O novo Código Civil, em vigor a partir do dia 11 de janeiro deste ano, estabeleceu um conjunto de regras especiais para as sociedades, associações e fundações.
Não há dúvida que todas as empresas que se constituiram ou se constituírem a partir daquela data estão sujeitas às regras da nova lei.
No que se refere às empresas já existentes, nem todas as regras se aplicarão. Quanto à obrigatoriedade da mudança dos contratos sociais, para incorporar as novas exigências, o artigo 2031 é claro: as associações, sociedades e fundações, constuídas na forma das leis anteriores (Código civil, Código comercial e Lei das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada) estão obrigadas a fazer as adaptações no prazo de um ano a partir do início da vigência, ou seja, até 11 de janeiro de 2004.
Cuidadosamente, o mesmo artigo afirma que “igual prazo é concedido aos empresários”. Explica-se o adendo: a denominação “firma individual” deixou de existir, passando a se designar a empresa unipessoal simplesmente “empresário”.
Eventual dúvida poderá surgir com relação ao disposto no artigo 2.033: “salvo disposto em lei especial, as modificações dos atos constitutivos das pessoas jurídicas referidas no artigo 44 (associações, sociedades e fundações), bem como a sua transformação, incorporação, cisão ou fusão, regem-se desde logo por este Código.”
Há quem entenda que, por causa deste dispositivo, as pessoas jurídicas ficam automaticamente subordinadas à nova lei e, portanto, não é preciso tomar qualquer iniciativa para adequação.
Entendemos que não é verdade. Existem várias exigências novas a reger, principalmente, as sociedades, que impedem a alteração automática. Muitos atos obrigatórios dependem da manifestação da vontade dos sócios e a única conseqüência automática que realmente existe é de que todas as empresas que não definirem claramente os limites da responsabilidade, a forma das suas deliberações e não cumprirem os outros requisitos exigidos pelo Código (que, aliás, as Juntas Comerciais e Cartórios de Registro Civil já estão preparados para fiscalizar e registrar), será a de serem tratadas – neste caso, sim, automaticamente – como sociedades simples. Ou seja: todos os sócios respondem integralmente, com o seu patrimônio pessoal, por todas as obrigações assumidas pela sociedade. Exatamente como ocorria no legislação anterior com as “sociedades irregulares” ou “sociedades de fato”.
Por exemplo: nas sociedades entre marido e mulher, o Código não mais a admite quando se trata de casal sob o regime de comunhão universal de bens ou separação obrigatória de bens. Logo, somente através do contrato social será possível (porque a lei anterior não exigia que constasse expressamente) aferir se o regime de bens dos contratantes é um dos que a lei permite ou é um dos proibidos. Os órgãos registrários são obrigados a exigir – e efetivamente exigem – a alusão expressa ao regime de bens.
Isto porque os regimes “proibidos” simplesmente impedirão o registro. Assim, mesmo aqueles que estavam no regime “permitido” são obrigados a declará-lo, a não ser que, coincidentemente, já o tenham feito antes. Não é admissível que se presuma, no silêncio dos interessados, nem que o regime seja o “permitido” nem que seja o “proibido”.
O artigo 2034 não desmente o que acabamos de afirmar. Pelo contrário, o reitera. Ao asseverar que “a dissolução e a liquidação das pessoas jurídicas referidas no artigo antecedente, quando iniciadas antes da vigência deste Código, obedecerão ao disposto nas leis anteriores”, simplesmente afirma que os processos de dissolução ou liquidação (inclusive falência e concordata) estão sujeitos às leis anteriores (o que se justifica por boa técnica processual, sob pena de processos que já tramitaram vários anos voltarem à estaca zero) significa, a contrário senso, que todos os novos processos dessa natureza estão sujeitos às regras novas. Por último, o artigo 2035 mostra o tratamento a ser dado aos negócios em curso, que se iniciaram sob a legislação velha e produzirão seus efeitos debaixo da nova: “os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução.”
Não há dúvida que esta fusão (confusão) entre direito civil e direito empresarial em um diploma legal único, raríssimo no mundo, teve o objetivo de preservar tão somente os interesses dos credores. Nesse ponto o legislador foi cuidadoso. A adaptação não é opcional e exige ato material e concreto dos empresários, até mesmo para preservar os poucos direitos que lhe restaram. O castigo dos omissos, repetimos, é serem tratadas as suas sociedades como “sociedades simples”, de responsabilidade ilimitada.