A Constituição brasileira não admite qualquer censura prévia, reiterou hoje (20) o ministro da Justiça, Tarso Genro, em entrevista à imprensa após passar pelo auditório onde se realizava mais uma audiência pública para discutir a portaria que estabelece parâmetros para a classificação indicativa dos programas exibidos na televisão aberta.
“Nós não estamos tratando de censura, estamos tratando de classificação indicativa para satisfazer as próprias finalidades da norma constitucional, dos direitos culturais, dos direitos à informação, dos direitos da cidadania e também da possibilidade de as pessoas divulgarem os seus pontos de vista, divulgarem a sua arte, divulgarem as suas opiniões”, acrescentou o ministro.
A audiência reuniu representantes de organizações da sociedade civil, a favor da portaria, e das emissoras de rádio e televisão, que contestam a medida. A portaria 264 foi assinada em fevereiro e atualmente três pontos estão suspensos pelo Ministério de Justiça e outro por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a pedido da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).
Os pontos suspensos dispõem sobre a padronização dos símbolos que informam a classificação dos programas, a necessidade de indicar a faixa etária em chamadas de televisão e traillers de filmes, e a vinculação entre a faixa etária e o horário da programação, um dos mais polêmicos. Segundo o advogado Antônio Carlos Ferreira Netto, consultor da Abert, a imposição de horários “é uma forma de censura à.criação artística e liberdade de expressão”. Ele acrescentou: “A Abert acredita que a forma correta e compatível com a Constituição de se fazer classificação indicativa é que seja submetido ao ministério um resumo descritivo das obras e que, a partir desse resumo, o ministério possa então classificá-las”.
Representantes dos artistas, como os atores Juca de Oliveira, Tony Ramos e Fernanda Montenegro, compareceram à audiência e defenderam que a classificação não seja normativa por horário. “A indicação é interessante, mas se você interfere muito no conteúdo, pode, sim, criar sem querer a figura da censura”, disse Ramos.
Já a procuradora federal dos direitos do cidadão, Ela Wiecko, defendeu a construção de “mecanismos para que essa regulação seja participativa e leve em conta as modificações dos valores”. E o coordenador de relações acadêmicas da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), Guilherme Canela, citou pesquisa que aponta prejuízo para o desenvolvimento da criança, semelhante ao da carência de cálcio, na relação com conteúdos televisivos potencialmente inadequados. “Se o Estado brasileiro estiver ignorando esse tipo de pesquisa, estará descumprindo o artigo 227 da Constituição. Criança é prioridade absoluta”, disse.