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Manifesto do TJMG contra atuação do CNJ

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, diante das recentes e anunciadas resoluções estabanadas que, no mínimo, afrontam os princípios mais comezinhos do Pacto Federativo e mesmo do Direito e da Justiça, e que têm procurado humilhar as justiças estaduais e, particularmente, seus juízes, pede aos que possuem um mínimo de discernimento e boa-fé, que atentem para um movimento de resistência e mesmo de insubmissão que ora está a deflagrar.

Não se esqueçam de que esta Corte de Justiça, ao longo dos anos, vem contribuindo para a construção do Direito brasileiro, personificada dentre outros em Orozimbo Nonato, Hermenegildo de Barros, Tito Fulgêncio, Edmundo Pereira Lins, Amílcar de Castro, Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto, Hélio Costa e Edésio Fernandes.

O TJMG – é bom que se lembre e afirme – é o mesmo que estruturou os Juizados Especiais Criminais e Cíveis, num sistema que virou padrão para o país.

Numa área em que tem sido crescente a omissão do Estado, principalmente da União, que é o equacionamento do problema da violência e da expansão da criminalidade, o TJMG vem contribuindo com um sistema de APACS, que também já chamou a atenção até de organismos internacionais, isso sem falar na larga repercussão social em nossas cidades.

É ele ainda que atentou para o problema dos incapazes com outro programa inovador, o do PAI PJ, e que organizou uma escola para a formação de juízes, também modelo no país.

E o que dizer das Centrais de Conciliação, iniciativa que vem se espalhando pelo Estado, compondo conflitos e desestimulando a propositura de ações dolorosas e sempre difíceis de serem vencidas, notadamente porque centradas em problemas familiares?

Tudo isso vem sendo feito – acentue-se, sobretudo porque muito importante – com a decisiva contribuição de seus membros e dos magistrados mineiros, que nada recebem a mais por tais iniciativas e enormes responsabilidades.

Quem questiona demagogicamente nossas atividades, certamente sequer se digna de ler o Diário Oficial na parte do Poder Judiciário. Ali se pode constatar o trabalho imensurável que os magistrados vêm desenvolvendo cotidianamente, julgando centenas de casos, com todos se empenhando até além dos limites do tolerável e em sacrifício de suas vidas familiares.

Declara, ainda, o TJMG, que a adoção sumária das férias individuais, no Tribunal, por ordem e sob sanções do Conselho Nacional de Justiça, tem aumentado a demora da prestação jurisdicional, feito o Tribunal funcionar sempre incompleto e o obrigado a custos e despesas adicionais, em detrimento do Erário e do interesse dos jurisdicionados.

Não é na seara do Poder Judiciário que se investiga a corrupção dos mensalões!

Aqui não se sabe o que é Caixa 2. Aqui não se admite o desconhecimento sobre o que ocorre nos autos e em nosso redor! Os números exibidos no Diário Oficial evidenciam um trabalho constante, ininterrupto e hercúleo.

É por isso que os magistrados mineiros recusam veementemente o tratamento de moleques e marginais que vêm recebendo de parte desinformada da sociedade, nascido de ações desastradas e absurdas de novos pretensos caçadores de marajás que, no fundo, voltam a se utilizar da demagogia mais rasteira na busca de interesses eleitoreiros, sem compromisso nenhum com a melhoria da sociedade. Nosso desabafo nasce da total falta de oportunidade de defesa que estamos constatando, porque, com acesso fácil à mídia, nossos acusadores primam pelos ataques e nada esclarecem. Pelo contrário: tumultuam.

O Judiciário não tem agências de publicidade a seu dispor para divulgar seus feitos e, mais do que isso, nunca se prestaria a se auto-endeusar alardeando e enganando os mais crédulos com façanhas que não fez.

O Conselho Nacional de Justiça, órgão concebido e instituído por um parlamento debilitado pela corrupção, capitaneado pelo Sr. Nelson Jobim com poderes ilimitados, com um comportamento ditatorial a serviço do reino, que, irresponsavelmente, legisla por meio de resoluções, quebra o pacto federativo, ao açambarcar a competência dos Estados em organizar a sua justiça, ofende frontalmente a Constituição, atentando contra a coisa julgada e o direito adquirido, institutos que determinam a estabilidade das relações sociais, e hostiliza de forma desumana o magistrado estadual de segunda instância.

Pertinente transcrever parte do discurso proferido por Paulo Brossard, na Sessão do Senado de 19.03.1975, político honrado, jurista, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, natural do Rio Grande do Sul, estado em que também há homens de bem:

“O Brasil não tem constituição, tem leis e não tem lei. Nesse fato aberrante reside a causa das causas da continuada insegurança em que vive o País. A segurança é filha das leis; a quebra da legalidade é mãe da insegurança. Quando a lei é editada por quem, legalmente, não tem competência para fazê-lo, quando a lei, como enfeite que se muda de lugar conforme o gosto, ou o capricho, é mudada aqui e ali, consoante a convivência do dia ou o embaraço da ocasião, está rompida a teia invisível da segurança jurídica, sem a qual não há segurança alguma. E quando os governados não têm seguros os seus direitos, os governantes não têm seguros o seu poder.”

Agora, estão em tubo de ensaio, prontas para homenagear S. Exa. o Presidente do Supremo Federal, antigo deputado e aspirante a um domínio maior, conforme ele mesmo declara, uma série de medidas que, antes de serem ofensivas aos princípios mais rudimentares da Constituição, como irredutibilidade de vencimentos e direitos adquiridos, exibem verdadeiro menosprezo aos juízes, principalmente aos desembargadores, na maioria com mais de trinta anos de serviços prestados.

No caso de Minas Gerais, foram anos e anos de miséria e de luta para se estruturar a carreira de magistrado de forma a possibilitar o recrutamento e a formação de valores realmente à altura das exigências da função e da sociedade. Os vencimentos dos magistrados decorrem integralmente de leis legítimas e transparentes, nada havendo a ser ocultado. Leia-se a Constituição do Estado de Minas Gerais! É este o documento básico que vem sendo afrontado e ignorado por tais desmandos.

O tratamento indigno que vem sendo incentivado de Brasília, notadamente até por manipuladores confessos da Constituição da República, evidencia-se como parte final de uma política de atemorizar e apequenar o Judiciário – principalmente a Justiça Estadual -, pois ele é o único Poder da República que pode representar perigos e incômodos para os mensalistas e demagogos, que só têm olhos para seus interesses e ambições e nunca para o cenário de corrupção e miséria que os cerca, tudo gerando uma situação de instabilidade e desconforto crescente na nação.

Nosso inconformismo avança ainda para contender com os oportunistas de plantão, ávidos na exploração de uma opinião pública sensacionalista, tudo em busca de holofotes para suas ambições pessoais e políticas, incapazes de avançarem até uma melhor compreensão dos fatos e a constatação da enorme injustiça de muitas dessas medidas. E eles estão incrustados em Associações de classe e até na OAB, todos se valendo dos palanques que não temos, para nos acusar de tal forma que, hoje, para o povo brasileiro, a palavra juiz está sendo quase que sinônimo de ladrão, tudo feito sem se dar oportunidade ao debate, à defesa e ao esclarecimento.

O mais grave é que, paradoxalmente, instituições como a AMB e OAB, cujos dirigentes, por dever de ofício, têm consciência da necessidade de um Judiciário forte para que seja mantido o paradigma do Estado Democrático de Direito, adotado pelo Constituinte de 1988, fazem coro à campanha insidiosa contra os Judiciários Estaduais.

Mesmo reconhecendo que se possa tomar esta manifestação como fruto de mero inconformismo, diante das atitudes concretizadas pelo Conselho Nacional de Justiça, chegamos agora a um ponto em que precisamos ter a coragem de divulgar nossa mais veemente indignação e reconhecermos que também temos de colocar de lado a modéstia e a contenção de falarmos o que temos feito de serviços ao povo mineiro.

Sabemos que o Sr. Nelson Jobim procurará reduzir nosso documento a uma simples reação de nababos da Administração Pública, como é de seu feitio, no sentido de desqualificar a Magistratura, notadamente a Estadual. Com isso, ele, mais uma vez, estará fugindo do debate realmente importante que deve ser voltado para o aprimoramento do Judiciário através, no mínimo, da revisão de uma legislação confusa e que possibilita as manobras que impedem uma rápida solução dos conflitos, principalmente da parte do próprio Estado.

Cientes de tudo isso, entretanto, lançamos o nosso protesto, fincando-o, principalmente, na histórica construção da unidade da Federação que vem sendo ignorada e afrontada pelo Conselho Nacional de Justiça, a mesma Federação já discutida em 1831, por ocasião dos atos parlamentares a respeito do Ato Adicional de 1834, quando se consagrou a autonomia provincial.

Que os intérpretes e legisladores do Conselho Nacional de Justiça não se esqueçam do movimento liberal de 1842, liderado por Minas Gerais e por São Paulo!

Se o passado nada vale para os cultores dos planos transitórios dos governos e mesmo para o chamado Líder do Governo no Supremo Tribunal Federal, para nós ele precisa ser respeitado, pois é a própria essência que deu alma ao nosso país, congregando a todos numa Federação.

É por isso que causa espanto verificar o deboche que tem sido dispensado aos pleitos de magistrados, especialmente os estaduais.

Embora respeitemos, como devemos respeitar, a decisão judicial, é de estarrecer que ministros votem em sentido diametralmente oposto àquele constante de suas obras anteriores ao empossamento no cargo, exibindo uma absurda falta de responsabilidade com o passado de jurista e uma maior desonestidade ainda para com os leitores de suas obras, agora inteiramente desmerecidas por eles mesmos. Estamos diante de um outro estelionato: o intelectual!

O que constatamos é que o Congresso, por fatores externos, encontra-se mergulhado em escândalos, não cumprindo sua função primordial de legislar, restando-lhe tão-somente a homologação das Medidas Provisórias.

Legisla, sim, o Conselho Nacional de Justiça. E quer afrontar e passar por cima até da Constituição do Estado de Minas Gerais!!!

Deve ser objeto da nossa preocupação o comportamento do atual governo que a tudo quer controlar: instituiu o controle do Poder Judiciário, como também do Ministério Público, subtraindo-lhes poderes, instituições que não conseguiu desestabilizar por meio da remuneração indigna; tentou criar o Conselho Federal da Imprensa com o objetivo de calar os órgãos de comunicação, colocando-os a seu serviço exclusivo; banalizou a corrupção, instituindo a remuneração criminosa de parlamentares para aprovação de projetos de seu interesse; governa quase que, exclusivamente, por meio de medidas provisórias; vem procurando, a todo custo, enfraquecer as forças armadas, destinando-lhes, a cada ano, verbas menores e, finalmente, o que é pior, montou, ao seu feitio, o Supremo Tribunal Federal. Cabe aqui a advertência de Rui Barbosa: “Quando a decepção pública já não puder levantar as mãos para os tribunais,(como é o caso dos magistrados estaduais de segunda instância em relação ao Supremo Tribunal Federal) acabará por pedir inspirações ao desespero”.

É por isso que só nos resta, acuados e até mesmo em legítima defesa, reclamarmos que se respeite a Federação, que se devolva ao juiz estadual a dignidade, perdida pelas manifestações desairosas, jocosas, debochadas, infelizes e que assassinam qualquer incentivo e desestimulam todo este trabalho que estamos tentando aumentar em nosso Estado, tudo oriundo desse “Líder” Nelson Jobim.

Diante deste quadro, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, para salvaguarda da própria honra, sua e de seus desembargadores, como também do próprio Estado de Minas Gerais, declara que resistirá a qualquer disposição arbitrária de órgão público que não respeite os mínimos princípios constitucionais e, a partir deste momento, protesta veementemente contra as maldosas insinuações políticas, principalmente do Sr. Nelson Jobim que, transitoriamente, ocupa a Presidência do Supremo Tribunal Federal.

Dispõe mais este Tribunal: cansado das invectivas injustas, descabidas e até imorais, está disposto a tomar medidas, as mais drásticas possíveis, que manifestem repúdio aos atos abusivos de qualquer órgão público que tenha por objetivo a desmoralização do Poder Judiciário de Minas Gerais, para resguardar a própria democracia brasileira, da qual Minas está na vanguarda.

Por tudo isso, conclama as autoridades a fazerem cumprir a Constituição e as leis, defenderem a ordem e as instituições democráticas e fazerem prevalecer o justo, conscientes de que o juiz não pode pretender a infalibilidade e que todos os Tribunais têm o dever de se esmerar, de se corrigir e de não ceder ao casuísmo, ao capricho e à desobediência à Constituição, que juraram obedecer, certos de que, como escrito por Bancroft, na história das instituições e do pacto federal dos Estados Unidos da América, as decisões, ainda que do Supremo Tribunal, que a contravierem, são vãs e nenhumas.

DELIBERAÇÃO

Reunido em Sessão Extraordinária, em 16 de março de 2006, o Pleno do Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu, por unanimidade, que dia 20, os seus Desembargadores fariam uma paralisação total dos trabalhos, numa manifestação de advertência, ante os termos da Proposta de Resolução do Conselho Nacional de Justiça, que, tal como disponibilizada até agora no site daquele Órgão, contém ameaças intoleráveis aos direitos defendidos pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.