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Ação popular como instrumento na preservação do meio ambiente

O Direto Ambiental é de fundamental importância para a manutenção da vida no Planeta Terra. E surgiu com o intuito de tutelar o ambiente visando a otimização da qualidade de vida do homem.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como resultado da convenção sobre o meio ambiente em Estocolmo no ano de 1972, versa no artigo 225: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Em se tratando de Direito Ambiental o Prof. Tycho Brahe Fernandes Neto o conceitua como um “conjunto de normas e princípios editados objetivando a manutenção de um perfeito equilíbrio nas relações do homem com o meio ambiente.”¹

Porém, essa é uma noção que propicia o antropocentrismo da questão, colocando o homem como o centro da relação. Afinal, o Direito Ambiental serve somente ao homem? Apesar de o homem ser a única criatura racional habitando a superfície terrestre, o Direito Ambiental resguarda todas as formas de vida.

De acordo com Paulo Affonso Leme Machado o Direito Ambiental é:

“(…) um Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o meio ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata mais de construir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo, um Direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodiversidade. O Direito Ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca interligar temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de preservação e de reparação, de informação, de monitoramento e de participação.”²

Essa definição nos leva à questão principal do presente artigo, a participação da sociedade na preservação do meio ambiente. Sendo que, no desenvolver do chamado Direito Processual Ambiental, a doutrina tem reconhecido como instrumentos processuais constitucionais de tutela ambiental a ação civil pública, a ação popular, o mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção. A seguir vamos nos aprofundar na ação popular que aqui chamaremos de AÇÃO POPULAR AMBIENTAL.

A AÇÃO POPULAR AMBIENTAL

A Ação Popular apesar de não ser um instrumento processual novo adquiriu uma nova dimensão a partir da Constituição de 1988, que expandiu suas possibilidades de utilização no seu artigo 5, inciso LXXIII:

“Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular em que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e de ônus da sucumbência.” Percebe-se também a preocupação do dispositivo com a defesa do meio ambiente, visto que o próprio sistema constitucional colocou o mesmo como bem de uso comum do povo e por ele deve ser protegido. É nesse escopo que adquire qualidade de instrumento de promoção do acesso à justiça em matéria ambiental. Vale ressaltar o entendimento de LEITE:

“(…) atribuindo ao cidadão à legitimidade na defesa jurisdicional do ambiente, via ação popular, aperfeiçoa-se o exercício da tarefa solidária e compartilhada do Estado e da coletividade, na consecução do poder-dever da proteção ambiental.” ³

LEGITIMIDADE ATIVA NA AÇÃO POPULAR AMBIENTAL

É o cidadão que tem legitimidade ativa para propor a Ação Popular, ou seja, pessoa natural em pleno gozo de seus direitos políticos. Isso porque se faz necessário o binômio nacionalidade-direitos políticos, que delega apenas aos nacionais a participação política para obter o “status civitates”, subsistindo face ao artigo 1º, parágrafo 3º da Lei da Ação Popular, que expressamente preceitua que a comprovação da cidadania será por meio do título de eleitor.

Uma questão que gerava dúvidas era se a pessoa jurídica poderia ser autora popular. Acerca do tema não há muito que discutir com a vigência da Súmula 365 do STF: “Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular.”

No caso dos estrangeiros serão considerados cidadãos somente aqueles que forem naturalizados, com base na própria Constituição Federal que diz no artigo 14, parágrafo 2º: “Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.”

Cabe citar que qualquer cidadão pode ser litisconsorte facultativo ou assistente do autor popular. Nesse caso cabem, respectivamente, as regras dos artigos 46 a 55 do Código Civil Brasileiro.

Até agora falamos das considerações dominantes na Ação Popular comum, contudo há entendimentos da sua não aplicação integral quando o ato lesivo ou ilegal for praticado contra o meio ambiente, configurando assim a Ação Popular Ambiental, onde entende-se a necessidade da extensão da legitimidade ativa como estratégia de ampliação do acesso à justiça.

A Ação Popular Ambiental não deve ser interpretada na mesma visão que a Ação Popular Comum por ser regida através de princípios constitucionais próprios, consagrados na Magna Carta que em seu artigo 225 determina o meio ambiente ser “essencial à qualidade de vida”. Será que o legislador pensou que a vida citada nesse dispositivo se restringiria apenas à do cidadão brasileiro, portador de um título de eleitor? Ou também de todos aqueles que vivem no Brasil?

Dessa forma temos que repensar se cabe apenas ao cidadão a legitimação ativa para propor uma Ação Popular Ambiental. E até mesmo rever os conceitos de cidadão que nos é imposto. Assim, Fiorillo, Rodrigues & Nery (apud Vitta, 2000, p.41), dizem:

“Os requisitos exigidos pelas legislações no tocante à legitimidade ativa para a propositura da Ação Popular não precisam ser respeitados quando se refiram à Ação Popular para proteger o ambiente. Como o constituinte tratou do tema exaustivamente, qualquer restrição do legislador ordinário quanto à legitimidade ativa seria inconstitucional.”4

O CONCEITO DE CIDADÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 dispõe, em seu artigo 5º que “Todos (grifo nosso) são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”.

Assim o conceito de cidadão pode ser discutido tanto em sentido amplo quanto em sentido estrito, e Amorim diz que:

“Em sentido amplo, quer significar a participação do cidadão em diversas atividades ligadas ao exercício de direitos individuais, fundamentando-se, então, no artigo 1º da Constituição da República. “A cidadania está aqui num sentido mais amplo do que o titular de direitos políticos” (…). Em sentido estrito é a qualidade de ser eleitor, votar e ser votado.Dentro do âmbito de nossa indagação, necessário é tomarmos posição e afirmar que o direito positivo atual brasileiro considera cidadão não só o eleitor, mas também indivíduos outros que, mesmo sem estar no exercício dos direitos políticos, podem exercer atos concernentes à cidadania.(…)”5

Esta nova consciência no status de cidadão acentua os debates sobre exclusão social, direitos humanos e atuação política na sociedade civil. De outro ângulo, levando em consideração a o estágio atual do Capitalismo, falar de cidadania significa considerar, igualmente, as próprias mudanças sociais, nos valores e na educação, ocorridas pelas rápidas mudanças tecnocientificas.

Com isso podemos dizer que todos esses anos de evolução acabaram por afirmar que a cidadania de fato só pode se constituir por meio de acirrada luta cotidiana pelos direitos e garantias daqueles que já existem. Além disso, notamos uma preocupação maior com a difusão desses direitos, através tanto da educação formal quanto dos meios de comunicação que, por programas diários de televisão vislumbram-se debates acerca de temas como violência, saúde, meio ambiente, educação, habitação, e tantos outros direitos básicos.

Tendo em vista os problemas atuais, violação dos direitos humanos, ineficientes políticas públicas governamentais e a real pauperização e marginalização manifestadas na periferia do capitalismo, exigi-se da cidadania mais do que o simples ato de votar, ou até mesmo de pertencer a uma sociedade política. Cabe a sociedade civil, portanto, uma atuação efetiva na luta pela resolução dos problemas sociais visando suprir as inúmeras carências provenientes das desigualdades de condições, do descaso do poder público e do próprio significado antigo de cidadania, como guardiã de fonte de direitos. Proporcionando, dessa forma, uma melhora na qualidade de vida merecida por todos os seres, sejam eles humanos ou não, assim como na problemática abordada no presente artigo.

CONCLUSÃO

Podemos concluir que com o aumento dos legitimados ativos para propor a Ação Popular Ambiental, estaremos tendo um ganho imensurável no que diz respeito ao acesso à justiça, assim como à qualidade das ações a serem impetradas e até mesmo no preparo para enfrentar a demanda, que tende a se tornar maior e mais complexa.

Com essa extensão poderemos também ampliar o acesso à justiça através da abertura para a legitimação de associações, que estão diretamente ligadas à problemática ambiental, ganhando maior representatividade no exercício da cidadania, uma vez aqui estudada no seu conceito mais amplo.

Fazendo-se necessária uma discussão mais profunda sobre a contribuição e a efetiva utilização da Ação Popular como instrumento na preservação do meio ambiente, bem como a realização das necessárias adequações, inclusive a título de legitimação ativa, a fim de que esta arma processual de natureza coletiva não seja esquecida podendo, de maneira eficaz, constituir-se num instrumento verdadeiro de promoção do acesso à justiça em matéria ambiental.