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STJ julgará mérito de processo sobre licitação para modernização de passaportes

O ministro Francisco Falcão, da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, levará a julgamento nos próximos dias recurso (mandado de segurança) impetrado pelo Consórcio Sinag (formado pelas empresas Siemens Ltda., Siemens Nixdorf e Tejofran de Saneamento e Serviços Gerais Ltda) contra ato do ministro da Justiça e do diretor-geral do Departamento de Polícia Federal, que revogou a licitação para contratar os serviços necessários à implantação e execução do Programa de Modernização, Agilização e Aprimoramento da Segurança e da Fiscalização do Tráfego Internacional e do Passaporte Brasileiro (Promasp).

Orçada em R$ 136 milhões, a licitação pública foi revogada pelo Governo federal após a desvalorização do real, em janeiro de 1999, quando houve a substituição do sistema de bandas pelo sistema de livre flutuação do dólar americano. O relator do caso negou a liminar requerida pelo consórcio, mantendo a decisão do Governo, que suspendeu a licitação. Segundo o Francisco Falcão, o consórcio vencedor queria corrigir o contrato, com base na desvalorização do real, o que caracterizaria a quebra da isonomia com as outras empresa participantes. Como a liminar foi negada, o Governo federal não ficou impedido de realizar nova licitação. A Primeira Turma do STJ julgará agora o mérito da questão.

Com o programa, seria possível reduzir as fraudes nos passaportes e nos vistos consulares emitidos pelo Brasil, abrangendo todos os postos de serviço do Departamento de Polícia Federal e do Ministério das Relações Exteriores, no Brasil e no exterior. O Promasp, que fez parte do Plano Plurianual da Presidência da República (1996-1999), combateria a crimininalidade transnacional, mediante controle da imigração no Brasil. Com o programa, o Brasil cumpriria compromisso assumido perante a Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci), relacionado à fiscalização e agilização do atendimento de passageiros do tráfego internacional.

O processo licitatório teve início em setembro de 1996 e foi concluído em janeiro de 1999, quando o Consórcio Sinag foi declarado vencedor, depois de apresentar as melhores propostas técnicas e comerciais. O preço global apresentado pelo Sinag foi R$ 135,8 milhões, contra R$ 189,3 milhões, oferecido pelo segundo colocado – Consórcio Passaporte Brasileiro. A licitação chegou a ser homologada e a partir daí foi iniciado o “detalhamento do fornecimento”, etapa que, seguindo o edital, precederia à assinatura do contrato. Com a desvalorização do real, o consórcio solicitou audiência com o ministro da Justiça para discutir o impacto da medida sobre o valor do contrato, já que a execução do programa depende de bens e serviços importados.

Analisando a solicitação, a Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça emitiu nota técnica sugerindo a revogação da concorrência, visto que a preocupação do consórcio em assegurar o reequilíbrio econômico do contrato implicaria em indexação do valor do ajuste ou em anterioridade de repactuação a contrato não firmado, mecanismos não previstos pela legislação brasileira. “A política governamental não propicia essa indexação. A justificativa para a revogação do certame está, evidentemente, na substituição do então sistema de bandas pelo sistema de livre flutuação do dólar americano, implantada a partir de 12/01/1999 e a desvalorização do real em cerca de 70%, que refletiram conseqüências para a Administração Pública, na condição de contratante, e para os empresários, na condição de contratados”, afirmou o consultor jurídico do MJ, Byron Prestes Costa, em nota ao então ministro Renan Calheiros.

Contra a decisão, o consórcio apresentou recurso administrativo, ao qual foi negado provimento. Na Justiça, o consórcio pretende demonstrar que a licitação foi revogada “de forma extemporânea, ilegal e com evidente abuso de poder”, o que violou seu direito líquido e certo. No mandado de segurança junto ao STJ, o consórcio pediu liminar para suspender temporariamente o ato do ministro até o julgamento final do recurso. Com a liminar, o consórcio pretendia impedir que o Ministério da Justiça abrisse nova licitação do Promasp. Após negar a liminar, Falcão enviou pedido de informações ao Ministério da Justiça.

Nas informações prestadas ao ministro, o Ministério da Justiça invocou a Lei 8.666/93, que dispõe sobre normas para licitações e contratos da Administração Pública. A Lei (art.49) confere poderes à autoridade competente para revogar licitação por razões de interesse público decorrentes de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta. “Ora, é inquestionável que a livre flutuação cambial adotada pelo Brasil tornou-se o fato superveniente de força maior a justificar a revogação, em nome do interesse público, ou seja, para evitar que a coletividade, de súbito, seja compelida a arcar com um preço desconhecido, bem mais alto que o inicialmente fixado no edital licitatório”, afirmou o assistente jurídico do MJ, Fernando de Carvalho Amorim, em ofício encaminhado ao ministro Francisco Falcão.

No parecer juntado ao mandado de segurança, o Ministério Público Federal opina pelo improvimento do recurso. “Não restam dúvidas que o procedimento licitatório alcançou a fase de homologação ao ato de julgamento e adjudicação. Resta saber da possibilidade de se revogar a licitação nessa fase. No caso, não se trata de anulação, já que o procedimento estava isento de ilegalidades. Assim revoga-se a licitação por interesse público, embora seja regular o seu procedimento. Portanto, a revogação da licitação nada mais é do que o exercício, pela Administração Pública, da sua faculdade de corrigir os seus próprios atos, carentes de utilidade para o serviço público”, afirma a subprocuradora-geral da República, Yedda de Lourdes Pereira, no parecer juntado aos autos.