A Sessão Especializada em Dissídios Individuais – 2 (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho garantiu a uma trabalhadora do interior paulista o cancelamento de decisão judicial que havia homologado acordo para quitação de débito trabalhista. Conforme o voto do ministro Emmanuel Pereira (relator), os integrantes da SDI-2 deferiram recurso ordinário em ação rescisória após reconhecer que a inexistência de vontade da parte para o ato, após a constatação de equívoco no cálculo dos valores devidos, permite a desconstituição da sentença homologatória.
A controvérsia teve início na 4ª Vara do Trabalho de Ribeirão Preto (SP), onde tramita a execução de débito correspondente às horas extras de uma ex-empregada da Kyu Shu Comércio de Produtos Alimentícios Ltda. Os cálculos totalizaram R$ 5.260,91 e a trabalhadora aceitou a proposta da empresa que ofereceu R$ 3.000,00 – o equivalente a cerca de 70% do débito.
Antes da homologação, contudo, a defesa da trabalhadora comunicou ao juízo a desistência em relação ao acordo, pois a nova análise dos valores devidos apontaram um erro de cálculo e a constatação de que o débito seria muito maior: R$ 28.303,68. O pedido de desistência não foi aceito pela Vara do Trabalho, o que levou ao ajuizamento de ação rescisória no Tribunal Regional da 15ª Região (Campinas-SP), que manteve o posicionamento da primeira instância.
Segundo o TRT, ao contrário do afirmado pela trabalhadora, não houve prova de comportamento doloso por parte da empresa nas negociações. “Os fatos narrados, portanto, não caracterizam qualquer das razões aptas a ensejar a anulação do acordo entabulado entre as partes nos autos da ação trabalhista”, apontou a decisão regional, acrescentando que a iniciativa da autora deveu-se somente, à sua insatisfação pelo valor inferior que iria receber.
No TST, o ministro Emmanuel Pereira observou que não houve demonstração de vício de consentimento para o ajuste, uma vez que a trabalhadora não conseguiu demonstrar ter sido induzida a erro. O relator do recurso constatou, contudo, que houve equívoco quanto aos benefícios financeiros do acordo e, sobretudo, manifestação da desistência antes da chancela judicial. “Os fatos narrados levam à conclusão da existência de defeito de forma pela ausência de vontade da parte quanto à celebração do acordo”, afirmou Emmanuel Pereira.
O relator verificou ainda que a análise da legislação civil leva à constatação do direito da trabalhadora. “O acordo é ato de vontade entre as partes com concessões mútuas, conforme disposto no artigo 840 do atual Código Civil; assim, inexistindo a vontade, o ato é tido por inexistente”, observou.
O procedimento judicial adequado para o caso, segundo Emmanuel Pereira, seria a análise dos pressupostos formais para a validade do ato a fim de que fosse confirmada a vontade das partes para a validade do acordo.
Com a concessão do recurso à trabalhadora, foi determinada a desconstituição da sentença que homologou o acordo, uma vez que considerada inválida pelo TST. A decisão também resultará no prosseguimento da execução do débito trabalhista conforme seus trâmites normais. (ROAR 1575/2002-000-15-00.8)