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Aspectos diferenciadores da jurisdição penal (ou a Cinderela do Direito Processual)

Cumpre em primeiro lugar, esclarecer em primeiro plano, acerca da jurisdição que é função estatal específica do Poder Judiciário, e como assevera Joaquim Canuto Mendes de Almeida no poder-dever pelos membros e órgãos assumido, ao serem investidos na função judicante, de realização de justiça.

É, em suma, o poder-dever de fazer justiça estatal através de juízes e tribunais que se realiza mediante atividade substitutiva à dos membros da comunhão social. Como função monopolizada pelo Estado a fim de evitar desordens e violências. É mesmo vedada a realização de justiça pelas próprias mãos (art.345 do CP).

Ao conceito de jurisdição deve ser analisadas as noções que segundo Carnelutti como a de interesse corresponde a “posição favorável à satisfação de uma necessidade”; a de direito subjetivo, a “um poder concedido à vontade de uma pessoa para prevalência de seu interesse”, a de dever (do mesmo modo que a de obrigação), a “um vínculo imposto à vontade para a subordinação de um interesse”;

Direito à jurisdição, por sua vez resultante da explicitada inibição de realização de justiça por si própria, pela pessoa física ou jurídica integrante da coletividade, diz com a permissibilidade que lhes é outorgada pelo ordenamento jurídico, de obtenção de prestação jurisdicional, emanada de órgão estatal competente.

A de ação, a de concreção desse direito subjetivo, consistente no respectivo exercício, com a solicitação ao Poder Judiciário, da tutela de outro direito. Os referidos órgãos integrantes do Poder Judiciário exercem o importantíssimo poder, precisado por Celso Neves, como poder de tutela jurídica processual, essencial à soberania do Estado, diferenciado em três aspectos: o dever de declarar o direito; o dever de satisfazer o direito derivante do declarado; e, dever de assegurar o direito cuja declaração, ou satisfação é invocada.

Chiovenda preleciona função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, de atividades particulares ou de órgãos públicos já no afirmar a existência da vontade da lei e, de torna-la praticamente efetiva.

Jurisdição consiste num poder-dever de realização estatal, mediante aplicação de normas disciplinadoras da conduta dos membros da comunhão social, incidentes sobre determinada relação jurídica com a conseqüente finalidade de declaração, satisfação e assecuração de um direito subjetivo material de um de seus destinatários.

Piero Calamandrei conferiu a jurisdição precisão conceitual indicando os caracteres da função jurisdicional, como atividade secundária e de natureza declaratória de sentença.

Michelli opina por não estar correto situar na substituição o caráter distintivo entre jurisdição e administração, até porque não se esclarece, que o elemento prevalente diz com a imparcialidade do órgão, em relação ao efeito jurídico obtido.

Também Carnelutti toma a imparcialidade do órgão judicante como critério diferenciador entre a função judiciária e a administrativa, onde ressalta a contraposição da Administração Pública como parte no processo.

Galeno Lacerda ressalta a precariedade do conceito de jurisdição baseado nas concepções de Chiovenda e Alfredo Rocco, sublinhando que a essência da atividade jurisdicional consistiria em seu caráter substitutivo e secundário.

Manzini observa que o Direito Penal não se apresenta senão como um “direito de coerção indireta”, em virtude de o poder de punir não ser dotado de atuação imediata. Só se aplica pena ou sanção, tão-só por meio do processo com estrita observância de todas as formalidades em leis prescritas.

Assim ressalta Frederico Marques que o poder de punir do Estado é auto-executável e, sim mediante e depois do pronunciamento jurisdicional. Assim o poder-dever de punir e o poder-dever de tutela jurídica processual tornam-se necessário o desdobramento em Estado-Administração, como titular do interesse punitivo, e em Estado-Jurisdição, ou, mais simplesmente, Estado-juiz, como titular de potestade-encargo jurisdicional.

Calamandrei enfoca que a guisa do processo civil inquisitório com o processo penal, particularmente no tocante à vinculação do julgador à perquirição da verdade material, independentemente da iniciativa ou de acordo das partes. Ou a verdade atingível pelos meios e métodos processuais de verificação.

José Alberto dos Reis aponta que é remota a distinção havida entre a jurisdição voluntária e contenciosa, mas a doutrina não conseguiu fixar nitidamente a linha divisória entre as duas espécies.

A mais difundida idéia processualista alega que a jurisdição voluntária se exerce inter volentes, enquanto que a contenciosa opera-se inter invictos, ou, inter nolentes. A jurisdição voluntária tem um escopo constitutivo tendente sempre a constituição de estados jurídicos novos, ou cooperam com o desenvolvimento das relações existentes.

Assim a jurisdição voluntária implica no exercício de atividade substancialmente administrativa e a contenciosa implica no exercício de atividade verdadeiramente jurisdicional.

Cristofolini assevera que a distinção entre a contenciosa e a voluntária reside no terreno da natureza material da atividade desenvolvida pelo órgão jurisdicional. Alcalá-Zamora y Castilo incisivamente fulcra a finalidade distintiva em litígio e negócio, sendo certo que, na denominada jurisdição voluntária, o litígio está ausente, e, por vezes latente, mas jamais presente.

A segunda referência diz respeito à natureza jurisdicional, quer positiva, quer negativa, para fixada a noção da genuína jurisdição. A terceira referência é a coisa julgada, meta final do processo contenciosa e totalmente estranha à jurisdição voluntária.

Amiúde a jurisdição contenciosa se caracteriza: a) pela existência de partes a lide ou litígio constitui objeto do processo indispensável à respectiva composição; b) pela possibilidade de contraditório; c) pelo fato de, com a preclusão dos prazos para recursos, formar-se a coisa julgada material, peculiar, exclusivamente, aos atos decisórios concernentes ao meritum causae.

A jurisdição voluntária versa sobre interesses não em conflito, constituindo administração de interesses privados pelos órgãos jurisdicionais. Nada mais há que um processo sem lide ocorre tão-só coisa julgada formal, com a possibilidade de revisão do decidido, ante a alteração das circunstâncias fáticas que sustentaram o decisum.

Fernando Luso Soares entende ser a jurisdição penal, voluntária enquanto que Frederico Marques a tem como contenciosa, ao asserir que a jurisdição ordinária se divide em penal e civil.

A simples verificação da irrelevância processual da lide em processo penal, quer pelo fato de estarem em jogo, sempre , interesses indisponíveis, quer pela conceituação carneluttiana de lide e de pretensão.

Aliás, a respeito dessa irrelevância processual da lide, pois o processo penal não visa remover um desacordo existente entre acusador e acusado a respeito da existência do crime ou da medida da pena;

O processo penal só pode ocorrer mediante pronunciamento jurisdicional jurídico da punição do réu, aquele mesmo caráter de necessidade. Inexiste a lide no processo penal, e, sim mera controvérsia. Também inaceitável a transposição do conceito civilístico de pretensão para o processo penal.

Não há no processo penal efetivamente pretensão, e só o ius ut procedatur.A finalidade da jurisdição penal é a de concretizar o fato delituoso e não de satisfazer um interesse de terceiras entidades distintas dos ius cuius re agitur.

Também não há tecnicamente partes, tendo em vista o fato de ser a acusação obrigatória e, ainda apurar-se a verdade material ou atingível inicialmente inquisitivo e, em segunda fase da persecutio criminis correspondente à instrução criminal, ou mais especificamente, da Ação Penal e que se realiza sob a forma acusatória.

Assim, o processo penal moderno delinea-se inquisitório, substancialmente, na sua essencialidade, ao mesmo tempo em que é, formalmente, no tocante ao procedimento, acusatório.

Não se deve confundir embora andem lado-a-lado, os conceitos de contrariedade e contenciosidade, o que não significam serem inseparáveis. Há sentenças penais de natureza condenatória que transitam em julgado apenas formalmente, podendo ser revogadas em qualquer tempo e, em variadas circunstâncias (habeas corpus, revisão criminal e, etc.).

Carnelutti expõe que o processo penal de conhecimento de caráter condenatório se apresenta como processo executivo quando absolvido o acusado, o juiz afirma que o processo não deve prosseguir; já quando o juiz efetivamente condena, dispõe juntamente sobre o prosseguimento da aça penal.

Daí o doutrinador italiano vicejar no prosseguimento do feito penal ou da condenação, a ostentação da natureza puramente processual. Em matéria penal, é preferível cogitar em preclusão, ao invés de coisa julgada (ne bis in idem).

No processo penal, há duas distintas situações quanto à coisa julgada: quando se tratar de sentença absolutória ou de extinção de punibilidade, por jamais poder ser modificado o seu conteúdo, com a preclusão dos prazos recursal forma-se a coisa julgada de autoridade absoluta.Porém, se a condenação for mutável, ver-se-á tutelada apenas, pela coisa julgada de natureza relativa.

Assim inserida somente no processo penal ter-se-ia a coisa julgada bivalente, sui generis, peculiaríssima da jurisdição penal. Destaque-se a inevitabilidade do processo penal perante toda a prática criminosa, e, com isso, o corolário da necessidade impostergável do processo penal.

O jus puniendi, portanto, é um direito de coação indireta, podendo a norma penal ser aplicada apenas judicionalmente e através do processo. A jurisdionalização da pena significa uma verdadeira garantia da pessoa tida como infratora da norma penal. É quando se substitui o império da violência privada pelo regime do Direito, da violência institucionalizada só aplicada somente mediante devido processo legal.

A tarefa judiciária é autêntica garantia de estabelecer a justa aplicação da sanção prevista em lei e, aplicada ao caso concreto submetido à cognição de órgão competente do Poder Judiciário.

No âmbito da jurisdição penal há um conflito interssubjetivo de interesses sempre públicos, retratados, por um lado, na intenção punitiva do Estado, ínsita ao jus puniendi, e tendo como pressuposto a prática, pelo membro da comunidade, envolvido na persecutio criminis.

Esses dois contrastantes interesses tanto na aparência como na essência traduzem na realidade o conteúdo da causa penal, cingindo-se à verificação da materialidade de fato típico, antijurídico e culpável (ilícito penal), à determinação da respectiva autoria, e à incidência ou não (até mesmo a sua exclusão), Àquele da norma penal material incriminadora.

Em síntese, a abstração da existência da lide, contraditório real e indispoisitivo ou indisponível e coisa julgada sui generis, referida à causa penal objetivada no processo, mostra que a jurisdição penal é distinta da dita contenciosa e, se apresenta de forma autônoma e peculiar.

Há muito tempo que o processo penal não é mais a Cinderela do Direito Processual conforme alcunhou Carnelutti, pois que dotado plenamente de dignidade e autonomia científica.

João Mendes de Almeida Junior intuiu precisamente “forma que dá realidade à operação”, o processo é o natural atributo de toda ação em movimento no tempo e no espaço, é a realidade da ação, e, portanto, a sua forma.

E, ainda complementa adiante, o processo judicial refere-se ao movimento dos atos da ação judiciária, ou seja, dos atos da ação em juízo. O processo é o instrumento do exercício da jurisdição.

E o processo penal se traduz no poder-dever estatal em decorrência da prática de um fato penalmente relevante, isto é, sendo típico, antijurídico e culpável, daí ser importante a adequação típica do fato.

Aduz Magalhães Noronha por ser o Estado um meio e, não um fim, tendo como objetivo a realização do bem comum, não o conseguiria se não estivesse investido do jus puniendi.

Dotado o Direito Penal como já salientados do caráter indireto de coação, para torna-la então finalmente efetiva necessita o Estado ostentar a titularidade de outro direito, igual e inequivocamente público e subjetivo, o chamado ius persequendi ou ius persecutionis.

O processo penal é instaurado em regra pela ação de uma das partes concebidas processualmente, visando ao julgamento da causa, que deriva diretamente da jurisdicionalização da sanção penal e o da afirmação do ius libertatis.

O processo penal é instrumento de preservação da liberdade jurídica do acusado em geral, há quem chegue afirmar que enquanto o Código Penal é o diploma do delinqüente, o Código de Processo Penal é o estatuto do inocente (Mestre Canuto).

As partes no processo penal, na relação jurídica penal concreta objetivada na persecutio criminis, compreende sempre duas situações jurídicas justapostos: a titularidade do ius puniendi, e outra à titularidade do ius libertatis.

O que vem acentuar seu caráter notadamente publicístico pela relevância dos interesses em conflito (punitivo e de liberdade) e a instrumentalidade da atuação dos agentes do Poder Judiciário no exercício da jurisdição penal.

Induvidosamente na Ação Penal de conhecimento de caráter obrigatório, o MP é um das partes, parte em sentido processual (é parte como órgão e não como representante do Estado). Assim o aspecto ritualístico do processo tanto leva o MP a atuar como fiscal da aplicação da lei como também a exercer a função de acusar.

A outra parte processualmente dita é o acusado, ao qual deve ser assegurado, o devido processo penal, como todos seus corolários como o contraditório e a ampla defesa.

Os pressupostos processuais penais tidos como indispensáveis tanto à constituição como ao desenvolvimento do processo correspondem aos elementos de natureza estritamente formal e indispensáveis ao julgamento do mérito.

Antes de o juiz manifestar-se sobre o meritum causae, obrigatoriamente deve verificar a regularidade do processo, desde a sua incoação, e relativamente a todos os atos processuais, que se sucedem, uns aos outros, e no procedimento se coordenam.

Duas espécies de pressupostos são conhecidas: os de existência e os de validez (nome preferido por Tornaghi) ou validade do processo. Os primeiros devem coexistir para que o processo validamente se constitua, e, portanto obviamente exista.

Já os de validez são imprescindíveis para que o processo possa desenvolver-se regularmente até o momento da entrega final da prestação jurisdicional.

Três pressupostos de constituição válida do processo, a saber: a) propositura ou incoação de ação; b) órgão dotado de jurisdição; c) partes que se apresentem como sujeitos de direito.

Outrossim, são de duas modalidades: os subjetivos e os objetivos.Quanto aos subjetivos, deve o juiz ser competente e imparcial; e às partes devem ser capazes e estar em juízo representadas por advogado legalmente habilitado.

Sinteticamente anota detalhadamente Moacyr Amaral Santos referentes ao juiz que se trate de órgão estatal investido de jurisdição, dotado de competência originária ou adquirida, seja imparcial. E quanto às partes que tenham capacidade de ser parte, que tenham capacidade processual e que tenham capacidade para postular em juízo.

Quanto aos pressupostos de desenvolvimento cingem-se a inexistência de quaisquer nulidades prescritas na legislação em vigor. A aguda observação de Pontes de Miranda que o legislador ao cuidar das nulidades mais se preocupou com as regras jurídicas a elas contrárias, do que com a sua declaração, manifestando, explicitamente, o seu propósito político de salvar o processo.

Prelecionam Ada Pellegrini Grinover e outros que deve ser considerada em geral a distinção entre a nulidade absoluta e relativa; no tocante àquela, a gravidade do ato viciado é flagrante e manifesto prejuízo que sua permanência acarreta para a efetividade do contraditório ou para a justiça da decisão.

A irregularidade atinge o próprio interesse público de escorreita aplicação do direito; e, uma vez percebida, o próprio juiz deve de ofício e decretar-lhe a invalidade.

Já no tocante a nulidade relativa o legislador deixa ao alvedrio da parte prejudicada a faculdade de pedir ou não a invalidação do ato irregularmente praticado, subordinando também ao reconhecimento do vício, a efetiva demonstração do prejuízo sofrido.

Há ainda os pressupostos processuais inerentes ao processo penal atinentes à existência do processo e s/ao: um órgão jurisdicional penal legitimamente constituído (ou seja, juiz que possua jurisdição penal in genere); uma relação concreta de direito penal deduzida como objeto principal do processo, sito é, uma causa penal; a presença de um órgão regular da acusação e a intervenção da defesa.

Imprescindível a efetividade de uma causa penal onde incluídos os ius puniendi do Estado e ius libertatis do acusado ou indiciado. Enquanto que os pressupostos objetivos, em prima facie, em relação aos extrínsecos: a) a existência de causa penal pendente (litispendência), o que é inadmissível em matéria penal; b) ocorrência de coisa julgada de autoridade absoluta formada em processo anterior inteiramente desenvolvido e referente os mesmos fatos;

Os pressupostos intrínsecos são aqueles concernentes à regularidade do iter procedimental observado com exatidão, o due processo of law. Livre de quaisquer nulidades estatuídos no ius positivum em vigor.

Esclarece Hélio Tornaghi que: “Negado o processo pro falta de pressuposto não se nega à ação, que pode ser proposta em outro processo, nem o pedido, que neste pode ser satisfeito”.

O direito de petição segundo a exata definição de Pontes de Miranda consiste no poder de requerer, observar e reclamar contra a autoridade ou denunciar abusos delas, mediante petição, exercitável em face de qualquer um dos Poderes do Estado. È certo que é direito subjetivo material público.

Todavia, se distingue do direito à tutela jurisdicional que apesar de possivelmente terem uma origem comum e siamesa, tal direito, contudo, é incluso na mais importante das declarações de direitos humanos, a saber, a Declaração Universal dos Direitos dos Homens, proclamada pela ONU em 10/12/1948, art. 10.

Também previsto na Convenção Européia para a Salvaguarda dos Direitos dos Homens e das Liberdades Fundamentais de 04.11.1950 e, ainda no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 16.12.1966, art. 14, I; e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos conhecida também como Pacto de San José da Costa Rica de 22.1.1. 1969,art. 8o.

O direito à tutela jurisdicional ou à jurisdição é conferido indistinta e incondicionalmente de forma genérica e abstrata a todos os membros da comunidade, pro força da vedação à lei de exclusão da apreciação pelo Poder Judiciário, de qualquer lesão ou ameaça de direito.

Especifica-se o devido processo penal através das seguintes garantias:a)acesso à justiça penal; b) do juiz natural em matéria penal; c) de tratamento paritário dos sujeitos parciais do processo penal; d) da plenitude de defesa do indiciado, acusado ou condenado, com todos os meios e recursos a ele inerentes desde que legítimos e lícitos; e) publicidade dos atos processuais penais; f) da motivação dos atos decisórios penais; g) da fixação de prazo razoável de duração do processo penal; h) da legalidade da execução penal.

Assim, tais garantias servem para impedir que a pessoa física não seja privada de sua liberdade, ou de outros bens correlatos sem o devido processo penal em que se realize a ação judiciária atrelada aos preceitos constitucionais e as normas penais a fim de tornar efetiva a atuação da Justiça Criminal, sanção penal imposto, como também na afirmação do ius libertatis.

Além dos três postulados basilares quais sejam os atinentes à inadmissibilidade de sujeição de ser humano a persecutio criminis sem que tenha ocorrido a prática de fato típico, antijurídico e culpável e, haja, correlatamente, indícios de autoria (nulla informatio delicti sine crimen et culpa); à jurisdicionalização da sanção penal (nulla poena sine iudicio) e à vedação de realização satisfativa do ius puniendi antes de transitada em julgado sentença condenatória (nulla executio sine titulo).

Antes da imposição de qualquer sanção penal, tem direito a um processo prévio, em regra, antecedido de procedimento investigatório. Estatuído por lei regularmente elaborada e promulgada, e vigente, de um procedimento destinado à investigação, instrução e posterior julgamento acerca de fato tido como penalmente relevante.

Esclareça-se que a publicidade dos atos processuais constitui, em realidade, em garantia do direito de defesa, tanto para o acusado como para o juiz onde deve ostentar sua independência e imparcialidade. E, ainda, a correlação entre a acusação e a sentença de mérito.

O que impede a invocação dos ius novorum no juízo recursal, não havendo possibilidade, por força do regramento da imutatio libelli, de ser ele condenado por fatos não perfeitamente descritos e narrados na proposição acusatória.

A possibilidade de ampla defesa, ou seja, dotada de todos os meios e recursos a esta inerentes, tanto no aspecto material como tecnicamente. Reveste-se a garantia da ampla defesa da conjugação simultânea de três realidades procedimentais: a) o direito à informação; b) a bilateralidade de audiência (contrariedade);c) o direito à prova legitimamente obtida ou produzida ou a comprovação de inculpabilidade.

Ressalte-se que o direito de ser informado de todo teor da acusação conforme aponta Alex Caroca Pérez se constitui num requisito indispensável. O imputado deve ser considerado como parte ou sujeito processual e, ademais, como titular de direitos fundamentais. Daí justifica-se plenamente a intimação editalícia se for preciso do réu revel condenado.

O direito de defesa deve ser constituído por um conjunto de garantias, direitos e faculdades suficientes, para oposição efetiva à pretensão penal. Descreve Vicente Greco Filho que se consideram meios inerentes à ampla defesa, ter conhecimento da imputação; o poder de apresentar alegações contra a acusação; o poder acompanhar prova produzida e fazer contra-prova; ter defesa técnica pro advogado que aliás é essencial À Administração da Justiça ( art.133); e poder recorrer da decisão desfavorável.

Não se confunde a indicada defesa técnica com autodefesa sendo esta atinente aos atos defensivos praticados pelo próprio imputado inclusive com o exercício do direito ao silêncio e de caráter facultativo;

José Barbosa Moreira expressando a dificuldade da exata significação e alcance do princípio do duplo grau de jurisdição, endossado por Nelson Nery Junior argumentando a notória falibilidade humana daí decorrente a necessidade de permitir-se nova apreciação da causa, por órgão situado em nível superior na hierarquia judiciária, mediante a interposição de recurso ou expediente análogo após a primeira decisão.

Desta forma, a garantia do duplo grau de jurisdição serve como ferramenta fundamental da boa justiça. O não-reconhecimento do indiciado, ou acusado senão quando transitada a sentença condenatória. O due processo of law possui importante corolário que é o devido processo penal, e, mais outro, a presunção de inocência do acusado.

No direito moderno o significado de “ser imputado” mostra que as normas processuais não são destinadas a tutelar uma apriorística presunção de inocência, mas a contemplar a complexidade de fins a que tende a instauração e o desenvolvimento do processo especialmente nas relações decorrentes da pessoa e a concreta situação.

Assim consiste na garantia ao imputado de ter o direito ser considerado inocente até que a sentença penal condenatória, dada a preclusão temporal para a interposição recursal, transite formalmente em julgado, dando azo a coisa julgada de autoridade relativa.

A presunção de inocência sendo regra tradicional do common law fora consagrada graças às idéias liberais que impuseram a reforma do sistema repressivo do século XVIII e, se faz presente no art. 9o, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 e, no art. XI da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da ONU em 1948, e, nas cartas magnas dos povos civilizados, assim também como no nosso país no qual se encontra expressa no inciso LVII do art. 5o, in verbis: “ninguém será considerado culpado até o trânsito da sentença condenatória”.

Aliás, também assegurado pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos ou Pacto de São José da Costa Rica a presunção de inocência constitui uma expressivo favor libertatis determinante, como visto, de que, sem a necessária certeza de ser o imputado autor da infração penal cuja prática lhe é atribuída, que somente se concretiza com o trânsito em julgado da sentença condenatória, não há como considera-lo culpado.

Preceitua Canotilho e Vital Moreira além de ser um direito subjetivo é também uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável do réu, quando não tiver certeza sobre os fatos decisivos para a solução da causa, e vem também previsto na Constituição portuguesa, de idêntico senso, é o magistério de Daniele Saint-Laurent.

Essas garantias como da imprescindibilidade da estrita observância do título executivo penal e da assecuração, ao condenado, de todos os direitos não atingidos pelo julgamento, ou pela lei, ou seja, da legalidade da execução penal, no dizer de Railda Saraiva é que asseguram a legitimidade do procedimento, a imparcialidade do julgador e a justiça das decisões.

Em suma, é o que justifica a sociedade fazer justiça com dignidade, e, com a preservação dos elevados interesses sociais e, não meramente a vingança passional. Nem mesmo a bestialidade do crime não pode autorizar a adoção de meios repressivos, que agridem a consciência do país democrático, violando a dignidade da pessoa humana e reduzindo e amesquinhando o valor da liberdade e da igualdade.

Levando o Estado à imoral competição com os criminosos na prática da violência, em atos de desumanidade (cf. Valiante, Il nuovo processo penale: processo per luomo, Milão, 1975, p.45).

A legalidade da execução penal é definida pelos incisos XLV, XLVI, XLVIII, XLIX, e LXXV do art.5o. da CFRB. Tais garantias ainda possuem sucedâneos constitucionais como: a) o princípio da reserva legal; b) a irretroatividade da lei penal, em regra (inciso XL; c) a intocabilidade da coisa julgada penal pelo inciso XXXVI; d) a preservação da vida e da integridade física do indiciado, acusado ou condenado, no caput do art. 5o., e nos incisos III, LXIV e LXV; e) à inviolabilidade do domicílio(inc.XI); f) a guarda e manutenção do respeito ao sigilo da correspondência e de outras formas de comunicação e de informação (inciso XII); g) a não-consideração prévia de culpabilidade (inciso LVII); h) a insubmissão à identificação criminal a não ser em situações excepcionais legalmente determinadas no inciso LVIII; i) a inadmissibilidade de prisão a não ser em flagrante delito ou por ordem escrita e devidamente fundamentada da autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar definidos em lei (inciso LXI); j) à imediata comunicação da prisão (inciso LXII); k) ao direito à não auto-incriminação e ao silêncio, bem como à assistência da família e de advogado no inciso LXIII; l) a liberdade provisória no inciso LXVI.

Todos integrados possuem o mesmo significado, pois completam a grandiosidade da proteção da liberdade de locomoção da pessoa física, e cuja tutela se realiza pelos agentes do Poder Judiciário mediante atuações apropriadas que se efetuam no âmbito da justiça criminal.

A bem da verdade, a enumeração de tais corolários procedida não é exaustiva havendo outros tantos preceitos que não foram considerados como, por exemplo, o inciso LIX do art. 5o, referente Ação Penal de iniciativa privada subsidiária da pública.

O presente artigo mais uma vez percorrendo o viés didático tenta expor os aspectos diferenciadores da jurisdição penal.

Referências

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NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. São Paulo, Editora Saraiva, 2002.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 22a. edição verificada, atualizada e ampliada, São Paulo, Saraiva, 2000.

SMANIO, Gianpaolo Poggio. Processo Penal, 2a. edição, São Paulo, Atlas, 2000 (Série Fundamentos jurídicos).

TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudo sistemático), São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2002.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 10a edição, revisada e atualizada, São Paulo, Saraiva, 2003.

ROMEIRO, Jorge Araújo. Da Ação Penal, 2a edição Rio de Janeiro, Forense, 1978.