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A motivação das decisões penais como corolário garantista

Evolução histórica:nas sociedades antigas e na sociedade moderna

Fazendo uma análise rápida sobre o dever de motivar nas sociedades antigas chegar-se à conclusão que esse dever somente se estabelece como primeira referência no direito canônico. Antes deste, como por exemplo, na sociedade romana, muitas divergências existem até hoje entre os historiadores se realmente o dever de motivar dos juízes nas sentenças existia como ponto decisório.

Já nos povos bárbaros, na aplicação do direito germânico, como expõe Gomes filho ,é estranho pensar na idéia da existência do dever de motivar pelos juízes uma vez que as decisões eram baseadas em forças sobrenaturais, e o magistrado somente tinha a função de iniciar os meios probatórios que naquela época eram basicamente duelos, ordálias e juramentos, ficando a prova sobre influência divina. Ou seja, se atribui a irracionalidade ao meio probatório que era essencialmente sem explicações concretas e sem vínculo com a reflexão humana.

Então vai ser a partir do direito canônico que se começa a notar uma nova mentalidade sobre o papel do juiz e o seu convencimento nessa função desempenhada por ele. Passa assim a ter a obrigatoriedade de transcrever a sentença, apesar de naquela época o dever de motivar ter uma função diferente da atual, pois servia como meio de informar a um excomungado as razões da sua pena que fora aplicada pelo juiz.

No absolutismo, devido à política adotada na época, em que o rei era a representação do poder legislativo, a motivação entrou em declínio para proteger interesses da própria monarquia .

Essa incipiente prática de fundamentar as decisões não prosperou, sendo praticamente certo que, a partir do século XIV, a referência aos motivos deixa a ser encontrada nos registros das cortes de justiça A razão disso foi claramente política: com a paulatina afirmação do poder absoluto dos monarcas, a justiça real passou a impor – se sobre as justiças senhoriais.

Com base na ideologia iluminista, alguns dos estados de despotismo esclarecido, se aproximaram da idéia do poder de motivar tido na atualidade. Como demonstra Gomes Filho , “tanto nos processos escritos como nos orais ,o relator (referent) devia redigir uma proposta de decisão, na qual vinham expostas as questões de fato e de direito, bem como o relatório da tramitação processual e dos resultados da atividade probatória”.

Sobre essa mesma influência iluminista vão os franceses a partir da sua legislação revolucionária, como estabelece Gomes Filho (2001), definir uma maior delimitação da obrigação de motivar por possuírem no seu pensamento um posicionamento mais radical a respeito do Estado, do direito e da administração da justiça.

Mas, como ostenta Gomes Filho , “tais previsões , no entanto, tiveram efêmera duração , pois nas constituições dos Estados criados por Napoleão no início do século XIX já não se consagrava a motivação como princípio geral da administração da justiça”.

A constituição espanhola de 1978 estabelece o seu artigo 120 o direito a motivação que deve abranger todas as resoluções judiciais, não se limitando apenas a sentença e tem como finalidade evitar a arbitrariedade da decisão.

Observando o que pressupõe a Constituição Portuguesa de 1976 com a reforma tida em 1982, torna expressa a motivação da decisão pelo juiz no que tange o art. 210 deste texto legal.Só é causa de nulidade quando falta a motivação total.Exige-se ao menos uma fundamentação precisa.

No ordenamento de Commom law, destaca –se, como coloca em sua obra Gomes filho , “Quanto a esse tema, a primeira e mais genérica constatação é que nesses ordenamentos não só não existem prescrições escritas exigindo a motivação, mas ,ao contrário, a regra em geral admitida é justamente no sentido de sua não obrigatoriedade”.

Já a motivação no ordenamento brasileiro necessita de um maior destaque que será o objeto do ponto seguinte desse trabalho.

A motivação das decisões no ordenamento brasileiro

No Código de Processo Penal e na Constituição Federal de 1988

Chegando à nossa realidade, pela análise da Carta Magna do Brasil, podemos verificar que, como apresentar Gomes Filho , “Até a Constituição de 1988, o ordenamento brasileiro previa a exigência de motivação apenas no âmbito da legislação ordinária, especialmente pelas prescrições dos art. 381, III, do Código de processo Penal, e 458, II, do Código de processo Civil”.

Hoje, a Constituição Federal , no seu artigo 93, IX, assim determina que “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes”.

É perceptível também que com essa nova redação dada pela Carta Magna em vigor, nos remete a analisar dois novos aspectos extraídos esse artigo citado acima. Como bem chama a atenção o fato, Gomes Filho , primeiramente exponha que esse artigo trouxe uma maior extensão ao dever judicial de motivar, pois o artigo se refere as todas as decisões, ou seja, faz referência a todo e qualquer pronunciamento jurisdicional que contenha uma carga decisória.

O segundo aspecto a ser observado pela mudança trazida pela Constituição Federal de 1988 no artigo citado é prever a nulidade nos casos de falta de fundamentação, conforme o autor supramencionado.

Na mesma linha de raciocínio, Ronaldo Madeira , articular que:

A exigência constitucional inserida no art. 93, IX, de que todos os julgamentos dos órgãos do poder Judiciário serão fundamentados sob pena de nulidade, impede que uma sentença possa nascer de um subjetivismo puro, sem referenciais que poderiam ser interpretados como capricho pessoal e arbítrio. Assim, o juiz deve preservar as prerrogativas constitucionais no momento da aplicação do direito ao fato. A jurisdição tem compromisso com o direito, com o processo penal, mas acima de tudo com as prerrogativas da nossa lei Maior.

Assim, a constituição de 1988 quando impõe que todas as decisões sejam motivadas, oferece aos litigantes uma maior garantia do processo, Pacelli trata da matéria afirmando que “o convencimento deverá ser sempre motivado, como garantia do adequado exercício da função judicante e para que se possa impugná- lo com maior amplitude perante o órgão recursal”.

A motivação como garantia processual nas decisões judiciais

Como já foi dito anteriormente, a motivação como garantia constitucional, vem no texto legal, dar maior expressividade ao processo no tocante a garantir que a falta de fundamentação das decisões judiciais prejudique direitos individuais.

Para Gomes Filho , a função primordial no âmbito interno do processo é garantir que as decisões adotadas venham a compor o resultado de uma efetiva apreciação, pelo juiz, de todas as questões de fato e de direito suscitadas no processo, seja na fase decisória ou no seu curso.

Essa nova postura constitucional visa retirar do julgador que suas decisões sejam fruto da sua mera vontade pessoal, que seja engajada de subjetivismo e que julgue apenas através das suas convicções. Visando evitar esse estilo de julgados, a motivação tende a favorecer que a decisão seja baseada em uma interpretação correta, facilitando, caso haja necessidade, o exercício de contrapor a deliberação jurisdicional.

Destarte, Ada Grinover ,virtuosamente relata:

A motivação surge com instrumento através do qual as partes e o meio social tomam conhecimento da atividade jurisdicional; as partes para, se for o caso, impugnarem os fundamentos da sentença, buscando seja reformada;a sociedade, a fim de que possa formar opinião positiva ou negativa a respeito da qualidade dos serviços prestados pela justiça.

Para que o juiz possa fundamentar a sentença e fazer o seu convencimento a respeito do caso concreto que seja objeto da sua competência jurisdicional, é preciso dar um valor importante as provas que seram utilizadas no processo. Essas provas têm valores imprescindíveis para o convencimento do magistrado. Conforme expõe Gomes Filho :

Em relação à estrutura da motivação, isso significa que nela devem estar mencionadas todas as provas utilizadas para a fixação dos fatos discutidos no processo, sem o que não será possível conhecer as bases a partir das quais se desenvolveu o raciocínio judicial, constando-se, assim, o atendimento àquelas exigências de racionalidade e objetividade.

As decisões devem ser sempre motivadas e a falta de motivação é o componente necessário para que haja nulidade absoluta do processo.Não se admite a motivação feita de forma implícita, pois deve o julgador ser claro, coerente e preciso no momento da sua fundamentação.

Nesse sentido sobre a carência de motivação Ada Grinover , defende “(…) que se caracteriza quando o juiz deixa de apreciar provas ou questões de fato ou de direito decisivas para o julgamento, os tribunais têm fulminado a sentença, por insanável nulidade”.