Foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro a Lei 14.063, de 2020 que desburocratiza as assinaturas eletrônicas de documentos para ampliar o acesso a serviços públicos digitais. A iniciativa, publicada nesta quinta-feira (24) no Diário Oficial da União, teve origem na Medida Provisória 983/2020 aprovada no início de setembro pelo Senado na forma do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 32/2020. Alguns dispositivos foram vetados, entre eles, o que exige certificação digital à pessoa física requerente quanto aos seus próprios dados.
De acordo com a justificativa do Ministério da Economia, a manutenção do trecho na legislação inviabilizaria inúmeras iniciativas da administração pública. “A exigência aplica-se inclusive à pessoa física requerente quanto aos seus próprios dados, de forma que não será possível, por exemplo, requerer alguma forma de benefício assistencial sem certificado digital porque ao requerer o benefício será necessário informar o dado, sigiloso, referente à situação econômica do requerente”, exemplificou a equipe econômica na mensagem encaminhada ao Congresso.
A nova lei cria dois novos tipos de assinatura eletrônica em comunicações com entes públicos e em questões de saúde: simples e avançada. A assinatura simples se destina a transações de baixo risco que não envolvam informações protegidas por sigilo. O governo estima que 48% dos serviços públicos disponíveis poderão ser acessados por meio de uma assinatura eletrônica simples, a exemplo de requerimentos de informação, marcação de perícias, consultas médicas ou outros atendimentos.
Já a assinatura avançada se aplica a processos e transações com o poder público; ela garante o acesso exclusivo do titular e permite o rastreamento de alterações feitas no documento assinado. A assinatura avançada poderá ser usada, por exemplo, no processo de abertura, alteração e fechamento de empresas.
Essas assinaturas eletrônicas não servirão, no entanto, para processos judiciais, para interações nas quais pode haver anonimato, para sistemas de ouvidoria de entes públicos, para programas de assistência a vítimas e testemunhas ameaçadas e para casos em que a preservação do sigilo seja necessária.
A lei determina que todos os sistemas que utilizem assinaturas eletrônicas se adaptem às regras do projeto até 1º de julho de 2021.
Assinatura qualificada
Até a edição da medida provisória somente eram aceitas legalmente, na relação com órgãos públicos, as assinaturas eletrônicas emitidas com certificado digital no padrão Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil), que é validado pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), autarquia vinculada à Casa Civil.
Esse tipo de assinatura é classificada como qualificada e continuará sendo o único tipo autorizado em qualquer interação com o poder público que envolva sigilo constitucional, legal ou fiscal; em atos de transferência e de registro de bens imóveis; na assinatura de atos de chefes de Poder, ministros e titulares de órgãos; e na emissão de notas fiscais, exceto por pessoas físicas e MEIs (Microempreendedor Individual).
A nova lei estabelece que caberá aos chefes dos Poderes de cada ente federativo estabelecer o nível mínimo de segurança exigido para a assinatura eletrônica de documentos e transações. No entanto, durante o período da pandemia de covid-19, a legislação permitirá assinaturas com nível de segurança inferior para reduzir contatos presenciais ou para possibilitar atos impossibilitados de outro modo.
Ainda conforme o texto, o poder público deverá aceitar as assinaturas eletrônicas qualificadas contidas em atas de assembleias, convenções e reuniões de pessoas jurídicas de direito privado. Isso inclui associações, sociedades, fundações, organizações religiosas, partidos políticos e empresas limitadas (Ltda).
Outros vetos
Entre os vetos, o presidente rejeitou dispositivo que exigia assinatura eletrônica qualificada para transferência de propriedade de veículos automotores. Para o Ministério da Economia, o trecho contrariava o interesse público já que acabaria inviabilizando a transferência de veículos pela via eletrônica. “O dispositivo acabará por manter o atual contexto de uso de assinaturas físicas com firma reconhecida em cartório, e impedirá a simplificação burocrática, a redução de custo financeiro e a economia do tempo gasto por empresas e pelo cidadão na realização de uma transação de grande importância à economia do país”, diz a mensagem de veto.
O texto aprovado pelos congressistas exigia que os livros fiscais e contábeis com registro perante o ente público contivessem a assinatura eletrônica qualificada do profissional de contabilidade, o que foi vetado por Bolsonaro. A equipe econômica explicou que esse tipo de obrigação no âmbito federal só ocorre para escrituração contábil digital (ECD), que é a informação de caráter contábil e precisa da assinatura de um profissional da área, e para a escrituração contábil fiscal (ECF), a qual recupera dados contábeis da ECD, de forma que as demais escriturações exigem apenas a assinatura dos responsáveis pela pessoa jurídica ou por seus procuradores.
“A referida obrigatoriedade trará diversas dificuldades para o ambiente de negócios do país, com aumento de custo para as empresas cumprirem suas obrigações acessórias”, argumentou a pasta.
Comitê gestor
Também foi alvo de veto do presidente o dispositivo que criava uma nova instância, a comissão técnica executiva (Cotec), junto ao Comitê Gestor da ICP-Brasil. A comissão seria responsável por fixar as diretrizes e as normas para a emissão de assinaturas eletrônicas qualificadas no âmbito da legislação. No entanto, a equipe econômica do governo considerou que o colegiado iria “desestimular o uso das assinaturas eletrônicas e, ainda, por burocratizar, desnecessariamente, o setor, criando mais um órgão para definição de diretrizes e normas para a emissão de assinaturas qualificadas estando, inclusive, em descompasso com as diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) ao se estabelecer regime de licenças, permissões ou autorizações como requisitos de funcionamento”.
Tecnologia da Informação
O texto aprovado pelo Congresso ainda estabelecia competências e atribuições do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), ligado à Casa Civil da Presidência da República.
No entanto, Bolsonaro acabou vetando o dispositivo ao afirmar que tais disposições já se encontram definidas por meio da Medida Provisória 2.200-2/2001 e do Decreto 8.985, de 2017. Para o governo, no que diz respeito à atuação da ITI, o dispositivo vetado “reproduz o que está disposto no Decreto nº 8.985, de 2017, porém, impondo algumas restrições atualmente inexistentes, prejudicando a atuação da autarquia, criada com a finalidade de atuar nessa área técnica como entidade especializada”, afirma a mensagem de veto. Atualmente o ITI é responsável por imitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados eletrônicos.