundo “B”, o TJ-ES teria tratado os alimentos como definitivos, mas, na realidade, o pedido seria de alimentos provisórios até a partilha dos bens. “A” também entrou com um recurso especial afirmando que a culpa pela separação seria exclusiva da mulher e, por esse motivo, não seriam devidos por ele qualquer tipo de alimentos.
Os dois recursos foram julgados pela Quarta Turma, sob a relatoria do ministro Ruy Rosado de Aguiar. O relator acolheu parte do recurso de “B” determinando o pagamento por “A” dos alimentos provisionais até o trânsito em julgado da sentença que decretou a separação. “O fato de ter sido decretada a separação por culpa recíproca não elimina o direito de a mulher continuar recebendo alimentos – porque deles necessita, e o marido os pode fornecer – até o trânsito em julgado da sentença, porquanto a cassação dos provisionais antes disso causaria maior dano à mulher do que ao marido”, concluiu o ministro.
No entanto, Ruy Rosado rejeitou o pedido de extensão dos alimentos até a partilha dos bens. “Estaria em estender essa obrigação até a partilha dos bens do casal, no caso de a mulher não ter renda própria, ou quando permanecem sob a administração do marido os bens opostos a uma atividade remunerada”, o que não seria o caso, pois, de acordo com o processo, a mulher trabalha, possuindo renda própria. O relator destacou ainda que, mesmo não tendo direito aos alimentos até a partilha, “B” poderá cobrar do ex-marido os prejuízos de não estar usufruindo dos bens, que estão na posse de “A”.
O recurso de “A” foi rejeitado pelo relator. Segundo Ruy Rosado, a análise da culpa pela separação – recíproca ou exclusiva do mulher – só poderia ser feita com reexame de provas, o que não é permitido em recurso especial. Ruy Rosado destacou a crítica feita por “A” com relação às dificuldades impostas pela prática cartorária, de não permitir a realização da partilha já no processo de separação. Porém, segundo o relator, voltar à fase da partilha iria causar uma demora ainda maior, “o que não convém, pois é curta a vida para tão grande demora”. Dessa forma, a partilha dos bens do casal deve ser feita em processo próprio, devendo o ex-marido pagar alimentos à ex-mulher até o trânsito em julgado da sentença de separação, não se estendendo este dever até a conclusão da partilha.