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Cooperação jurídica internacional

1. Introdução. A soberania na atualidade
2. A Direito Internacional Privado contextualizado
3. A questão da imunidade diplomática perante o Judiciário Trabalhista Brasileiro.
4. O Judiciário Trabalhista e o Princípio da Lex Loci Executionis
5. Conclusão
6. Bibliografia

RESUMO

Como introdutório aborda-se a questão da cooperação jurídica internacional, no cenário que requer maior envolvimento e reciprocidade de tratamento entre os países. A realidade brasileira requer mais cooperação, haja vista a expansão da presença de brasileiros no exterior, potencializando o surgimento de demandas. Em paralelo, a preocupação em se combater o crime de caráter transnacional.

Destaca-se a questão do conflito da lei trabalhista no espaço, a aplicação do princípio da Lex Loci Executionis, a competência para o julgamento dos dissídios envolvendo trabalhadores brasileiros contratados para trabalhar no exterior, além da discussão a respeito da imunidade diplomática perante o Judiciário Trabalhista Brasileiro.

ABSTRACT

As introductory it is approached question of international the legal cooperation, in the scene that requires greater envolvement and reciprocity of treatment between the countries. The Brazilian reality requires more cooperation, has seen the expansion of de presence of brazilians in the exterior, boosting the sprouting of demands. In parallel, the concern in if fighting the crime of transnational character. It is distinguished question of the conflict of the working law in the space, the application of the principle of the Lex Loci Executionis, the ability for the judgment of the agreements involving diligent contracted Brazilians to work in the exterior, beyond the quarrel regarding the immunity diplomatics before the Judiciary Brazilian Member of labor party.

PALAVRAS-CHAVES

CompetênciaConflitoCooperação jurídicaImunidadeTrabalho no exteriorTerritorialidade

KEYWORDS

AbilityConflictLegal cooperationImmunityWork in the exteriorTerritoriality

1. Introdução. A soberania na atualidade

Não procede na atualidade o entendimento de que a soberania é absoluta, bem como não pode servir de anteparo de exposição de nacionalismo porque elemento historicamente necessário à formação da base do Estado: povo, território e soberania.

Não há mais espaço para concepção de soberania como poder único, pois seria uma desconsideração à mutabilidade do próprio conceito e formação do Estado que não é mais absoluto e único. Hoje prevalece o princípio da independência, implicando no papel de dizer a lei, aplica-la e anula-la, quando for o caso.

O fato é que a soberania é formulada com base na cultura de cada povo, embora seja regra que este poder não se submete ao jugo de qualquer outro na capacidade de autodeterminação dos povos.

Nicola Matteucci , em um sentido amplo, assim define a soberania: “… o conceito político-jurídico de soberania indica o poder de mando de última instância numa sociedade política e, conseqüentemente, aí está a diferença entre esta e as demais associações humanas em cuja organização não se encontra esse poder supremo, exclusivo e não derivado. Este conceito está, pois, intimamente ligado ao poder político: de fato, a soberania pretende ser a racionalização jurídica do poder, no sentido de transformação de força em poder legítimo, do poder de fato em poder de direito. Obviamente são diferentes as formas de caracterização da soberania, de acordo com as diferentes formas de organização do poder de que ocorrem na história humana: em todas elas é possível sempre identificar uma autoridade suprema, mesmo que, na prática, esta autoridade se explicite ou venha ser exercida de modos bastante diferentes”.

O fato de um Estado integrar-se em uma comunidade supranacional não está abrindo mão de sua soberania, submetendo-se à soberania de um organismo que se coloca acima. Salienta Canotilho que: “A União Européia não é um Estado soberano dotado de competências e poderes globais, mas um uma comunidade de estados dotada das competências que os estados membros, através de tratados internacionais, lhe vão atribuindo”.

E o princípio da limitação de competências em que a entidade supranacional dispõe de poderes que lhes são conferidos, atribuídos especificamente.Eis o contexto do direito internacional da atualidade, necessário para a inserção dos Estados na comunidade internacional, desistindo de políticas isolacionistas, numa consagração da abertura constitucional a revelar os seus princípios estruturantes e que, segundo Canotilho , em alusão à Constituição Portuguesa de 1976, cuja missão “foi afastar decididamente a arrogância do orgulhosamente sós e de radicar o princípio da abertura internacional”.

Pode se extrair que a cooperação internacional não fragiliza a soberania, mas, ao contrário, é a sua afirmação no universo de reafirmação do direito internacional sob nova medida informada e conformada por determinados princípios como o da independência nacional, o de respeito aos direitos humanos; da igualdade entre os Estados; solução pacífica dos conflitos e não ingerência/intervenção nos assuntos internos dos outros estados; repúdio ao terrorismo e ao racismo e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.

Esta cooperação não afronta a soberania porque qualquer medida suscitada por qualquer Estado, para cumprimento no Brasil, em qualquer tipo de procedimento, dependerá de um processo decisório para dar-lhe embasamento no sentido de verificar sua compatibilidade com a ordem pública e o interesse nacional.

E a necessidade de cooperação jurídica em nível internacional provocou em Nádia de Araújo e Lauro Gama Jr , a seguinte manifestação:

“(…) Para um país que se afirma como líder regional, buscar maior credibilidade no contexto internacional e o incremento de suas transações comerciais com parceiros estrangeiros, é salutar que a cooperação judiciária internacional permaneça na ordem do dia, sofrendo as críticas que induzem ao aperfeiçoamento. Por outro lado, a preocupação renovada das autoridades e da sociedade civil com o crime organizado – e, no particular, o crime transnacional – torna vital que nossos juízes estejam conscientes de suas imensas responsabilidades quanto à efetividade da cooperação internacional. Muito mais que um compromisso moral (a velha comitas gentium), a cooperação internacional tornou-se obrigação jurídica (art. 4º da Constituição) e imperativo de convivência civilizada entre os povos, que preserva e efetiva, no plano internacional, os valores fundamentais de justiça e solidariedade (…).”.

É fundamental para que o mundo globalizado alcance sua efetividade, que a prestação jurisdicional seja célere, efetiva e demonstre utilidade. E nesse contexto encontra-se, inclusive, a cooperação jurisdicional internacional, que requer a mesma efetividade, notadamente, considerando que as relações entre os países cada vez mais requerem envolvimento e tratamentos recíprocos.

Normalmente a cooperação jurisdicional dá-se pela via da carta rogatória, onde se constata, também, atuação do corpo diplomático, como por exemplo, na intermediação entre os Judiciários nacional e estrangeiros, inclusive, mediante iniciativas no sentido de proceder atualização do cenário normativo da cooperação internacional, com o objetivo maior de alcançar celeridade e eficácia. O cenário requer análise cuidadosa, tendo em vista o desafio de atuar emergencialmente em algumas situações e, ao mesmo tempo, encarar o quadro de atos normativos internacionais em confronto com as limitações internas. E Susan Kleebank destaca algumas tendências que têm gerado a multiplicação das demandas por cooperação jurídica:

a) Aumento do contingente de brasileiros no exterior (a expansão da presença de brasileiros no exterior, associada à presença de estrangeiros no Brasil, gera ao mesmo tempo demandas na área de cooperação judiciária, que envolvem, no caso do Itamaraty, um trabalho de natureza eminentemente diplomática (e não consular);b) Os novos contornos da inserção internacional do país, que também provocam aumento dos pedidos de cooperação judiciária;c) A preocupação renovada do Governo e da sociedade brasileira como combate ao crime de caráter transnacional (em geral associado ao narcotráfico) e à impunidade de criminosos importantes.

Vê-se diversidade de denominações, ou seja, quem denomine cooperação judiciária internacional, ora cooperação jurisdicional internacional, ou cooperação jurídica internacional. Entretanto, de conformidade com a destinação do ato de cooperação e o objetivo a ser alcançado, pode-se destacar que a cooperação jurisdicional envolve a participação do poder judiciário dos estados, especialmente, quando envolverem a prática de atos de natureza processual, normalmente relacionados a medidas de caráter executório. Enquanto que no que tange à cooperação judiciária, crê-se que a participação relaciona-se com a atuação das autoridades policiais, especialmente com o caráter investigatório.

Susan Kleebank transcreve conceito de Maristela Basso acerca de cooperação judiciária, in Mercosul – seus efeitos jurídicos, econômicos e políticos nos Estados-membros. Porto Alegre:Livraria do Advogado Editora, 1995, p. 343, que entende ser “o intercâmbio internacional para o cumprimento extraterritorial de medidas processuais provenientes da judicatura de um outro Estado e para a execução extraterritorial da sentença estrangeira”.

A fim de evitar discussões que em nada contribuiriam para a efetividade das medidas objetivadas pela cooperação internacional, inclina-se a doutrina para a terminologia cooperação jurídica internacional, como forma de abranger atos de caráter judicial e jurisdicional. Expressão adotada pela comissão para a elaboração de Anteprojeto de Lei de Cooperação Jurídica Internacional, instituída pelo Ministério da Justiça e presidida por Cláudia Chagas, Secretária Nacional de Justiça, integrada por Antenor Madruga, Athos Gusmão Carneiro, Carmen Tibúrcio, Gilson Dipp, Maria Rosa Guimarães Loula, Márcio Pereira Pinto Garcia, Nádia de Araújo e Walter Nunes Júnior.

O Anteprojeto de Lei de Cooperação Jurídica Internacional centrou-se no objetivo de instituir nova legislação de combate ao crime organizado transnacional e à efetividade das decisões em processos internacionais, procedimentos de obtenção de provas de crimes transnacionais, de recuperação de ativos remetidos para o exterior, auxílio na obtenção de pensão alimentícia de devedores residentes no exterior, além de estabelecer procedimento para que decisões cautelares estrangeiras, como bloqueios de bens, possam ser efetivadas no Brasil.

2. O Direito Internacional Privado contextualizado.

Em verdade o que se denomina direito internacional privado, não é internacional, tampouco privado, pois manifesta-se como um conjunto de normas de direito público e interno, especialmente por envolver questões a serem dirimidas pertinentes à nacionalidade e o conflito de jurisdições e de aplicação de normas.

Cabe salientar que em alguns países o conflito de leis não se concentra exclusivamente no âmbito internacional, quando permitem aos estados federados que legislem sobre assuntos variados, possibilitando o surgimento de conflitos não apenas internacionais, como interestaduais e entre leis estaduais e federais.

Por isso a existência de normas de conflitos que são elaboradas pelos Estados a fim de disciplinar este relacionamento e gerar segurança jurídica às partes envolvidas e aos operadores do direito, mediante instituição de princípios que permitam a aplicação ao caso à luz da lei nacional ou alienígena. As relações jurídicas que se submetem a esta análise apresentam elementos de conexão, como por exemplo, a nacionalidade, a residência/domicílio, o local onde praticado o ato, o lugar de situação do bem, dentre outras.

Primeiramente não se decide quem tem razão na relação jurídica onde se instalou o conflito de leis por intermédio das normas de Direito Internacional Privado, pois sua função é apenas indicar quais leis nacionais de países diferentes devem ser aplicadas para a resolução de cada litígio.

No que diz respeito ao Brasil, a regra de competência é estabelecida pela Lei de Introdução ao Código Civil, Decreto-Lei nº 4657, de 04/09/1942.

Oportuno destacar que, sobretudo, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

O art. 7º da Lei de Introdução prevê que a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras de começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. O art. 12, por sua vez, destaca a competência da autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.De conformidade com a L.I.C.C., há privilégio aos princípios da lei da execução do contrato de trabalho e o do direito do local do contrato, porque em seu art. 9º, no que diz respeito à regência das obrigações, aplica-se a legislação do país onde foram constituídas. Desse modo, considerar-se-á constituída a obrigação resultante do contrato, no lugar onde residir o proponente.

Valentin Carrion sempre foi crítico a este dispositivo da L.I.C.C., face o tratamento específico da CLT, em conformidade com o princípio da proteção, o caráter tutelar do Direito do Trabalho em relação ao hipossuficiente econômico, razão de ser desse segmento do Direito, justificando a inaplicabilidade da regra geral das obrigações, face a consagração do princípio da territorialidade evidenciado pelo direito comparado e tratados internacionais, como no Código de Bustamante (Convenção de Direito Internacional Privado, de Havana), sancionada pelo Decreto nº 5.647, de 08/01/1929, pelo Presidente Washington Luiz P. de Souza, e na Convenção de Roma (Convenção sobre a lei aplicável às obrigações contratuais, assinada em 19/06/1980 – 80/934/CEE – Official Jornal, L 266, 09/10/1980, p. 0001 – 0019.).

Eis alguns dispositivos previstos na Convenção de Roma :

“TÍTULO II REGRAS UNIFORMESArtigo 3ºLiberdade de escolha 1. O contrato rege-se pela lei escolhida pelas partes. Esta escolha deve ser expressa ou resultar de modo inequívoco das disposições do contrato ou das circunstâncias da causa. Mediante esta escolha, as partes podem designar a lei aplicável à totalidade ou apenas a uma parte do contrato. …

Artigo 4ºLei aplicável na falta de escolha 1. Na medida em que a lei aplicável ao contrato não tenha sido escolhida nos termos do artigo 3º, o contrato é regulado pela lei do país com o qual apresente uma conexão mais estreita. Todavia, se uma parte do contrato for separável do resto do contrato e apresentar uma conexão mais estreita com um outro país, a essa parte poderá aplicar-se, a título excepcional, a lei desse outro país. 2. Sem prejuízo do disposto no nº 5, presume-se que o contrato apresenta uma conexão mais estreita com o país onde a parte que está obrigada a fornecer a prestação característica do contrato tem, no momento da celebração do contrato, a sua residência habitual ou, se se tratar de uma sociedade, associação ou pessoa coletiva, a sua administração central. Todavia, se o contrato for celebrado no exercício da atividade econômica ou profissional dessa parte, o país a considerar será aquele em que se situa o seu estabelecimento principal ou, se, nos termos do contrato, a prestação deve ser fornecida por estabelecimento diverso do estabelecimento principal, o da situação desse estabelecimento. …

Artigo 6ºContrato individual de trabalho 1. Sem prejuízo do disposto no artigo 3º, a escolha pelas partes da lei aplicável ao contrato de trabalho, não pode ter como conseqüência privar o trabalhador da proteção que lhe garantem as disposições imperativas da lei que seria aplicável, na falta de escolha, por força do nº 2 do presente artigo. 2. Sem prejuízo do disposto no artigo 4º e na falta de escolha feita nos termos do artigo 3º, o contrato de trabalho é regulado: a) Pela lei do país em que o trabalhador, no cumprimento do contrato, presta habitualmente o seu trabalho, mesmo que tenha sido destacado temporariamente para outro país, ou b) Se o trabalhador não prestar habitualmente o seu trabalho no mesmo país, pela lei do país em que esteja situado o estabelecimento que contratou o trabalhador, a não ser que resulte do conjunto das circunstâncias que o contrato de trabalho apresenta uma conexão mais estreita com um outro país, sendo em tal caso aplicável a lei desse outro país….”.

A respeito da questão Carrion manifestou-se no sentido de que “salvo circunstância muito excepcional, percebe-se totalmente inadequado que os empregados que trabalhem no Brasil, habitualmente, estrangeiros ou não, tenham regulados seus direitos e obrigações por lei estrangeira, em virtude de ter pactuado seu contrato em outro país ou porque a empresa empregadora proponente nele resida”.

O autor destaca que o protecionismo do Direito do Trabalho, para que possa ser eficaz necessita do princípio da territorialidade que, segundo informa, apresenta duas exceções: a) o trabalho prestado para as pessoas jurídicas de direito público internacional; b) o trabalho prestado no Brasil, a título esporádico, inserido em uma relação laboral continuada desenvolvida em outro país ou em vários outros países e subordinada habitualmente à matriz ou filial no estrangeiro.

A Lei nº 7.064, de 06/12/1982 dispôs sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior, onde o legislador teve a preocupação de definir o enquadramento da transferência da seguinte maneira, conforme o art. 2º:

 Empregado removido para o exterior, cujo contrato estava sendo executado no território brasileiro;

 empregado cedido à empresa sediada no estrangeiro, para trabalhar no exterior, desde que mantido o vínculo trabalhista com o empregador brasileiro;

 empregado contratado por empresa sediada no Brasil.

E ficou excluído do regime desta Lei o empregado designado para prestar serviços de natureza transitória, por período não superior a 90 (noventa) dias, mas, desde que:

 Tenha o empregado ciência expressa da transitoriedade; Receba, além da passagem de ida e volta, diárias durante o período de trabalho no exterior, as quais seja qual for o respectivo valor, não terão natureza salarial.

3. A questão da imunidade diplomática perante o Judiciário Trabalhista Brasileiro

As Convenções de Viena, de 1961 e 1963, sempre embasaram as imunidades pessoais, sendo que a primeira relacionada ao serviço diplomático, enquanto a segunda, relativa ao serviço consular, embora, ambas não tenham se referido à imunidade do Estado estrangeiro representado.

O Judiciário brasileiro não ousou em alterar seu entendimento, tradicionalista, no sentido de considerar a imunidade diplomática como algo absoluto. Houve evolução, alteração de posicionamento, todavia, devido a influência externa, não fugindo ao comum. E que documentos externos influenciaram o nosso Judiciário no sentido de relativizar a questão da imunidade?

 European Convention on State Immunity, assinada na Basiléia, em 1971, trouxe definição sobre o que passa a ser alcançado pela imunidade, bem como sobre o que os Estados separam como atos de império e atos de mera gestão. A Convenção consolidou o entendimento de vários países, que já não admitiam a imunidade como absoluta, fazendo constar em seu art. 5º, a ressalva de que não prevaleceria a imunidade diplomática na hipótese de demanda trabalhista ajuizada por trabalhador local, independente de sua nacionalidade.

 Em 1976, nos Estados Unidos, editou-se a Foreign Sovereign Immunities Act, de caráter casuístico, inclusive com hipóteses que não são preservados pela imunidade.

 Em 1978, promulgou-se no Reino Unido o “State Immunity Act”, quebrando a regra do absolutismo da imunidade, excluindo da proteção as questões de natureza contratual, notadamente, trabalhistas, entre a missão diplomática ou consular e as pessoas contratadas no local em que credenciados.

Não fazia mais sentido o Supremo Tribunal Federal permanecer arraigado ao costume e ao conservadorismo, haja vista que o tradicional argumento do apego às Convenções de Viena, não mais sustentava a questão em outros países.

Por isso, a partir do voto do Min. Francisco Rezek, nos autos da Apelação Cível nº 9696-SP, de 31/05/1989, no Tribunal Pleno do STF, em sede de reclamação trabalhista movida por ex-empregada contra a Embaixada da República Democrática Alemã, com quem mantinha vínculo laboral.

Eis a ementa do Acórdão Aci 9696-3 – São Paulo – STF – Tribunal Pleno – Rel. Min. Sydney Sanches. (Apelante Genny de Oliveira e Apelada Embaixada da República Democrática Alemã).

“EMENTA – ESTADO ESTRANGEIRO. IMUNIDADE JUDICIÁRIA. CAUSA TRABALHISTA. Não há imunidade de jurisdição para o Estado estrangeiro, em causa de natureza trabalhista. Em princípio, esta deve ser processada e julgada pela Justiça do Trabalho, se ajuizada depois do advento da Constituição Federal de 1988 (art. 114). Na hipótese, porém, permanece a competência da Justiça Federal, em face do disposto no parágrafo 10 do art. 27 do ADCT da Constituição de 1988, c/c art. 125, II, da E.C.N. 1/69. Recurso Ordinário conhecido e provido pelo Supremo Tribunal Federal para se afastar a imunidade judiciária reconhecida pelo Juízo Federal de Primeiro Grau, que deve prosseguir no julgamento da causa, como de direito.”

A referida ação foi ajuizada antes da promulgação da Constituição Federal de 1988.

Posterior à Constituição Federal de 1988, as causas dessa natureza passaram para a competência da Justiça do Trabalho. Vejamos:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMUNIDADE DE EXECUÇÃO. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. LITÍGIO ENTRE ESTADO ESTRANGEIRO E EMPREGADO BRASILEIRO. Dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor exame do recurso de revista, ante a aparente violação do art. 114, I, da Constituição da República.RECURSO DE REVISTA. IMUNIDADE DE EXECUÇÃO. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. LITÍGIO ENTRE ESTADO ESTRANGEIRO E EMPREGADO BRASILEIRO. Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior do Trabalho, a imunidade de execução continua sendo prerrogativa institucional do Estado estrangeiro, dada a intangibilidade dos seus próprios bens, ressalvada a existência, em território brasileiro, de bens, que, embora pertencentes ao Estado estrangeiro, sejam estranhos, quanto a sua destinação ou utilização, às legações diplomáticas ou representações consulares por ele mantidas em nosso País, caso em que tais bens são suscetíveis de penhora judicial para garantia do crédito trabalhista, o que será apurado e definido no processo de execução. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá parcial provimento”. (Proc. TST-RR-1301/1991-003-10-40.6 – 5ª Turma – Rel. Juiz Convocado Walmir Oliveira da Costa).

“EMENTA: RECURSO DE REVISTA. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. DISSÍDIO DE ÍNDOLE TRABALHISTA ENTRE ESTADO ESTRANGEIRO E TRABALHADOR BRASILEIRO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. A Constituição Federal promulgada em 05 de outubro de 1988, seguindo a moderna tendência de relativização da imunidade absoluta de jurisdição, transferiu para a Justiça do Trabalho a competência, antes afeta à Justiça Federal (CF/1967, art. 119, II, f), para julgar dissídio individual em que se discute vínculo de emprego entre Estado estrangeiro e trabalhador brasileiro. Precedentes do Excelso STF. Recurso de Revista não conhecido.”. (Proc. TST-RR-669.368/2000 – 1ª Turma – Relator Juiz Convocado Altino Pedrozo dos Santos)

Saliente-se, portanto, a regra expressa no art. 114, da CF/1988:

“art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”

E assim tem se posicionado, atualmente, o Supremo Tribunal Federal:

AI-AgR nº 139.671/DF – Distrito FederalAG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTORelator (a): Min. Celso de MelloJulgamento: 20/06/1995 – Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicação: DJ 29/03/1996, pp. 09348. Ement. Vol-01822, pp. 00375.

E M E N T A: AGRAVO DE INSTRUMENTO – ESTADO ESTRANGEIRO – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA POR EMPREGADOS DE EMBAIXADA – IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO – CARÁTER RELATIVO – RECONHECIMENTO DA JURISDIÇÃO DOMÉSTICA DOS JUÍZES E TRIBUNAIS BRASILEIROS – AGRAVO IMPROVIDO. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. CONTROVÉRSIA DE NATUREZA TRABALHISTA. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS. – A imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro, quando se tratar de litígios trabalhistas, revestir-se-á de caráter meramente relativo e, em conseqüência, não impedirá que os juizes e Tribunais brasileiros conheçam de tais controvérsias e sobre elas exerçam o poder jurisdicional que lhes é inerente. ATUAÇÃO DO ESTADO ESTRANGEIRO EM MATÉRIA DE ORDEM PRIVADA. INCIDENCIA DA TEORIA DA IMUNIDADE JURISDICIONAL RELATIVA OU LIMITADA. – O novo quadro normativo que se delineou no plano do direito internacional, e também no âmbito do direito comparado, permitiu – ante a realidade do sistema de direito positivo dele emergente – que se construísse a teoria da imunidade jurisdicional relativa dos Estados soberanos, tendo-se presente, para esse especifico efeito, a natureza do ato motivador da instauração da causa em juízo, de tal modo que deixa de prevalecer, ainda que excepcionalmente, a prerrogativa institucional da imunidade de jurisdição, sempre que o Estado estrangeiro, atuando em matéria de ordem estritamente privada, intervier em domínio estranho aquele em que se praticam os atos jure imperii. Doutrina. Legislação comparada. Precedente do STF. A teoria da imunidade limitada ou restrita objetiva institucionalizar solução jurídica que concilie o postulado básico da imunidade jurisdicional do Estado estrangeiro com a necessidade de fazer prevalecer, por decisão do Tribunal do foro, o legitimo direito do particular ao ressarcimento dos prejuízos que venha a sofrer em decorrência de comportamento imputável a agentes diplomáticos, que, agindo ilicitamente, tenham atuado more privatorum em nome do Pais que representam perante o Estado acreditado (o Brasil, no caso). Não se revela viável impor aos súditos brasileiros, ou a pessoas com domicilio no território nacional, o ônus de litigarem, em torno de questões meramente laborais, mercantis, empresariais ou civis, perante tribunais alienígenas, desde que o fato gerador da controvérsia judicial – necessariamente estranho ao especifico domínio dos acta jure imperii – tenha decorrido da estrita atuação more privatorum do Estado estrangeiro. OS ESTADOS UNIDOS DA AMERICA E A DOUTRINA DA IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO RELATIVA OU LIMITADA. Os Estados Unidos da América – parte ora agravante – ja repudiaram a teoria clássica da imunidade absoluta naquelas questões em que o Estado estrangeiro intervém em domínio essencialmente privado. Os Estados Unidos da América – abandonando a posição dogmática que se refletia na doutrina consagrada por sua Corte Suprema em Schooner Exchang v. McFaddon (1812) – fizeram prevalecer, já no inicio da década de 1950, em típica declaração unilateral de caráter diplomático, e com fundamento nas premissas expostas na Tate Letter, a conclusão de que “tal imunidade, em certos tipos de caso, não devera continuar sendo concedida”. O Congresso americano, em tempos mais recentes, institucionalizou essa orientação que consagra a tese da imunidade relativa de jurisdição, fazendo-a prevalecer, no que concerne a questões de índole meramente privada, no Foreign Sovereign Immunities Act (1976). DESISTENCIA DO RECURSO. NECESSIDADE DE PODER ESPECIAL. Não se revela licito homologar qualquer pedido de desistência, inclusive o concernente a recurso já interposto, se o Advogado não dispõe, para tanto, de poderes especiais (CPC, art. 38). AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. A jurisprudência dos Tribunais e o magistério da doutrina, pronunciando-se sobre a ausência de manifestação do Ministério Público nos processos em que se revela obrigatória a sua intervenção, tem sempre ressaltado que, em tal situação, o que verdadeiramente constitui causa de nulidade processual não e a falta de efetiva atuação do Parquet, que eventualmente deixe de emitir parecer no processo, mas, isso sim, a falta de intimação que inviabilize a participação do Ministério Público na causa em julgamento. Hipótese inocorrente na espécie, pois ensejou-se a Procuradoria-Geral da Republica a possibilidade de opinar no processo.

Processo RE-AgR nº 222368/PE – PernambucoAG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIORelator (a): Min. Celso de MelloJulgamento: 30/04/2002 – Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicação: DJ 14.02.2003, pp. 00070 – Ement. Vol-02098-02, pp. 00344

Ementa

E M E N T A: IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – LITÍGIO ENTRE ESTADO ESTRANGEIRO E EMPREGADO BRASILEIRO – EVOLUÇÃO DO TEMA NA DOUTRINA, NA LEGISLAÇÃO COMPARADA E NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: DA IMUNIDADE JURISDICIONAL ABSOLUTA À IMUNIDADE JURISDICIONAL MERAMENTE RELATIVA – RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO. OS ESTADOS ESTRANGEIROS NÃO DISPÕEM DE IMUNIDADE DE JURISDIÇ ÃO, PERANTE O PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO, NAS CAUSAS DE NATUREZA TRABALHISTA, POIS ESSA PRERROGATIVA DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO TEM CARÁTER MERAMENTE RELATIVO. – O Estado estrangeiro não dispõe de imunidade de jurisdição, perante órgãos do Poder Judiciário brasileiro, quando se tratar de causa de natureza trabalhista. Doutrina. Precedentes do STF (RTJ 133/159 e RTJ 161/643-644). – Privilégios diplomáticos não podem ser invocados, em processos trabalhistas, para coonestar o enriquecimento sem causa de Estados estrangeiros, em inaceitável detrimento de trabalhadores residentes em território brasileiro, sob pena de essa pr ática consagrar censurável desvio ético-jurídico, incompatível com o princípio da boa-fé e inconciliável com os grandes postulados do direito internacional. O PRIVILÉGIO RESULTANTE DA IMUNIDADE DE EXECUÇÃO NÃO INIBE A JUSTIÇA BRASILEIRA DE EXERCER JURISDIÇÃO NOS PROCESSOS DE CONHECIMENTO INSTAURADOS CONTRA ESTADOS ESTRANGEIROS. – A imunidade de jurisdição, de um lado, e a imunidade de execução, de outro, constituem categorias autônomas, juridicamente inconfundíveis, pois – ainda que guardem estreitas relações entre si – traduzem realidades independentes e distintas, assim reconhecidas quer no plano conceitual, quer, ainda, no âmbito de desenvolvimento das próprias relações internacionais. A eventual impossibilidade jurídica de ulterior realização pr ática do título judicial condenatório, em decorrência da prerrogativa da imunidade de execução, não se revela suficiente para obstar, só por si, a instauração, perante Tribunais brasileiros, de processos de conhecimento contra Estados estrangeiros, notadamente quando se tratar de litígio de natureza trabalhista. Doutrina. Precedentes.

4. O Judiciário Trabalhista e o princípio da lex loci executionis

Nesse passo cabe a ressalva, objeto de dedicação à análise, a questão do princípio da lex loci executionis, ou seja, aplicação da lei do local da execução do contrato de trabalho, cujo entendimento apresenta-se pacificado pelo Tribunal Superior do Trabalho, por intermédio de sua Súmula nº 207, com a seguinte redação:

“SÚMULA 207 – CONFLITOS DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO. PRINCÍPIO DA LEX LOCI EXECUTIONIS – A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação.

Tal questão tem sua regulação no direito interno, como se observa no art. 9º e seus parágrafos da L.I.C.C. e art. 651, da CLT, privilegiando o princípio da lex loci executionis, sem desqualificar o princípio da territorialidade, apesar de haver críticas a respeito de corrente que entende serem incompatíveis tais princípios.

Em uma relação de natureza privada, como a trabalhista, envolve conflitos de aplicação de norma nacional ou estrangeira, especialmente quando o contrato envolve execução em mais de um país, contratação em um país para cumprimento em outro (s).

É territorial o princípio prevalecente com aplicação da lei do local da execução do contrato de trabalho, em consonância com o Código de Bustamante.

Eis o conteúdo do art. 198 – Capítulo V :

“Artículo 198. También es territorial la legislación sobre accidentes del trabajo y protección social del trabajador.”

E é oportuno destacar que a legislação brasileira aplica-se, também, aos empregados de empresas estrangeiras atuantes no território nacional, sejam elas estatais ou não, com exclusão daqueles que estejam afetos aos serviços diplomáticos, isto considerados os atos de império, a serviço do organismo ou estado estrangeiro. Entretanto, submetem-se os atos de gestão desses entes externos, como qualquer empregador, decorrentes de sua inserção no meio ambiente local.

No que diz respeito à competência jurisdicional, há de se ressaltar que conforme contido no art. 89, II, trata-se de competência absoluta da autoridade judiciária brasileira quando, no Brasil, tiver de ser cumprida a obrigação.

E esta questão de competência para julgar, ou seja, esta competência de foro nada tem a ver com a lei a ser aplicada à causa. Assim, a título de ilustração, cabe observar que não procede a justificativa da decisão a seguir, haja vista deixar clara a confusão entre a questão da competência e a da norma aplicável, se nacional ou estrangeira.

“EMENTA: HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA QUE DISPÕE SOBRE A PARTILHA DE BENS DA SOCIEDADE CONJUGAL. CONTESTAÇÃO.1. Casamento celebrado no Brasil e divórcio decretado pelo Poder Judiciário helvético, já homologado pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da SEC nº 3.862, RTJ 131/14.071.2. Partilha de bens da sociedade conjugal processada posteriormente perante o Judiciário suíço, com aplicação das leis brasileiras.3. Não fere o art. 89, II, do Código de Processo Civil, que prevê a competência absoluta da justiça brasileira para proceder a inventário e partilha de bens situados no Brasil, a decisão do Tribunal estrangeiro que dispõe sobre a partilha de bens móveis e imóveis em decorrência da dissolução da sociedade conjugal, aplicando a lei brasileira.4. Sentença estrangeira homologada.(Sentença Estrangeira contestada nº 4.512-6 – Confederação Helvética – Tribunal Pleno, 21/10/1994 – Relator Min. Paulo Brossard).

É caso de princípio territorial e o art. 89, II, do CPC é de competência absoluta. A questão da competência de foro nada tem a vê com a lei aplicável ao caso.

Ressalte-se que o art. 89 do CPC é definidor da competência da autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra, tanto para o conhecimento de ações relativas a imóveis situados no Brasil, como para proceder a inventário e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território nacional.

Tratando-se de questão trabalhista, da mesma forma, aplica-se a competência do judiciário brasileiro que, na forma do art. 651, da CLT, determina-se pela localidade onde o empregado, seja reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, isto onde se executar o contrato de trabalho, ainda que tenha sido contratado em outro local ou no estrangeiro. Tudo em consonância com a competência atribuída pelo art. 114, da CF/88, notadamente as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Ademais, há uma especificidade da norma prevista no parágrafo 2º do art. 651, da CLT, em que na ocorrência de dissídio em filial de empresa no exterior, não havendo convenção internacional em contrário e, desde que o empregado seja brasileiro, ainda assim a competência será do Judiciário Trabalhista brasileiro.

Eis o teor da especificidade da norma:

“art. 651 – …§ 2º – A competência das Varas do Trabalho, estabelecida neste artigo, estende-se aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário.”

Pode-se verificar a aplicação de normas internas a entes de direito externo, como a aplicação de normas externas pelo Judiciário brasileiro.

Não mais se discute se tal aplicação violaria a soberania nacional por uma questão de não se aplicar, por exemplo, a norma brasileira em dissídio julgado por autoridade nacional.

Não há violação à supremacia do direito interno entendido por Hegel como justificadora da soberania absoluta que ampara o constitucionalismo nacionalista. Ademais, a própria soberania é atributo em constante mutação a fim de buscar adequação à realidade e isto tem se observado com mais freqüência após o fenômeno da globalização, o surgimento dos blocos econômicos, uniões aduaneiras e o desenvolvimento do direito comunitário com suas normas supranacionais.

E o assunto não é recente, bastando observar o que escreveu o Prof. Gerson Boson , em 1958:

“A soberania é um conceito de elaboração metafísica, que vem sofrendo deslocamentos de atribuição, pela necessidade de adequar-se à realidade social e jurídica dos povos, em cada momento da Cultura. Em perspectiva histórica, não é difícil vê-lo nos paramos celestiais, no Papado, no Império, para em seguida incarna-se nos reis, de onde passou à realidade da nação, sem omitir-se a variante estatal propugnada por Hegel. Hoje se sustenta – somo se viu – ser um conceito aplicável somente à internacional, ou a uma civitas máxima.

E nessa mesma linha encontra-se Reinaldo Rivera para quem “a globalização impõe o repensar do conceito de soberania, mesmo no seu viés interno, pois não se pode falar que o Estado dispõe de autonomia e independência absolutas ainda que nos limites do seu território. Exemplo disso está no desrespeito aos direitos fundamentais, que pode ser coibido por diversas ações internacionais.”

O brocardo do rebus sic stantibus ainda prevalece e, inclusive, o Projeto de Lei do Senado Federal, de 2004, de autoria do Senador Pedro Simon , sobre cooperação jurídica internacional, em seu art. 12, assim previu:

“art. 12. Obrigações Contratuais – As obrigações contratuais são regidas pela lei escolhida pelas partes. Essa escolha será expressa ou tácita, sendo alterável a qualquer tempo, respeitados os direitos de terceiros.

§ 1º Caso não tenha havido escolha ou se a escolha for ineficaz, o contrato, assim como os atos jurídicos em geral, serão regidos pela lei do país com o qual mantenham vínculos mais estreitos.§ 2º Na hipótese do § 1º, se uma parte do contrato for separável do restante, e mantiver conexão mais estreita com a lei de outro país, poderá esta aplicar-se, a critério do Juiz, em caráter excepcional.§ 3º A forma dos atos e contratos rege-se pela lei do lugar de sua celebração, permitida a adoção de outra forma aceita em direito.§ 4º Os contratos realizados no exterior sobre bens situados no País, ou direitos a eles relativos, poderão ser efetuados na forma escolhida pelas partes, devendo ser registrados no Brasil de acordo com a legislação brasileira.”

Entretanto, a escolha contratual de determinada jurisdição, nacional ou estrangeira, resultará em sua competência exclusiva.

O projeto adotou a idéia básica contida no art. 7º, da Convenção do México, de 1994, assinada pelo Brasil, com a seguinte redação: “o contrato rege-se pelo direito escolhido pelas partes. O acordo das partes sobre esta escolha deve ser expresso ou, em caso de inexistência de acordo expresso, depreender-se de forma evidente da conduta das partes e das cláusulas contratuais, consideradas em seu conjunto. Essa escolha poderá referir-se à totalidade do contrato, ou a uma parte do mesmo. A eleição de determinado foro pelas partes não implica necessariamente a escolha do direito aplicável.”

Há menção de que o aludido projeto está integrado ao que se intitula de direito internacional privado uniformizado, especialmente quanto ao referido artigo 12 acima transcrito, que reflete o ideal da Convenção do México, no que diz respeito ao preceito de que o contrato se rege pela lei do país com o qual mantenha os vínculos mais estreitos. E, de conformidade com a referida Convenção, o tribunal levará em consideração todos os elementos objetivos e subjetivos que se depreendam do contrato, para determinar o direito do Estado com o qual mantém os vínculos mais estreitos.

Esta solução foi vislumbrada pelo Projeto por tê-la considerado a que mais liberdade proporciona ao julgador para escolher a lei com a qual o contrato esteja mais vinculado, haja vista que outras soluções não estariam completas para tanto, como por exemplo, a aplicação da lei do país em que se constituírem as obrigações, como previsto no art. 9º da L.I.C.C., ou a lei do país onde o contrato deva ser cumprido, como aplicado pelo Direito Francês.

Nesse sentido a Justiça do Trabalho, no Brasil, já mantém este entendimento, embora com mais objetividade, como se constata na Súmula nº 207, do Tribunal Superior do Trabalho, transcrita.

Esta solução mais se aproxima daquela adotada pelo Direito Francês, como também se aproxima da intenção do projeto de lei de cooperação jurídica internacional, notadamente diante da hipótese em que, “caso não tenha havido escolha ou se a escolha for ineficaz, o contrato, assim como os atos jurídicos em geral, serão regidos pela lei do país com o qual mantenham vínculos mais estreitos”, como previsto no art. 12, § 1º do referido Anteprojeto.

O contido na Súmula 207/TST, ou seja, a aplicação da lei do local da execução do contrato de trabalho, guarda pertinência com a “lei do país com o qual mantenham vínculos mais estreitos”, analisando o vínculo com a execução desse contrato, onde ele produzirá efeitos e, eventualmente, gerará conflitos.

Eis o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho em caso concreto:

“SÚMULA 207 DO TST. TRABALHO NO EXTERIOR. O Acórdão tal como decidido está em consonância com a Súmula 207 do TST, assim redigida: Conflitos de leis trabalhistas no espaço. Princípio da lex loci executionis. A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação. (res. 13/1985, DJ 11.07.1985). O recurso esbarra no óbice do parágrafo 5º do art. 896 da CLT. Recurso não conhecido”. (Proc. TST-RR-150567/2005-900-01-00.0 – Relator Min. Barros Levenhagen – 4ª Turma/TST – Recorrente José Rosivam Pereira Lyra e Braspetro Oil Services Company e outra.)

“JURISDIÇÃO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 651, CAPUT E § 3º, DA CLT. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM DIFERENTES PAÍSES. OPÇÃO DO EMPREGADO.1. Determina o exercício da jurisdição trabalhista a lei do local da execução do serviço (“lex loci executionis”), o que é consentâneo com o escopo protetivo das normas trabalhistas.2. Ao empregado estrangeiro cujo contrato foi celebrado e rescindido no exterior, bem assim que, por conta de transferências, ora trabalhou no Brasil, ora na Argentina, ora na República Dominicana, é lícito demandar perante o Estado brasileiro para solver o litígio concernente ao período em que prestou serviços no Brasil.3. Embargos parcialmente conhecidos e providos para limitar o exercício da jurisdição trabalhista ao período em que o contrato de trabalho foi executado no Brasil(TST-E-RR-478.490/98.9 – Acórdão SBDI-1 – Partes Embargante IBÉRIA LINEAS AÉREAS DE ESPAÑA S.A. e Embargado HETOR ALEJANDRO NAIDICH – Relator Min. João Oreste Dalazen.)

Trata-se de demanda proposta no Brasil, justamente em relação ao período em que aqui trabalhou o demandante, mesmo que tenha sido contrato e dispensado em outro país.

Em seu voto s.Exa. o Min. João Oreste Dalazen enfatizou parte do estudo do Prof. Arnaldo Süssekind, denominado Conflitos de Leis do Trabalho, da Livraria Freitas Bastos S/A , RJ, 1979, pp. 50 e 60/63, do seguinte teor: Esclareça-se, por fim, questão de relevo alusiva ao Direito Internacional Privado: a transferência do empregado de um para outro país não importa na celebração, por ajuste expresso ou tácito, de novo contrato de trabalho. Quando o trabalhador inicia a prestação de serviços num lugar e depois é deslocado para empresa do mesmo grupo empregador ou uma de suas filiais em outro país, o seu contrato de trabalho permanece íntegro. Por conseguinte, o tempo de serviço prestado ao mesmo empregador, antes da transferência, é computado para gerar os efeitos jurídicos determinados pela lei do lugar onde o contrato passou a ser executado…”.

O art. 314 do Código de Bustamante preceitua que a jurisdição competente é a do lugar da prestação dos serviços. E o Brasil adota a regra universal da lex fori, como se extrai do art. 12 da L.I.C.C., complementado, no caso, pelo art. 651, da CLT.

Apesar do princípio da lex loci executionis encontrar-se consagrado na Súmula 207/TST, afirma-se que este princípio não é absoluto, haja vista a possibilidade da contratação ocorrer em determinada localidade, entretanto, o empregado é destinado a tarefa de caráter transitório em outro país. Neste caso, doutrina e jurisprudência têm admitido a aplicação da lei do local da contratação. Vejamos:

“CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO. A contratação de trabalhador realizada por empresa sediada no Brasil para prestação de serviço técnico no exterior atrai a incidência da Lei 7.064/82, que dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior. O art. 3º, inciso II, do referido diploma legal assegura ao empregado a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, sempre que for demonstrado ser esta mais favorável que a legislação territorial. Cuidando-se de legislação especial, afasta o princípio da lex loci executionis, consagrado na Súmula n. 207 do TST, que trata, genericamente, do tema.”( Proc. TST-RR-749120/2001.1 – 2ª Turma/TST – Relator Min.José Simpliciano Fontes de F. Fernandes – Recorrente Fundação Visconde de Cabo Frio e Recorrido Antônio Farias Veras).

Eis o contido na Lei n. 7.064/82 que dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior.

“art. 3º – A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços:I (…)II – a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas em relação a cada matéria.”

Esta norma estabelece garantias mínimas ao trabalhador brasileiro transferido para o exterior, mas não descurando de prestigiar a territorialidade da norma trabalhista, como também, o reconhecimento da soberania de outros paises.

Entretanto, a respeito do contido na Súmula 207/TST, Francisco Jorge Neto e Jouberto Cavalcante ao destacarem que a lei nacional não atinge trabalhadores que prestam serviços em outros países, assim manifestam-se: “Desse modo, um nacional, que pretenda residir ou trabalhar fora do país terá suas relações trabalhistas reguladas pelas leis do país onde estiver, não podendo invocar a legislação obreira nacional, posto que essa não vigora em território estrangeiro.

A título de ilustração, reforçando este entendimento transcrevemos recente decisão da MM. 3ª Vara do Trabalho de Brasília, de lavra da Exmo. Sr. Juiz Carlos Alberto Oliveira Senna , em reclamação trabalhista de autoria de ex-empregada de empresa multinacional brasileira, por esta contratada em cidade norte-americana, onde, inclusive, o contrato teve sua execução. No caso, houve a formulação de pedidos com base na legislação brasileira, inclusive em relação ao FGTS e multa de 40%, bem como, “alternativamente, o requerimento de pagamento de horas extraordinárias em conformidade com o regulamento empresarial vigente no Estado Americano, horas extras pela não concessão de intervalos mínimos, pagamento pelos feriados laborados, aviso prévio de 60 dias, férias vencidas e não gozadas, diferenças salariais decorrentes de equiparação salarial, indenização por discriminação, o pagamento do pacote de desligamento severence day e de honorários advocatícios”. Vejamos:

Quanto à competência assim decidiu:

“3-Da CompetênciaEm se tratando de demanda proposta por trabalhador em face de seu empregador, esta Especializada é competente para conhecer e julgar a lide (art. 114, CF)A Justiça do Trabalho brasileira, também é territorialmente competente para dirimir o conflito de interesses de trabalhador brasileiro que executava seu mister no estrangeiro, como positiva o § 2º do art. 651, da CLT, art. 12 da Lei de Introdução ao Código Civil e art. 88, inc. I, do CPC, sendo relevante ressaltar a ausência da comprovação da existência de convenção internacional dispondo em contrário.Nesse sentido, pronuncia-se a jurisprudência:

Ementa:JURISDIÇÃO. TRABALHADOR FRONTEIRIÇO. Litígio envolvendo trabalhador brasileiro que, independentemente do local da contratação, prestou serviços no exterior, para empregador brasileiro, também domiciliado no Brasil, e que apenas desenvolve atividade econômica no estrangeiro, deve ser dirimido pela Justiça Brasileira. A decisão que melhor equaciona o debate se fulcra na aplicação do disposto no art. 12, da LICC, preconizando que a autoridade judiciária brasileira é competente para o julgamento de litígios quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação; no art. 88, do CPC, prescrevendo a competência internacional concorrente, para os casos em que o réu, independentemente de sua nacionalidade, esteja domiciliado no Brasil, bem como no art. 31, do Código Civil, relativamente ao ânimo definitivo de a pessoa estabelecer sua residência (TRT 24ª R.RO 1861/1999. Juiz Relator João de Deus Gomes de Souza, 12/04/2000, Publicado no DJ nº 5256 de 05/05/2000, pag. 60)…7- Do vínculo mantido entre as partesConsidero despicienda a cizânia existente acerca do local da contratação da reclamante, vez que incontroverso que esta somente laborou na agência de Miami, sendo aplicável ao caso em comento a lex loci executionis, em consonância com o disposto no art. 9º da LICC e jurisprudência cristalizada do C. TST (Súmula 207 TST).Assim, inaplicáveis as disposições celetárias ao caso em comento….Pelo que, reputo que a autora foi efetivamente contratada no exterior, na agência de Miami. Tal se justifica em face das contradições extraídas do depoimento pessoal da obreira e da prova documental constante dos autos, não sendo esta última objeto de impugnação pela reclamante (fls. 465 ss)…Diante disso, as alegações sustentadas em sede de depoimento pessoal não se ajustam aos dados apurados nos documentos apresentados. Assim, não há como dar guarida à tese de que foi contratada em fevereiro de 1989 no Brasil, para prestar serviços à reclamada em Miami, Flórida, Estados Unidos da América do Norte. …Pelo exposto, serão objeto de análise apenas os pedidos formulados à luz da legislação norte-americana.(grifo nosso)

E destaca-se o caráter relativo do princípio, especialmente, na hipótese de o empregado prestar serviços em mais de um país, em vários períodos, o que pode ensejar uma instabilidade jurídica às partes. Tal situação justifica a adoção do princípio da aplicação da norma mais favorável. Cite-se como exemplo, a situação dos empregados qualificados, considerados executivos de porte internacional, até considerados expatriados em alguns casos.

E nesse sentido pode-se mencionar decisão do E. Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, por intermédio de sua 1ª Turma, à unanimidade, com base em voto relator da Exma. Juíza Maria Clara Saboya A. Bernardino , assim considerou:

EMENTA: CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL E TRANSFERIDO A TÍTULO PRECÁRIO PARA TRABALHAR NO EXTERIOR. O Brasil consagrou no artigo 9º, da Lei de Introdução ao Código Civil, o princípio da lex loci executionis, ao dispor que para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem, o qual guarda perfeita sintonia com o artigo 198, do Código de Bustamante, ratificado pelo Decreto 18.871/1929. No campo do direito do trabalho, também, regente para solução de conflitos de leis no espaço, o princípio da aplicação da lei do local da prestação dos serviços (CLT, art. 651). A matéria, a propósito, não comporta mais discussão, mercê da edição da Súmula 207, pelo Tribunal Superior do Trabalho, segundo o qual “CONFLITOS DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO. PRINCÍPIO DA LEX LOCI EXECUTIONIS. A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação. Clarividente, assim, que o empregado contratado no Brasil para trabalhar no estrangeiro ou transferido em definitivo para prestar serviços no exterior fica sujeito às leis trabalhistas do local da prestação de serviços. O caso dos autos, porém, é de contrato único, vigente no período de 15 de dezembro de 1986 a 30 de abril de 2003, firmado e executado, parcialmente, no Brasil (início e término), com cessões, a título precário, transferências provisórias, para empresas alienígenas, integrantes do mesmo conglomerado econômico, situadas nos Estados Unidos da América (janeiro de 1998 a março de 1999) e Espanha (janeiro de 2001 a 15 de abril de 2003), sem, contudo, perder sua vinculação com a empresa nacional. Incidente, portanto, à espécie a lei brasileira.

Nesse sentido destaca Amauri Mascaro Nascimento que “a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho não impede, no entanto, o reconhecimento, pela Justiça do Trabalho brasileira, de regras contratuais estipuladas pelas partes em outro país, desde que mais benéficas para o trabalhador, com fundamento no princípio do pacta sunt servanda. O que a lei quer é dar ao empregado as garantias conferidas pelas leis brasileiras sem impedir que outros direitos estipulados no seu país de origem o beneficiem, bem como impedir que os direitos mínimos aqui assegurados possam ser afastados pelo contrato de trabalho ajustado entre as partes.”

Washington Trindade bem analisa a questão destacando que “se a prestação de serviço é contratada no mesmo país em que o serviço vai ser executado obedece-se à lei do domicílio do trabalhador. É o caso de empresa estrangeira que executa em outro país serviços especializados e que contrata nacionais para a sua execução. A lei que rege a capacidade do agente é a do domicílio.”

O fato é que para aos trabalhadores que prestam serviços de natureza transitória em outro país, aplica-se a lei do país da sede da empresa, enquanto que, por seu turno, ainda como exceção à regra predominante de aplicação da lei do lugar da execução do contrato de trabalho, temos, ainda, a questão dos tripulantes de navios e aeronaves, aos quais se aplica a lei do país onde estiver matriculado o respectivo navio ou aeronave.

A questão dos tripulantes de navios e aeronaves não é pacífica. Observa-se, como princípio, que o Código de Bustamante, em seus arts. 274 a 281, faz referência à lei do país da patente de navegação, o que equivale à localidade de matrícula do navio ou aeronave.

Entretanto, alguns autores, do porte de Pontes de Miranda , já lançou entendimento de que a lei regente do contrato de trabalho, termina por ser a lei do local da prestação do trabalho, entendido como a lei do pavilhão.

Outros autores afastam a aplicação da lei do pavilhão, especialmente quando o registro do navio ou matrícula pode estar mascarando possível fraude à execução do contrato de trabalho, com a utilização de “bandeira de favor”. Nesse caso, aplica-se a regra do local da sede da empresa e houve a contratação do tripulante.

Washington Trindade destaca, ainda, que o exame da questão das normas de superdireito dá-se sob no campo do direito internacional privado, que considera de ângulo difícil e sublimado, especialmente considerando o esforço nacional para consolidar o consórcio das nações vizinhas. Enfatiza, ainda, o Prof. Washington que o sugestivo do tema é o que se refere à unilateralidade e à omnilateralidade da regra de sobredireito.

Argumenta o autor que, “de fato, os internacionalistas informam que existe uma tendência para as regras omnilaterais ou plurilaterais pelo legislador interno, enquanto que do ponto de vista internacional predomina a regra unilateral. O art. 7º da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro é um exemplo de regra omnilateral, ao dispor:

A lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

Enfatiza que há uma abrangência à pessoa tanto nacional como estrangeiro, estabelecendo a liberdade de aplicação da sua lei nacional, da mesma norma que reconhece a lei outro país que se aplica a brasileiro lá domiciliado.

Da mesma forma, o art. 8º da Lei de Introdução ao Código Civil enquadra-se como norma omnilateral no que diz respeito à situação dos bens ao determinar a aplicação da lei do país onde estiverem os mesmos situados, lex loci rei sitae.

5. Conclusão

A dinâmica da atualidade não mais permite que o Estado no exercício do seu soberano poder de julgar possa exercer com eficácia o controle jurisdicional sobre seus súditos, especialmente porque com a aproximação cada vez maior dos Estados e a redução das fronteiras, a conduta dos indivíduos cada vez menos se restringe aos seus limites territoriais.

Não são coincidentes os limites de atuação dos sujeitos nacionais com os limites territoriais do Estado a que se subordinam e, conseqüentemente, extrapolam com suas atitudes os limites da soberania deste Estado, que se deparam com os atributos de soberania de outros estados.

A questão é hodierna e sofre incremento com o trânsito de pessoas entre os países travando relações e gerando conflitos, também.

E como foi analisado, verifica-se a possibilidade de determinado estado impor a sua soberania, notadamente, o seu poder jurisdicional sobre um cidadão seu que se encontre em território de outro estado. Da mesma forma, o estudo permite analisar situações concretas e o direito que ampara a solução dos conflitos resultantes desse universo de relações internacionais.

Oportuno destacar a abordagem de Tatyana S. Friedrich e Leonardo A. Araújo:

“Nesse contexto de Estados Nacionais e independentes, as relações jurídicas respondem a duas modalidades: 1ª – relação de subordinação, o indivíduo apresenta-se como súdito do Estado soberano; 2ª – relação de coordenação, quando os Estados soberanos se relacionam entre si numa circunstância de igualdade, fundada na interdependência e no necessário auxílio entre as nações.

Em um ambiente comunitário a cooperação jurídica requer harmonização da legislação dos Estados-membros nas áreas pertinentes, tendo sua fundamentação nas tradicionais regras de Direito Internacional, com auxílio dos mecanismos de cooperação jurisdicional, a fim de consolidar seus objetivos e solucionar os litígios decorrentes.

No âmbito trabalhista destaca-se a aplicação do princípio da proteção, tendo em consideração seus desdobramentos relativos à aplicação na norma mais favorável e da condição mais benéfica. Entretanto, com o objetivo maior de preservar a efetividade da prestação jurisdicional, sobretudo, sem gerar insegurança jurídica para as partes envolvidas no conflito, prevalece o princípio da lex loci executionis, isto é, as leis vigentes no pais onde ocorre a prestação do serviço, ou seja, a execução do contrato de trabalho regerão as relações jurídicas trabalhistas.

A territorialidade está associada ao local da execução do contrato de trabalho e não o local de sua contratação.

O auxílio de cooperação faz-se necessário para a realização da justiça além das fronteiras nacionais, de modo que o Direito de um Estado possa repercutir em território alienígena, mantendo a solidariedade na tutela da legalidade.