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Responsabilidade do médico

1 RESPONSABILIDADE DO MÉDICO1.1 CONCEITO1.2 NATUREZA JURÍDICA1.3 PRESSUPOSTOS2 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE3 ERRO MÉDICO3.1 ERRO DE DIAGNÓSTICO3.2 ERRO DE CONDUTA E ERRO PROFISSIONAL3.3 ERRO DO PACIENTE4 VÍNCULO OBRIGACIONAL4.1 OBRIGAÇÃO DE MEIO4.2 OBRIGAÇÃO DE RESULTADO

1 RESPONSABILIDADE DO MÉDICO

1.1 CONCEITO

Para que a responsabilidade sobre um ato danoso seja atribuída ao médico faz-se necessário que ele deixe de observar os deveres de sua profissão, quais sejam: dever de aconselhar e informar seu paciente, dever de assistir e dever de prudência.Inicialmente, entende-se o dever de informar e aconselhar como a necessidade do médico esclarecer ao paciente qual moléstia que lhe acomete, o melhor tratamento disponível, estabelecer juntamente com seu paciente o serviço a ser prestado, os planos de saúde que atende, o preço da consulta, as condições de pagamento etc.

Nessa fase, o médico deverá fornecer todas as informações necessárias para que o paciente opte por contratar ou não seus serviços, alertando-o, inclusive, quanto à sua especialidade e o estado clínico do paciente, tudo em linguagem acessível.Por sua vez, o dever de assistir caracteriza-se na prestação dos serviços contratados dentro de critérios técnicos, estando sempre alerta aos chamados e acompanhando as condições de saúde do paciente durante o tratamento.

A ocorrência de danos ao paciente advindos da falta de assistência médica pode caracterizar o abandono, ensejando ao profissional a responsabilização. Assim sendo, o médico deve permitir que o paciente o encontre com facilidade em caso de necessidade, como por exemplo, fornecendo o número telefônico de sua residência, seu telefone celular, etc.

Para Maria Helena Diniz :

O médico tem o dever de cuidar do enfermo com zelo, diligência, utilizando todos os recursos da medicina. Assim será responsabilizado se não der assistência ao seu cliente ou se negligenciar as visitas, abandonando-o. è preciso lembrar que o exercício da medicina livre, de forma que o médico poderá negar-se de atender chamado de um doente, não sendo assim obrigado a prestar contas de sua recusa à pessoa que o chamou, a não ser à sua consciência, mas não poderá desatender a um chamado de um cliente seu.

Cumpre esclarecer que o médico pode deixar de prestar seus serviços ao paciente desde que a sua recusa não cause dano imediato. Todavia, nunca poderá abandoná-lo, devendo ainda, comunicar o próprio paciente ou seus familiares a respeito de outro médico mais habilitado em dar seqüência ao tratamento.O dever de prudência revela-se na maneira do proceder médico. Este não poderá fazer experimentos científicos em seus pacientes ou realizar intervenções que envolvam grande risco de morte, sem a autorização, ainda que tácita, do cliente, e na sua impossibilidade, de seus familiares – excepcionalmente, em casos de extrema urgência, o médico deverá decidir da melhor forma possível.

Do até aqui exposto, encontra-se a conceituação de responsabilidade médica, que hoje rege-se pelos princípios gerais da responsabilidade civil, segundo a qual quem pratica um ato em estado de sã consciência e capacidade, intencional ou por mera culpa, tem a obrigação de ressarcir ao prejudicado as conseqüências danosas suportadas.

Desta feita, não se pode olvidar das lições de Arturo Ricardo Yungano que entende que “a responsabilidade médica é a obrigação que tem aquele profissional de reparar e satisfazer as conseqüências de atos, omissões e erros voluntários ou involuntários, dentro de certos limites e cometidos no exercício de sua profissão” .

Hélio Gomes ensina que “para que ocorra a responsabilidade médica se faz necessária a presença de cinco elementos: agente, o ato profissional, a culpa, o dano e a relação de causalidade”. Logo, em caso de responsabilidade médica, o profissional legalmente habilitado é o próprio agente. Insta ressaltar que os curandeiros, parteiros, charlatões etc. responderão por outro tipo de ilícito, já que não possuem habilitação específica para exercer a medicina.

Por conseguinte, o ato médico somente poderá ser praticado pelo profissional habilitado, durante o exercício de sua profissão.A culpa, como será visto adiante, é o erro de conduta, moralmente reprovável.

O dano é o resultado prejudicial advindo da ação ou omissão do médico.

Por último, a relação de causalidade é o nexo entre a causa e o efeito que deve existir entre o ato do médico e o prejuízo ocorrido.O egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo assim decidiu:

Responsabilidade médica confirmada. Remessa prejudicada. Configurada a negligência médica consubstanciada nas provas carreadas aos autos por abandono do doente e omissão de tratamento. Verificam-se presentes os requisitos indispensáveis à efetivação da responsabilidade médica: a) o autor – o ora condenado IESP; b) o ato – a ação omissiva; c) a culpa – a negligência operada; d) o dano – a lesão cerebral evidenciada e e) o nexo causal – o elo entre o ato omissivo e o dano cerebral ocasionado. Procede a pretensão autoral, mantida a decisão de piso. (TJES – 4ª. Câmara Cível – Remessa ex-oficio n°. 35940043975 – Rel. Des. Frederico Guilherme Pimentel – Julg. 02.03.1999).

Outrossim, o artigo 951 do Código Civil, também prevê a indenização para aquele que, no exercício de atividade profissional, agravar o mal já existente.

Art. 951. O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Esta hipótese permite o ressarcimento a um maior número de pessoas, pois o profissional que prejudicar o quadro pré-existente também responde pela sua conduta.Todavia, para se determinar a responsabilidade médica faz-se necessário verificar se efetivamente o dano ocorrido foi causado pelo ato profissional, ou se adveio de evolução natural da enfermidade. Esta diferenciação é de extrema importância, pois evita a confusão entre o erro médico ou progresso do estado mórbido.

1.2 NATUREZA JURÍDICA

Conforme já observado no capítulo anterior, no item referente a espécies de responsabilidade civil, especialmente quanto ao seu fato gerador, didaticamente, há diferenças entre a obrigação contratual e a aquiliana (extracontratual).

Na responsabilidade médica seria contratual aquela obrigação assumida através de contrato escrito ou verbal, onde o paciente contrata diretamente com o médico de sua escolha, acertando livremente o tipo de serviço a ser prestado, os encargos, a forma de pagamento etc, sendo irrelevante presença de retribuição pecuniária ou não do serviço.

Ainda existem situações em que a responsabilidade civil do médico será considerada como aquiliana ou extracontratual.Neste caso a responsabilidade origina-se de um dever geral ou legal. É o caso do médico que presta socorro necessário à vitima de um acidente de trânsito.

In casu, é incontestável que se o paciente não possui condições para consentir, não há como caracterizar a contratualidade da relação. Uma vez que, para a celebração de um contrato se exige um acordo de vontades exteriorizadas.

Hildegard Taggesell Giostri identifica como casos de responsabilidade médica extracontratual:

1.°) Casos em que os serviços prestados pelo facultativo o sejam de forma espontânea, sem intervenção alguma da vontade do paciente.

2.°) O atendimento do médico à incapaz de fato, sem poder comunicar-se com seu representante legal, a fim de obter a devida autorização.

3.°) A atividade do facultativo desenvolvida contra a vontade do paciente, verbi gratia, nos casos do suicida que recebe assistência antes da consumação do ato.

4.°) No caso de serviços médicos requeridos por pessoa distinta do paciente, sempre e quando aquela não se apresente como representante legal ou voluntária do paciente, o que obrigaria contratualmente ao último.

5.°) Quando o feito do médico configurar – sem prejuízo da ilicitude civil – um delito penal, eivado de dolo.

6.°) Quando o contrato celebrado entre facultativo e paciente for nulo – lato sensu – por carecer de alguns elementos essenciais, ou pela presença de qualquer outro defeito ou vício.

7.°) O atendimento por intermédio do serviço público patrocinado pelo Estado, e que caracteriza responsabilidade objetiva para a entidade e extracontratual para o profissional.(…)

Entretanto, esta distinção revele-se irrelevante na prática. A doutrina é uníssona em afirmar que a responsabilidade civil do médico é contratual. Muito embora a responsabilidade médica não seja objetiva.

O médico não se compromete a curar, mas proceder de acordo com as regras e os métodos da profissão.

Nesse sentido é a lição de Miguel Maria de Serpa Lopes :

(…) pouco importa a natureza do contrato que vincula o profissional e seu cliente, pouco importa que se trata de uma responsabilidade contratual ou extracontratual, de qualquer modo, em se tratando de uma obrigação de meios, ao prejudicado é que incumbe o ônus probatório da infringência dessas obrigações.

A jurisprudência pátria confirma a natureza contratual da responsabilidade médica. O Tribunal de Justiça do Paraná entende que “ainda que se admita a natureza contratual do serviço médico, não se pode presumir a culpa do profissional, por envolver obrigação de meio e não de resultado. Sem prova dessa culpa, improcede ação de indenização”.

1.3 PRESSUPOSTOS

A responsabilidade médica é a obrigação que o profissional da saúde possui de ressarcir os prejuízos decorrentes de seu ato no exercício de sua profissão.

Conforme já observado, essa responsabilidade é subjetiva, ou seja, baseia-se na teoria da culpa. Segundo esta teoria, são pressupostos necessários para caracterizar a responsabilidade civil do médico: o dano, o nexo de causalidade e a existência da culpa.Desta forma, observado no caso concreto, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre a ação/omissão do profissional e a lesão suportada pelo paciente, deve o médico ser responsabilizado civilmente. Porém, não comprovada a presença dos pressupostos que ensejam a responsabilidade civil subjetiva, a tutela judicial pretendida será improcedente, condenando-se o paciente/autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios e, se comprovada, na litigância de má-fé.

Nesta seara manifestou-se o Tribunal de Justiça do Espírito Santo:

Responsabilidade civil – Culpa – Inocorrência – Apelo provido. A responsabilidade civil dos médicos decorre de culpa provada e não presumida. Resultando não provado nos autos que o apelante agiu com imprudência, imperícia ou negligência, nem verificada a hipótese de erro grosseiro, mas, ao contrário, consoante laudo técnico, unânime, que houve uma complicação natural suscetível às cirurgias desta natureza, dá-se provimento ao apelo para julgar improcedente a ação, com inversão do ônus da sucumbência. (TJES – 3ª. Câmara Cível – Apelação n°. 24920053741 – Des. Pedro Valls Feu Rosa – Julg. 14.04.1995).

No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná:

Ação de indenização por lesões corporais e danos morais. Cirurgia (retirada de ovário e trompa – lado direito). Perícia – Obstrução da trompa esquerda – Culpa do médico afastada. Ausência de nexo causal – Responsabilidade civil – Inocorrência. Consentimento do paciente – Desnecessidade – Razoabilidade – Caso concreto. Recurso improvido. 1- Demonstrado na prova pericial, que ao tempo da cirurgia realizada na paciente, não havia aderência sobre a tuba uterina esquerda, sendo de nenhuma contribuição ao fato (dano), o ato cirúrgico realizado pelo médico. Não há, assim, que cogitar de erro profissional a configurar conduta culposa em qualquer das suas modalidades e apta a produzir o resultado lesivo, inexistindo relação de causa e efeito entre a conduta do médico e o dano (retirada do ovário e trompa do lado direito e obstrução da trompa esquerda). 2- Sendo subjetiva a responsabilidade do médico, para a caracterização da culpa, torna-se imperiosa a comprovação de que o profissional não agiu com o grau de diligência razoável cujo dano resultou de erro grosseiro. 3- Acerca da necessidade de consentimento da paciente para a tomada de decisões pelo médico durante a cirurgia, a fim de realizar procedimentos inevitáveis, decididos à luz do diagnóstico do profissional pautado no conhecimento científico e na ética, inviável, porquanto, seria submeter a paciente a uma segunda cirurgia, após, recobrar os sentidos, considerando-se todos os riscos inerentes à outra cirurgia. (TJPR – 9ª. Câmara Cível – Acórdão n°. 249 – Des. Rel. Miguel Pessoa – Julg. 16.12.2004).

1.3.1 Dano médico

O primeiro pressuposto refere-se à existência de uma lesão moral, material ou estética suportada pelo paciente, de modo que o prejuízo causado seja contrário à lei. Na ausência de dano, a responsabilidade não restará configurada, a menos que a conduta do médico, por si só, caracterize-se como fato punível.Adriano de Cupis conceitua dano como “prejuízo, aniquilamento ou alteração de uma condição favorável, tanto pela força da natureza quanto pelo trabalho do homem”.

Logo, sofrerá um dano médico, o paciente que sofrer qualquer alteração desfavorável ou lesão em decorrência da atividade médica.

Os danos médicos podem ser físicos ou corporais, materiais ou morais.

Dano físico corresponde à perda de um órgão, função ou sentido – seja total ou parcialmente, ou ao agravamento do estado clínico do paciente em decorrência de uma operação mal feita.Devido a sua importância os danos corporais ou físicos recebem um tratamento isolado, eis que os prejuízos de tal ordem compõem-se de elementos variáveis, pelo que são indenizados separadamente, conforme a extensão da lesão. Teresa Ancona Lopez de Magalhães corrobora com este entendimento:

Partindo-se da idéia que o dano deformante à integridade física não é igual a qualquer outro tipo de dano moral, constituindo a mais grave e mais violenta das lesões à pessoa, pois além de gerar sofrimento pela transformação física, gera um outro dano moral, que é o dano moral à imagem social, pode-se pensar na possibilidade de cumular estes dois tipos de dano.

Por sua vez, o dano material é mais facilmente visualizado. É o prejuízo financeiro, aquele de ordem pecuniária que vem minorar a esfera patrimonial do lesado. Comumente, os danos materiais decorrem dos danos físicos compreendendo além das despesas hospitalares, os remédios, lucros cessantes etc.Já os danos morais são aqueles que não afetam diretamente o patrimônio do lesado, mas estão estritamente ligados aos direitos concernentes à personalidade.

Aguiar Dias entende que “o dano moral consiste na penosa sensação da ofensa, na humilhação perante terceiros, na dor sofrida, enfim, nos defeitos puramente psíquicos e sensoriais experimentados pela vítima do dano (…)”.

O dano moral, então, consiste na afetação ou perturbação de bens que trazem alguma valoração na vida do homem, quais sejam, a paz, integridade física, a intimidade, a imagem, a tranqüilidade, etc.Segundo lição de Maria Helena Diniz , os danos morais também compreendem os danos estéticos:

O dano estético estaria compreendido no dano psíquico ou moral, possibilitando, em regra, a cumulação da indenização do dano estético com a indenização por dano moral, representado pelo sofrimento, pela vergonha, pela angústia ou sensação de inferioridade da vítima, atingida em seus mais íntimos sentimentos e afetada em sua imagem social.

Assim, os danos estéticos caracterizam-se quando há uma lesão permanente à beleza física do paciente.

Todavia, este dano é de difícil mensuração, vez que o conceito de beleza não segue padrões fixos, repousando na subjetividade.Para que o julgador possa atribuir valor econômico ao dano estético é mister levar em consideração os seguintes critérios: o local da lesão, sua extensão, a probabilidade de sua remoção – total ou parcial, o sexo, a idade e a profissão do paciente, seu estado civil e a possibilidade do retorno ao convívio social, dada a aparência repulsiva da lesão.Ainda quanto ao dano estético, Wilson de Melo da Silva adiciona:

O dano estético não seria apenas o aleijão, mas também as deformidades ou deformações outras, as marcas e os defeitos, ainda que mínimos e que pudessem implicar, sob qualquer aspecto, um afeiamento da vítima ou a que se pudessem vir a constituir para ela, numa simples lesão desgostante.

Ademais, a Constituição Federal em seu artigo 5°, inciso V , especifica as três espécies de dano – patrimonial, moral e à imagem, sendo que o dano à imagem não se confunde com o dano moral. Assim, o dano à imagem consiste em uma espécie independente de dano.A jurisprudência dos tribunais pátrios já se manifestaram:

Ação ordinária de indenização. Dano estético. Intervenção cirúrgica. Responsabilidade do chefe de equipe médica. 1. A permanência do cabo do aparelho de diatermia, após a realização da operação, de forma a causar queimaduras no paciente, é de responsabilidade do médico chefe de equipe. Essa responsabilidade, pelo dano estético causado ao paciente, inclui a obrigação de assegurar a necessária cirurgia reparadora. Ação procedente. 2. Conseqüentemente, não tem obrigação alguma o paciente, assim lesionado, de pagar os honorários pela intervenção cirúrgica, da qual resultou o dano estético. Reconvenção improcedente. (TJPR – 4ª. Câmara Cível – Acórdão n°. 2293 – Rel. Des. Jorge Andriguetto – Julg. 21.03.1984).

Quando o dano estético compromete a imagem da pessoa perante outros, alterando-lhe a aparência, fica comprometida sua convivência social, chegando-se a casos extremos de isolamento. Existe, então, a possibilidade de cumulação do dano estético com o dano moral e até mesmo com o dano patrimonial. Esta é a lição de José de Aguiar Dias :

A alteração do aspecto estético, se acarreta maior dificuldade no granjeio da substância, se torna mais difíceis para a vítima as condições de trabalho, se diminui suas possibilidades de colocação ou de exercício da atividade a que se dedica, constitui sem dúvida um dano patrimonial. Não se pode objetar contra a sua reparação, nem quando, erradamente, se considere dano moral, porque nem apresenta dificuldade para avaliação. Deve ser indenizado, pois, como dano patrimonial, o resultado prejudicial da ofensa ao aspecto estético, sempre que se traduza em repercussão de ordem material, porque a lesão, o sentimento ou a dor psíquica, com repercussões patrimoniais, traduz dano patrimonial. É dessa natureza o dano estético que deforme desagradavelmente as feições, de modo que cause repugnância ou ridículo e, portanto, dificuldade à atividade da vítima.

Nesse sentido, manifestou-se o Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

(…) O dano material haverá de corresponder à perda patrimonial pessoal (econômica) da vítima, que teve sua capacidade laboral diminuída. O valor de um salário mínimo mensal indenizatório, desde a data do fato, mostra-se justo. O dano moral (estético), distintamente do dano material, reflexo que é da dor moral, afeta a personalidade do indivíduo, seu bem-estar íntimo, causando a quem o suporta uma indisposição de natureza espiritual – pateme danimo. Na hipótese, o pagamento de uma soma pecuniária busca uma satisfação compensatória da dor-sentimento. (…) (TJDF – 1ª. Câmara Cível – Acórdão n°. 115159 – Rel. Des. Edmundo Minervino – Julg. 25.11.2004).

Mesmo quando o dano estético possa ser disfarçado ou ocultado por meio de artifícios como a prótese, por mais perfeitos que estes sejam, o médico não estará isento de reparar, mesmo porque o paciente jamais retornará ao status quo ante, restando-lhe, para se dizer o menos, péssimas lembranças do infortúnio.

1.3.2 A culpa

O Código Civil adotou a teoria da responsabilidade subjetiva. Portanto, incumbe à vitima provar, além do fato, do resultado e do vinculo de causalidade, o dolo ou a culpa do agente para obter a reparação do dano.

O médico como profissional liberal, além de ser amparado pela legislação comum, é assistido por lei especial. O Código de Defesa do Consumidor dispõe no parágrafo 4.°, do artigo 14, que “a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”. Percebe-se, então, que a responsabilidade do profissional liberal é fixada com base na culpa, logo é subjetiva. Cabe ressaltar que aqui a culpa deve ser entendida latu sensu, abrangendo o dolo (intenção do médico em causar algum dano ao paciente) e a culpa stricto sensu, com suas várias modalidades: imperícia, imprudência e negligência. O Código de Ética Médica dispõe no artigo 29 que é vedado ao médico “praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência”.

Assim, para que o médico se abstenha de uma eventual condenação em ação indenizatória, é imperioso que a sua conduta esteja amparada pela perícia médica, ausentando-o, desta maneira, de qualquer possibilidade de incorrer em ação culposa.Por outro lado, se o médico, dolosa ou culposamente, causar um dano ao seu paciente por ato próprio, poderá ele ser condenado a reparar os danos morais, materiais ou estéticos que porventura tenha causado ao paciente ou a terceiros.

Como dito, a conduta culposa do médico é manifestada sob três modalidades: a negligência possui característica omissiva, é um ato de omissão aos deveres. É um não agir, uma abstenção do comportamento indicado para aquela situação.

Genival Veloso França afirma que a negligência “caracteriza-se pela inação, indolência, inércia, passividade. É ato omissivo” .Destarte, a negligência é uma modalidade de culpa que se efetiva quando o profissional não fez o que deveria ter feito seja por inércia, indiferença, preguiça ou menosprezo.

A título exemplificativo, tem-se como negligente o médico que diante de caso grave e urgente permanece cochilando na sala dos médicos do hospital. Também é negligente o médico clínico que não encaminha o doente para fazer cirurgia urgente, quando há sério risco de morte. A falta dos devidos cuidados com a assepsia ou com a escolha dos materiais adequados, entre outros.A imprudência caracteriza-se por um comportamento comissivo do profissional, marcado por ações precipitadas e sem a devida cautela. É a contradição com as normas de procedimento. Como exemplo, pode-se citar a conduta do médico que confia plenamente em suas habilidades ignorando a necessidade da cooperação de auxiliares durante uma cirurgia.

A imperícia, por sua vez, caracteriza-se por um agir sem conhecimentos técnicos suficientes ou pela má aplicação dos conhecimentos que possui. É a falta de habilidade para praticar atos que exigem conhecimentos específicos.

Tem-se que o médico foi imperito no caso do obstetra que ao realizar operação cesariana, corta a bexiga da parturiente. Também tem-se pleiteado culpa por imperícia do médico que realiza laqueadura e posteriormente a mulher venha a engravidar.Sobre o tema, Miguel Kfouri Neto :

Não é imperito quem não sabe, mas aquele que não sabe aquilo que um médico ordinariamente deveria saber; não é negligente quem descura alguma norma técnica, mas quem descura daquela norma que todos observam; não é imprudente quem usa experimentos terapêuticos perigosos, mas aquele que os utiliza sem necessidade. Sobre a imperícia, o médico deverá, diante de um caso que supere seus conhecimentos, confidenciar com colegas ou indicar um especialista. Antes de intervir, deve avaliar a si mesmo.

Derradeiramente, cabe salientar que a imperícia e a imprudência não podem coexistir, uma vez que uma necessariamente exclui a outra. Assim é que se o médico age com imperícia, não possui ele todos os conhecimentos técnicos que a sua profissão exige, enquanto que a imprudência pressupõe que o profissional detém a técnica, mas não a utiliza de forma cautelosa.

1.3.3 O nexo causal

Na esfera médica, torna-se bastante complexo averiguar a culpa médica e indicar a sua causa. O profissional da saúde trabalha concomitantemente com vários fatores que envolvem o paciente e sua moléstia.

Por tal razão, com exceção dos erros grosseiros, são necessários os esforços de um perito médico para se atribuir à conduta do profissional a situação gravosa do paciente.

Neste momento, surge mais um entrave, o corporativismo da classe médica. Esta união entre os médicos acaba por tornar mais difícil a constatação da culpa médica, pois somente um médico possui capacidade técnica para justificar ou reprovar qualquer procedimento relativo à sua ciência. Cabe ao perito verificar se a conduta do profissional realmente ensejou a lesão. Desta forma, por nexo de causalidade, pode-se entender o liame entre a conduta do médico e o resultado danoso. Segue entendimento do extinto Tribunal de Alçada do Paraná:

Apelação cível. Responsabilidade civil. Erro médico não configurado. Ausência de prova. Utilização adequada de todos os recursos médicos disponíveis para tentar controlar a atonia uterina de que foi acometida a vítima. Responsabilidade do hospital. Não comprovação. Não configurado nos autos tenha faltado sangue para a realização da necessária transfusão na paciente que veio a óbito. Recurso desprovido. Para que seja possível estabelecer a responsabilidade civil para reparação de danos, é necessário que se estabeleça o nexo causal entre a ação do agente e o resultado danoso. Não pode ser responsabilizada pelo evento morte, médica que no exercício de seu mister, utilizou-se de todos os recursos técnicos, medicamentosos e cirúrgicos na tentativa de combater as conseqüências que a atonia uterina gerou em sua paciente. Não comprovado nos autos que o pequeno estoque de sangue existente nos hospital tenha contribuído para o evento morte da paciente, posto que conseguido, a tempo e através de parentes da paciente, sangue em outro hospital, não há como responsabilizá-lo civilmente por dano moral. (TAPR – 6ª. Câmara Cível – Acórdão n°. 10834 – Julg. 23.10.2000).

Daí é que, ao se verificar a existência dos três pressupostos acima explanados, pode-se atribuir a responsabilidade civil ao médico.

2 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE

Existem situações excepcionais em que ocorre o dano, mas que em razão de características peculiares, isenta-se o médico do dever de indenizar. Essa irresponsabilidade médica encontra fundamento jurídico na ausência de dolo na conduta do profissional.

Hildegard Taggesel Giostri afirma que “o profissional poderá não ser responsabilizado por dano ao seu paciente, se no curso de sua atuação profissional, configurar-se uma das excludentes de responsabilidade, a saber: o caso fortuito, a força maior, ou a culpa exclusiva da vítima”.

Por força maior, entende-se um fato natural superior às forças humanas, não sendo possível ao homem evitar sua ação, apesar de identificada e previsível. É o evento exterior à relação médico-paciente.

O caso fortuito caracteriza-se por ser um acontecimento da natureza humana impossível de encontrar qualquer previsão. Ao contrário da força maior, o caso fortuito não pode ser previsto.Ambas as excludentes liberam o médico do cumprimento da obrigação contratual, exonerando-o da responsabilidade civil. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal já decidiu que “não configura erro médico o procedimento cirúrgico realizado sem falha e que resultou em acidente vascular equiparável ao caso fortuito, cuja ocorrência rompe o nexo de causalidade e descaracteriza o dever de indenizar”.

Noutro ponto, a culpa exclusiva do paciente também exonera o médico de qualquer responsabilidade. É o que entende o Tribunal de Justiça de São Paulo:

Resultado do exame de AIDS. Interpretação errônea por parte do leigo. Responsabilidade da ré. Inocorrência. Resultado do exame que, embora pertencente ao paciente a ele não se destina. Interpretação que deve ser feita por profissionais habilitados, a classe médica. Interpretação errônea ou precipitada por parte do leigo que não pode responsabilizar o laboratório que forneceu o resultado. Recurso provido. (TJSP – 1ª. Câmara de Direito Privado – Apelação Cível n°. 103.006-4 – Rel Des. Guimarães e Sousa – Julg. 19.09.2000).

Quando há culpa concorrente, que se trata tanto de culpa do paciente quanto do médico, não há exclusão de responsabilidade, mas diminuição do valor das indenizações que cada uma das partes envolvidas no atendimento médico deverá suportar pela parcela de culpa que lhe couber.

Assim, o médico e o paciente se responsabilizam pelas situações que derem causa. Neste sentido, manifestou-se o extinto Tribunal de Alçada do Paraná:

Ação de reparação de danos. Parturiente submetida à cesariana antes do tempo. Recém nascido acometido de membrana hialina que vem a lhe causar o óbito. Gestante que não realizou nenhum dos exames requisitados pelo médico, informando-lhe data errônea para cálculo do parto. Médico que deveria ter realizado outros exames para aferição das semanas gestacionais. Culpa concorrente. (…) Evidenciada a ocorrência de culpa concorrente, nas categorias negligência e imprudência, que vieram a dar causa ao evento fatídico, deve a indenização ser adequada a culpa de cada um, impondo-se sua redução, na medida de suas responsabilidades. Não é possível o parcelamento dos danos morais, já impostos de acordo com a capacidade do ofensor. (…) (TAPR – 6ª. Câmara Cível – Acórdão n°. 13039 – Rel. Carvilio da Silveira Filho – Julg. 04.03.2002).

3 ERRO MÉDICO

Antes de se reportar à responsabilidade civil dos profissionais da medicina, se faz necessário obter uma visão verossímil acerca do erro médico. È bastante comum a existência de situações em que é atribuída responsabilidade ao médico por um resultado adverso, sem que este gravame realmente tivesse origem na ação do médico.

A evolução natural de algumas doenças pode apresentar circunstâncias que para um leigo parecem ser um erro médico. Isto decorre da complexidade técnica inerente da medicina.Julio Cezar Meirelles Gomes e Genival Veloso França definem erro médico como:

Erro médico é a conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica, capaz de produzir um dano à vida ao à saúde de outrem, caracterizada por imperícia, imprudência ou negligência.

Não se pode confundir então, erro médico com a falha técnica, erro técnico com erro voluntário. A doutrina faz esta diferenciação:A falha técnica depende tanto da competência e da dedicação do médico como também da resposta do paciente, que pode falhar, agravada por doença ou situação desconhecida.Erro técnico é aquele decorrente de falhas estruturais, ou seja, quando os meios ou as condições de trabalho são impróprias, ineficazes ou insuficientes para uma resposta satisfatória. Neste caso, incluem-se as falhas dos aparelhos de raios-x, dos aparelhos de anestesia, de oxigênio, das ambulâncias etc.O erro voluntário, também conhecido como doloso, é inadmissível ao profissional médico, sendo aquele erro cometido deliberadamente. Trata-se pois de um crime.

Erro médico é, portanto, a falha do profissional no exercício de seu mister, ocasionando um resultado diverso do pretendido, fruto de uma ação/omissão ou da inobservância de norma de conduta técnica, estando o profissional no gozo de todas as suas faculdades mentais.

Excluem-se as limitações impostas pela própria natureza da doença, bem como as lesões eventualmente produzidas pelo médico no tratamento um mal maior.

3.1 ERRO DE DIAGNÓSTICO

Para o dicionário médico, diagnóstico é a arte de determinar a natureza de uma doença ou a conclusão a que se chega na identificação de uma doença. Tecnicamente, consiste em identificar e determinar a moléstia que acomete o paciente, dependendo dele a escolha do tratamento.A certeza diagnóstica pressupõe, preliminarmente, a tomada de duas providências. A primeira refere-se à coleta de dados com a verificação dos sintomas pelos quais se manifesta a doença. A segunda, refere-se a interpretação dos dados obtidos, coordenando-os e relacionando-os entre si, bem como os comparando com os inúmeros quadros patológicos conhecidos pela Medicina. Em outras palavras, o diagnóstico consiste na realização de um juízo de valor.Fernanda Schaefer divide o erro de diagnóstico em evitável e inevitável:

Serão inevitáveis quando decorrentes das próprias limitações da Medicina, ou seja, são inúmeras as doenças ainda não catalogadas e outras tantas das quais não se conhecem as causas, os avanços tecnológicos às vezes não se mostram suficientes para determinar um correto diagnóstico. Não constituem faltas graves, portanto, não são puníveis.

Maior atenção deve se dar aos erros de diagnóstico evitáveis, pois estes sim, envolvem responsabilidade civil e/ou penal do médico. São erros que teriam sido evitados se todas as precauções necessárias (como realização de exames clínicos, laboratoriais, físicos etc.) tivessem sido tomadas.

Nesse sentido, não cabe ao juiz analisar o erro de diagnóstico propriamente dito, mas se o médico teve culpa no modo pelo qual procedeu, se empregou, ou não, todos os recursos que tinha a seu dispor na identificação da moléstia, bem como se prescreveu os remédios e tratamentos adequados à patologia diagnosticada.Assim, o erro de diagnóstico somente acarretará responsabilidade ao médico se um profissional prudente – estando nas mesmas condições – não o cometesse.

3.2 ERRO DE CONDUTA E ERRO PROFISSIONAL

Conforme anteriormente demonstrado, muito embora algumas vezes o diagnóstico tenha caráter genérico, não pode o médico conduzir o tratamento de maneira errada nas demais fases do procedimento médico.

Assim, todo médico que procede a intervenções cirúrgicas inúteis ou mesmo que solicita a realização de exames desnecessários, entre outros exemplos, incorre em erro de conduta médica.Por isso, Fernanda Schaefer anota que o médico deve “a cada passo dado no tratamento, corrigir, se necessário, o diagnóstico dado, sendo consenso entre os profissionais que o erro de diagnóstico é admissível, mas o de conduta não”.

As falhas porventura existentes devem ser corrigidas durante o tratamento, em tempo real, para que o desvio seja o menor possível e o retorno ao caminho certo seja mais fácil, rápido e com a menores seqüelas.

De outro vértice, caracteriza-se o erro profissional quando a conduta do médico é correta, mas a técnica por ele utilizada é incorreta.

Embora não se permita um direito ao erro, será este escusável quando invencível à mediana cultura médica, tendo em vista as circunstâncias do caso concreto.

Nessa categoria, inserem-se os casos nos quais o médico procedeu corretamente, mas o doente omitiu informações, ou não colaborou com a sua parte na elaboração do diagnóstico ou no decorrer do tratamento.

Irany Novah Moraes explica que “se o erro só pode ser estimado pelo resultado, o médico só deve responder pelo que depende exclusivamente dele, e não dá resposta do organismo do paciente”.

Para concluir, Hildegard Taggesell Giostri arremata “caracterizando o erro profissional como sendo aquele contingente que decorre de falta não imputável ao médico, seja pelas naturais limitações da medicina, seja pela impossibilidade de um diagnóstico exato, o que poderia levar o profissional à escolha de uma conduta errônea”.

3.3 ERRO DO PACIENTE

Existe, por parte do paciente, uma grande expectativa em relação ao trabalho do médico, eis que seu mister está diretamente ligado ao que lhe é mais valioso: a sua saúde e a sua vida.Assim, ao procurar seu médico, o paciente cria diversas expectativas para com o trabalho a ser realizado, pois almeja que suas aflições sejam eliminadas.

Ocorre que a medicina moderna, o automatismo no atendimento dos pacientes e a imposição do sistema público de saúde, com horários fixos de plantão e rígida repartição de tempo nos atendimentos, faz com que se acentue a suspeita e a prevenção do paciente para com médico, com o qual passou a ter uma relação episódica, rápida e pontual.

Por isso, muitas vezes, a não realização das expectativas do paciente é confundida com erro médico, decorrente, na maioria dos casos, da incompreensão sobre o que foi dito pelo médico ao paciente, ou do que não foi adequadamente entendido.Destaca-se, daí, a importância de uma boa relação entre o médico e o paciente e da necessidade deste último estar informado da melhor maneira possível sobre os prognósticos de sua patologia, independentemente do seu nível de entendimento e compreensão.Também há que levar em conta, conforme anota Hildegard Taggesell Giostri , que:

a importância dos dados fornecidos pelo cliente ao seu médico, no momento da anamnese, ou seja, do relato histórico de suas queixas, (…) vai determinar não só a medicação a ser prescrita, como os exames laboratoriais a serem pedidos, bem assim todo o procedimento do profissional a partir de então.

Logo, a simples frustração do paciente não é capaz de caracterizar o erro médico.

4 VÍNCULO OBRIGACIONAL

Washington de Barros Monteiro , ao definir a acepção jurídica do termo, conceituou obrigação como sendo:

(…) a relação jurídica de caráter transitório, estabelecida entre o devedor e o credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal e econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro, ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio.

Portanto, a obrigação é a realização pelo devedor daquilo que se comprometera. E por conseqüência o vínculo obrigacional é o elo entre o devedor da prestação e seu respectivo credor. Na relação médico-paciente, evidencia-se o médico como devedor da prestação a ser cumprida para com o paciente.Mas se tratando de responsabilidade civil médica, é relevante a classificação da obrigação assumida pelo profissional como de meio e de resultado.

4.1 OBRIGAÇÃO DE MEIO

Na obrigação de meio o que se exige do devedor é simplesmente o emprego de determinado meio sem ter em vista o resultado. Esse tipo de obrigação é típica dos contratos de prestação de serviços, como o de advogados, publicitários e médicos etc.Assim, a medicina deve ser desempenhada da melhor maneira possível, com a diligência habitual dos seus profissionais em busca do melhor resultado, mesmo que este não seja conseguido.A existência de obrigação de meios é a única saída para justificar a liberdade de atuação do médico. Se o profissional empenha seus esforços dentro dos parâmetros ditados pela ciência, estará cumprindo os deveres decorrentes do contrato firmado, sendo descabida sua responsabilização caso o estado de saúde de seu paciente piore.

Para Fernanda Schaefer :

São obrigações de meio aquelas em que o médico, ao assistir o paciente, obriga-se apenas a empregar de forma diligente todos os meios e recursos disponíveis para a melhor condução do quadro clínico apresentado, sendo irrelevante a verificação do resultado. Nestes casos o ônus da prova é do credor, ou seja, deve o paciente demonstrar que o médico (devedor) agiu com dolo, negligência, imprudência ou imperícia.

Não há dúvidas, então, quanto à caracterização da obrigação médica ser de meio. Isto porque o médico, ao atender seu paciente, não assume o compromisso de curar sua moléstia, mas sim de prestar serviços técnicos específicos.Não é outro, aliás, o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:

Civil. Indenização. Ato ilícito decorrente de erro médico. Descaracterização. Profissional que diagnosticou corretamente a existência de corpo estranho no olho do cliente e que também providenciou sua retirada e aplicou o tratamento adequado a uma ceratite ulcerosa, que a despeito disso, evoluiu e deu causa a perda parcial da visão. Tratando-se de atividade-meio, na qual o médico não se compromete a curar, mas a aplicar toda a diligência na cura, não se pode falar de culpa quando não chega o profissional ao resultado desejado. Desde que o diagnóstico foi correto e a terapêutica adequada, não há que cogitar de relação de causa e efeito entre a atividade do medico e o dano. Descaracterização da culpa em qualquer das suas modalidades. Improcedência do pedido condenatório. Apelação desprovida. (TJPR – 2ª Câmara Cível – Acórdão n° 10220 – Rel. Des. Sydney Zappa – julg. 30.03.94)

Por isso, na infração a um dever de meios, há culpa a ser provada pelo paciente. Vigoram as regras da responsabilidade subjetiva. O médico, nesses casos, defende-se sob a alegação de estrito cumprimento da ciência médica, e da ausência de nexo de causalidade entre a sua conduta e o dano.

4.2 OBRIGAÇÃO DE RESULTADO

Na obrigação de resultado o devedor se compromete a realizar determinado ato e, necessariamente, deve atingir um resultado preciso. Neste caso, o insucesso torna o devedor responsável pela não prestação. Para Fernanda Schaefer , quanto à obrigação de resultado:

O que importa é o resultado final e não os meios utilizados. Não sendo atingido o resultado, será o médico considerado inadimplente. Aplicam-se a estes casos os princípio da responsabilidade civil objetiva, restando ao devedor demonstrar que não atingiu os objetivos estipulados por total impossibilidade objetiva.

Portanto, nas obrigações de resultado, como há a presunção de culpa, o ônus da prova recai sobre a pessoa do médico.Em que pese a obrigação médica seja classificada, como regra geral, em uma obrigação de meio, existem situações em que a atividade médica pode ter como fim um resultado específico. Devido a essa controvérsia, segue uma abordagem mais detalhada acerca da cirurgia plástica.

Existem duas modalidades de cirurgia plástica: a cirurgia estética reparadora e a cirurgia meramente cosmética ou embelezadora. A primeira reporta-se às situações em que há um dano estético e a atividade do profissional é sanar ou amenizar as seqüelas advindas. É de pacífico entendimento que as cirurgias reparadoras são obrigações de meio.

Com relação à segunda espécie de cirurgia, a plástica embelezadora, existe grande polêmica. A jurisprudência pátria dominante, aliada a alguns autores, manifesta-se com tendência à obrigação de resultado.A doutrina de Caio Mario da Silva Pereira comunga desse mesmo entendimento. Para este autor a cirurgia estética gera obrigação de resultado e não de meio.

Com a cirurgia estética (embelezadora), o cliente tem em vista corrigir uma imperfeição ou melhorar a aparência. Ele não é um doente, que procura tratamento, e o médico, não se engaja na sua cura. O profissional está empenhado em proporcionar-lhe o resultado pretendido, e se não tem condições de consegui-lo, não deve efetuar intervenção. Em conseqüência recrudesce o dever de informação bem como a obrigação de vigilância, cumprindo, mesmo, ao médico recusar seu serviço, se os riscos da cirurgia são desproporcionais às vantagens previsíveis.

Quanto à cirurgia corretiva (reparadora), o mesmo autor faz a seguinte distinção:

Cumpre, todavia, distinguir a cirurgia corretiva (reparadora). A uma pessoa que é portadora de uma deformação (não importa se congênita, cirúrgica ou traumática), o médico nem sempre pode prometer eliminá-la, porém, realizar o que seja melhor: obrigação de meios e não de resultado, neste caso.

O Tribunal de Justiça do Paraná manifestou-se “que na cirurgia plástica e corretiva de desvio de septo em modelo-manequim, responde o médico pelo insucesso da cirurgia estética. É obrigação de fim. Devido os danos morais e os valores referentes às cirurgias necessárias a correção do resultado lesivo”. Em outro julgado, o extinto Tribunal de Alçada do Paraná explica “que a cirurgia plástica de caráter estético consiste em obrigação de resultado, pela qual o médico se compromete a obter o resultado pactuado e, não o obtendo, é passível de responsabilização”.

Porém, contrária a este entendimento, considerando a cirurgia estética embelezadora como uma obrigação de meio, Hildegard Taggesel Giostri sustenta:

O paciente quando procura um cirurgião plástico quer melhorar algo que lhe desagrada, bem como encontra-se – ao menos em tese – em estado de perfeita higidez. Seria inadmissível que tal paciente, após intervenção daquele profissional, viesse a se encontrar em situação pior do que a anterior a cirurgia. (…) Não pode ser o médico responsabilizado se em fazendo tudo o que estava ao se alcance. Dentro das condições físicas e mentais normais e das técnicas consideráveis adequadas, o resultado atingido não foi o esperado ou o ideal. Até porque o que é ideal para alguns não é para outros.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Fernanda Schaefer, sob alegação de “que não se pode exigir que o médico seja infalível” , conclui que todas as obrigações médicas são exclusivamente de meio.

Carlos Alberto Jaimovich, Talita Franco e Márcia Rosa Araújo entendem que:

(…) toda reparação busca a beleza, sempre que possível, e alterações estéticas podem representar, para seus portadores, verdadeiras patologias com repercussões graves na esfera emocional. A cirurgia plástica, portanto, em qualquer dos seus aspectos, é uma atividade médica que trata de doenças, sejam predominantemente físicas ou psicossomáticas.

Denota-se, então, que o paciente ao buscar o médico-cirurgião para alterar o seu corpo através da cirurgia plástica, não se encontra em posição confortável, pois algo o incomoda física ou psicologicamente. Portanto, não há que se distinguir, os atos cirúrgicos das operações estéticas dos demais, eis que ambos buscam eliminar uma patologia.