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STF pode mudar precedente sobre o estupro como crime hediondo

O Supremo Tribunal Federal pode mudar seu entendimento quanto ao crime de estupro, para considerar a forma simples também como hedionda. Na sessão plenária de ontem (28/11), durante o julgamento de um Habeas Corpus (HC 81288), o ministro Carlos Velloso votou no sentido contrário da jurisprudência dominante da corte. Em seguida, a ministra Ellen, que é relatora de um outro Habeas Corpus sobre a mesma matéria, tomou a palavra e leu um longo voto, citando várias pesquisas que chamam atenção sobre a gravidade e a disseminação da prática de estupro na sociedade.

A atual interpretação do Supremo para a Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90) é a de que só tem essa classificação o estupro qualificado, ou seja, aquele do qual resultem lesões corporais graves ou morte. Na sessão de ontem, apreciava-se o caso de um pai condenado a mais de 16 anos de prisão por manter relações sexuais com duas filhas menores de idade. Entendendo não se tratar da forma qualificada, o relator, ministro Maurício Corrêa votou pelo deferimento do pedido de redução de pena.

O ministro Velloso, em seguida, opinou no sentido contrário. Ele fez uma análise da redação do artigo 1.º da Lei 8.072 com o objetivo de demonstrar que a intenção do legislador foi classificar as duas formas como hediondas. A ministra Ellen Gracie reforçou esse argumento explicando que é preciso fazer uma leitura sistêmica, comparando o estupro com outros crimes abrangidos pelo dispositivo.

Relator do Acórdão do Habeas Corpus 80479, que fixou a atual interpretação do Supremo sobre o assunto, o ministro Nelson Jobim mudou seu posicionamento, seguindo os votos de Velloso e Ellen. Ele disse que anteriormente havia feito leitura isolada da lei, e não interpretou corretamente o significado da conjunção “e”, que nesse caso significaria adição. O ministro Néri da Silveira chegou a se manifestar contra a mudança proposta pelos colegas, sustentando que a lei só classificou como hediondos formas qualificadas dos crimes, e o mesmo deveria valer para o estupro. Contudo, o julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do ministro Ilmar Galvão.

Em seu voto, a ministra Ellen foi além da análise legislativa. Ela trouxe vários estudos, baseados em fontes nacionais e internacionais que demonstram serem os danos psicológicos advindos do estupro mais contundentes e duradouros que os danos os físicos. Por isso, afirmou, “mesmo quando não há lesões corporais graves, há graves lesões psíquicas”.

Se for mudada a jurisprudência do Supremo quanto ao estupro, o mesmo deve ocorrer quanto à forma simples do crime de atentado violento ao pudor (artigo 214 do Código Penal), de que podem ser vítimas também pessoas do sexo masculino.