Os Conselhos Regionais de Medicina (CRM) são competentes para penalizar os médicos militares que infringem as regras de conduta ética no exercício da profissão. Essa é a decisão unânime da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, no recurso de Ricardo Agnese Fayad que, acusado de prática de tortura na condição de médico militar do Serviço Ativo do Exército, teve seu registro profissional cassado.
Em novembro de 2000, o Superior Tribunal de Justiça julgou o processo do médico Ricardo Fayad, acusado de participar de sessões de tortura no início da década de 70. Segundo um dos depoimentos de presos políticos, o acusado fazia parte do esquema de tortura, com a função no processo de tortura de reanimar os pacientes para que pudessem ser novamente torturados e determinar se estavam ou não sofrendo grandes sofrimentos”.
Ricardo Fayad, entretanto, alegou que sua condição militar restringia ao Exército a iniciativa de aplicar qualquer penalidade. O ministro relator, Franciulli Netto, no entanto, esclareceu que “antes de ser servidor público militar, o médico é um profissional sujeito às regras determinadas por sua entidade de classe”. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça reformou as decisões de primeira e segunda instâncias federais e reconheceu a legitimidade do CRM para impor penalidades aos profissionais infratores do Código de Ética de Medicina. Como o recurso questionava apenas a legitimidade do CRM para penalizar profissionais militares, os autos foram, novamente, remetidos a primeira instância para que a apreciação dos demais aspectos fosse realizada.
O médico recorreu ao próprio STJ, argumentando que a decisão anterior havia violado a lei 6.681/79, que dispõe sobre a inscrição de médicos militares em Conselhos Regionais de Medicina. Além disso, afirmou que a Turma deveria reformar a decisão de primeiro grau e não remeter os autos novamente à primeira instância, “porque não é de boa lógica se mandar fazer o que já foi feito”. Para finalizar, alegou o médico que a ordem constitucional foi violada, pois, durante todo o trâmite do processo administrativo, ele não foi ouvido.
O ministro Franciulli Neto manteve sua decisão, assegurando que “ao investigar o campo de incidência da lei 6.681/79, deu-lhe conteúdo lógico e coerente, tanto com a natureza da atividade militar, como com a da profissão médica”. O relator ao justificar sua interpretação da lei, lembrou que “há muito o juiz vem deixando de ser simplesmente a boca da lei para retornar ao seu ofício primordial que é a distribuição da justiça”. Franciulli Neto esclareceu que “a matéria cuja apreciação fora devolvida ao STJ restringiu-se apenas ao tema da competência para o processo disciplina e, por isso, a remessa dos autos ao juiz de primeiro grau não se trata de ‘mandar fazer o que já foi feito’, mas sim, em obediência ao princípio do devido processo legal, determinar que, superado esse tema, proceda o juiz sentenciante ao exame das demais questões”.