Press "Enter" to skip to content

Função do Direito

A vida do homem em sociedade, pela força da convivência, sempre gerou conflitos inevitáveis, pois, com o livre arbítrio, o homem é senhor de si mesmo e age conforme os ditames de sua consciência, que varia de individuo para individuo.

A natureza humana é por si mesma insatisfeita, daí a brusca necessidade de meios que possam satisfazer seus interesses e ambições, muitas vezes desmedidas, fazendo com que esses mesmos interesses entrem em choque com os demais, seus semelhantes, gerando, por fim, conflitos que podem perturbar a ordem social do seu grupo ou da sociedade, que é a reunião destes.

Desde muito cedo, pessoas de senso procuram debelar os males causados pelos constantes atritos ocasionados pela vivência em comum. A princípio esses males eram debelados por meio do apelo “honesto” dos moralistas e sacerdotes aos homens, procurando mostrar-lhes que acima dos bens materiais existia uma força interior que ditava a ordem do justo, e que superava qualquer outra, isto é, qualquer força imposta pela experiência humana no convívio entre os demais.Como os homens se diferenciam entre si, pela própria formação biopsíquica, o apelo à moral começou a não surtir efeito, com o crescente progresso social. Com o progresso, as ambições se multiplicam e, conseqüentemente, os conflitos tomam sentidos diversificados, necessitando, desta forma, de estudos acurados da realidade social a fim de encontrar meios que possam condizer com a necessidade do momento.

Norma social que é “o direito não surge à toa na sociedade, mas sim para satisfazer a imprescindíveis urgências da vida. Ele é fruto de necessidades sociais e existe para satisfazê-las, evitando assim a desorganização social.

Foi dessa necessidade de controle social, surgido tão somente pela experiência do convívio, que o Direito Positivo se fez necessário para impor a “boa ordem” já que a consciência, isto é, a moral ou a religião não estava surtindo efeito. Oportuno lembrar que durante o predomínio do pensamento positivista no campo da filosofia, no fim do século XIX, surge então a Escola Positiva coincidindo com o nascimento dos estudos biológicos e sociológicos.

A Escola Positiva surgiu no contexto de um acelerado desenvolvimento das ciências sociais (Antropologia, Psiquiatria, Psicologia, Sociologia, Estatística, etc). Ao abstrato individualismo da Escola Clássica, a Escola Positiva opôs a necessidade de defender mais enfaticamente o corpo social, priorizando os interesses sociais em relação aos individuais.

No entanto, logo se constatou que essa metodologia era inaplicável em algo tão circunstancial como a norma jurídica. Essa constatação levou os positivistas a concluírem que a atividade jurídica não era científica.

A priori, o Direito surgiu como Direito Natural emanado de um ser transcendental, com pensamentos político e jurídicos vindo do Ocidente, tendo por máxima: “QUOD TIBI FIERI (NON) VIS, ALTERI (NE) FECERIS”.

“Desde que o homem reflete sobre suas relações recíprocas, desde que a sociedade como tal se fez problema – e este problema é mais velho que qualquer outro objeto de conhecimento, inclusive o chamado de Natureza – não cessou de preocupar a questão de um ordenamento justo das relações humanas”, escreve Kelsen.

Os primeiros a discutirem o problema foram os gregos que, pelas peculiaridades históricas que envolveram sua formação como um povo de mercadores, habituado pelo comércio ao contato variado com os mais estranhos usos e instituições dos povos mais diversos, viram-se compelidos a meditar sobre esse objeto, procurando solucionar a difícil questão do justo, especulando se o direito e a justiça eram meros produtos da utilidade e da convenção ou se alguma base desconhecida existia, imorredoura e imutável, sob a aparência desnorteante da mais excessiva mutabilidade das leis e dos costumes que de alguma forma revelasse “este terrível segredo da Justiça”.Dentre os primeiros filósofos gregos, é em Heráclito que se pode, por vez primeira, encontrar uma concepção da lei natural.

Em oposição à sua filosofia do eterno fluir, encontra-se no filósofo de Éfeso a doutrina de um direito imutável, conforme a lei natural e o logos universal, onde a legislação humana tiraria a sua força e o seu prestígio.

Velho aristrocata e conservador, a sua concepção do Direito Natural iria desembocar numa atitude contra-revolucionária e na justificação de um despotismo aristocrático – o governo racional do mais sábio, pois:

“… um só vale dez mil se é o melhor”

Porém, os tempos mudam e as idéias revestidas de roupagens novas, servindo a objetivos os mais antagônicos, por vezes, permanecem desafiando bravamente a capacidade criadora da inteligência humana.

Assim aconteceu com o Direito Natural; idéia antiqüíssima, cujos primórdios dificílimos, senão impossíveis, seria pesquisar no amontoado das lendas, tradições e costumes de povos, cuja história nos separam séculos e milênios…

Quando tudo parecia indicar ao ingênuo otimismo cientificista da centúria que nos procedeu, que historicismo e o positivismo jurídico já lhe haviam executado a sentença de morte, eis que, como expressão parcial do ressurgimento da metafísica neste século, movimento de idéias cujas raízes se vão originar antes do findar do “oitocentos”, renasce de suas cinzas, aparentemente apagadas, a idéia milenar do Direito Natural, inspirada agora, não mais numa uniforme visão do mundo, de que carecemos inteiramente em nossa época – que por isso mesmo já se convencionou chamar de crise – , mas sim nos múltiplos postulados das mais variadas filosofias.

Já Stammler “em suas numerosas obras” insistia continuamente em que, além de investigar o Direito Positivo, era necessário fazer a teoria do Direito Justo. Porém assinalou que o conteúdo substantivo do Direito não pode ser determinado de uma vez para todas, mediante uma prova universalmente válida, porque a sociedade está mudando constantemente e o Direito Positivo tem que se adaptar sempre às condições particulares de lugar e tempo. Imaginou Stammler a difícil acrobacia intelectual de um direito natural de conteúdo variável, procurando dessa maneira, uma cômoda síntese da antiqüíssima polêmica entre jusnaturalismo e historicismo.

O Direito atual deveria alcançar grande perfeição baseado unicamente na humanização. Cada preceito jurídico obedece aos fatos sociais da época que variam de civilização a civilização. Cada sociedade tem sua história baseada no tempo de vivência do homem, desde as mais rústicas até as mais requintadas. Onde existir o humano, em qualquer época, em qualquer sociedade, encontram-se fatores negativos presentes, que só com o polimento do espírito será possível seu extermínio. É , pois, firmado nos fatos sociais, encontrados em toda e qualquer sociedade, em qualquer tempo da história da humanidade que o Direito organiza suas normas.

A justiça é, por conseguinte, firmada na própria natureza do homem, porque esta palavra indica (jus-unir). Isto quer dizer que a idéia de justiça já nasce com o homem pela necessidade deste unir-se aos demais, seus semelhantes, com a finalidade de maior rendimento necessário à sua sobrevivência. O justo baseado na união sadia dos indivíduos, pode alcançar o objetivo do Direito. É este o ideal do Direito: conduzir os homens de modo que esses possam encontrar a Justiça na sua própria consciência, ainda que demore um pouco, até que o homem refine seu espírito com a prática de boas ações. Para que se chegue neste momento, é necessário que o humano pare de rastejar sobre o manto da ignorância, condizente ao seu cérebro em evolução.O Direito para Chamoun é um fenômeno de consciência ou de valorização subjetiva; é um bem comum.8

Para Miguel Reale a ciência do Direito “é uma ciência de realidade e não física, nem psíquica, mas cultural. O Direito com toda ciência positiva, implica uma atitude realista, enquanto analisa fatos do comportamento humano e até mesmo enquanto estuda normas que são apreciadas pela Dogmática Jurídica como um já dado, algo (im) posto à interpretação do jurista como tal. A concepção do Direito como experiência histórico- cultural abre perspectivas reservadoras para a Ciência Jurídica, inclusive porque nos dá consciência de que o Direito não é um presente, uma dádiva, algo gracioso que o homem tenha recebido em determinado momento da história, mas ao contrário, o fruto maduro de sua experiência multimilenar”.

Del Vecchio diz: “o Direito é estudado como fenômeno ou fato social, sendo, portanto, impossível alcançar-se um conceito universal de Direito”. Ele afirma ainda que o Direito “é a parte objetiva da Ética”.

Hans Kelsen, na sua “Teoria Pura” concebe o Direito “como um sistema escalonado e gradativo de normas, ou proposições normativas que se apóiam uma nas outras formando um todo coerente, recebem uma das outras a sua vigência, e todas de uma norma fundamental, suporte lógico da integralidade do sistema. As normas jurídicas não são comandos ou imperativos no sentido psicológico do termo, como se atrás de cada preceito houvesse alguém a dar ordens, mas sim enunciados lógicos que se situam no plano do dever ser”.

Para Hobbes, Rosseau e Locke o Direito é convencional, isto é, resultante de um acordo. Hobbes achava que o homem era mau por natureza, algo inerente: “HOMO HOMINIS LUPUS EST”.Com Thomasius o mundo moral separa-se do jurídico pelo critério da exterioridade. Quando no Direito surge a interferência da força, esta não afeta a natureza mesma do Direito. Para ele o Direito apresenta-se como algo coercível, isto é, que para ser obedecido, às vezes é necessário o emprego da força física.Jhering, seu continuador, afirmou que conceber um Direito destituído de coação seria o mesmo que pensar em fogo que não ilumina, em chama que não aquece.

Aristóteles, Platão, Kant, Spinosa, Leibiniz, Hegel, Duguit, para não citar outros tantos que foram estudiosos do Direito e procuraram dar sua contribuição na explicação do fenômeno jurídico. Foi César Beccaria, no entanto, quem deu sua contribuição humanística, sendo radicalmente contra o Estado Déspota (despotismo). A justiça provinda deste último, não pode nem deve receber o nome de justiça, e infeliz do que cair nas mãos fétidas dessa gente, porque tem um espírito polido pelo sentimento humanístico, sua consciência é qual jardim, cujas flores exalam seus perfumes através da tolerância, prudência e discernimento. CONSIDERAÇÕES FINAIS A necessidade de justificar a brusca mudança social que implica a transformação revolucionária, determina por si só, a necessidade de uma justificação moral.

Uma posição historicista não poderia servir a tal propósito. Com efeito a relativização dos “valores absolutos” que o historicismo representa, ao dissolver tais valores na história, reduzindo-os a fatos humanos e , conseqüentemente, mutáveis – o que aliás vem, de alguma forma, colocar em perigo o próprio valor do historicismo – não poderia servir ao intento revolucionário de justificar tão violenta transformação como uma forma de definitiva instauração da justiça na sociedade dos homens.

Infelizmente, em época de esclerose do Direito Positivo, quando este não é mais a ordem “reconhecida” da justiça, mas um instrumento do qual se serve a classe dirigente para estabelecer sua dominação social e política – a qual não pode mais se legitimar diante do bem comum – os grupos revolucionários e reformistas se vêem, então, obrigados, se não querem nem podem atribuir o bem velho direito, a recorrer ao Direito Natural.Porém, neste momento, o Direito Natural aparece muitas vezes misturado com impurezas, engajado de uma maneira quase insolúvel nas reivindicações jurídicas, às vezes não muito bem fundadas e onde a paixão intervém mais que a razão. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BACCA , Juan David García .Invitación a Filosofar, vol.1, La Casa de España en México ,”Prólogo”, 1940. BECCARIA. Cesare de. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Revista dos Tribunais,1999. BITENCOURT,Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. São Paulo: Saraiva,2003. ENTERRIA. Eduardo Garcia de. Reflexiones sobre la ley e los princípios gerales Del Derecho , Madri: Cuadernos Civitas, 1984. GALVAN, Manuel Grosso. Nueva Criminologia y dogmática jurídico penal, CPC 10, 1980. JHERING. Rudolf Von. O Espírito do Direito Romano Várias edições e traduções. KAUFMANN, Armin. Teoria da Norma Jurídica. Rio de Janeiro: Rio, 1984.KELSEN Hans.Teoria Pura do Direito, São Paulo: Saraiva, 1996._____________ La idea del Derecho Natural y otros ensayos Buenos Aires: Losada, 1946. NETO, A.L. Machado, Sociologia Jurídica. São Paulo, Saraiva, 2000. PEGORARO, A Olinto Ética é Justiça. Petrópolis: Vozes, 1995. PRADO, Lídia Reis Almeida “Alguns aspectos sobre a lógica do razoável na interpretação do Direito” in “Direito, Cidadania e Justiça, ed RT, 1995. REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito , São Paulo: Saraiva, 1976._____________ Filosofia de Direito,São Paulo, Saraiva, 2000. VECCHIO. Giorgio Del. Lezioni di Filosofia del Diritto, Milão: Guiffré, 1948.Trad. do italiano por Maria Cândido Reis. São Paulo: Nova Cultural, 1990.