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STF julga constitucional divulgação da Lista Suja do Trabalho Escravo

Ministros rejeitaram a ação proposta pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias para derrubar a medida

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter a divulgação da lista de empregadores autuados e punidos em processo administrativo por manter trabalhadores em condição análoga à de escravidão, a chamada Lista Suja do Trabalho Escravo.

O julgamento foi realizado em sessão encerrada na noite de segunda-feira (14) no plenário virtual, formato em que os ministros votam por escrito remotamente.

A lista do trabalho escravo existe desde 2004, tendo sido renovada e regulamentada por diversas portarias desde então. Em geral, os empregadores listados foram alvo de fiscalização em que houve o resgate de trabalhadores em condições precárias.

A lista era contestada pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). Para a entidade, seria inconstitucional uma portaria conjunta publicada em 2016 pelos então ministérios do Trabalho e das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. A norma regulamentou como seria feita a divulgação dos nomes.

Entre outros pontos, a Abrainc argumentava que a divulgação em si já geraria prejuízo e uma espécie de nova sanção administrativa, sem direito a defesa. Segundo a entidade, isso violaria direitos fundamentais dos empregadores, entre os quais o de livre iniciativa. E, pelo caráter de punição, a divulgação da lista somente poderia ter sido estabelecida por lei aprovada no Congresso, argumentou a associação.

Votos

O relator do caso no Supremo, ministro Marco Aurélio Mello, discordou. Ao contrário de violar direitos fundamentais, como alegado pela associação, o ministro afirmou que a divulgação da lista garante a aplicação de direitos previstos na Constituição, entre os quais os que tratam de trabalho digno e acesso a salários justos e o da dignidade humana em geral.

“A quadra vivida reclama utilização irrestrita das formas de combate a práticas análogas à escravidão”, escreveu o ministro. Para ele, a divulgação está ainda justificada pela Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), que serviu de base para regulamentar a lista. Marco Aurélio destacou que a transparência é a regra da administração pública.

O relator da ação, ministro Marco Aurélio, afastou este argumento. Ele considerou que o princípio da reserva legal foi devidamente observado, pois o cadastro dá efetividade à Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), que tem por princípio a chamada “transparência ativa”, segundo a qual os órgãos e entidades têm o dever de promover a divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitação. “Não é suficiente atender a pedidos de acesso, fazendo-se imperativo que a administração, por iniciativa própria, avalie e disponibilize, sem embaraço, documentos e dados de interesse coletivo, por si produzidos ou custodiados”, afirma o relator.

O ministro destacou que o cadastro não representa sanção. Em vez disso, visa dar publicidade a decisões definitivas em processos administrativos, observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa, referentes a ações fiscais em que for constatada relação abusiva de emprego, similar à de escravidão. Segundo ele, ao divulgar o resultado de inspeções de interesse coletivo, o cadastro sinaliza o monitoramento da razoabilidade das condições de trabalho, pois o nome do empregador infrator é mantido na lista por dois anos.

Para o ministro Marco Aurélio, a portaria interministerial realiza direitos fundamentais relativos à dignidade da pessoa humana, composto pela proibição de instrumentalização do indivíduo, e aos valores sociais do trabalho. “A quadra vivida reclama utilização irrestrita das formas de combate a práticas análogas à escravidão”, frisou.

O relator foi acompanhado integralmente pelos ministros Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin também votaram pela constitucionalidade da lista, embora com diferenças na fundamentação.

“De fato, a manutenção da existência de formas modernas de escravidão é diametralmente oposta a quaisquer objetivos de uma sociedade que se pretende democrática”, escreveu Fachin em seu voto. O ministro frisou que a Lista Suja do Trabalho Escravo é “meramente informativa” e não configura “espécie de sanção aos empregadores”.

O ministro Alexandre de Moraes foi o único a divergir, por considerar que o processo sequer deveria ser julgado pelo Supremo, uma vez que, para ele, a Abrainc não tem legitimidade para propor ação sobre o assunto.