É possível revogar uma escritura de adoção simples, ainda que o adotado seja menor de idade? A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, entendeu que em determinadas situações a revogação pode ser concedida sim. Foi o caso da ação movida por E.L. e sua mulher M.Z.S.L., que recorreram ao STJ para anular a adoção de K.O., hoje com doze anos.
Em 1998, M.Z.S.L. deu à luz a K.O. Mas como era mãe solteira, alegou ter sido constrangida pela própria família a consentir que seu filho fosse adotado por uma irmã que já era casada. A tia adotou a criança e, juntamente com seu marido criou o menino por quase dois anos. Mas o pai adotivo acabou falecendo, comprometendo a vida financeira da viúva que, em 1991, concordou em devolver o garoto para a companhia da mãe biológica, que neste período de tempo também havia se casado.
M.Z.S.L. e seu marido entraram, então, com um pedido de anulação da escritura de adoção de K. no Tribunal de Justiça de São Paulo. Contudo, o TJ/SP negou provimento ao recurso, alegando que à época da adoção, a mãe biológica era absolutamente capaz e não teria comprovado qualquer tipo de coação psicológica para entregar o filho à irmã. “Pretende-se nulidade de ato de adoção, sob o fundamento de coação psicológica, que há de ser efetivamente provada, porque a adoção é irrevogável, enquanto o adotado não atingir capacidade plena”, concluiu o Acórdão da Sexta Câmara Civil daquele tribunal.
O casal apelou ao STJ afirmando que a decisão do TJ/SP teria violado o artigo 374 do Código Civil que estabelece: “Também se dissolve o vínculo da adoção quando as duas partes convierem”. E como ambas as mães, a adotiva e a biológica pretendiam revogar o ato de adoção, não haveria motivos para mantê-la. Além disso, a criança estaria “constrangida” por não ter o mesmo sobrenome que seus pais atuais. “A insensibilidade a esse aspecto humano e social da questão demonstrada pelos julgadores (do TJ/SP) não haverá de afetar a Vossas Excelências (os ministros do STJ) que, do exame minucioso dos autos, decidam o que for melhor, não para atender à letra fria de uma lei irracional, mas para atender o interesse do menor K., cujo direito ao bem-estar e de viver com sua mãe de sangue e assinar o sobrenome desta e daquele que conhece como pai, deve pairar acima das convenções humanas”, enfatizou a defesa do casal.
O ministro Ruy Rosado de Aguiar, relator do processo, explicou que a adoção simples já era revogável antes mesmo da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Mas também ressaltou que, em caso de menor adotado, impossibilitado de se manifestar por questões legais, o correto seria aguardar o alcance da maioridade, “para que então pudesse ele promover o seu desligamento do laço adotivo, nos termos do art. 373 do Código Civil”.
Entretanto, o ministro entendeu que a causa em julgamento apresentava uma “série de peculiaridades a justificar, desde logo, que seja desfeito o vínculo decorrente da escritura de adoção”. A manifestação de concordância de ambas as mães seria uma destas particularidades, bem como o longo tempo (10 anos) em que a criança se encontra na companhia do casal, “suficiente para consolidar os laços de afeto que decorrem da maternidade e justificam seja restabelecida a filiação de sangue”, salientou Ruy Rosado. Desse modo, a dissolução da adoção foi concedida com base no art. 374 do Código Civil, voltando o menor a assinar o nome da mãe biológica.”