Ao total, 11 empresas e 42 pessoas físicas foram condenadas por terem participado de conluios em licitações realizadas em SP, DF, MG e RS .
Na sessão de julgamento desta segunda-feira (08/07), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) condenou 11 empresas e 42 pessoas físicas por formação de cartel em licitações públicas de trens e metrôs realizadas em São Paulo (SP), Distrito Federal (DF), Minas Gerais (MG) e Rio Grande do Sul (RS). O Tribunal concluiu que, pelo menos, 26 certames foram prejudicados pela atuação do cartel durante os anos de 1999 a 2013.
Pelas práticas anticompetitivas, foram condenadas as empresas Alstom Brasil Energia, Bombardier Transportation Brasil, CAF Brasil Indústria e Comércio, IESA Projetos Equipamentos e Montagens, MGE Equipamentos e Serviços Rodoviários, Mitsui & Co Brasil, MPE – Montagens e Projetos Especiais, TC/BR Tecnologia e Consultoria Brasileira, Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços, Temoinsa do Brasil, e TTrans Sistemas de Transportes ao pagamento de multas que somam, no total, 515,6 milhões. Com relação às 42 pessoas físicas condenadas, o Conselho aplicou multas no valor total de R$19,5 milhões.
O caso teve início em maio de 2013, a partir da assinatura de acordo de leniência celebrado entre Siemens, Superintendência-Geral do Cade, Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado de São Paulo. Com base nos indícios apresentados, o Cade obteve autorização judicial para realizar, em julho do mesmo ano, operação de busca e apreensão na sede de empresas suspeitas de participarem do cartel. A análise do material apreendido (mais de 30 terabytes de dados eletrônicos e documentos físicos) resultou na instauração do processo administrativo.
De acordo com a investigação do Cade, o cartel foi organizado a partir de encontros e contatos entre empresas e/ou consórcios concorrentes ou que tinham potencial interesse em determinada licitação pública. Os contatos aconteciam antes e durante os certames, estendendo-se em alguns casos até o momento posterior à adjudicação do contrato.
O objetivo do cartel era dividir o mercado, fixar preços, ajustar condições, vantagens e formas de participação das empresas nas licitações. Para tanto, os membros do conluio utilizaram estratégias como supressão de propostas, apresentação de propostas de cobertura, formação de consórcios e realização de subcontratações, e ainda contaram, por vezes, com a colaboração e facilitação de consultorias especializadas.
O conjunto probatório das condutas anticompetitivas inclui e-mails, faxes, anotações manuscritas, atas de reunião, planilhas e documentos impressos. Esse material apresenta conteúdo como discussões explícitas para realização e monitoramento do cartel; registros de reuniões entre concorrentes; tabelas de alocação das licitações e valores das propostas a serem apresentadas; ajustes para compensação entre projetos; além de relatórios comprovando o sucesso dos acordos anticompetitivos e o consequente superfaturamento dos contratos.
Projetos afetados pelo cartel
Linha 5 – Metrô de São Paulo
Os contatos ilícitos tiveram início em 1999, por ocasião do processo licitatório referente ao projeto da Linha 5 do Metrô de São Paulo, realizado pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Participaram desses acordos anticompetitivos as empresas Alstom, DaimlerChrysler (atualmente Bombardier), CAF, Mitsui e Siemens.
No âmbito desse projeto, as estratégias utilizadas pelas participantes foram o reconsorciamento e, possivelmente, a realização de subcontratações. As empresas inicialmente se apresentaram na licitação como concorrentes em consórcios diferentes e após a fase de pré-qualificação combinaram a formação de um consórcio único. O objetivo foi eliminar a possibilidade de disputa, com a divisão do objeto entre todos os participantes do cartel, gerando a elevação dos preços das propostas e, consequentemente, do contrato assinado.
Manutenção de trens da CPTM
No início dos anos 2000, os acordos anticompetitivos se expandiram para as licitações referente aos projetos da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) para manutenção dos trens das Séries 2000, 3000 e 2100
O acordo anticompetitivo estabelecia a divisão das licitações entre as empresas Siemens, Alstom, Bombardier, CAF, TTrans, Temoinsa, Tejofran e Mitsui que combinaram quais seriam as vencedoras de cada certame, quais delas seriam subcontratadas após a adjudicação do contrato, de forma a recompensar sua colaboração no acordo colusivo (seja pela supressão de propostas, seja pela apresentação de propostas de cobertura).
Segundo a investigação, a Série 2000 foi alocada ao Consórcio Cobraman (formado por Alstom, Bombardier e CAF). Já a Série 3000 foi destinada à Siemens e a Série 2100 ao consórcio Alstom e CAF, que subcontrataria as empresas Bombardier, Temoinsa e Mitsui. Também participaram desses acordos as empresas Tejofran e TTrans.
Nos anos 2006 a 2008, ocorreu outra rodada de negociações entre as empresas para dividir o objeto de novas licitações realizadas pela CPTM para contratação de serviços de manutenção dos trens das Séries 2000, 3000 e 2100. Participaram novamente do acordo as empresas Alstom, Bombardier, CAF, Siemens, Temoinsa, Tejofran, TTrans, além de MPE e MGE.
Da mesma forma, entre os anos 2011 e 2013 Alstom, Bombardier, CAF, Siemens, Temoinsa, Tejofran, TTrans, MPE e MGE se reuniram novamente para dividir licitações realizada pela CPTM. Dessa vez, os alvos dos acordos eram os objetos dos certames para manutenção dos trens das Séries 2070, 7000, 7500 e 9000, além de 2000, 3000, 2100.
As empresas Alstom, MGE, CAF, Bombardier, Siemens, Tejofran e Mitsui também estabeleceram contatos para eliminar a competição do projeto de aquisição e manutenção de trens da Série 5000 da CPTM, em 2009. O ajuste era destinado à formação de um acordo global entre os três grupos interessados em participar da licitação: Bombardier, Siemens, Tejofran e Mitsui; CAF; e Alstom e MGE. O objetivo era que todos se beneficiassem com a simulação de concorrência no certame.
Linha 2 – Metrô de São Paulo
Em 2005, as empresas Alstom, Siemens, TTrans e Bombardier mantiveram contatos que afetaram a concorrência da licitação referente ao projeto de extensão da Linha 2 do Metrô de São Paulo.
O acordo celebrado entre as envolvidas no cartel estabeleceu a formação de dois consórcios para dividir o objeto do certame. O Consórcio Linha Verde (Alstom e Siemens) foi designado como o vencedor, enquanto o Consórcio Linha Dois (Bombardier, Balfour Beatty e TTrans) apresentou uma proposta perdedora para, posteriormente, ser subcontratado.
Projeto Boa Viagem – CPTM
Entre 2004 e 2005, as empresas Siemens, Alstom, Bombardier, CAF e IESA realizaram vários contatos com o objetivo de dividir os lotes da licitação do projeto Boa Viagem da CPTM. O certame tinha como objetos a execução de serviços voltados à expansão da malha, manutenção de vias, melhorias nos sistemas fixos de vias e de alimentação e à revitalização do material rodante.
No acordo anticompetitivo, foram adotadas estratégias de apresentação de propostas de cobertura ou supressão de propostas, simulando a concorrência do certame.
Aquisição de carros – CPTM
No período de 2007 a 2008, quando foram realizadas as licitações dos projetos da CPTM para aquisição de 320 carros e de 64 carros, as empresas Alstom e Siemens realizaram acordos anticompetitivos com o objetivo de eliminar a concorrência no certame.
As empresas fizeram diversos contatos para combinar qual consórcio seria vencedor de cada licitação e de que forma se dariam as subcontratações.
Linhas 1 e 3 – Metrô de São Paulo
Entre 2008 e 2009, as dez empresas participantes das licitações para reformas das Linhas 1 e 3 do Metrô de São Paulo realizaram acordos anticompetitivos para dividir entre si o escopo dos projetos.
Para eliminar a concorrência no certame, Alstom, Siemens, Bombardier, Tejofran, MGE, TTrans, Temoinsa, IESA, MPE e CAF utilizaram estratégias de formação de consórcios e realização de subcontratações, bem como apresentação de propostas de cobertura e não apresentação de documentos de habilitação básicos.
Manutenção de trens – Metrô DF
No projeto de manutenção da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô DF), realizado em 2005, também foram mantidos contatos entre concorrentes que resultaram em um acordo anticompetitivo envolvendo as empresas Alstom, IESA, TCBR e Siemens.
O objetivo do cartel foi dividir o escopo do projeto por meio da subcontratação do consórcio perdedor pelo consórcio vencedor. Desse modo, foi estabelecido que 52% do volume total seria do Consórcio Metrô Planalto (constituído por Alstom, IESA e TCBR) e os outros 48% para o Consórcio Metroman (formado pela Siemens e Serveng).
Aquisição de trens – CBTU e Trensurb
Em 2012, CAF e Alstom mantiveram contatos que resultaram na divisão das licitações promovidas pela Empresa de Trens Urbanos (Trensurb) e pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), destinadas à aquisição de trens para os metrôs de Porto Alegre e Belo Horizonte, respectivamente.
Em razão desse acordo, as empresas participaram das licitações como um consórcio e definiram que a CAF ficaria com a maior parte do projeto da CBTU e a Alstom com a maior parcela do certame da Trensurb. A atuação coordenada das empresas teve como objetivo eliminar a competição das licitações e elevar o preço final dos projetos.
Leniência
Em razão da declaração de cumprimento integral das obrigações do acordo de leniência, o Tribunal do Cade decretou a extinção da pretensão punitiva da Administração Pública em favor da Siemens e seis pessoas físicas ligadas às empresas.
Outras penalidades
Além da aplicação de multas, o Conselho determinou à Alstom pena de proibição de participação em licitações públicas, nos ramos de atividade afetados pela conduta, realizadas pela Administração Pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal e por entidades da administração indireta, pelo prazo de cinco anos.
Além disso, o Tribunal recomendou aos órgãos públicos competentes para que não seja concedido às empresas Alstom, Bombardier e CAF, pelo prazo de cinco anos, parcelamento de tributos federais devidos ou para que sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos fiscais ou subsídios públicos, nos termos da alínea ‘b’ do inciso IV do artigo 38 da Lei 12.529/11.
Arquivamento
O Conselho determinou o arquivamento do processo em relação às empresas Serveng-Civilsan e Hyunday, além de pessoas físicas relacionadas a elas, por insuficiência ou ausência de provas.
Com relação às empresas Procint Projetos e Consultoria Internacional e Constech Assessoria e Consultoria Internacional, além de três pessoas físicas, o processo foi arquivado por prescrição da pretensão punitiva.
O Tribunal também arquivou o caso em relação às empresas Caterpillar Brasil e RHA do Brasil Serviços de Infraestrutura, por reconhecimento da ilegitimidade passiva.
O processo foi desmembrado em relação a duas pessoas físicas e a individualização da representada Balfour Beatty Rail Power será feita nos autos do processo nº 08700.000448/2015-32.