Press "Enter" to skip to content

O princípio da proporcionalidade no momento de dosagem das sanções dos casos de Improbidade Administrativa

Introdução. 1.Improbidade Administrativa e sua contextualização. 2.Aspectos Administrativos Conceituais: Princípios, Discricionariedade e Arbitrariedade. 3.A Lei 8.429/92: sanções e natureza jurídica. 4.A aplicação do princípio da proporcionalidade para a dosagem das sanções nos casos de Improbidade Administrativa. Conclusão. Referências Bibliográficas.

Introdução

O enfoque principal deste trabalho surgiu após algumas análises e leituras de textos sobre os temas de improbidade administrativa, discricionariedade administrativa e controle principiológico.Os principais autores consultados para a elaboração do artigo foram Garcia e Alves (2004), que trazem uma abordagem completa do tema Improbidade Administrativa; Carvalho Filho (2004), que acaba por auxiliar nos conceitos da matéria administrativa e Tourinho (2005), no que tange às matérias de Discricionariedade Administrativa e Improbidade Administrativa.O artigo é dividido em quatro momentos. Primeiramente, será feita uma contextualizando do tema no mundo jurídico e social. No segundo momento serão feitas considerações administrativas conceituais; em seguida, teremos questionamentos acerca da Lei de Improbidade, como a sua natureza jurídica e previsão das sanções. Por fim, relacionaremos a aplicação do princípio da proporcionalidade com a dosagem das sanções nos casos de Improbidade Administrativa.

O tema é de fundamental importância, além da inegável contemporaneidade. O mundo jurídico vive em constante mudança, e os juristas, contando até mesmo com a sociedade, ficam atentos a tal momento.

Cada vez mais fica difícil coibir a improbidade, pois esta já se encontra arraigada ao sistema. Por isso que os mecanismos sancionatórios têm seu cunho decisório como meio de assepsia do sistema. A justiça tem que estar presente no Direito, pois ela é alicerce de todo o ordenamento jurídico.

O presente trabalho tem o intuito de apresentar uma análise acerca da matéria em questão, evidenciando posicionamentos e correntes diante da problemática do presente tema, salientando conceitos que são extremamente necessários para o entendimento do assunto e que propiciam um melhor estudo da Improbidade Administrativa, principalmente no que se refere à interferência do princípio da proporcionalidade no momento de dosagem da pena sobre atos de improbidade.

A intervenção do Estado em matéria de Direito Administrativo zela principalmente pela manutenção do Estado Democrático de Direito, configurando-se como um dever constitucional, sempre tendo como parâmetro à preservação do interesse público e do cumprimento de regras administrativas. Em razão desta importância, que atinge diretamente a sociedade e a proteção dada pelo nosso ordenamento jurídico, o tema é de grande interesse público.

De acordo com Garcia e Alves , a corrupção é tida como fenômeno social composto por desvios de comportamento que infringem a normatividade estatal ou os seus valores morais em troca de uma vantagem correlata. Isso acaba por degradar os padrões da sociedade, desestabilizando todo um sistema.

O Direito brasileiro, convivendo constantemente com esse tipo de situação, deu uma configuração à improbidade administrativa, mostrando que esses comportamentos seriam passíveis de sanções.

1. Improbidade Administrativa e sua contextualização.

Inicialmente, para poder situar o tema “Improbidade Administrativa” no Direito e na sociedade, é necessário fazer uma retrospectiva histórica, no que tange ao surgimento e aplicação desse vocábulo.

Desde a antiguidade mais remota, a sociedade distingue os comportamentos antagônicos do bem e do mal. Conforme Garcia e Alves , tal distinção apresenta-se como fator de valoração humana durante todos os processos históricos, tornando-se inafastáveis e indissociáveis ao homem.

A palavra probidade é originária do latim “probitas” e do radical “probus”, cujo significado é crescer retilíneo. Essa concepção era, inicialmente, aplicada às plantas. Depois, passou a ser usada em sentido moral, dando origem a provo, reprovo e aprovo, além de outros cognatos. Significa a atitude de respeito total aos bens e direitos alheios e constitui ponto essencial para a integridade do caráter.

A improbidade, tanto a casual quanto a administrativa, nunca foi esquecida pelo processo histórico-filosófico. Fazendo um apanhado, temos vários autores renomados discorrendo a respeito. Locke, na sua famosa obra “Dois tratados de governo civil”, alude à sociedade para a prevenção de qualquer atentado que fosse leviano ou maldoso e que se dirigissem contra a liberdade e a propriedade das pessoas. Já Montesquieu, em “Os espíritos da lei”, dedica vários capítulos à corrupção nas diversas formas de governo.

Logo, fazendo um conceito jurídico negativo pelas bases acima firmadas, a improbidade administrativa pode ser tida como a conduta inadequada de qualquer agente público, e até mesmo de terceiros, que pratiquem atos lesivos ao erário, ou que resultem em enriquecimento ilícito, ou que simplesmente atentem contra os princípios da administração.

O dinheiro público, quando despendido com atos de motivação fútil e imoral, sem levar em conta o interesse público e os princípios administrativos, expõe a flagrante desproporção entre o valor gasto e o benefício, se é que este existe, auferido pela sociedade. O gestor administrativo não é o detentor dos bens que administra, por isso cabe-lhe tão somente praticar atos administrativos que beneficiam o povo, pois caso contrário, deverá responder por aquilo que acabou praticando.

Conforme dito na Introdução desse artigo, Garcia e Alves considera a corrupção um fenômeno social composto por desvios de comportamento que infringem a normatividade estatal ou os seus valores morais em troca de uma vantagem correlata. É uma forma de degradação dos padrões ético-jurídicos que devem reger o comportamento individual nas esferas pública e privada.Etimologicamente, o termo corrupção deriva do lato rumpere, equivalente a romper, dividir, vindo a gerar o termo corrumpere, que significa deterioração, deprovação, alteração, sendo largamente coibida pelos povos civilizados.

A improbidade sempre foi presença constante nas esferas do governo brasileiro. A corrupção teve na colonização o marco inicial de sua implantação no Brasil. O elo entre Monarca e Administradores era marcado por interesses pessoais e paternalistas, somado com o objetivo comum de lucro desenfreado, descomprometido com ideais éticos, deveres funcionais ou interesses coletivos. A coisa pública era considerada como “coisa de ninguém”, atendendo, apenas, aos desejos das classes dominantes.

Essa classe ainda persiste no poder, apesar de ter uma nova denominação. A reiteração das práticas e a inaceitável idéia de que são toleráveis, possibilitou a institucionalização da corrupção, enfraquecendo a consciência coletiva de que algo deveria ser feito para haver mudanças.

A responsabilidade do agente público pelos ilícitos que venha a praticar é consequência lógica da inobservância do dever jurídico de atuar em busca da conservação do interesse público. Tal responsabilização envolve a esfera administrativa, política, penal, cível ou até mesmo a moral. Esses ramos acompanharão a natureza do ato e a sua potencialidade lesiva no contexto social, permitindo a aplicação de sanções extremamente variáveis, seja em grau ou essência.

Porém, é inútil a cominação de severas sanções se os mecanismos de controle e de execução são ineficazes. O temor inibitório só incidirá no agente político se este perceber que uma sanção será inevitavelmente aplicada. Quanto maior o prejuízo patrimonial passível ao agente ímprobo e mais eficaz o meio de controle dos atos, menores serão os estímulos à corrupção.

Conforme enfatiza Rita Tourinho :

“os serviços administrativos eram, e ainda são, geralmente exercidos por pessoas despreparadas, mal remuneradas e sem afinidade com o interesse público. Isso colabora com a estruturação do elenco de pressupostos atinentes à corrupção”.

A partir dessa situação, começa a entrar em cena uma incessante busca mais efetiva de justiça, já que o povo, cansado da prática reiterada de atos corruptos, opta por utilizar a lei como mecanismo de defesa, tendo o intuito de combater esse atos.

O sistema jurídico brasileiro, diante da convivência direta com essa situação, foi dando uma configuração à improbidade administrativa, demonstrando que esses comportamentos seriam passíveis de sanções. A Constituição Federal de 1988 foi a responsável por estabelecer princípios e normas pertinentes à moralidade e à improbidade administrativa. O art. 37 consignou a moralidade como princípio expresso da Administração Pública, e tem, em seu §4, a declaração de que a improbidade produziria vários efeitos sancionatórios, como a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao erário.

É nítida a vontade do Constituinte, cansado da prática de condutas reveladas pelo desvio de poder, em adotar uma postura de maior dignidade e afastar-se da degeneração de caráter de muitos que ascendem à gestão do interesse público. Com base nas normas constitucionais, aparece a Lei n.º 8429/92, buscando regular os casos de improbidade, identificar os sujeitos, as sanções, as providências processuais, o ressarcimento ao erário, entre outros.Porém, é necessário deixar claro que existem diferenças entre as diversas condutas caracterizadas como improbidade administrativa, e essa distinção é feita através da intensidade do elemento de vontade que as originou, as peculiaridades dos sujeitos ativo e passivo, a conjuntura do momento de sua prática, a dimensão dos possíveis danos causados e os reflexos que gerou no organismo social.

Destarte, mesmo que dois atos sofram o mesmo padrão normativo de subsunção, os efeitos produzidos provavelmente serão diferentes, pois os elementos que os informam não são iguais. Por isso que existem diretivas de proporcionalidade na individualização das sanções.

2. Aspectos Administrativos Conceituais: Princípios, Discricionariedade e Arbitrariedade.

Os princípios, de acordo com a acepção jusnaturalista, seriam preposições supremas, de natureza universal e necessária, próprias da razão humana e cuja observância independe de normas. Já para os positivistas, os princípios seriam alicerces básicos de todo sistema jurídico e seriam utilizados para limitar e direcionar a aplicação do Direito, podendo ser implícitos ou expressos.

Hoje em dia, os princípios deixaram de ser meros complementos das regras, passando a ser vistos como formas de expressão da própria norma, ou seja, os princípios possuem caráter normativo, sendo marcados por um acentuado grau de imperatividade. Vale ressaltar que os princípios atinentes à atividade estatal estão inseridos na nossa CF88.

Como diretrizes comportamentais, os princípios têm a função de promover uma maior unicidade ao sistema, devendo ser aplicados conjuntamente com as regras, acarretando um dever positivo para o agente – atuar para alcançar essa diretriz – e um negativo – não realizar qualquer ato que afronte tais valores. Com isso chegamos na conclusão de que qualquer ato que destoe de algum princípio tem como conseqüência a ilegitimidade.

A aplicação de regras resume-se a subsunção da norma ao fato, porém, quando falamos dos princípios, estamos a realizar uma atividade de concreção, densificando os valores incidentes no caso, fazendo um exercício de ponderação e buscando a solução mais justa para o caso concreto.

Com a concepção de que os princípios são espécies de normas jurídicas, podemos esclarecer que, dentro da esfera administrativa, todos os atos dos agentes públicos pressupõem conformidade com as regras e princípios que os informam, determinando um grau de obrigatoriedade bastante apurado.

Se os fatos são harmônicos entre si e consoantes com o Direito, estando presente os valores que assolam nosso ordenamento jurídico, estará demonstrada a probidade. Porém, descumprida a regra ou inobservados os princípios, temos a configuração de improbidade, associada também com a potencialidade lesiva em detrimento dos interesses tutelados, operação esta que será realizada com a utilização do princípio da proporcionalidade.

O princípio da proporcionalidade surgiu através de uma construção dogmática destinada a garantir a legitimidade de atuação estatal e a preservar o equilíbrio, a harmonia e a racionalidade dos atos praticados pelos agentes públicos, pois o princípio da legalidade, em certas ocasiões, foi insuficiente à plena garantia das liberdades públicas.

Se o fato é exagerado e inadequado ao administrado, configura desproporcionalidade e, conseqüentemente, sua própria ilegalidade. Os ensinamentos de Garcia e Alves afirmam que o princípio da proporcionalidade:

“impõe a obrigação de que o Poder Público utilize os meios adequados e interdita o uso de meios desproporcionais”.

Concluímos, então, que a proporção adequada implica numa condição de legalidade.

Como vimos, o princípio da proporcionalidade destina-se a garantir o uso moderado e adequado do poder, prevenindo e coibindo o excesso do agente público. Indiretamente, implica na promoção da justiça do caso concreto. Porém, devemos ter cuidado ao afirmar isso, pois uma expansão demasiada pode cair na mesma seara de abusos, no sentido de que haveria uma suscitação demasiada deste princípio.Mas, antes de prosseguir com a inovação da Carta Magna, é necessário fazer uma distinção entre discricionariedade, arbitrariedade e vinculação de atos administrativos, pois estes podem, em determinado momento, virem a constituírem atos abusivos e, a depender da natureza e do grau de lesão causado à Administração, serem configurados como atos ímprobos.A realidade polifacética do mundo jurídico implica numa situação em que a lei nem sempre é capaz de ditar de modo completo o único comportamento viável à plena satisfação do interesse público. Então, em algum momento é capaz da lei conferir uma margem de liberdade para que o administrador, diante do caso concreto, possa escolher qual a solução mais adequada para a satisfação legal.

Porém, mesmo com essa atividade discricionária, o administrador público deverá atender aos princípios que norteiam a Administração Pública, fazendo com que o campo de liberdade de atuação seja reduzido, limitado. Essa abertura para uma atuação mais pessoal não poderá repercutir na prática de atos visando a satisfação de interesses próprios ou de grupos econômicos ou políticos.

De acordo com Rita Tourinho :”a discricionariedade conferida ao administrador público como dever-poder voltado para o melhor atendimento do interesse público, é utilizado como manto destinado a encobrir uma série de atos irregulares e arbitrários”.

Bandeira de Mello , utilizando a terminologia “atos vinculados”, diz que são aqueles que a Administração Pública é obrigada a praticar nos termos regrados por lei. Desta forma, se as condições do fato previstos na norma são cumpridas, caberá à subsunção de tal, fazendo com que a Administração obedeça a seu comando. Resulta na objeção a qualquer tipo de juízo subjetivo.

Vale verificar que nem sempre as normas são dotadas dessa vinculação. No entanto, o conteúdo, determinado ou não, estará sempre direcionado a realização da vontade do legislador, espelhada nas atitudes do agente público. Este último deverá sempre agir com o objetivo de alcançar os fins ditos na norma.

A discricionariedade aparece toda vez que a lei não tem condições de apresentar a solução adequada para o caso concreto, transferindo esse encargo para o seu administrador. Porém, devemos excluir a idéia de que o agente público tem liberdade total, pois toda e qualquer atividade típica do Estado deverá ser voltada à satisfação de um interesse público, não importando a vontade ou opinião do administrador.

Estaremos diante da discricionariedade, conforme afirma Maria Sylvia Di Pietro :”toda vez que o regramento não atinge a totalidade dos aspectos da atuação administrativa, deixando uma margem de liberdade de decisão do caso concreto, de tal modo que a autoridade poderá optar pela escolha de uma dentre as varias soluções possíveis, todas pré-validadas perante o direito”.

Nessa linha, nos casos que permitam a existência de parcela discricionária, a atuação administrativa deverá sempre ser atentada a um limite previamente traçado na norma legal, para que não se cometa o equívoco de confundir a discricionariedade com a arbitrariedade.

A arbitrariedade pode ser definida como a ação desprovida de motivação e sem qualquer vínculo com uma ordem já expressa, podendo ser considerada fruto da vontade e do capricho do administrador público. O que impera, nessas ocasiões, é a vontade pessoal do titular do poder, desconhecendo todos os limites jurídicos admitidos.

Concluímos que a arbitrariedade e a discricionariedade são conceitos antagônicos. Essa diferenciação é de crucial importância, visto que o dever-poder conferido na discricionariedade é, geralmente, decifrado por quem o exerce como um poder incondicional e sem limites formais e materiais.

É por isso que as arbitrariedades mais significantes são àquelas realizadas por quem está na competência discricionária. A partir desse momento, está configurada a improbidade administrativa, restando-nos, então, a busca por uma punição justa e proporcional.

3. A Lei 8.429/92: sanções e natureza jurídica.

Apesar da Lei 8.429/92 não se preocupar em tipificar crimes de improbidade administrativa, acabou por indicar quais as penas que seriam aplicadas aos atos ímprobos que importassem em enriquecimento ilícito, que causassem dano ao erário e aqueles atentatórios aos princípios da Administração Pública.

Antes de enumerarmos as sanções para cada tipo de improbidade administrativa, precisamos nos atentar ao conceito de sanção, que derivado do latim sanctione, pode ser definido como: “1. parte da lei em que se cominam as penas contra os transgressores; 2. pena; 3. castigo”.

O artigo 12, da Lei 8429/92, enumera as penas cabíveis para cada caso de improbidade administrativa. O inciso I refere-se ao art.9º, o inciso II incide na hipótese do art.10 e aplica-se o inciso III caso ocorra situação prevista no art.11 da referida lei.

Os atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito estão sujeitos às seguintes penas: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos (oito a dez anos), pagamento de multa civil (até três vezes o valor do dano), proibição de contratar com o Poder Público (dez anos). É o que trata o art.12, I.

De acordo com o art.12, II da Lei 8429/92, os atos de improbidade que causem dano ao erário são apenáveis com: ressarcimento integral do dano, perda de bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda de função pública e suspensão dos direitos políticos (cinco a oito anos), pagamento de multa civil (até duas vezes o valor do dano) e proibição de contratar com o Poder Público (cinco anos).

Por fim, os atos atentatórios aos princípios da Administração Pública têm como pena: ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público pelo prazo de três anos. Isso em consonância com o art.12, III.

Não podemos fechar os olhos para a triste realidade que acompanha o povo brasileiro desde a colonização portuguesa. Não interessa as razões que levaram à implantação desta “cultura de improbidade” exercida, muitas vezes, através da discricionariedade. O que importa é a necessidade de utilização de mecanismos capazes de extirpar tais práticas. E é dentro dessa seara, quando o Poder Judiciário dosa a quantidade de pena aplicável a cada caso concreto, que aparece o princípio da proporcionalidade.

Justamente pelo fato de indicar quais as penas que seriam aplicadas aos atos ímprobos, essa Lei acabou por ter sua natureza jurídica questionada, se seria civil ou penal.

Ora, acabaram por relacionar o conteúdo das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa com o de diversas leis penais. Embora, muitas vezes, as condutas descritas sejam semelhantes, vale frisar que os processos punitivos são de natureza diversa, os quais não se confundem e nem se excluem mesmo quando incidem sobre o mesmo agente.

A Lei 8429/92 possui rito processual próprio, previsto nos seus artigos 14 a 18, tendo, também, conseqüências punitivas peculiares, como a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e a obrigação de ressarcimento ao erário do que foi desviado.Por isso não deve prosperar a idéia de que as sanções de improbidade poderiam ser identificadas com as de natureza penal. A esse respeito, a Constituição Federal é suficientemente clara quando afirma no preceito que gerou a lei de improbidade, ou seja, no seu artigo 37, § 4º que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública (…) sem prejuízo da Ação Penal cabível (grifo acrescido)”.

Pela simples interpretação literal dos termos previstos na norma constitucional, conseguimos eliminar possíveis dúvidas quanto à exclusão de uma suposta natureza penal de tal lei. Como vimos, a expressão “sem prejuízo da Ação Penal cabível” acaba por excluir, ao meu ver, a caracterização da natureza jurídica como sendo penal.

Não sendo suficiente a separação dessas instâncias punitivas feita pela nossa Carta Magna, a própria Lei 8429/92 deixou claro a especificidade própria de suas sanções, as quais se apresentam como diversas, inclusive, das sanções civis e administrativas. Por isso, entende-se, como mais coerente, o argumento de que a lei de improbidade tem especificidade própria quanto à sua natureza jurídica.

De acordo com as idéias do autor Luiz Henrique Urquhart , vale dizer que em função dessa especificidade é que poderão coexistir harmonicamente outros tipos de sanções, inclusive para efeitos processuais e seguindo ritos independentes, com possibilidades de conexão, também previstas em lei, quando as circunstâncias o exigem. Cite-se como exemplo, o artigo 125 da Lei 8112/90 que estatui: “As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si” porém, segundo o artigo seguinte, 126: “A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria”.

No mesmo diapasão, a Lei 8429/92 estabelece a sua especificidade, de ação de improbidade, diferente das demais, ao afirmar no seu artigo 12 que: “Independentemente das sanções penais, civis e administrativas (grifo acrescido), previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações (…)”.

4. A aplicação do princípio da proporcionalidade para a dosagem das sanções nos casos de Improbidade Administrativa.

Com este trabalho, percebemos que apesar da lei sugerir uma aplicação em bloco das sanções contidas na Constituição Federal sobre os casos de improbidade administrativa, afirma-se que o princípio da proporcionalidade influencia a dosagem de tais sanções de uma forma mais coerente e justa, no sentido de estas sejam proporcionais ao grau de lesão do ato ímprobo.É por isso que defendo a aplicação desse princípio, pois, na medida em que tal é aplicado, têm-se uma solução mais justa do caso concreto.No Brasil, a utilização desse princípio vem sendo ampliada pelos tribunais, e, apesar de não ser expresso na CF88, ele deriva de outros princípios. Deflui do princípio da Estado Democrático de Direito e da necessidade de proteção aos direitos fundamentais assegurados pela Carta Magna.A proporcionalidade, especificamente em relação à Lei 8.429/92, será observada com a verificação dos seguintes fatores: adequação entre os preceitos dessa lei e o fim da preservação da probidade administrativa, salvaguardando o interesse público e punindo o ímprobo; necessidade dos preceitos dessa lei, os quais devem ser indispensáveis à garantia da probidade administrativa; proporcionalidade em sentido estrito, o que será constatado a partir da proporção entre o objeto perseguido e o ônus imposto ao atingido, vale dizer, entre a preservação da probidade administrativa, incluindo as punições impostas ao ímprobo, e a restrição aos direitos fundamentais.

Concorda com esse tipo de posicionamento a autora Vera Scarpinella Bueno , que afirma o seguinte:

“para que sejam aplicadas as severas penas previstas na lei 8429/92, é necessário analisar a conduta do agente público (…) Esta análise dos danos causados pelo autor passa a ser importante para uma razoável e proporcional qualificação da pena (…)”.

E mais. Acredito ser possível, ainda, a sugestão de que, nos casos de improbidade administrativa em menor grau lesivo, o juiz possa dar tranqüilamente a improcedência da ação do que tratar de uma forma tão ofensiva os atos tidos como não muito severos, aplicando, de imediato, sanção mais branda, porém, não perdendo o intuito de promover a assepsia da corrupção no nosso ordenamento jurídico.

Conclusão

Concluindo esse artigo, podemos perceber que o princípio da proporcionalidade faz com que só sejam aplicadas ao agente, as sanções compatíveis com a reprovabilidade de sua conduta e com a natureza dos valores porventura infringidos.

A desconformidade da atuação desse agente com os princípios e normas do Direito poderá se enquadrar na previsão do art.11 da Lei 8429/92, configurando, assim, num ato de improbidade administrativa, que deverá ser combatido para evitar uma reincidência.

É por isso que a probidade administrativa, no moderno estudo do tema, apresenta-se como uma manifestação do princípio constitucional da moralidade administrativa, que, por sua vez, possui inegável feição difusa. Todos os agente públicos deverão ter suas ações consubstanciadas nesse sentido, para que estas atuem em conformidade com as normas e princípios jurídicos.

Não podemos deixar de mencionar que a Lei 8.429/92 representa valioso instrumento para assegurar a probidade administrativa por parte de todos a quantos se acha entregue a condução da Administração Pública, nos entes a que se refere a mencionada lei, garantindo-se, assim, a incolumidade do patrimônio público e o respeito aos princípios da sã administração, mediante o ressarcimento do erário, a punição dos culpados e sua retirada temporária dos quadros político-administrativos.

É fundamental que a ação de improbidade administrativa seja empregada com responsabilidade, nos casos em que realmente se vislumbre a prática de ilícitos. Deve ser utilizada com rigor, mas dentro dos conceitos de razoabilidade e proporcionalidade, evitando-se quaisquer abusos.