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Provas ilegais levam STJ a anular processo contra acusadas de matar síndica

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça anulou o processo contra a técnica em administração Marli José da Silva Barbosa e a aeroviária Rosane Lage Ligero, suspeitas de serem mandantes do assassinato da síndica do prédio onde moravam, em Jaboatão dos Guararapes (PE), por não haver indício suficiente de participação no crime. As indicações são de que as provas foram obtidas pela polícia sob tortura e outros meios ilegais. A defesa das rés sustentou que todo o processo, que as levaria a julgamento por um tribunal de júri popular, configurava erro judiciário.

De acordo com denúncias à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Pernambuco, policiais chefiados pelo delegado Evaristo Ferreira Neto submeteram Marli e Rosane à tortura, coação e humilhação para que confessassem o crime. O Ministério Público Federal (MFP) rejeitou, em seu parecer, o pedido de absolvição das rés, mas reconheceu que “arbitrariedades e falhas na investigação policial” contaminaram irremediavelmente a instrução do processo. O MPF conclui pela anulação do processo e a realização de nova investigação policial.

Segundo as duas principais testemunhas – o porteiro do prédio e uma ex-empregada doméstica das acusadas – Marli e Rosane pagaram R$ 2 mil a um ex-policial e a um motorista de táxi para matar a síndica Joseth Pessoa de Siqueira. A motivação do crime seria um comentário feito pela vítima à Marli de que sua companheira, Rosane, estaria mantendo relacionamento amoroso com outra pessoa, o que teria “provocado a animosidade” das acusadas. O corpo de Joseth Pessoa Siqueira, morta por asfixia, foi encontrado em um terreno baldio um dia após seu desaparecimento.

Os depoimentos das duas testemunhas e uma fita gravada na delegacia, que supostamente registra as vozes de Rosane e Marli, são as principais provas de acusação. A perícia transcreveu o conteúdo da fita, mas não identificou as vozes. “Tal gravação se deu ao arrepio dos direitos fundamentais”, afirmou a sub-procuradora-geral da República Ela Wieck de Castilho, que emitiu parecer no recurso ajuizado pelas acusadas no STJ.

A defesa das rés denuncia as arbitrariedades policiais e sustenta que não foram realizadas investigações suficientes, inclusive sobre outros possíveis suspeitos, como o namorado da síndica, que teria sido a última pessoa que esteve com ela na noite de seu desaparecimento. A defesa das rés relata ainda que a vítima mantinha atritos com vários moradores do prédio, sendo que o fato “não mereceu a devida atenção da autoridade policial”. Como advogada, a síndica trabalhava em uma causa, “cuja complexidade e perigo dali decorrente alardeara a todos” e estaria sofrendo ameaças, o que também não foi apurado, segundo os advogados das rés.

A subprocuradora-geral da República concluiu que “paira sobre este caso uma forte suspeita de que tenha sido cometido abuso de autoridade, além das nulidades e irregularidades já expostas”. “Não é de desprezar a possibilidade de que o fato das recorrentes (Marli e Rosane) serem homossexuais, uma delas negra, tenha influído na condução da investigação”, reforçou. “Este caso me levou a uma profunda reflexão”, disse o ministro Vicente Leal, ao iniciar a leitura de seu voto durante o julgamento. Após destacar vários trechos do parecer do MPF, o relator vota pela improcedência das acusações contra as rés.

&Processo: Resp 246577