Elenca os requisitos legais do mandado de busca e apreensão e no que consiste o controle da atividade policial. É abordado “o que” se apreende, “quando”, medidas adotadas “antes” da busca e apreensão, “durante”, e “após”. Explica a necessidade e o procedimento da busca quando abrange computadores e as circunstâncias em que o escritório pode ser objeto de busca e apreensão. Por fim, destaca que a apreensão só se procede quando o investigado é o próprio advogado ou no local se encontra o corpo de delito, instrumento ou produto do crime e não correspondências protegidas pelo sigilo constitucional na relação cliente-advogado.
Já dizia Calamandrei (2000), que a parcialidade do advogado é a garantia da imparcialidade do Juiz. Contudo, essa parcialidade guarda limites na Constituição Federal e na Lei nº. 8.906/94 e, especialmente, nas prerrogativas funcionais de magistrados, promotores, procuradores da república, delegados de polícia e servidores públicos em geral.
O sigilo profissional dos advogados é uma manifestação do direito de defesa e não é esse o objeto das investigações e operações policiais, tampouco dos mandados de busca e apreensão. A incursão no inviolável local de exercício de atos da profissão nada interessa à Polícia Federal, enquanto ligado umbilicalmente à sua atividade-fim, qual seja a defesa de interesses de terceiros, face ao Estado.
A legislação processual penal admite a busca em escritório de advocacia, especialmente, se o advogado estiver na posse do corpo de delito (artigo 243, § 2º do CPP), instrumento ou produto do crime, ou se o próprio advogado for suspeito da prática de algum ilícito. Nesse aspecto, os Tribunais Regionais Federais têm consignado, à exaustão, a legalidade do procedimento policial, que há décadas ocorre com fulcro na legislação citada.MIRABETE (2001, p. 535), leciona:
“240.1 A fim de que não desapareçam as provas do crime, a autoridade policial deve apreender os instrumentos e todos os objetos que tiverem relação com o delito (art. 6º, II). O art. 240 relaciona ainda objetos e pessoas que podem ser objeto da busca e apreensão tanto pela autoridade policial como pelo juiz, quando fundadas razões a autorizarem. Embora a busca e a apreensão estejam insertas no capítulo das provas, a doutrina as considera mais como medida acautelatória, liminar, destinada a evitar o perecimento das coisas e das pessoas.
O que não é corpo de delito, instrumento ou produto do crime e diga respeito exclusivamente ao exercício ético da advocacia não é objeto de apreensão. O DOU I, p. 50, de 01-07-2005, publicou as Portaria nº. 1.287, e 1288. Destaco os principais pontos da Portaria nº. 1288, relacionado ao cumprimento de mandados de busca em escritórios de advocacia:
a. participação de advogado na prática delituosa sob investigação; b. instrumento ou produto do crime ou que constitua elemento do corpo de delito em poder de advogado; c. documentos imprescindíveis à elucidação do fato em apuração (art 2º, Port. nº. 1288-05/MJ).
Requisitos da representação de busca:
a. instrução do pedido com todos os elementos que justifiquem a adoção da medida; b. indicação, com a maior precisão possível: das razões da diligência do local, de forma fundamentada; c. da finalidade da busca dos objetos que se pretende apreender. (art. 1º da Portaria nº. 1287/MJ).
Medidas após a execução do mandado de busca:a. comunicação ao magistrado; b. objetos arrecadados ou apreendidos que não tiverem relação com o fato em apuração serão imediatamente restituídos a quem de direito, mediante termo nos autos. (art. 4º, § 2º da Portaria nº. 1287/MJ); c. faculdade de o interessado extrair cópia dos documentos apreendidos, inclusive dos dados eletrônicos, mediante justificativa, para evitar o uso protelatório em prejuízo da investigação.
No julgamento do Mandado de Segurança nº. 247.735 (processo nº. 2003.03.00.017120-6), a 1ª Seção do TRF 3ª Região, em Acórdão da lavra da Exma. Desa. Federal Ramza Tartuce (RTRF 62/120), constatou-se que “não se poderia exigir que – a autoridade – conhecesse quais os documentos e arquivos continham, por assim dizer, as informações que interessavam à justiça”, pois era necessária a “análise de documentos fiscais envolvendo conhecimentos de finanças, de operações bancárias e de informática”.
O eminente jurista LUIZ FLÁVIO GOMES , em recente artigo intitulado “Limites à inviolabilidade do advogado e do seu escritório”, leciona:
“Não é preciso (e é desarrazoado exigir) que do mandado conste o nome completo, qualificação, idade, local de nascimento etc. do investigado. Isso é exagero. De outro lado, jamais se pode exigir que o mandado defina, de pronto, qual ou quais documentos serão apreendidos. Isso é absurdo! O juiz não tem bola de cristal para saber, de plano, qual ou quais documentos serão úteis e necessários para a comprovação “do corpo de delito”. (Destacou-se).
Certamente, o artigo doutrinário citado é produto de profundas reflexões oriundas de debate que participamos, em 29-07-2005, na Escola de Magistrados do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (EMAG/TRF-3ª Região), sob os auspícios da Diretora e Desembargadora Federal, dra. Suzana Camargo, portanto, em ambiente democrático e com bilateralidade de audiência de todos os interessados. O painel de debate abordou a temática “Limites à inviolabilidade do advogado no exercício da profissão”, denominação muito próxima de outra eleita pela Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, com orientação da Coordenadora do Curso de Direito, professora e mestra em Direito, Marcília Rodrigues, na data de 23-08-2005.
Há inúmeros controles dos atos estatais da Administração policial – controle interno (Direção-Geral do DPF, Corregedoria Geral e Regionais e respectivos Núcleos de Disciplina e Correição, CGU), externo (MPU, TCU, Comissão de Prerrogativa da OAB), hierárquico (MJ), judicial dos atos do Inquérito, popular, imprensa falada, escrita e eletrônica -, contudo, até o momento, apenas uma única representação contra procedimento de busca e apreensão em escritório de advocacia foi feita e, pelo que até agora foi apurado, não foi comprovado abuso ou excesso de poder. Não se tem notícia de que seja o suposto prejudicado, embora se tenha apregoado a existência de “invasões”, o que leva a crer que as críticas são genéricas, amplas e abstratas.
A apreensão de computadores não é a regra; prioritariamente se faz o backup do hardisk, contudo é sabido que há inúmeros programas de computação que ocultam dados e o próprio ato de executar o backup pode gerar uma cópia defeituosa ou perda de dados. Deve ser lembrado que a relação de sigilo cliente-advogado é preservada, e desconsidera-se, por ilícito, qualquer outro elemento colhido durante a busca e apreensão que não diga respeito ao objeto do Inquérito policial e não esteja nas hipóteses previstas pelo CPP, ou seja, protegidos pelo sigilo profissional constitucionalmente assegurado. Diverso do CPC, o Processo Penal não acolheu a figura da impenhorabilidade do instrumento de trabalho e nem poderia pois a opção legislativa foi a proteção da coletividade frente ao indivíduo que detém no computador comprovação de atividades supostamente ilícitas como transações bancárias, financeiras e contábeis ligadas à “blindagem de bens” e “offshores”.
Falhas pontuais e isoladas na representação por buscas ou na expedição de mandados podem ser corrigidas a qualquer tempo, mediante provocação ou de ofício, e não geram qualquer nulidade ou prejuízo, desde que haja a fundamentação exigida constitucionalmente pelo art. 93, inciso IX da C.F.-88, aplicando-se o princípio “pas de nullité sans grief”: é legítima e válida a diligência e provas produzidas, respeitado o sigilo e a garantia do exercício da advocacia.
O mandado de busca e apreensão é medida cautelar, antecipatória para garantir a subsistência da prova, do resultado útil da investigação policial, e não juízo de certeza de culpabilidade. Exigir a antecipação do objeto buscado é desconhecer os percalços da atividade policial e pressupor uma prévia visita da autoridade ao local objeto da busca para tomar conhecimento do que ali se encontra, o que seria absurdo.
As críticas bem fundadas e baseadas em fatos concretos e específicos são sempre bem-vindas, recebidas, analisadas e apreciadas. Imputações genéricas e abstratas são desabonadoras de cidadãos de bem e, além de nada contribuir, só denigrem a imagem de uma instituição ímpar num País que tem a 2ª pior distribuição de renda mundial.