O artigo 257 do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que “As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código”. Assim, ao contrário do que muitos imaginam, as multas por infrações de trânsito podem ser aplicadas a outras pessoas, que não sejam condutores ou proprietários de veículos automotores, bastando haver expressa menção no CTB.
Entretanto, alguns infratores de trânsito não são multados, por inexistência atual de sistemática que possibilite a aplicação da penalidade de multa sem o usual vínculo com o registro do veículo. Neste diapasão, é de se verificar que o próprio Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, ao tratar da responsabilidade pelo pagamento da multa, previu, por meio da Resolução nº 108/99, que “Fica estabelecido que o proprietário do veículo será sempre responsável pelo pagamento da penalidade de multa, independente da infração cometida, até mesmo quando o condutor for indicado como condutor-infrator nos termos da lei, não devendo ser registrado ou licenciado o veículo sem que o seu proprietário efetue o pagamento do débito de multas, excetuando-se as infrações resultantes de excesso de peso que obedecem ao determinado no art. 257 e parágrafos do Código de Trânsito Brasileiro”.
Embora tenha o CONTRAN, por meio da citada Resolução, tratado apenas das multas aplicadas aos veículos (excetuando-se ainda aquelas cujas responsabilidades sejam do expedidor e do transportador), o fato é que o Código de Trânsito estabeleceu determinadas infrações de trânsito em que as penalidades devem (ou pelo menos deveriam) ser aplicadas a pessoas físicas ou jurídicas expressamente previstas na lei, o que, por falta de meios técnico-operacionais, não tem ocorrido na quase totalidade dos órgãos e entidades executivos de trânsito e rodoviários.Para começar nossa análise destas infrações, basta verificarmos as infrações de trânsito cometidas pelos pedestres, previstas no artigo 254 do CTB: embora a lei preveja multa, em cinqüenta por cento do valor da infração de natureza leve (o equivalente a R$ 26,60), bem como já existam códigos de enquadramento (para o processamento das multas), estabelecidos pelo DENATRAN, na Portaria nº 01/98, juntamente com os códigos de todas as outras infrações, não se tem notícia de pedestres multados, por exemplo, por andar fora da faixa própria (ou por qualquer uma das condutas previstas nos seis incisos daquele dispositivo).Assim como foram previstas, no CTB, infrações cometidas pelos pedestres, também existem condutas a serem penalizadas, atribuídas aos condutores de veículos de tração animal ou propulsão humana, nos seguintes artigos:
Art. 247 – Deixar de conduzir pelo bordo da pista de rolamento, em fila única, os veículos de tração ou propulsão humana e os de tração animal, sempre que não houver acostamento ou faixa a eles destinados:
Infração – média.
Penalidade – multa.
Art. 255 – Conduzir bicicleta em passeios onde não seja permitida a circulação desta, ou de forma agressiva, em desacordo com o disposto no parágrafo único do art. 59:
Infração – média.
Penalidade – multa.
Medida administrativa – remoção da bicicleta, mediante recibo para o pagamento da multa.
Nestes casos, a aplicação das penalidades depende da regulamentação quanto ao registro e licenciamento destes veículos, que deve ser estabelecida em legislação municipal do domicílio ou residência de seus proprietários, na forma do preconizado no artigo 129 do CTB.
Se, nos casos acima suscitados, não vemos a aplicação das penalidades aos infratores de trânsito, não é de se estranhar que tal fato igualmente ocorra naquelas situações em que os infratores nem mesmo são usuários da via, como vemos nas infrações dos artigos 174, 221, 243, 245 e 246, transcritos a seguir (e nos quais destacamos os responsáveis pelas infrações, mencionados nos próprios artigos):
Art. 174 – PROMOVER, na via, competição esportiva, eventos organizados, exibição e demonstração de perícia em manobra de veículo, ou deles participar, como condutor, sem permissão da autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via:
Infração – gravíssima.
Penalidade – multa (cinco vezes), suspensão do direito de dirigir e apreensão do veículo.
Medida administrativa – recolhimento do documento de habilitação e remoção do veículo.
Parágrafo único – As penalidades são aplicáveis aos PROMOTORES e aos condutores participantes.
Art. 221 – Portar no veículo placas de identificação em desacordo com as especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN:
Infração – média.
Penalidade – multa.
Medida administrativa – retenção do veículo para regularização e apreensão das placas irregulares.
Parágrafo único – Incide na mesma penalidade AQUELE QUE CONFECCIONA, DISTRIBUI OU COLOCA, em veículo próprio ou de terceiros, placas de identificação não autorizadas pela regulamentação.
Art. 243 – Deixar a EMPRESA SEGURADORA de comunicar ao órgão executivo de trânsito competente a ocorrência de perda total do veículo e de lhe devolver as respectivas placas e documentos:
Infração – grave.
Penalidade – multa.
Medida administrativa – Recolhimento das placas e dos documentos.
Art. 245 – Utilizar a via para depósito de mercadorias, materiais ou equipamentos, sem autorização do órgão ou entidade de trânsito com circunscrição sobre a via:
Infração – grave.
Penalidade – multa.
Medida administrativa – remoção da mercadoria ou do material.Parágrafo único – A penalidade e a medida administrativa incidirão sobre a PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA responsável.
Art. 246 – Deixar de sinalizar qualquer obstáculo à livre circulação, à segurança de veículo e pedestres, tanto no leito da via terrestre como na calçada, ou obstaculizar a via indevidamente:
Infração – gravíssima.
Penalidade – multa, agravada em até cinco vezes, a critério da autoridade de trânsito, conforme o risco à segurança.Parágrafo único – A penalidade será aplicada à PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA responsável pela obstrução, devendo a autoridade com circunscrição sobre a via providenciar a sinalização de emergência, às expensas do responsável, ou, se possível, promover a desobstrução.
Se analisarmos os demais artigos de infrações de trânsito, encontraremos outras situações em que os verdadeiros infratores também não são multados, preferindo-se penalizar aquele que se encontra ao volante, como se ele fosse responsável, única e indiscutivelmente, por tudo que ocorre no interior de seu veículo.Vejamos, por exemplo, a infração, muito comum, relativa ao não uso do cinto de segurança:
Art. 167 – Deixar o CONDUTOR ou PASSAGEIRO de usar o cinto de segurança, conforme previsto no art. 65:
Infração – grave.
Penalidade – multa.
Medida administrativa – retenção do veículo até colocação do cinto pelo infrator. Diferentemente do que ocorre com a utilização do capacete de segurança nas motocicletas, motonetas e ciclomotores, em que o artigo 244, II, preconiza como infração o TRANSPORTE DE PASSAGEIRO SEM CAPACETE, no caso do artigo 167 a infração não ocorre pelo TRANSPORTE DE PASSAGEIRO SEM CINTO, mas a lei disciplina duas condutas irregulares, no mesmo dispositivo: “Deixar o CONDUTOR de usar o cinto” OU “Deixar o PASSAGEIRO de usar o cinto”; aliás conclusão que se mostra mais justa e equilibrada, em especial quando tratamos de veículo de transporte coletivo, de modo a individualizar as condutas transgressionais. Destarte, a prática adotada pela fiscalização de trânsito, de modo geral, tem pautado pela aplicação de penalidade ao condutor, independente de quem estava sem o cinto, com a conseqüente responsabilidade ao proprietário pelo pagamento da multa.
Embora compreenda que seja uma posição inovadora, dentre os estudiosos da legislação de trânsito, entendo que o passageiro de veículo que não utiliza cinto de segurança deveria ser diretamente penalizado pela infração cometida, assim como DEVERIA OCORRER, nas respectivas infrações, com os pedestres; condutores de veículos de tração animal ou propulsão humana; promotores de competições não autorizadas; fabricantes, distribuidores e instaladores de placas de identificação irregulares; empresas seguradoras e pessoas físicas ou jurídicas que utilizam a via como depósito ou criam qualquer obstáculo, sem a devida sinalização. Ou, então, que se mude a lei, amoldando a teoria ao que ocorre na prática.