É possível o afastamento de promotora de Justiça de suas atribuições eleitorais devido à promoção de Ação Penal privada anterior contra candidato. Com esse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso em mandado de segurança de promotora que contestava seu afastamento durante as eleições municipais em Antonina (PR).
A partir de reclamação dos diretórios municipais dos partidos Social Trabalhista (PST), Socialista Brasileiro (PSB) e Republicano Progressista (PRP) por suposta inimizade entre a promotora e a candidata à prefeita pela coligação, Munira Peluso, o procurador regional eleitoral do Paraná recomendou o afastamento da promotora do pleito, já que ela havia registrado queixa-crime contra a candidata à reeleição.
Com base nessa decisão do procurador eleitoral, o procurador-geral do Estado resolveu acatar o pedido de afastamento da promotora de suas funções eleitorais, designando outro membro do MP para atuar na 6a Zona Eleitoral de Antonina (PR).
No recurso, a promotora sustentou que não ficara comprovada sua inimizade com a candidata; que a violação de seus direitos ficou amplamente comprovada nos autos; a suspeição não poderia ter sido alegada pela coligação, mas apenas por pessoa diretamente afetada; que o procurador regional eleitoral, apesar de reconhecer que a promotora não agiu em desacordo com seu encargo legal, recomendou seu afastamento; que a representação processual dos partidos não restou legitimada, pois não apresentaram seus estatutos sociais; que o próprio parecer que recomendou o afastamento não atribuiu à promotora nenhum comportamento indevido ou irregular e que não foi respeitado seu direito à ampla defesa.
O Estado do Paraná contra-argumentou considerando a inexistência de direito líquido e certo, afirmando ainda que foi dada a ela a oportunidade de se defender e que o afastamento foi determinado por autoridade competente em cumprimento da disposição legal, seguindo ainda a opinião da Corregedoria-Geral do MP e da Coordenação do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Eleitorais.
O parecer do MP Federal foi no sentido de dar provimento ao recurso. Para o MPF, o procurador-geral de Justiça do Estado do Paraná seria incompetente para determinar o afastamento da promotora de suas funções eleitorais, o que seria atribuição exclusiva do procurador regional eleitoral. Isso porque os promotores eleitorais exercem funções do MP Eleitoral.
O ministro Arnaldo Esteves Lima destacou, no entanto, que o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é diverso, entendendo ser da competência do procurador-geral de Justiça a indicação ao procurador regional eleitoral do substituto do promotor eleitoral impedido. O relator esclareceu que o procurador regional eleitoral, ante a representação de suspeição, decidiu ser caso de afastamento da promotora de suas funções eleitorais e solicitou, conforme a jurisprudência do TSE, que o procurador-geral de Justiça indicasse o substituto. Daí a inexistência de ilegalidade no ato.
O período de afastamento também não seria excessivo, já que a jurisprudência entende que, pelas características especiais que regem o processo eleitoral, é possível o afastamento, por todo o procedimento, de magistrado ou membro do MP em razão de impedimento ou suspeição. Também devido a essas regras especiais, não seria necessário o respeito às regras contidas no Código de Processo Civil relativamente à representação de suspeição de membro do MP. “Trata-se de argüição autônoma de suspeição/impedimento em que os partidos políticos requerem o afastamento da recorrente de todo o processo eleitoral e que foi apresentado nos termos do artigo 96 da Lei 9.504/97, que assim prescreve: ‘Salvo disposições específicas em contrário desta lei, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato’”, afirmou o relator.
A existência efetiva de impedimento da promotora também foi analisada. O ministro Arnaldo Esteves Lima esclareceu que a representação apreciou a questão e verificou a existência de Ação Penal privada promovida pela promotora contra a candidata por suposto crime contra a honra. “Não se trata de uma denúncia-crime onde a Promotora Pública funcionasse, embora como órgão de acusação, de forma imparcial. Na Ação Penal privada ela é parte e, portanto, parcial. A existência dessa ação indica a presença de animosidades que vão além daquelas meramente derivadas do exercício de suas respectivas funções. Tornou-se pessoal”, considerou o procurador regional eleitoral.
O ministro entendeu aplicável ao caso o disposto no artigo 95 da Lei n. 9.504/97: “Ao Juiz Eleitoral que seja parte em ações judiciais que envolvam determinado candidato é defeso exercer suas funções em processo eleitoral no qual o mesmo candidato seja interessado”.
“Vale ressaltar”, completou o relator, “que o reconhecimento do impedimento da recorrente para exercer suas funções eleitorais de forma alguma depende da prática de atos irregulares de sua parte ou implica punição. O instituto do impedimento serve como garantia às partes de que o magistrado ou o membro do MP que venha a atuar no processo eleitoral aja com absoluta imparcialidade, livre de quaisquer interesses privados. Não se trata de punição à recorrente ou imputação de prática de atos irregulares. Apenas garantia de imparcialidade na atuação do MP nas eleições municipais.”
O direito de defesa da promotora também foi respeitado no entendimento do ministro Arnaldo Esteves Lima, já que teve oportunidade de responder na representação que deu origem ao ato apontado como irregular, não tendo negado a existência da Ação Penal privada que fundamentou a decisão do afastamento.