Um homem foi condenado a quase nove anos de detenção, em regime fechado, pela prática de tortura contra o filho menor de 16 anos de idade. A decisão é da 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve sentença da Comarca de Belo Horizonte.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, no dia 24 de fevereiro de 2018, no Bairro Europa, na capital mineira, o pai submeteu o adolescente, que se achava sob sua guarda e cuidados, a intenso sofrimento físico e mental, com emprego de violência e grave ameaça, como forma de aplicar-lhe castigo pessoal.
O agressor e a vítima retornavam, na data, de uma visita ao Conselho Tutelar. Ao chegarem em casa, o acusado ameaçou agredir o filho, que disse que procuraria novamente o conselho, caso as agressões se concretizassem.
Diante disso, o réu ficou muito nervoso e iniciou o espancamento, atingindo a vítima com pauladas, chutes e socos, além de acertá-la com um cinzeiro, fato que culminou em uma tentativa de suicídio por parte do adolescente.
Em primeira instância, a Vara de Crimes Contra a Criança e o Adolescentes de Belo Horizonte condenou o pai a 8 anos, 11 meses e 10 dias de reclusão, em regime fechado, pela prática de tortura. Foi negado e ele o direito de recorrer em liberdade.
Diante da sentença, o homem recorreu, pedindo absolvição, sob o argumento de falta de provas da ocorrência de crime de tortura e solicitando a aplicação do princípio in dubio pro reo. Alternativamente, pediu que, mantida a condenação, o delito fosse desclassificado para maus-tratos ou lesão corporal.Histórico de agressões
Ao analisar os autos, o juiz convocado, José Luiz de Moura Faleiros, observou que a materialidade do delito era inquestionável, tendo em vista diversos documentos juntados aos autos, como o prontuário médico, e as provas orais colhidas.
“Cumpre salientar que o ofendido sofreu, no caso em apreço, violência, tanto física quanto mental, sofrimento este que não deixa vestígios, sendo incabível, nessas hipóteses, a realização de exame de corpo de delito”, destacou.
O magistrado afirmou ainda ter sido possível constatar, pelo histórico dos fatos, pela documentação apresentada e pelos depoimentos, “que o adolescente vinha há muito tempo sendo submetido a tratamento absolutamente degradante e traumatizante, sendo levado, inclusive, a atentar contra sua própria vida”.
A autoria do crime de tortura também era incontroversa, embora o pai tenha negado categoricamente os fatos, dizendo que não agrediu fisicamente o filho, mas que apenas lhe aplicou “correção verbal, diante do seu comportamento indevido, em um momento de desespero”.
Na avaliação do relator, a negativa do réu em relação ao crime de tortura não encontrou respaldo no conjunto de provas. Durante a investigação, o adolescente narrou detalhadamente todo o histórico da violência a que foi submetido pelo pai, de forma injustificada, depois da morte de sua mãe, que era também constantemente agredida pelo homem.
Ao ser ouvido em juízo, observou o relator, o adolescente fez o mesmo relato e ainda detalhou a ocasião em que o pai o agrediu após voltarem de uma reunião no Conselho Tutelar, o que culminou com sua tentativa de suicídio no mesmo dia.
“Sobre as provas dos autos, é cediço que, nos crimes praticados às ocultas, como o delito de tortura, as declarações prestadas pela vítima possuem grande valor probatório, prevalecendo sobre a negativa do acusado, mormente quando narram, de forma coerente, como se deu a ação criminosa”, destacou o relator.
O juiz convocado também ressaltou, em sua decisão, trecho do atendimento do adolescente pelo setor psicológico do hospital em que ele ficou internado por vários dias, após a tentativa de suicídio. O documento indica que os conflitos violentos eram as razões do sofrimento mental do filho.
“Dessa forma, resta evidente e isento de dúvidas, pela dinâmica e reiteração das lesões, que a vítima foi submetida a intenso sofrimento físico e mental, como forma de aplicar castigo na relação familiar”, afirmou.
O magistrado destacou ainda que, no caso, restava evidente “que a conduta perpetrada tem relação com a agressividade própria do apelante, e não com a intenção de correção ou educação, visto que muitas vezes exercida sem motivo aparente ou por implicância”.
Destacando ainda testemunhos da avó paterna da vítima e de uma amiga da família, o magistrado concluiu que, diante de todas as provas, não havia que se falar em desclassificação para o crime de lesão corporal no âmbito das relações domésticas.
Assim, manteve a sentença, sendo seguido, em seu voto, pelos desembargadores Márcia Milanez e Dirceu Walace Baroni.