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Terceira Seção do STJ rediscute eficácia técnica da Súmula sobre uso de arma de brinquedo

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça está prestes a revogar a Súmula 174, que prevê o aumento da pena nos crimes de roubo cometidos mediante intimidação com arma de brinquedo. Na sessão desta tarde (26), os ministros iniciaram a votação sobre a questão, que foi suspensa por um pedido de vista do ministro Fontes de Alencar, último a votar após seis votos pela revogação contra um pela manutenção da Súmula. O único voto divergente partiu do ministro Edson Vidigal.

Os seis ministros que votaram pela revogação da Súmula – José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer, Gilson Dipp, Hamilton Carvalhido, Jorge Scartezzini e Paulo Gallotti – esclareceram que a decisão tem caráter técnico e impedirá que a pena seja aplicada duas vezes para o mesmo fato. O Código Penal (art.157) prevê pena de reclusão de quatro a dez anos e multa para o crime de roubo mediante grave ameaça ou violência. O mesmo artigo prevê aumento de um terço até a metade da pena se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma. Para a maioria dos ministros, o uso da arma de brinquedo insere-se na primeira parte (caput) do artigo. A aplicação da majoração só se justifica quando a arma tem real potencial ofensivo.

O efeito prático da revogação da Súmula 174 será evitar que o aumento da pena seja aplicado com base no Código Penal, entretanto não impedirá que sejam aplicadas as punições previstas na Lei 9.437/97, que estabeleceu o porte de arma de brinquedo como um crime autônomo. Um ano após a edição da Súmula 174 (de 23/10/1996), o Congresso Nacional aprovou esta lei, punindo expressamente a utilização da arma de brinquedo ou simulacro de arma capaz de atemorizar alguém, quando destinadas ao cometimento de crimes.

A discussão sobre a revogação da Súmula 174 do STJ teve início com o julgamento de recurso do Ministério Público de São Paulo contra Acórdão do Tribunal de Alçada Criminal do Estado, que excluiu da condenação imposta a Samuel da Cunha Souza a causa especial de aumento de pena pelo porte de arma de brinquedo. Samuel foi condenado a dois anos e oito meses de reclusão depois de ter invadido um caixa eletrônico e obrigado um casal a sacar todo o dinheiro de sua conta-corrente. Para efetuar o crime, Samuel utilizou uma arma de brinquedo.

Relator original do recurso, o ministro José Arnaldo da Fonseca votou pelo seu desprovimento, mantendo a decisão da justiça paulista, o que ensejou a abertura do debate. Por sugestão do ministro Edson Vidigal, a questão foi levada à Terceira Seção, que reúne a Quinta e Sexta Turmas do STJ, especializadas em Direito Penal.

“A revogação da Súmula 174 não significa que estamos liberando o uso de armas de brinquedo, até porque existe lei específica punindo tal conduta”, advertiu o ministro Felix Fischer. A advertência foi reforçada pelo ministro Gilson Dipp, que afirmou que o STJ não estará dando um salvo-conduto para o uso deste tipo de arma. “Não estamos dizendo que portar armar de brinquedo é legal”, ressaltou Dipp.

Para o ministro Hamilton Carvalhido, a causa do aumento do emprego de arma no crime de roubo tem ligação direta com a integridade física do indivíduo, por isso remete ao uso de armas verdadeiras. “A tipificação autônoma do crime de porte de arma de brinquedo por si só serve de argumento para revogarmos a Súmula”, afirmou Carvalhido. O ministro Jorge Scartezzini afirmou “quando o legislador quis distinguir arma e arma de brinquedo, ele editou a lei (Lei 9.437/97)”.

O ministro Paulo Gallotti esclareceu que este é um julgamento técnico. “Os votos proferidos até agora deixam claro que o roubo continua sendo um crime com a mesma gravidade, mas não se justifica que ele tenha a pena aumentada pelo emprego de arma de brinquedo. Quando o Código Penal refere-se a emprego de arma significa que esta arma tenha potencial ofensivo”, explicou Gallotti.

Único até agora a votar pela manutenção da Súmula 174, o ministro Edson Vidigal afirmou ser irrelevante o fato de a arma ser verdadeira ou não. “Para a configuração da qualificadora basta que a grave ameaça tenha sido exercida mediante o emprego da arma, não sendo necessária a ocorrência de dano à integridade física da vítima. Daí ser irrelevante o fato do instrumento ser efetivamente eficaz para causar o dano ou não. Não há hoje nenhuma diferença visual entre muitos revólveres de verdade e muitos revólveres de brinquedo”, afirmou. Para sustentar sua posição, o ministro Vidigal levou à sessão três armas de brinquedo e desafiou os colegas a distingui-las das verdadeiras.