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Agricultor que deve ao Banco do Brasil duas toneladas de mandioca não pode ser preso

Não cabe ação de depósito com pedido de prisão do devedor quando o bem dado em garantia é “fungível e consumível”, ou seja, não tem durabilidade, é perecível. A orientação unânime é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça ao conceder o recurso em habeas-corpus de Pedro Maróstica contra ato do juiz da 1ª Vara de Paraguaçú Paulista/SP, que decretou a prisão civil do agricultor que deve ao Banco do Brasil mais de duas toneladas de mandioca.

Em 1996, Maróstica obteve crédito junto ao Banco do Brasil para custear sua lavoura de mandioca. Como forma de garantir o pagamento do empréstimo, penhorou a própria colheita (2.640 mil quilos do produto, cerca de R$ 68.360,00), além de um imóvel rural em hipoteca. Um ano depois, a execução contra o agricultor foi ajuizada. O Banco do Brasil requereu do credor a penhora dos bens dados em garantia e três anos mais tarde, em julho de 2000, o juiz de primeiro grau determinou que Maróstica apresentasse a safra ou seu equivalente em dinheiro, sob pena de ser preso por não pagar a dívida junto à instituição financeira.

Como Maróstica não tinha mais em seu poder a safra colhida, entrou com um pedido de habeas-corpus junto ao Tribunal de Alçada (TA) do Estado de São Paulo. O TA não concedeu a liminar em favor do devedor, argumentando que a solução para a dívida estaria no depósito do equivalente da colheita de mandioca em dinheiro. Inconformado, o agricultor apelou ao STJ alegando não ser possível a prisão civil “em caso de penhora resultante de penhor rural de safra futura, quer em ação de depósito, que em execução de título extrajudicial”.

O agricultor também afirma que “nunca soube ser depositário da mandioca”, pois o acerto não estaria subscrito no termo de empréstimo. “Sendo a mandioca perecível e do período agrícola abril/95-agosto/96, poderia existir os exatos 2.640 mil quilos por ocasião da penhora efetuado no final do mês de julho de 1997?”, questionou a defesa de Maróstica.

De acordo com o ministro Cesar Asfor Rocha, relator do processo, o depósito de coisas “fungíveis e consumíveis é mero garantidor de mútuo celebrado”, não merecendo, portanto, “a proteção austera decorrente da ameaça de prisão que incide sobre o depositário”. Desse modo, a ação de depósito movida contra o agricultor seria imprópria, pois não se pode aceitar a presunção de que um ano após a colheita fosse possível cobrar a exata quantidade de mandioca que serviu de estimativa no “penhor cedular”. Cálculo que, no caso, acabou não correspondendo à realidade física do momento em que ocorreu a penhora. “Sabido que a prisão civil do depositário infiel não é pena ou sanção, é forma de coagir o devedor solvente ao cumprimento de sua obrigação, carece a prisão de justa causa se o devedor, ao tempo da lavratura do auto de penhora, não possuía o bem objeto desta”, concluiu o relator.