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Dos deveres do Juiz

IMPARCIALIDADE E INÉRCIA NA ATUAÇÃO DO JUIZ

Cumpre ressaltar a carga valorativa que a imparcialidade e a inércia têm no direito, de modo que devemos desmistificá-los para que não se possa fazer confusão na atuação do juiz no processo, ou ainda, qualquer juízo de valor acerca de suas decisões sem antes refletirmos sobre a sua missão dentro do processo.A imparcialidade é pressuposto nas decisões judiciais, é a certeza de que a decisão não se reveste de qualquer eiva de emoção, predileção ou qualquer outro sentimento que tenha o condão de impor e desviar uma decisão judicial do que lhe informaria a razoabilidade e o sentimento de justiça, neste sentido a professora LÍDIA REIS assevera que: “(…) o juiz moderno compreende que lhe é exigida a imparcialidade, no que diz respeito à oferta de iguais oportunidades às partes e à recusa em estabelecer distinções em razão das pessoas ou reveladoras de preferências personalíssimas”. Importante salientarmos o conceito de parte para ao final concluirmos o que orienta a imparcialidade das partes no processo.

Na lição de JUVÊNCIO VASCONCELOS VIANA, podemos conceber que a parte “poderá apresentar-se da seguinte forma; a) em nome próprio, na defesa do próprio interesse; b) em nome próprio, defendendo direito alheio (substituto processual – art. 6º do CPC) e c) por intermédio de outrem, na qualidade de seu representante”.

Para DE PLÁCIDO E SILVA o conceito de parte seria:”parte, no sentido processual não é somente o autor ou o réu. Parte também é o opoente ou o assistente ou todo aquele que, no exercício de legítimo e próprio direito vem a intervir numa causa em curso.”

Por fim, OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA, “parte, portanto, segundo este conceito, será aquele que pede (autor) para si alguma providência judicial, capaz de corresponder ao que Chiovenda denomina um bem da vida; e aquele contra quem se pede esta providência (réu).”

Destarte, parte é todo aquele que age com parcialidade, movido por emoção ou outro sentimento propulsor que lhe seja capaz de dinamizar suas condutas, por muitas vezes, em razão de sentimentos íntimos desfocados de referenciais de razoabilidade. Portanto, podemos concluir que quando um juiz move-se por sentimentos que devem escapar-lhe ao momento de suas decisões, este age com parcialidade.

Ainda, o CPC cuidou de traçar hipóteses em que ficaria caracterizado o impedimento, o qual, por consectário lógico poderia levar a parcialidade do juiz, o que por decorrência tem o condão de anular todos os atos praticados por esta autoridade. Pois o artigo 134 do CPC se incumbe de declinar algumas hipóteses – ressalte-se que este rol é exemplificativo, estando a lei impossibilitada de prever todas as situações possíveis no campo da vida – em que ficaria prejudicada a atuação do juiz.

A neutralidade, por seu turno, não significa o juiz isolar-se na função judicante, estando alheio às transformações sociais, o magistrado deve estar ciente de todos os obstáculos e albergado dentro de uma ordem jurídica, importando-se com o uso da racionalidade, exprimir uma decisão justa. A professora LÍDIA REIS traça importante histórico na atuação do juiz:(…)Após a revolução francesa, a vitória da burguesia trouxe para o pensamento jurídico a tendência da preservação dos interesses individuais, limitados apenas pela norma, expressão dos ideais coletivos. Dessa tendência decorreu como conseqüências, um extremo apego à lei na interpretação e aplicação do Direito pelo juiz, assim como a proibição, imposto ao Judiciário, de participar da criação jurídica, atividade exclusiva do Legislativo, órgão representante da vontade popular. Tais conseqüências reforçavam o ideal de neutralidade do magistrado.

A evolução da atividade judicante ao longo do tempo decorreu das recorrentes situações que emergiram das relações sociais, da organização político – econômica do Estado. Pode-se perceber que a organização social, econômica e política reclama um juiz atuante, desprendido de preconceitos, ligado ao ideal de justiça. Para tanto alcançar é necessário que o juiz cada vez mais se aperceba das minúcias que regem as relações e que não se isole num crepúsculo estruturado por normas abstratas sem co-relação com o mundo fático.

Nos remotos tempos pensava-se que o juiz estava adstrito apenas à aplicação mecânica da norma ao fato, olhando apenas a letra fria da lei, prestigiando apenas um mero silogismo, em que a premissa maior seria a lei, a menor, o fato e a conclusão: a sentença. Percebendo, desta sorte, que em nada sobressaltava ao juiz ser atencioso aos fatos a ele apresentado e ao deslinde da causa caso tenha que agir mecanicamente. Portanto, o referido dogma da neutralidade, na realidade, prestou um desserviço ao principal objetivo da sentença, a realização da justiça.

Nesta linha, FRANK apud LÍDIA REIS “ressaltou o caráter criador da sentença, bem como a importância, na decisão, da pessoa do magistrado e de seus conteúdos internos. Para ele, nas sociedades complexas, as decisões jurídicas apresentam um caráter plástico e mutável, com a finalidade de amoldarem-se às cambiantes circunstâncias da vida social” .

Segundo FRANK apud LÍDIA REIS, “as normas gerais consistem em apenas um dos ingredientes presentes na sentença Todavia, o mesmo autor não esquece a importância do fato de que as normas, os princípios jurídicos nelas contidos, os precedentes jurisprudenciais, os valores gerais contribuem para a formação dessas intuições”.

Não podemos deixar de sopesar os matizes individuais de cada caso concreto, desperdiçando a inteligência, o objetivo do juiz na resolução da contenda e o dever de fazer que a justiça se imponha em cada caso. Também não podemos, pois, pensar em juizes alheios ao ideal de justiça, dado que aparenta pouco provável que um juiz olhe para o processo e não se importe se o autor ou réu vencerão, estando amparado por provas firmes de que A é credor do direito em relação a B.

Desta sorte, a atividade judicante reclama um juiz capaz de valorar os fatos e as situações que lhe são apresentadas de modo a não somente entregar a solução fria da subsunção do fato a norma, mais uma solução que tenha calor humano e seja capaz de dignificar a atividade judicante, que tenha o condão de imprimir justiça ao caso concreto, dado que não pode estar indiferente ao resultado da causa dentro do anseio de justiça. Outrossim, a sua intervenção no processo orientará a busca do resultado útil. Portanto, deve ser prudente e zeloso na busca da justiça em cada caso, empenhado em bem exercer sua profissão, fazendo vitorioso aquele que tem o melhor direito, não perdendo de vista, estar respaldada o judiciário por seres pensantes e capazes de perceber o sofrimento da parte que reclama por um direito notório e inconteste.

Neste sentido afirma OLIVEIRA:Indispensável, outrossim, desligar-se de concepções unilaterais, que só enxergam a norma ou o fato, sem incluir o valor, como requer uma visão necessariamente totalizante do fenômeno jurídico. A esse respeito, tenho ressaltado que o plano dos fatos trabalha com efeitos físicos, próprios do mundo natural, como acontece com a evaporação da água, efeito de seu aquecimento a 100°C. Já o mundo jurídico lida com valores, e o efeito (jurídico) da norma não é nem o simples valor nem o simples fato, mas o valor atribuído ao fato, conforme o enquadramento realizado pela norma.