A maior parte das democracias modernas onde a divisão dos três poderes é um princípio regulador cujo alcance na prática é limitado por muitas exceções1
A independência do legislativo pode ser reduzida de diferentes formas, seja diretamente pelo legislativo seja pelas manobras do executivo.
É incontestável que um simples cidadão, ao transgredir uma lei do seu país, deva ser entregue nas mãos do poder judiciário. E este, para julgar imparcialmente deva estar a salvo de qualquer pressão externa seja por parte do legislativo quanto por parte do executivo.
Os partidários da democracia2 concordam em reconhece-la como um regime digno a atender tanto ao Estado de Direito como a separação de poderes3.
Mas também possui adversários que questionam o privilegiado laço que a democracia afirma ter com a liberdade26.
Os adeptos do fascismo ou fundamentalistas de todas as religiões visam, na verdade, instaurar uma ditadura (leiga ou teocrática).
Foi bem formulado por Richard Rorty que defende a “evidente” superioridade da democracia por si mesma, e explica em texto de 1984 intitulado “A prioridade da democracia sobre a filosofia”.
Rorty inspirado em Dewey declara que o principal mérito da democracia é “produzir menos sofrimento inútil do que qualquer outro tipo de regime”.
O problema proposto é o dos limites do racionalismo da questão relativa da liberdade que já se encontra desde da filosofia grega sob duas versões distintas: uma radical, em Platão; e outra, mais moderada, em Aristóteles.
Tanto em Platão como em Aristóteles como até mesmo seu mestre em comum, Sócrates ambos fundadores da tradição filosófica ocidental apesar de partidários da democracia, alertaram sobre os perigos para a comunidade política que o excesso de liberdade poderia causar…
A palavra”democracia”4surge nos textos gregos do século V a.C., cada polis (cidade) constituía um Estado independente, compreendendo apenas um número limitado de habitantes, agrupados em um território restrito, daí ser possível a democracia direta, onde os cidadãos reunidos habitualmente no mesmo local público(agora) discutem e decidem conjuntamente os assuntos de interesse geral. Adotam o princípio de votação com base na igualdade aritmética na qual um cidadão significa ou vale um voto.
Existe evidentemente um valor fundamental para a cidade democrática, é isonomia correspondendo a igualdade dos direitos políticos para os homens livres.5
Quanto às leis e decisões, tal tarefa confiada a funcionários responsáveis diante da assembléia dos cidadãos, e geralmente sorteados. Seu mandato é de certa duração: de alguns meses a um dia.
Assim grandes probabilidades faz com que todo cidadão possa ter chances de exercer uma função executiva ou judiciária pelo menos uma vez na vida6.
Tal regime favorável à liberdade, não é, no entanto, liberal pois os gregos como todos os povos da Antigüidade, não separaram a política da religião7.
A segunda razão que prova que a democracia grega não é liberal é que os critérios definidores do status de cidadão também um dos mais restritivos.
Só um indivíduo em Atenas do sexo masculino, nascido “livre”e de pai e mãe atenienses, pode tornar-se cidadão.
Restam três categorias de seres humanos que não chegariam nunca até a cidadania, as mulheres, os estrangeiros e os escravos.8
Aliás não é a exclusão da mulher do cenário público e político um traço peculiar da Grécia e nem das civilizações antigas. Está ligada a um preconceito que perdurará pois o direito de voto só será concedido às mulheres na maioria das democracias ocidentais, depois da II Grande Guerra Mundial, e, ainda está longe de ser admitido por toda a parte fora do Ocidente.
Mesmo na valente e corajosa democracia brasileira, onde recentemente se elegeu um “presidente-operário e companheiro”, o Lula, constatamos que nos escalões superiores do poder, a mulher ainda é minoria. Não obstante a mulher apresentar estatisticamente maior nível de politização.
A exclusão dos estrangeiros está ligada a preconceito mais difundido, e não possuíam em Atenas nenhum status político ou cívico, gozam de um status social que apenas lhes permite a exercer sua profissão.
Quanto aos escravos, a pior das três classes e apesar da existência de procedimentos jurídicos de libertação, negam-se a estes quaisquer direitos e até mesmo a qualidade de ser humano, pois são res(coisa)9.
Ironicamente, sem a presença dessa mão-de-obra, a sobrevivência da democracia não seria possível10 …
Não é estranho que Aristóteles estime indispensável consagrar à justificação da escravatura onde refutava a idéia segundo a qual a escravidão não seria “natural” (physei) quanto se acreditava então …
Rousseau aponta os motivos do sucesso da democracia direta ateniense devido serem pouco numerosa a população e se concentrar em território restrito, e, totalmente dispensados da preocupação de trabalhar para ganhar a vida.
Aliás, o trabalho em geral tinha conotação pejorativa e já que existe uma mão-de-obra gratuita que dele se encarrega, que em geral, é de origem estrangeira, o que reforça sua exclusão de toda participação nos negócios públicos e até mesmo do conceito de humanidade.
Longe de ser a democracia grega “para todos” é mesmo uma oligarquia que só oferece à uma pequena elite o gozo da liberdade, porque se baseia sobre opressão indefinição de um número muito maior de seres humanos.
Outro fator relevante, é o fato de que com poucas exceções, os agentes do executivo nas cidades gregas estavam inteiramente nas mãos do legislativo. Ausente a verdadeira separação de poderes, possuía um risco permanente: o de ver o partido majoritário na assembléia do povo a exercer uma ditadura sobre a cidade.
A história grega se traduz numa luta interminável de facções entre o partido aristocrático e o partido popular.12
Mas nem Platão, nem Aristóteles e nem Sócrates estavam do lado do partido popular. O partido aristocrático é obrigado a aceitar a lei da cidade, mas ele tem como objetivo evitar que a democracia degenere em demagogia. Ou seja, impedir que o setor mais pobre ou mais popular da assembléia dos cidadãos assuma, sobre esta, uma predominância decisiva.
Era difícil de admitir para os aristocratas, o governo do povo pelo povo, e seria intolerável o governo pelo “baixo povo” ou populacho.
A fração da comunidade ateniense quer afastar do governo a maioria da comunidade julgada por ela socialmente inferior, e intelectualmente incompetente, tal fração a que pertencia Platão. Reside aí, a condenação platônica contra a democracia que segundo Léo Strauss jamais foi pronunciada (Quest-ce que la philosophie politique ? 1959 trad. francesa, Paris, PUF 1992, p.40).
A principal objeção socrática à democracia deve-se ao critério formal(correspondente a maioria dos sufrágios) e não a partir da competência ou do saber para pautar decisões. Resultando num profundo esvaziamento do conteúdo das noções de justiça, como também as de bem e mal.
Conduzindo a liberdade à degeneração , transformando-a em licenciosidade sob o risco de anarquia, risco do qual só é escapável pela tirania consagrada como o pior regime de governo concebível. (A República, Livro VIII).
Para Platão, a solução é confiar o poder àqueles que “sabem” , é o filosófo-rei.A estratificação social proposta por Platão era a seguinte: na base estaria a classe mais numerosa, a dos trabalhadores, excluídos de toda participação nos negócios públicos.
Mais acima, a classe mais restrita a dos “guerreiros”, encarregados de defender a cidade, e, no cume ou ápice, a classe ainda mais restrita e privilegiada a dos filósofos reais.13
Como a filosofia14 é a forma mais elevada de conhecimento humano e a que envolve todas ass demais. A aristocracia sonhada e idealizada por Platão é um suma, a aristocracia do saber, ou, do know-how. Era precursor de todas as formas modernas da tecnocracia.
Aristóteles enunciava que a democracia é perigosa porque permite à maioria do povo comandar por ser pouco educada e inclinada a atender aos baixos instintos.
E distinguia três formas retas de governo ou de constituição (politeia): a realeza, a aristocracia e a república ou governo constitucional, assim como também reconhece as três formas corrompidas que são desvios das formas retas: a tirania, a oligarquia e a democracia.
Alguns especialistas em teses aristotélicas preferem acreditar que este tendia mais para aristocracia ou para governo constitucional. Para eles, a aristocracia é definida como o governo dos melhores, ou dos virtuosos , ou dos mais sábios.
O governo constitucional seria então do tipo misto que combina traços de oligarquia com os traços da democracia (que seria o governo dos pobres).
Historicamente, portanto, a democracia grega estava fundada sobre a igualdade (dos direitos dos homens livres) mais do que propriamente sobre a idéia de liberdade(em sentido absoluto).
A democracia permite o reinado da minoria para quem Platão e Sócrates pensavam levar diretamente à tirania, enquanto que Aristóteles a identificava como tirania das massas. E tal duplo preconceito vai marcar longamente toda a filosofia ocidental15.
A democracia acarretaria inevitavelmente uma “orgia” de liberdade bem próxima À licenciosidade e com isto ocorreria a destruição da democracia ou a sua substituição por uma forma política ainda mais odiosa. A única saída é renunciar À liberdade, seria um bem em si
Léo Strauss que para fugir dos nazistas foi refugiar-se nos EUA, lança sobre a democracia “de massa” um olhar conservador, para quem a liberdade é menos importante do que a virtude, o conhecimento ou a excelência em geral. Strauss não acredita e considera que a filosofia política grega ultrapassada ou refutada.
A crítica socrática sobre a democracia não é por completo infundada. Despreza a regra da maioria que impõe competência e está longe de ser ideal.
É justificável temer a tirania da maioria que toda democracia quer seja direta ou não traz conforme pressentiram ao longo da história da humanidade vários filósofos tais como Platão, Kant e Tocqueville.
A liberdade nem sempre é o mais importante e nem o único bem valoroso, daí a pertinência da crítica socrática.
Depois ainda há a constatação empírica de que nenhuma democracia permite verdadeiramente o triunfo da liberdade e ainda abrange variantes como a forma forte e a forma fraca18.
Os modernos adversários da democracia19que são Martin Heidegger e Michel Foucault(que se antagonizam entre si muito menos que se poderia acreditar).
O intrigante é a simpatia de Foucault pro certas subcorrentes do anarquismo que, por certas subcorrentes do anarquismo que, no início dos anos 70, também não hesitou a comparar a França com os piores dos totalitarismos e nem em apoiar aos negacionistas.
Os argumentos de Foucault contra a democracia21 são contra a democracia são resumíveis em poucas assertivas: ” a democracia é um sistema fundado no respeito ao direito, um sistema “jurídico”, logo formal”.
A democracia dissimula hipocritamente o fato de que os homens estão distantes na realidade, de ser livres e iguais (e nunca22 o serão).
A democracia burguesa é apenas detestável do que outros regimes, na medida em que é o único que em lugar de reconhecer essa situação de contraste, a nega ou afirma que ela não tem importância”.
Eis aí, o porquê a acusação de Foucault em suas primeiras aulas no Collège de France, e que explicita em 1978, em sua conferência feita em Tóquio: “Em muitos pontos, fascismo e stalinismo apenas prolongaram toda uma série de mecanismos que já existiam nos sistemas sociais e políticos do Ocidente23.”
Retomada a ênfase acusatória em 1982 quando o filósofo repete uma das razões pelas quais o fascismo e stalinismo lhe interessam embora longe de serem originais, utilizaram simplesmente os mecanismos já presentes na maioria de outras sociedades, e se limitaram em grande parte, a reutilizar as idéias e procedimentos da racionalidade política democrática.
Giorgio Agamben em seu Homo sacer ( em 1995) retorna ao impasse do pensamento de Foucault e dedica-se a justifica-lo sob o ponto de vista teórico e do histórico24.
Assim sendo, toda a política ocidental seria o que Foucault chama “biopolítica”25 que é uma dimensão comum às democracias e aos regimes totalitários.
Os totalitarismos apenas levam ao “paroxismo” o que as democracias fazem. As distinções políticas tradicionais (direita e esquerda, liberalismo e totalitarismo, privado e público) conclui Agamben perdem sua clareza e inteligibilidade, já que a vida nua se torna sua referência fundamental, elas entram assim em zona de indiferença”.
Declaração bombástica mesmo foi feita por Karl Löwith (discípulo de Heidegger)2 pois “essa politização da vida” consiste na “estranha relação de contigüidade que une a democracia ao totalitarismo”.
Aponta também Agamben a freqüente facilidade com que em nosso século as democracias acabaram por se transformar em Estados totalitários (e, até inversamente).E as democracias recorrem as práticas totalitárias (experiências médicas com detentos e, etc).
E habitualmente os Estados democráticos que continuam atualmente a atribuir-se poderes exorbitantes, como violar o segredo de comunicações telefônicas privadas, definir critérios legais para morte biológica ou aprisionar arbitrariamente em “zonas de espera” que se assemelham aos “campos” onde toda a legalidade fica suspensa, os estrangeiros que reivindicam o status de refugiados.
Tanto a censura como a corrupção28 como também a tortura foram utilizadas pelas democracias moderna assim como também pelos Estados totalitários…
Toda a coletividade dilacerada por desigualdades abissais de fortuna, de prestígio ou poder, onde se instituía a guerra de todos contra todos e que não se estende como a democracia poderia ser o único regime que não escondesse uma “guerra social” desse gênero, o que justifica a célebre afirmação de Foucault ao mencionar: ” É preciso defender a sociedade”, corroborada por Clausewitz onde declara in verbis: “a política é a guerra continuada por outros meios”.(Michel Foucault, “Il faut défendre de la sociéte” , Paris, Seuil, Gallinnard, 1997, p.16).
Mais adiante, Foucault explica que a relação de poder é em geral, no fundo, uma relação de “guerra” de “luta de morte”. O princípio da inteligibilidade do político não deve ser procurado em nenhum outro lugar a não ser “no sangue e na lama das batalhas” referindo-se mais as batalhas históricas do que as reais”: “A lei nasce das batalhas, reais(…) dos massacres(…) que têm sua data e seus heróis do horror; a lei nasce das cidades incendiadas, das terras devastadas; ela nasce com os famosos inocentes que agonizam no dia que começa”.
Estamos todos em guerra uns contra os outros; “Não há indivíduo neutro” e, enfim, “a guerra está longe de acabar, as batalhas decisivas ainda estão sendo preparadas” (continua profeticamente Foucault quase adotando um tom nietzschiano).
Aliás, o próprio filósofo se diz taxativamente não-marxista, efetivamente não o é, na proporção em que não tem o que fazer com o materialismo histórico e até zomba das explicações históricas que terminam por atribuir à economia um papel determinante em última análise.
Analisando a própria biografia de Foucault assinalamos que foi amigo íntimo de seu professor na École Normale Supérieure o marxista Louis Althusser que nunca tocou no dogma fundamental que é a luta de classes, na qual o Estado longe de ser árbitro, seria necessariamente um agente engajado.
Reflete Althusser que tais “aparelhos do Estado” seriam a administração, a justiça, o exército, segue o mote de outro marxista Gramsci…
Althusser apenas assume a concepção marxista 1 de Estado vindo mesmo se influenciar mais em Boufainvillièrs que é o ideólogo mais fanático da chamada “reação nobiliária”.
Mas um impasse surge: a guerra é inevitável ? Publicado em 1959, Montesquieu, a política e a história continua sendo, apesar de sua concisão e seu aspecto didático, um dos mais estimulantes textos da filosofia política contemporânea.
Althusser bem lembra que foi Montesquieu o primeiro a alimentar o projeto de fundar uma “ciência” da política e da história. Ignorar a moral, a religião foi proposta aliás feita antes por Maquiavel, Hobbes e Spinoza.O caminho revolucionário consiste em afasta as teorias do direito natural e do contrato social.
O grande dilema da sociedade não é, em verdade, descobrir sua origem e, sim, o seu funcionamento. Montesquieu quer dar à necessidade real da história a forma da sua lei, extraindo a lei da diversidade dos fatos e de suas variações.
A lei que determina nossas normas políticas e está no “Espírito das leis”: representa o sistema de “forças em conflito permanente umas com as outras”.
Montesquieu sendo jurista visualizava bem que o direito pode tornar-se, nas mãos do Estado, um maravilhoso instrumento de poder para certas forças sociais estabelecerem sua dominação sobre outras.
Foi Montesquieu retrógrado e um dos principais adversários das teorias do contrato social, é porque estas teorias de inspiração”burguesa” e redundam num reconhecimento da igualdade de direitos, entre os homens o que seria inaceitável para o senhor de La Brède
Mas reconhecia alguns anos mais tarde assim como também Foucault que o universo da política não é o do direito “puro”, a politicamente é sumariamente a guerra continuada por outros meios…
Montesquieu teve o mérito de ser o único em seu tempo a observar cientificamente a política embota tenha igualmente feito Maquiavel a quem se credita os primeiros passos da ciência política.
Maquiavel foi o primeiro a pensar a política como uma relação de forças, como um conjunto de relação de forças em moto contínuo.( A ignorância é talvez a raiz de todos os males sociais, porque fere o homem no que lhe é mais específico: a racionalidade).
Muitos posteriormente tais como Spinoza e Hegel cometeu o maquiavelismo, apesar deste último filósofo, este não diz de forma alguma que o homem de Estado deva sistematicamente ignorar ou desprezar a moral.
E para escandalizar Strauss diz que a moral e a política não são a mesma coisa. A verdade e a justiça não possuem assim, na política, uma significação absoluta, e, sim relativa ligada a uma conjuntura e a um momento histórico determinado.
O príncipe deve ser capaz de determinar sem engano quais são as circunstâncias em q eu é preciso ser moral, e quando não o ser.
O problema prioritário do príncipe depois da conquista do poder é a manter-se no poder. E para tanto precisa adotar a estratégica adequada, conhecer bem as leis “objetivas” da política.
O homem luta pelo poder, nem sempre motivado pelo amor ao lucro, mas também movido por ver triunfar seus ideais e idéias. “Não se pode fazer nada se não tem primeiro, o poder”, a abordagem metodológica na política é ir direto À verdade efetiva da coisa” além das imaginárias que os homens fazem dela.”
A regra hermenêutica na política deve pautar-se em termos de relações de força. E perquire quais os motivos do combate. Efetivamente, Althusser consagrou Maquiavel, depois de Gramsci, dá ao Príncipe um caráter de verdadeira, ciência “objetiva” (em outras palavras, materialista) da história e da política.
Uma das limitações do pensamento maquiavélico era não definir o conjunto de leis gerais que regeriam os negócios humanos, e como resolver um problema político concreto.
Althusser consagrou Maquiavel como “o maior filósofo materialista da história”. Devemos reconhecer infelizmente que a sociedade democrática não escapa, mais que as outras, à violência, mesmo que ela consiga canalizar a “guerra” segundo procedimentos legais ou jurídicos ou mesmo procedimentos contratuais. Com certeza, a democracia permite garantir pelo menos para alguns, um certo grau de liberdade.30
Mas, em nenhum caso, ela garante uma liberdade total ou irrestrita pois que a democracia enquanto regime é incapaz de pôr termo a todas as formas de violência que se exercem sobre a humanidade.
A liberdade embora um bem, não é o único bem desejável. Aliás, existem os pensadores que contestam a legítima existência da liberdade.
A justiça também é um precioso “bem desejável” e talvez mais importante que a própria liberdade …
Apesar de imperfeita, a democracia é o menos pior dos regimes possíveis e, é o único regime a tentar instaurara “a justiça” sem sacrificar a “liberdade”31. Assim é o enigma do poder…
Adendos1 “Não é a consciência dos homens que determina o seu ser social, mas , ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência”. Karl Marx
2 Somente na clara noite do nada da angústia surge a originária abertura do ente enquanto tal(…) Heidegger
3 “Não observar uma lei é dar mau exemplo, sobretudo quando quem a desrespeita é o seu autor; é muito perigoso para os governantes repetir a cada dia novas ofensas à ordem pública”Maquiavel Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, 2 ed., ver., Trad. Sérgio Barth, Brasília, Ed. Universidade de Brasília, p. 198, 145-182.
4. Diz Gérard Lebrun: “Se, numa democracia, um partido tem peso político, é porque tem força para mobilizar um certo número de eleitores(…) A força não é sempre um revólver apontado para alguém; pode ser o charme de um ser amado, quando me extorque alguma decisão (uma relação amorosa é, antes de mais nada, uma relação de forças).”
5. “A justiça sem força é impotente: a força sem a justiça é tirânica. A justiça sem a força será contestada, porque há sempre maus: a força sem a justiça será acusada. É preciso, pois reunir a justiça e a força; e, dessa forma, fazer com que o que é justo seja forte, e o que é forte seja justo”(…) Blaise Pascal, pensamentos, Col. Os pensadores, São Paulo, Abril Cultural, 1973, p.117.
6. O déposta – em grego despotês – é uma figura da sociedade e da política gregas; é o chefe da família (…) entendendo-se por família e casa, três são as relações fundamentais: a do senhor e o escravo,a do marido e a mulher, das pessoas que dele dependem para sobreviver(…)
“Seu poder, escreve Aristóteles, é arbitrário pois decorre exclusivamente de sua vontade, de seu prazer e de suas necessidades. (…) onde houver politéia, não pode haver despotéia, não se pode manter o princípio do poder despótico, que pertence ao espaço privado e à vida privada.(Marilena Chauí, privado, despotismo in Adauto Novaes, (org.,) Ética p.357).
7 O grande exemplo está ligada à morte de Sócrates que fora condenado a beber cicuta por razões políticas e religiosas.
O tribunal popular encarregado de julgar Sócrates acusou-o de “corromper a juventude”, ou seja, de incita-los a desviar-se dos deuses da cidade e das regras morais fixadas pela tradição grega. Incitava os jovens a não se conformarem docilmente com as opiniões tradicionais.
Assim infringiu o dogma que estabelecia que não se devia questionar nem as tradições cívicas e nem os deuses que as garantiam. Sócrates ao criticar em sua época a democracia ateniense, também criticou a religião sobre a qual se apoiava.
Na verdade, a margem de existência da liberdade nas democracias gregas é a das mais reduzidas, se comparada com as atuais.
8. Visto que a autoridade sempre exige obediência, ela é comumente confundida com alguma forma de poder ou violência. Contudo, a autoridade exclui a utilização de meios externos de coerção: onde a força é usada, a autoridade em si mesma fracassou(…)
A autoridade implica em obediência na qual os homens retêm sua liberdade… Hannah Arendt, Entre o passado e futuro, São Paulo, perspectiva, 1972, p.129).
9.À violência é sempre dado destruir o poder, do cano de uma arma desponta o domínio mais eficaz, que resulta na mais perfeita e imediata obediência. O que jamais poderá florescer da violência é o poder. Hannah Arendt
10 A política não é ciência. É ação que se inventa. Os transformadores sabem que navegam sem mapa, campeando justiça e emancipação dos homens”. Marilena Chauí
11.Segundo Marilena Chauí, as determinações constitutivas do conceito de democracia são as idéias de conflito, abertura e rotatividade.
12. (…) E eu não tenho pátria: tenho mátria Eu quero frátria (…)Letra da música “Língua” Caetano Veloso
13. Dois axiomas , com efeito, aprecem guiar a marcha da civilização ocidental, desde de sua aurora: o primeiro estabelece que a verdadeira sociedade se desenvolve sob a sombra protetora do Estado; o segundo enuncia um imperativo categórico: é necessário trabalhar. (Pierre Clastres, A sociedade contra o Estado, p.135).
14. Outra característica das teorias políticas antigas é a concepção cíclica das história, segundo a qual os governos se alternam passando de uma forma par outra (de desenvolvimento ou de decadência), representando um curso fatal do destino humano.
15. “Dois amores construíram duas cidades: o amor de si levado até ao desprezo de Deus edificou a cidade terrestre, civitas terrena; o amor de Deus levado até ao desprezo de si próprio ergue a cidade celeste: uma rende glória a si, a outra ao Senhor; uma busca uma glória vinda dos homens; para a outra, Deus, testemunha da consciência é maior glória.” Santo Agostinho
16. A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem. Para que não se possa abusar do poder que, pela disposição das coisas o poder freie o poder… Montesquieu
17. A célebre disputa entre Voltaire e Rousseau onde este destaca a importância dos sentimentos e recusa o racionalismo exacerbado dos pensadores da Ilustração de Voltaire que não lhe poupa ácidas críticas.
18. Todos os homens têm igual direito à satisfação das suas necessidades e ao usufruto de todos os bens da natureza, e a sociedade deve consolidar esta igualdade. Babeuf
19. “Cada um é o único guardião autêntico da própria saúde, tanto física quanto mental e espiritual.” Stuart Mill
20 ” Qualquer pessoa que tenha lido a história da humanidade aprende que a desobediência é a virtude”. Oscar Wilde
21.”O melhor governo é aquele que não governa” Henry Thoreau
22. “A verdadeira moral zomba da moral” Pascal
23. “A indiferença é o peso morto da história. É a bola de chumbo para o inovador, é a matéria inerte na qual freqüentemente se afogam os entusiasmos mais esplendorosos”. Gramsci
24. Há verdades das quais não basta que nos persuadamos: é preciso senti-las. Tais as verdades relativas à moral.” Montesquieu
25. “Abdicar da liberdade é destruir a própria natureza humana” Rousseau
26. “O determinismo absoluto parte do princípio de que neste mundo tudo tem uma causa”. O progresso científico consistiu historicamente em estender a aplicação do princípio de causalidade a todos os setores da realidade: físico, químico, biológico, etc…” Sanchez Vazquez
27. “Em Roma ela se chama bustarela; em Moscou, vzyatha; em Berlim, tink geld e, em Brasília pode ser jeitinho, mas em qualquer lugar do mundo e a qualquer época será sempre a corrupção, uma prática tão antiga quanto a existência do homem. Sua arma predileta é a dissimulação, e seu instrumento mais eficaz, o suborno, desde o mais célebre da história o de Judas Iscariotes” (…)
28. Poderia-se dizer que livre, livre mesmo, é quem decide de uma hora para outra que naquela noite quer jantar em Paris e pega um avião. Mas mesmo este depende de estar com o passaporte em dia e, encontra lugar na primeira classe.
E nunca escapará da dura realidade de que só chegará em Paris para o almoço do dia seguinte. O planeta tem seus protocolos” Luis Fernando Veríssimo
29. À porta da cidade, teve de responder ao enigma de uma esfinge. Se errasse a resposta, seria morto, como muitos: já o tinham sido. O enigma era: Qual é o ser que de manhã de quatro pés, ao meio-dia, dois e ao entardecer, três ? Édipo acerto e disse: “O homem”.
De manhã (na infância), engatinha: ao meio-dia anda sobre os dois pés; ao entardecer (na velhice), anda sobre dois pés e apoiado à bengala. Com isso, Édipo entra como herói em Tebas, casa-se com Jocasta, a rainha, que era sua própria mãe. Cumpre-se, assim o destino, maketub.
30. A ideologia é um fenômeno que encobre as contradições sociais, tomando a aparência das coisas como a realidade dos fatos.
31. A luta pela justiça é uma parte essencial da luta pela liberdade. Eis o testemunho de um dos mais conceituados analistas das modernas teorias da libertação Paul Eugène Charboneau: “No plano internacional, povos inteiros são espoliados e mantidos sob tutela econômica, proletarizados e marginalizados enquanto nações são escandalosamente exploradas, num desprezo absoluto pelas mais elementares normas de justiça(…) Massas gigantescas chafurdam na miséria. Morrem de fome, estagnam no desemprego, ou então trabalham em condições piores do que as da escravidão, pois seu trabalho não lhes proporciona nem mesmo a alimentação necessária à manutenção da força vital” ( Da Rerum Novarum À Teologia da Libertação, são Paulo, Ed. Loyola, 1986, p.42).