A existência de circuito fechado de televisão para vigilância eletrônica em supermercado não torna a prática de furto crime impossível, ou seja, aquele que não pode ser consumado em razão da absoluta ineficácia do meio ou impropriedade do objeto e cuja tentativa não é punida. O entendimento é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determinou o recebimento de denúncia rejeitada sob tal fundamento.
No caso, a denúncia por furto de um relógio despertador avaliado em R$ 11,99 foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS) sob o fundamento de se tratar de crime impossível devido à vigilância exercida por meio de câmeras de vídeo instaladas no interior da loja. O tribunal local, no entanto, afastou a aplicação do princípio da insignificância que fundamentara a primeira rejeição da denúncia: o juiz de Direito havia enquadrado o crime como se fosse de bagatela. O Ministério Público gaúcho recorreu, então, ao STJ, para afastar a tese de ser crime impossível o furto praticado sob tais condições.
O ministro Gilson Dipp citou Damásio de Jesus para explicar o conceito de crime impossível: “Em determinados casos, após a prática do fato, verifica-se que o agente nunca poderia consumar o crime, quer pela ineficácia absoluta do meio empregado, quer pela absoluta impropriedade do objeto material (pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta).”
Mas o relator, seguido de forma unânime pela Turma, não entendeu ser esse o caso presente. O denunciado estava sob observação do segurança do supermercado por meio do monitoramento eletrônico e foi perseguido quando deixou o estabelecimento. “Verifica-se que o meio, na realidade, não se mostrou inteiramente ineficaz para a produção do resultado, uma vez que, ainda que mínimo, havia o perigo de consumação do delito. Nas palavras de Mirabete, ‘não se pode tachar de meio ineficaz aquele que, na prática, demonstra eficácia’. Tampouco poderia se falar em absoluta impropriedade do objeto, que, no caso de furto, ocorre na ausência do objeto material, o que não é o caso dos autos”, explicou o ministro Gilson Dipp.
A tese adotada pelo TJ-RS de que a existência do sistema de vigilância torna ineficaz o meio para furtar mercadorias, acrescenta o ministro, não pode prevalecer. “Isto porque o sistema de vigilância eletrônico instalado em uma loja não é infalível, pois, a despeito de dificultar a ocorrência de furtos no interior do estabelecimento, não é capaz de impedir, por si só, a ocorrência do fato delituoso. E, se não há absoluta impossibilidade de consumação do delito, não há que se falar na hipótese de crime impossível”, concluiu o relator.