A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que declarou nulas as doações praticadas por ex-marido a sua mãe e irmão. Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, a doação praticada por um cônjuge que faz uso, para tanto, de mandato pelo outro concedido do qual não constam a individualização dos bens e tampouco a determinação do donatário deve ser considerada nula.
Maria Lúcia Gregourt da Silva, representando seus filhos menores R. e T., ajuizou uma ação declaratória de nulidade de ato jurídico contra o seu ex-marido, Alexandre Carneiro da Silva, a mãe dele, Jane Thereza Carneiro, e seu irmão Valentino Carneiro da Silva para ver desconstituídas duas doações realizadas por ele já às vésperas do término do seu casamento com ela.
Segundo Maria Lúcia, as doações ofenderiam a legítima dos filhos do casal e as normas atinentes ao contrato de doação, porquanto do mandato usado por Alexandre para prescindir da sua autorização expressa constavam apenas poderes genéricos para administração do patrimônio do casal; inexistindo poderes específicos para a prática dessa liberalidade, uma vez que não há individualização dos bens a serem doados e, tampouco, do donatário ao qual se destinam.
Fazendo uso dessa autorização genérica, continuou a defesa de Maria Lúcia, o cônjuge doou os dois imóveis quando passados praticamente dez anos da outorga do mandato do qual fez uso e quase um ano após ter abandonado o lar conjugal, o que ocorreu em 30/12/1995.
Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente para declarar nulas as doações praticadas ao argumento de que é inválido o mandato conferido por Maria Lúcia ao ex-marido, por não conter o requisito da especialidade na indicação da coisa a ser doada e seu beneficiário.
Inconformado, o ex-marido apelou sustentando, em síntese, que não há qualquer falha a contaminar o mandato outorgado há mais de dez anos, pedindo o reconhecimento da eficácia da procuração que autorizou as doações de bens em favor de sua mãe e irmão. O Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento à apelação.
No STJ, alegaram violação do artigo 1295, parágrafo 1º, do CC/16, porque a exigência de individualização do bem a ser doado e do donatário, no caso concreto, vai além do que se entende pela exigência de “poderes especiais e expressos” no mandato para a prática de doação.
Ao votar, a ministra Nancy Andrighi ressaltou que, de acordo com cópia do mandato juntado aos autos do processo, verifica-se que Maria Lúcia concedeu ao então marido, em 30/9/1987, “(…) amplos, gerais e ilimitados poderes para gerir e administrar todos os bens, negócios, direitos e interesses da outorgante e do casal”, constando autorização genérica para a prática dos mais diversos atos jurídicos, dentre os quais, doar e receber doações.
Seguindo entendimento do próprio STJ, a ministra relatora afirmou não ser suficiente um mandato com poderes para alienar, nem mesmo que se especifique que eles abrangem a doação, pois o animus donandi é essencial; e ele só existe se for mencionado na procuração o donatário a quem o doador quer beneficiar, não bastando o animus donandi indeterminado. “Forte em tais razões, não conheço do recurso especial”, concluiu.