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O sistema de cotas para negros em Universidades

Algumas universidades brasileiras estão se aventurando em um novo programa: o de cotas para negros. Trata-se de uma iniciativa de garantir alguma porcentagem de vagas dessas universidades para estudantes negros, com o objetivo de pagar uma dívida histórica com esta minoria étnica. No entanto, precisamos esclarecer certas coisas acerca do programa, pois apesar de se tratar de uma nobre iniciativa, tem gerado uma série de grandes controvérsias.

A decisão de se adotar o sistema de cotas para negros em universidades no Brasil é muito séria, e a questão se torna ainda mais grave quando paramos para analisar como ele está sendo realizado em nosso país. Em primeiro lugar, existe uma grande confusão no que diz respeito a definir quem é e quem não é negro. Falo isso porque há muitas pessoas alegando ser sua cor negra somente no momento de inscrição dos processos seletivos das universidades, negando a raça em outras ocasiões, ou seja, muitos candidatos estão tentando obter vantagem na prova de vestibular. Mas este não é o ponto principal, mas a falta de organização e de critérios claros de diferenciação das raças.

Daí surge mais um problema do nobre projeto: o estabelecimento de diferenças entre raças. Trata-se da mais escancarada discriminação de que tenho ouvido falar nos últimos tempos, pois o programa acaba, mesmo não sendo este um fim, mas uma conseqüência, colocando o negro como inferior em sua capacidade. É evidente que sabemos que isto não é verdade.Com o programa de reserva de cotas para negros demos um grande passo e isto não pode ser negado. A sociedade brasileira finalmente assumiu a inegável existência da exclusão racial em nosso país. É verdade que temos uma dívida histórica com a comunidade negra, afinal foram séculos de escravidão, fato que acabou colocando os negros numa posição muito aquém das demais raças dentro da estrutura da sociedade atual. Daí percebe-se que o preconceito realmente existe.

É bem verdade também um argumento que é muito utilizado pelos defensores do sistema de cotas para negros, aquela velha pergunta da qual não podemos escapar: quantos negros médicos você conhece? Ou então, qual é mesmo a proporção de brancos e negros no congresso nacional? E estes são apenas alguns exemplos. Para muitos é difícil admitir esse tipo de coisa, até porque acaba sendo muito fácil para nós que temos condições de viver dignamente negarmos a existência da exclusão racial. Nós não podemos nos acovardar e continuar negando isso para sempre. A solução é enfrentar o problema.

É exatamente aí que se encontra o ponto da questão, a verdadeira razão pela qual sou contra o sistema de cotas para negros: a forma como o problema é encarado e a proposta de solução. O programa de cotas tem sido encarado com irresponsabilidade no que diz respeito aos critérios de definição de quem se beneficiará, pois é muito difícil diferenciar quem é negro de quem não é. Além disso, não se corrige uma injustiça cometendo outra. É preciso colocar em discussão outras formas de quitar essa dívida com os negros, que não o sistema de cotas em universidades.Este programa beneficiaria primordialmente os negros de classes média e alta, os quais têm condições de financiar seus estudos e que logicamente não precisam ser beneficiados com esse tipo de privilégio.

Parece claro, então, que o sistema de cotas, tanto pela sua proposta inicial quanto pela forma como tem sido realizado no país, não apresenta resultados satisfatórios no que diz respeito à quitação de uma dívida histórica pela oportunidade de ingresso ao ensino superior pelo negro que não tenha condições de financiar estudos básico e médio de qualidade.

A Universidade de Brasília (UnB) resolveu adotar recentemente o sistema de cotas para negros, a exemplo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). O detalhe é que na UERJ o programa foi imposto pelo governo do Estado, não tendo sido dada nenhuma opção aos membros da instituição. E o resultado na Universidade de Brasília provavelmente será o mesmo que o da universidade carioca. O nível de ensino na instituição aparentemente caiu, pois o verdadeiro âmago da questão está na ausência de uma educação de base de qualidade e, ao contrário do que muita gente está afirmando por aí, os negros que estão ingressando na universidade estão sendo discriminados pelos demais que não ingressaram pelo sistema de cotas. A conclusão que se pode tomar disso é que tanto os meios utilizados (tentativa de corrigir uma injustiça cometendo outra) quanto os fins (o preconceito permanece) não estão corretos.

Se o sistema de cotas realmente tivesse que ser implementado, seria melhor que, pelo menos, fosse feito através de porcentagens de vagas para estudantes provenientes de família de renda menor, mas não para negros. Neste caso, a distinção se justificaria por motivos relativos à condição social, e não por distinção e capacidade intelectual entre negros e brancos, o que caracteriza um ato discriminatório.

Uma solução para o caso seria que o Governo Federal proporcionasse aos estudantes de baixa renda, e aí se enquadrariam também os negros de classe baixa, oportunidades de uma educação de qualidade. A princípio isso pode ser feito de duas formas simultaneamente. Uma delas é injetar investimentos na educação pública a fim de melhorar sua qualidade, pois a própria História prova que sem investir em educação um Estado não é capaz de se desenvolver. A outra forma é negociar com as instituições particulares de ensinos fundamental e médio a garantia de uma porcentagem de suas vagas para estudantes carentes, que não tenham condições de financiar seus estudos em uma escola privada. Essa negociação se daria através de uma proposta de isenção de impostos ao Estado por parte destas mesmas instituições. Seria, então, uma espécie de programa de cotas para estudantes de baixa renda em escolas particulares de educação básica. Como resultado, estudantes que não têm condições de bancar seus estudos teriam condições de competir em igualdade com todos os demais candidatos a uma vaga em uma universidade pública.

É claro que a proposta não é de simples execução, mas quem foi que disse que se trata de um problema de fácil resolução? Se estes programas de garantia de ingresso por parte dos mais pobres ao ensino de qualidade e de um verdadeiro compromisso com a melhoria da qualidade do ensino público fossem seguidos à risca, estaria o Brasil certamente se colocando nos trilhos certos rumo ao desenvolvimento, sem a necessidade de assumir os riscos gerados pela implementação de programas de cotas em universidades.