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Estado do Rio vai recorrer contra decisão do TJ que impede cobrança de 200% de ICMS sobre armas de fogo

O procurador-geral do Estado, Francesco Conte, informou que o governo do estado vai recorrer no Supremo Tribunal Federal (STF) da decisão do Tribunal de Justiça do Rio, que derrubou, na segunda-feira passada, a lei que aumentava o ICMS no sobre a venda de armas e munição em 200%. Os desembargadores do Órgão Especial do TJ entenderam que a lei é inconstitucional, mas o procurador contesta. Segundo Conte, essa interpretação é equivocada e, por isso, vai ingressar com um recurso extraordinário no Supremo, tão logo o Acórdão do TJ seja publicado em Diário Oficial.

– O entendimento do TJ foi equivocado porque o aumento da alíquota não teve um caráter arrecadatório e sim de inibir a comercialização de armas. Portanto, não tem confisco como os desembargadores alegaram – disse Conte.

Além de derrubar o aumento do ICMS, os 25 desembargadores fizeram críticas ao Estatuto do Desarmamento no despacho que julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade, impetrada no TJ pelo deputado federal Flávio Bolsonaro (PP). Entidades de classe, autoridades, especialistas em segurança pública e ONGs reagiram ao parecer.

O secretário estadual de Segurança Pública, Marcelo Itagiba, lamentou a decisão. Por sua assessoria de imprensa, Itagiba disse que os altos impostos poderiam reduzir a criminalidade.

– Com todo o respeito à medida dos desembargadores do TJ, acredito que a lei que cobrava altos tributos sobre as armas diminuiria a circulação de armas de fogo no estado e, conseqüentemente, os números de crimes provocados por elas.

O presidente do Tribunal de Justiça, que participou da decisão, preferiu não polemizar o despacho. Sérgio Cavalieri Filho, disse que defende o Estatuto do Desarmamento e que é contra a população se armar para se proteger. Cavalieri, no entanto, disse que não se lembrava da votação na última segunda-feira, quando presidia a sessão. Ele voltou a defender, contudo, que a lei estadual que aumentava o ICMS era inconstitucional.

Seguindo o mesmo raciocínio do secretário de Segurança Pública do Rio, Cavalieri disse que o cidadão armado, quando surpreendido pelo bandido, muitas vezes é morto ou tem o revólver roubado, o que aumenta ainda mais a circulação de armas na sociedade.

O presidente da ONG Viva Rio, Rubem César Fernandes, que entrou na Campanha do Desarmamento com postos civis de recolhimento de armas, espantou-se ao saber que os desembargadores do Órgão Especial do TJ não apóiam o estatuto. Rubem César acredita que os magistrados estão dando passos para trás:

– Eles estão sendo insensíveis e agindo de forma retrógrada. Os desembargadores estão seguindo na contramão de toda a sociedade brasileira, que há tempos vem lutando para desarmar a população. As armas do cidadão de bem, compradas nas lojas do ramo, acabam parando na mão dos criminosos.

A cientista política Lúcia Hipólito ficou surpresa com as críticas ao estatuto.

– Parece que os desembargadores estão em conflito com o estatuto. Eles podem ter um opinião formada de foro íntimo, mas não deveriam ser contra uma lei federal, aprovada pelo presidente da República. Lúcia Hipólito, porém, preferiu não questionar a razão pela qual os 25 magistrados decidiram, por unanimidade, derrubar a lei estadual que aumentava em 200% o ICMS sobre armas e munição.

O sociólogo Michel Misse, especialista em estudos sobre a violência, também criticou os comentários pessoais dos desembargadores ao Estatuto do Desarmamento, quando o assunto em questão era meramente tributário. Segundo Misse, os magistrados aproveitaram a discussão sobre a queda da lei estadual que aumentava ICMS de armas e munição em 200%, para fuzilar o estatuto:

– Não faz sentido ir de encontro à uma campanha que vem dando ótimos resultados. Acho que os desembargadores emitiram opiniões políticas em uma discussão meramente tributária. O sociólogo comentou ainda que o desarmamento da população é tema polêmico, “que não é consenso em lugar nenhum da face da Terra”.

O deputado estadual Carlos Minc (PT) ficou indignado com a decisão e ao saber o teor do despacho. No documento, os desembargadores disseram que “armas em poder da população ordeira salvam vidas e defendem propriedades”. Minc considerou a declaração dos magistrados “o passaporte para a morte.” Segundo ele, os desembargadores podem até questionar, tecnicamente, o valor dos tributos, mas não deveriam interferir em leis federais importantes como a do desarmamento. O parlamentar espera que os desembargadores admitam que agiram de forma equivocada e preconceituosa:

– Respeito profundamente o poder judiciário, mas espero que os desembargadores reconheçam que exageraram e acabaram extrapolando

O procurador-geral de Justiça, Mafan Vieira, disse que ainda não tomou conhecimento sobre a decisão dos desembargadores e preferiu avaliar melhor o teor da ação para decidir se recorrerá da medida:

– Só quero me posicionar sobre o assunto depois de tomar ciência total dos fatos. Preciso conhecer a natureza da ação para decidir se tentarei recorrer da decisão.

Mas houve também quem apoiasse as críticas dos desembargadores. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio, Octávio Gomes, seguiu o exemplo dos magistrados e também criticou o Estatuto do Desarmamento. Octávio disse que a legislação sobre armas não está se mostrando eficaz para diminuir a criminalidade. Segundo ele, bandidos não compram armas em lojas. Octávio disse ainda que a OAB apóia qualquer medida para reduzir tributos.

– Usar a caneta para aumentar impostos não adianta de nada. É jogar para a arquibancada. Foi pura jogada política. É preciso coibir o contrabando e integrar as polícia para que elas atuem juntas na investigação e na repressão ao comércio ilegal de armas – disse Octávio.

O deputado federal Flávio Bolsonaro (PP), autor da representação de inconstitucionalidade, comemorou a decisão judicial com uma declaração polêmica:

– A Justiça está endossando o que eu sempre dizia: o estatuto não diminui a criminalidade. O curioso é que os autores e defensores do desarmamento são os primeiros a contratarem seguranças armados para garantir proteção.

Segundo ele, o Estatuto do Desarmamento só serve para tolher a liberdade do cidadão de se defender contra a ação dos bandidos.