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BB terá de devolver, corrigidos, quase três mil salários mínimos, depositados há 55 anos

Depósitos bancários realizados em virtude de determinação judicial são diferentes de depósitos realizados voluntariamente por quem detém recursos, não havendo prescrição para o caso. A conclusão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão que obriga o Banco do Brasil a devolver à Zeni Federizzi, de Bento Gonçalves, do Rio Grande do Sul, depósitos realizados pelo pai, em seu nome, há 55 anos, equivalentes a 2.631,58 salários mínimos.

A quantia depositada à época foi de Cr$ 1.000,00 (um mil cruzeiros), decorrente de herança deixada pela mãe. Passados quase quarenta anos, ela procurou o Banco do Brasil para a retirada. O estabelecimento informou que a questão estava protegida pelo sigilo bancário, não fornecendo qualquer indício de que a conta estava localizada ou não.

Foi, então, proposta uma ação de restituição de depósito contra o banco. “A guia de depósito (…) é bastante clara: ali está consignado que a referida importância ‘fica a disposição do juízo desta comarca’ uma vez que na ocasião (1949) era menor de idade, tendo ainda no referido documento a chancela do banco demandado, de ‘recebemos’”, alegou a defesa. “Constata-se assim que o depósito efetivado era judicial, eis que efetuado dentro do arrolamento de bens de Terezinha Marcon Federizzi”, acrescentou.

O banco se defendeu, argumentando que houve prescrição. “Mesmo não correndo a prescrição quando a autora era menor de idade, configurada estaria aquela, uma vez que a maioridade teria sido atingida em 1968”, afirmou. Ainda segundo o banco, o depósito foi efetuado unicamente pelo fato da menoridade à época, não em função de uma contenda judicial.

Em primeira instância, a ação foi julgada procedente. “Condeno (o banco) a restituir à demandante o valor objeto do depósito (…), incidindo juros (arts. 1266 e 1063, ambos do Código Civil) e integral correção monetária, incorporando, ainda juros moratórios, estes a contar da citação”, determinou o Juiz de Direito Newton Fabrício, em regime de exceção, em sentença do dia 2 de dezembro de 1999. O banco apelou, mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, negou provimento. “Existente a relação contratual de depósito bancário, sem ter ocorrido sua rescisão ou extinção, não há falar em prescrição”, considerou o TJRS. “O valor do depósito será corrigido pela variação do salário mínimo até a entrada em vigor da lei 4.357, de 16.7.64, que instituiu a correção monetária no país”.

No recurso para o STJ, o banco reiterou os argumentos, afirmando ainda que o depósito bancário é uma espécie de mútuo, uma vez que possui natureza de obrigação pessoal. “Em decorrência da ausência de movimentação na conta, a guarda dos documentos referentes ao contrato em questão foi transferida para o Tesouro Nacional”, acrescentou.

Ao julgar, a Terceira Turma não conheceu do recurso do banco. “Não se cogita aqui de depósito voluntariamente efetuado por quem detinha os recursos, mas sim realizado em virtude de terminação judicial”, observou o ministro Castro Filho, relator do recurso no STJ. “Desse modo, não é regido pelas normas comuns dos depósitos bancários. Portanto, entendo que, mesmo já decorridos mais de vinte anos do contrato de depósito – porque depósito é, e não mútuo – inexiste prescrição, exatamente porque o contrato de depósito é por tempo indeterminado”, acrescentou.

Para o ministro, o depósito bancário, realizado por ordem judicial, no interesse de herdeiro menor de idade, deve, alcançada a maioridade deste, ser devolvido com correção monetária, ainda que essa cláusula não tenha sido explicitada pelo juiz.