O proprietário de veículo que entrega o automóvel a pessoa sem habilitação não pode ser punido também como se fosse o condutor, devendo ser aplicada a ele apenas a multa prevista no artigo 163 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). A conclusão é da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento a recurso especial do Departamento de Trânsito (Detran) do Rio Grande do Sul contra uma dona de veículo. “A responsabilidade solidária do proprietário de veículo automotor, por multa de trânsito, deve ser aferida cum grano salis”, observou o relator do caso, ministro Luiz Fux. “Isto porque o Código de Trânsito Brasileiro prevê hipóteses de caráter individual dirigidas tanto ao proprietário quanto ao condutor”, acrescentou o ministro.
A proprietária O.E.R. entrou na Justiça com ação anulatória de multas de trânsito contra o Detran, após receber duas penalidades pela prática de uma única infração. Segundo a defesa, no dia 28 de abril de 2003, a proprietária foi chamada ao local onde seu marido fora interceptado pela Polícia Militar, dirigindo sem habilitação. Mesmo após a apresentação dos documentos, ela foi multada por dirigir sem habilitação e também por entregar a direção do carro a pessoa sem habilitação. As infrações estão previstas nos artigos 162 e 163 do CTB.
Em primeira instância, foi dado parcial provimento ao pedido, tendo o juiz afastado a multa do artigo 162. Para o magistrado, ou a autora é punida porque dirigiu seu veículo sem habilitação, ou porque entregou a direção do veículo a pessoa inabilitada.
O Detran apelou para o Tribunal de Justiça estadual (TJ/RS), alegando não se tratar de dupla apenação pelo mesmo fato. Segundo o órgão, uma infração é do condutor, que dirigia sem a habilitação, e outra infração é do proprietário, que entregou o veículo à pessoa não habilitada.
O TJ/RS negou provimento à apelação. “A conduta tipificada no artigo 163 do Diploma de Trânsito já abrange a tipicidade prevista pelo dispositivo do artigo 162”, considerou o desembargador relator. “O ato de entregar o veículo a pessoa não habilitada responsabiliza o proprietário, devendo, para tanto, suportar as penalidades. Não é razoável punir novamente o mesmo por infração cometida por terceiro, sob o pretexto de que esta (pessoa não habilitada) poderia ficar impune”, acrescentou. O Detran recorreu, então, ao STJ.
No recurso, o Detran sustentou ofensa ao artigo 162 da Lei nº 9.503/97. “O artigo 162 do CTB visa punir o condutor do veículo que dirigiu sem habilitação ou permissão. Já a conduta do artigo 163 do CTB visa punir o proprietário, que tem o dever de zelo pelo seu automóvel e o entregou para pessoa não habilitada”, argumentou.
A Primeira Turma negou provimento ao recurso. “Ao proprietário competiam tão-somente as infrações do artigo 163 do CTB, notadamente porque o condutor encontrava-se presente no momento da notificação (…), a quem deveriam ser dirigida as penas do artigo 12, I, do CTB”, concluiu o relator, ministro Luiz Fux.