1. Dos Procedimentos Especiais2. Do Usucapião2.1. Espécies de usucapião de imóveis2.2. Requisitos Gerais e Específicos do Usucapião 3. Legitimidade4. Competência5. Procedimento
1.Dos Procedimentos Especiais
Regula o Código Processo Civil, em seu livro IV, os procedimentos especiais. O processo jurisdicional é uma entidade complexa, que se revela sob dois aspectos: internamente, o processo se manifesta como uma relação jurídica de direito público, entre o Estado-Juiz e as partes, tradicionalmente designada relação processual. Externamente, porém, o processo se manifesta com outro aspecto, revelando-se como um procedimento que se desenvolve em contraditório.
O procedimento pode ser definido como ” uma seqüência ordenada de atos, em que cada ato é causa do seguinte e conseqüência do anterior, todos se encadeando como instrumentos de obtenção de um resultado final. Só há processo, porém quando o procedimento se desenvolve em contraditório, isto é, quando é assegurado a todos os interessados a possibilidade de participar do procedimento, influindo no resultado final que se irá alcançar.Para o processo cognitivo, que é o que hora nos interessa, prevê o Código de Processo Civil uma distinção: há procedimentos comuns e especiais. Os especiais são regidos pelo livro IV do CPC, e passam a ser, agora, objeto de nossa atenção.
Conceito: Pode-se definir o procedimento especial como aquele que se encontra submetido a trâmites específicos e que se revela parcial ou totalmente distinto dos procedimentos comuns.
Procedimentos de jurisdição contenciosa e de jurisdição voluntária: O entendimento majoritário, atendendo a teoria revisionista, defende a natureza propriamente jurisdicional da jurisdição voluntária. Esta, porém, está sujeita a regras próprias, que decorrem logicamente de suas características, que a distinguem da jurisdição contenciosa, como é o caso da inaptidão das decisões proferidas em tal sede de serem alcançadas pela autoridade de coisa julgada substancial.
Utilização do procedimento especial: Toda vez que se vai ajuizar uma demanda em que se manifesta pretensão de natureza cognitiva, é preciso verificar se existe, para a hipótese, algum procedimento especial previsto. Havendo procedimento especial, este será o utilizado. Não existindo procedimento especial previsto para a hipótese, será adequada a utilização do procedimento comum, ordinário ou sumário, conforme o caso. Não há, pois, qualquer liberdade na escolha do procedimento, sendo as normas que determinam sua utilização de ordem pública, cogente. Não se pode, por exemplo, optar pelo procedimento comum em detrimento do especial. Tendo, porém, o demandante optado pelo procedimento inadequado, caberá ao juiz determinar a conversão, aproveitando-se os atos já praticados que se revelem compatíveis com o procedimento correto.
Técnicas de especialização procedimental: Segundo a classificação de Humberto Teodoro, as técnicas de especialização são: a) simplificação e agitação dos trâmites processuais, por meio de expedientes como a redução de prazos e o da eliminação de atos desnecessários; b) delimitação do tema que se pode deduzir na inicial e na contestação; c) explicitação dos requisitos materiais e processuais para que o procedimento especial seja eficazmente utilizado.
Aplicação subsidiária do procedimento ordinário: Nos termos do que dispões o parágrafo único do artigo 272 do CPC, cada procedimento especial é regido pelas disposições que lhes são próprias, aplicando-se-lhe, subsidiariamente, o procedimento ordinário.
2. Do Usucapião
Usucapião é o modo de adquirir a propriedade (ou outro direito real) pela posse continuada, durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei. É instituto jurídico predominantemente ligado à aquisição da propriedade imobiliária, muito embora se preste também à aquisição do domínio dos bens móveis e outros direitos reais.
O procedimento especial traçado nos artigos 941 a 945 é destinado restritamente ao usucapião de terras particulares. Já o procedimento de usucapião de coisas móveis e usucapião especial é o sumário (CPC, artigo 275, II, a, e a lei 6969/81, artigo 5º), nada dispondo a lei a respeito a ser adotado para o usucapião indígena.
2.1. Espécies de usucapião de imóveis Há três espécies de usucapião: ordinário, extraordinário e especial. Ordinário:
Extraordinário:
Especial (pro labore e urbano)
2.2. Requisitos Gerais e Específicos do Usucapião
Posse “ad usucapionem”
A posse “ad usucapionem” tem que se conjugar aos qualificativos da continuidade, da incontestabilidade e o do animus domini. Posse continua ou ininterrupta é a que completa todo o lapso de tempo do usucapião sem sofrer interrupções nos atos evidenciadores da atividade configuradora da condição de possuidor do usucapiente. Posse incontestada ou posse mansa e pacífica é a que se desenvolve durante todo o tempo reclamado para aperfeiçoamento do usucapião sem sofrer contestação ou moléstia por parte do verdadeiro dono ou dos outros interessados. Quanto ao animus domini trata-se do qualificativo da posse que evidencia, exteriormente, está agindo o possuidor com o comportamento ou postura de que se considera, de fato, proprietário da coisa.
Tempo
Usucapião, como forma que é de aquisição do domínio pela posse prolongada, tem no elemento tempo um dos seus requisitos fundamentais. Ao usucapião se aplicam as causas que suspendem ou interrompem o prazo da prescrição extintiva. Assim, se, por exemplo, morre o dono do imóvel usucapiendo e entre os seus herdeiros a um menor impúbere ou outro incapaz, suspenso ficará o fluxo do prazo de prescrição aquisitiva enquanto durar a incapacidade absoluta dos novos proprietários do bem.
Coisa hábil
Nem todas as coisas suscetíveis de figurar numa relação jurídica podem ser objeto de usucapião. Em primeiro lugar, se essa forma de aquisição dominial pressupões posse, deve-se logo concluir que apenas as coisas corpóreas são usucapíveis, visto que não se compreende no sistema civil posse das coisas incorpóreas. Pela mesma razão não se concebe o usucapião de partes incertas ou imprecisas de imóvel. Outra exigência das coisas usucapíveis é a sua disponibilidade, de sorte que não são adquiríveis através de usucapião as coisas fora do comércio, isto é, as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis.
São requisitos específicos do usucapião ordinário:
Prazo
O prazo é de 10 anos. Será de cinco anos, porém, se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores dele estiverem estabelecido sua moradia, ou realizado investimento de interesse social e econômico.
Justo título
Ter justo título é ser portador de documento capaz de transferir-lhe domínio, se proviesse do verdadeiro dono.
Boa-fé
No usucapião ordinário, além de apoiar-se em justo título, tem o possuidor de exercitar sua posse animu domini com boa-fé. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício ou obstáculo …
São requisitos específicos do usucapião extraordinário:
A configuração do usucapião extraordinário se contenta com os requisitos básicos da prescrição aquisitiva. Não se exige nem justo título ou boa-fé. Basta que o prescribente possua, como seu, o bem, durante o prazo legal, para que lhe adquira a propriedade. São requisitos, portanto, a serem provados na ação de usucapião sobre imóveis: a) a posse contínua e incontestada; b) o ânimo de dono; c) prazo de 10 anos se o proprietário …prazo
São requisitos específicos do usucapião especial:
Prazo
Segundo a Constituição, o prazo é de cinco anos ininterruptos, seja para Área do bem imóvel
Sendo o imóvel rural, a área do bem usucapiente será de cinqüenta hectares. Sendo urbano, a área será de até duzentos e cinqüenta metros quadrados.
Não ser proprietário de outro bem imóvel
Destinação
No imóvel urbano deve ser utilizado para sua moradia ou de sua família. No rural deve ser produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nele a sua moradia.
3. Legitimidade
A ação de usucapião é demanda de conhecimento, que tem por fim a obtenção de sentença de mérito. Nesta, como em qualquer outra demanda, devem se fazer presentes as “condições da ação”. Legitimidade ativa É legitimado ativo é aquele que afirma ter adquirido a propriedade (ou outro direito) de bem imóvel através da usucapião ordinário. Sendo o demandante casado deverá ter sua legitimidade integrada, por força do que dispõe o art. 10 do CPC, pelo consentimento do cônjuge ou companheiro.
Legitimidade passiva É aquele em cujo nome se encontra registrado o imóvel (e, se casado, também seu cônjuge, em litisconsórcio necessário determinado pelo disposto no § 1º do artigo 10 do CPC. Além daquele em cujo nome o imóvel está registrado, devem ainda ser citados, em litisconsórcio passivo necessário, os proprietários dos imóveis confrontantes (art.942, do CPC). Sendo tais réus casados ou vivendo em regime de união estável, deverão também ser citados seus cônjuges ou companheiros. A citação dos confinantes, como litisconsortes necessários, facilmente se compreende. Tem ela por objetivo permitir a precisa delimitação da área usucapienda. Por tal razão, tem a doutrina considerado que na ação de usucapião se encontre inserida uma ação demarcatória. Isso se dá porque pode ocorrer de área ocupada pelo demandante não corresponder, com precisão, aos limites do imóvel. Sendo a citação dos confinantes destinada a permitir a demarcação da área usucapienda, não haverá tal litisconsórcio necessário quando o imóvel usucapiendo for uma unidade autônoma num condomínio em edifício.
Fica, assim, conhecidos os réus certos, isto é, aqueles em cujos nomes o imóvel está registrado e os proprietários dos imóveis confinantes. A ausência de algum deles terá conseqüências diversas, que devem ser examinadas. Antes de qualquer outro ponto, deve-se afirmar que a ausência daquele em cujo nome o imóvel está registrado é fator de ineficácia absoluta da sentença de mérito, não se podendo considerar tal provimento jurisdicional capaz de gerar certeza quanto a sua titularidade do domínio. De outro lado, a ausência de alguns dos confinantes gera ineficácia da demarcação, em nada afetando a declaração de aquisição do domínio.
Serão citados por edital os réus certos que estejam em lugar ignorado e, além destes, os eventuais interessados, na forma no disposto no artigo 942 do CPC. Estes últimos são conhecidos como réus incertos. É de se considerar, porém, que o fato de os réus incertos serem citados por edital não permite a nomeação de curador especial para o caso de ninguém responder a citação. Isto porque o não comparecimento de qualquer interessado não deve levar a consideração de que os mesmos incorreram em revelia, mas sim a presunção de que não existem interessados.
4. Competência
Diante dos termos claríssimos do artigo 95 do CPC, não há margem para dúvidas em torno da competência para o procedimento especial do usucapião de terras particulares: competência é o foro da situação do bem usucapiendo. Ocorrendo, todavia, interesse da União na causa, o processo será deslocado da competência da justiça estadual para o da justiça federal. Questionada a alegação da Fazenda Federal, o processo deverá ser prontamente remetido à Justiça Federal, pois somente a ela compete apreciar a legitimidade, ou não, do interesse da União na causa.
5. Procedimento
Considerando a nova redação conferida aos artigos 942 e 943 pela Lei 8951/94, que não mais prevêem a realização de audiência de justificação prévia da posse, o procedimento a ser adorado para o processamento de usucapião de terras particulares é exclusivamente o ordinário, mantidas, apenas, a necessariedade do litisconsórcio passivo e a exigência da citação editalícia dos eventuais interessados e de intimação das Fazendas Públicas e do Ministério Público – as quais, todavia, não são privativas do processo de usucapião, nem atuam como causa de especialidade do procedimento respectivo.
Petição inicial
A par dos requisitos gerais do artigo 282, a ação de usucapião deverá ser iniciada por petição que contenha: a) o fundamento do pedido; b) a exata individuação do imóvel usucapiendo, através da planta do imóvel – trata-se de documento essencial ao ajuizamento da demanda, aplicando-se o disposto nos artigos 283 e 284; c) o pedido de declaração do domínio ou de servidão predial (artigos 941 e 942).
Citação
Recebida a inicial, o juiz determinará a citação pessoal do proprietário do imóvel, bem como de seus confinantes, e por edital dos réus em lugar incerto e dos eventuais interessados. Vale dizer: serão citados pessoalmente os réus certos, quais sejam, o proprietário do imóvel e seus confinantes – que ocupam no processo, alias, posição de litisconsorte passivos necessários, em virtude da possibilidade de está o autor da ação pretendendo a declaração de domínio também sobre os imóveis que lhes pertencem. Pode ocorrer, ainda, v.g., que o possuidor tenha, por qualquer motivo, perdido a posse após haver preenchido todos os requisitos do usucapião, caso em que, promovendo ele a ação, indispensável é a citação pessoal do possuidor atual do bem sob pena de nulidade do processo. Além dessas citações pessoais, determina a lei a citação por edital daquelas pessoas eventualmente interessadas na demanda, mas que sejam incertas ou desconhecidas. Os representantes da Fazenda Pública da União, do Estado (ou do Distrito Federal) de do Município onde se situe o imóvel serão necessariamente intimados (e não citados) da propositura da ação, por via postal, para que, sendo o caso, ingressem no processo e contestem o pedido do autor (art. 943).Por derradeiro, intimar-se-á o representante do Ministério Publico (curador dos registros públicos) a fim de que intervenha, sob pena de nulidade, em todos os atos do processo (art. 944, c. c. 84 e 236, §1). O órgão do Ministério Publico deve funcionar como custos legis.
Depois das citações e intimações serem efetivadas, segue-se, sem qualquer modificação, o procedimento ordinário.
Sentença
Não há muitas dúvidas a respeito da natureza da sentença de procedência do pedido em “ação de usucapião” : trata-se de sentença meramente declaratória. A sentença de procedência do pedido em “ação de usucapião” não constitui o direito de propriedade, mas tão-somente reconhece um domínio preexistente. A sentença de procedência do pedido formulado na ação de usucapião é, pois, meramente declaratória e, como todas as sentenças dessa natureza, tem eficácia retroativa, ex tunc. È preciso, porém, determinar até quando retroage os efeitos da sentença que ora se estuda. É ensinamento corrente em doutrina, amplamente majoritária, que a sentença retroage à data em que se completou o tempo para aquisição do domínio (ou direito real) através do usucapião.
Coisa julgada
A coisa julgada material na ação de usucapião segue os mesmos princípios da coisa julgada em qualquer outro caso sujeito às normas do Código de Processo Civil em tal matéria. A sentença de improcedência do pedido alcança a autoridade de coisa julgada. É certo que o mesmo autor poderá, posteriormente, ajuizar novamente, ação de usucapião referente ao mesmo imóvel desde que o autor alegue suporte fático ao menos parcialmente diverso do apresentado na primeira demanda.
Registro de imóveis
Uma vez transitada em julgado a sentença de procedência, expede-se mandado, para que a mesma seja registrada junto à matrícula do imóvel no Registro de imóveis. Tal registro tem finalidade meramente declaratória da aquisição do domínio, já que o demandante era, mesmo antes de sua efetivação, titular da propriedade (ou outro direito real) sobre a coisa.
Usucapião como defesa
É possível a alegação do usucapião como matéria de defesa. Isto se deve ao fato de que a aquisição da propriedade (ou outro direito real) através do usucapião se dá sem que haja necessidade de ajuizamento da ação de usucapião.
A exceção de usucapião, ou seja, a alegação do usucapião como defesa, tem sido admitida pela jurisprudência, como não poderia deixar de ser. Basta dizer, quanto ao ponto, que a matéria encontra-se sumulada pelo STF na súmula número 237, que assim diz: ” Usucapião pode ser argüido em defesa”. Não se pode admitir, porém, a alegação do usucapião como defesa nas ações possessórias, em razão da separação operada no direito brasileiro entre os juízos possessório e petitório.
A sentença que reconhecer o usucapião alegado como defesa não poderá ser levada a registro junto à matricula do imóvel no Registro de imóveis. Isto porque a contestação não amplia o objeto do processo.
Por fim, deve-se dizer que sendo reconhecido o usucapião alegado como defesa a única conseqüência daí advinda será a improcedência do pedido do autor. Não haverá declaração de que o réu adquiriu o domínio com força de coisa julgada.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Vol. III. 3. ed. – Rio de Janeiro: Lúmen Juris,2001.
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