O entendimento de que o autor de uma ação de reparação por danos morais não é obrigado a estipular o valor do pedido de indenização levou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça a rejeitar recurso de um laboratório de análises clínicas de São Paulo (SP), que está sendo processado por um resultado falso-positivo do vírus HIV. Em outubro de 1994, a secretária M.G.B.O, então grávida, realizou uma série de exames de rotina no laboratório B.M.A.C., a pedido de seu obstetra, entre eles o de Reação Sorológica de Triagem por Método Imuno-enzimático (Elisa), que identifica o vírus da Aids.
O primeiro teste Elisa foi positivo, o mesmo acontecendo com o segundo, realizado para confirmar o resultado inicial. Segundo o laboratório, seria necessária uma nova coleta de material biológico para a repetição do exame, dessa vez, porém, mais específico, com a utilização de testes como o de Western Blot. O Elisa é considerado um teste de triagem, um dos métodos mais sensíveis para detectar o vírus, o que acarreta, em contrapartida, a probabilidade de resultados falso-positivos.
Ao ser informado sobre o teste positivo, o obstetra R.D.B pediu que os resultados fossem entregues à sua paciente em envelope lacrado e endereçado a ele. M.G.B.O. conta que foi comunicada por seu médico sobre a contaminação pelo HIV. Ele solicitou novo teste por um novo laboratório, que deu negativo. Um outro exame, para tranquilizar a paciente, realizado no Hospital Sírio-Libanês, descartou a presença do vírus.
Na ação de reparação por danos morais ajuizada na 15ª Vara Cível de São Paulo, M.G.B.O. pede que a ré seja condenada a pagar indenização arbitrada pelo “prudente arbítrio” do juiz, de acordo com a repercussão e intensidade dos fatos, levando em consideração a posição econômica das partes, com correção monetária. Antes mesmo do julgamento do mérito da ação, o laboratório contestou a ação (preliminar de inépcia da inicial) com o argumento de que M.G.B.O. havia formulado pedido genérico, o que seria contrário à regra geral estabelecida no Código Civil, segundo o qual o pedido de indenização deve ser certo e determinado.
Ao rejeitar o pedido de extinção do processo, o juiz Galdino Toledo Júnior concluiu que a lei civil, quando exige a formulação de pedido certo, não se refere a seu exato valor, mas obriga o autor da ação a determinar de forma clara sua pretensão. No caso, o juiz entendeu que a petição inicial “explicitou de maneira expressa a intenção da autora (M.G.B.O) de obter indenização por dano moral, preenchendo assim os requisitos legais”.
A apelação (agravo de instrumento) do laboratório foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça sob o fundamento de que na fixação da indenização por danos morais vários fatores devem ser considerados, dentre eles, a situação econômica do causador ou responsável, o que pode impossibilitar a fixação do valor da indenização. Assim, o valor pode ser arbitrado em sentença e pode até mesmo ser apurado em fase de liquidação.
Em seu voto, o relator do recurso ajuizado no STJ, ministro Ari Pargendler, cita que julgamento anterior da Terceira Turma confirma essa decisão. Nesse processo, o relator, ministro Eduardo Ribeiro, hoje aposentado, diz que “sendo a quantificação do valor da indenização algo que se sujeita a forte dose de subjetivismo”, é razoável admitir-se que não seja exigida de quem ajuiza ação por danos morais.