Em caso de separação do casal, créditos provenientes de ação trabalhista devem ser incluídos na partilha dos bens. O entendimento – firmado anteriormente pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – foi confirmado pela maioria dos ministros da Segunda Seção.
A questão chegou à Justiça em ação de uma funcionária pública do Rio Grande do Sul que foi casada de setembro de 1984 a maio de 1992. Quando se divorciou, não foram incluídos na partilha R$ 118.599,59, recebidos pelo marido em abril de 1997.
Em primeira instância, a Justiça gaúcha acolheu o pedido. O juiz entendeu que os frutos do trabalho do marido recebidos em reclamação trabalhista, débito que remonta à constância do casamento, devem ser partilhados. A decisão, contudo, foi inversa no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, onde o valor foi excluído da partilha.
A decisão levou a ex-mulher a recorrer ao STJ, onde o caso foi distribuído ao ministro Ruy Rosado de Aguiar, na Quarta Turma. Para o ministro, as leis em vigor são aparentemente contraditórias. No artigo 263 do Código Civil, os frutos civis do trabalho de cada cônjuge estão excluídos da comunhão universal. No artigo 271, os mesmos frutos entram na comunhão no caso de regime de comunhão parcial. Ainda para esse mesmo regime, o artigo 269 estabelece que nele não entram os bens excluídos da comunhão universal. O artigo 346 do Código Civil define como bem reservado o produto do trabalho da mulher.
Entendeu o relator, no julgamento do recurso especial, que essas disposições devem ser conciliadas, de modo a alcançar solução adequada à realidade, preservando a razão da lei. Para a maioria dos casais brasileiros, os bens se resumem à renda mensal familiar. Se tais rendas forem retiradas da comunhão, esse regime praticamente desaparece. “Se houver a separação, tais bens seriam apenas daquele que trabalha”. No caso de apenas o marido trabalhar, a mulher seria prejudicada na meação, muito embora tenha contribuído como dona de casa para a renda e aquisição do patrimônio. “A comunhão relativa ao salário dos cônjuges, portanto, penso que deveria ser reconhecida tanto no regime universal como no de comunhão parcial, fazendo prevalecer a regra do artigo 271. Isso para os ganhos do homem e também para os da mulher, uma vez que a discriminação feita no artigo 246 não pode prevalecer, considerando o princípio da igualdade”, disse.
De acordo com ele, não tem maior importância o fato de o pagamento da indenização ter acontecido depois da separação. “O período aquisitivo dos direitos transcorreu durante a vigência do matrimônio, constituindo-se crédito que integrava o patrimônio do casal quando da separação. Portanto, deveria integrar a partilha”, concluiu.
Essa decisão levou à rediscussão da matéria a pedido do ex-marido, que impetrou embargos de divergência (tipo de recurso em que se alega que a conclusão difere de outras tomadas em recursos sobre questão semelhante). O caso foi então apreciado pela Segunda Seção, que reúne os ministros da Terceira e Quarta Turmas, responsáveis pelos julgamentos das causas referentes a Direito Privado. Apesar de reconhecer que a decisão diverge de outras anteriores, a maioria dos ministros, seguindo o entendimento do ministro Cesar Asfor Rocha, concluiu que “integra a comunhão a indenização trabalhista correspondente a direitos adquiridos durante o tempo de casamento sob o regime de comunhão universal”. Nesta semana, a Segunda Seção rejeitou novo recurso dos advogados do ex-marido, mantendo a decisão.