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STJ confirma extinção de ação contra 404 acusados de irregularidade em concorrência pública

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça negou o pedido do Ministério Público do Estado de São Paulo para o prosseguimento de Ação Penal contra quatro centenas de empresários de São Paulo acusados do crime de abuso do poder econômico. Entre março e abril de 1993, a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) realizou tomada de preços para a reforma de 415 escolas estaduais, na qual estabeleceu o valor máximo a ser pago pela obra contratada. De acordo com o MP, as empresas teriam combinado oferecer, todas elas, o preço máximo estipulado pela FDE para não haver vencedores. A intenção seria levar as obras a sorteio. A denúncia enquadrou as supostas irregularidades na Lei 8.137 (artigo 4º, I), que define como crime contra a ordem econômica a eliminação da concorrência mediante acordo (cartel).

Entre as evidências de irregularidades, o Ministério Público apontou “milhares de propostas idênticas”. Os empresários da construção civil convidados a participar da tomada de preços teriam, segundo a denúncia, promovido ajuste, “objetivando eliminar a concorrência entre as empresas que representam legalmente, abusando do poder econômico e tornando os certames enumerados uma farsa”.

No Inquérito policial aberto para apurar o processo de concorrência, a presidente da comissão permanente de licitação da FDE na época, Marilice Amalia Peron Pereira, foi acusada de participação no suposto crime. Em habeas-corpus impetrado por ela, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou o trancamento da Ação Penal contra os 404 acusados por entender ser incabível a aplicação da lei contra a ordem econômica (Lei nº 8.137) em crime supostamente cometido contra a administração pública.

A palavra concorrência, mencionada no texto da lei, “não tem o sentido de licitação ou de concorrência pública, razão por que essa norma não pode ser aplicada ao caso em exame”, concluiu o TJ. O artigo 4º, citado pelo Ministério Público, tem como fim impedir que empresas da indústria e do comércio façam ajustes e acordos, com o fim de dominar o mercado ou eliminar a concorrência, total ou parcialmente. As vítimas, nesse caso, são as demais empresas que trabalham no mesmo mercado e os consumidores em geral.

A decisão do Tribunal de Justiça fundamentou-se no entendimento de que o sistema penal brasileiro adotou o princípio da tipicidade estrita, no qual não se pode condenar alguém por crime que não esteja definida em lei, sem a descrição completa do comportamento ilícito e da sanção correspondente.. Dessa forma, é incabível a simples utilização da analogia e da interpretação extensiva de alguma norma legal. O Ministério Público pediu a aplicação contra a ordem econômica porque, na época, não havia “figura típica”, ou seja, lei para definir o crime supostamente cometido durante o processo de tomada de preços da FDE. A Lei 8.666/93 que estabelece normas e contratos da administração pública, foi promulgada três meses depois da licitação.

O relator do processo, ministro Gilson Dipp, explicou que a revisão da decisão do TJ, concedendo o habeas-corpus, exigiria a reapreciação dos fatos e das provas, vedado quando se trata de recurso especial, como no caso. Além do mais, esclareceu, o TJ fundamentou sua decisão não apenas na atipicidade, ou seja do crime sem definição legal, mas também no fato de não ter havido vítimas e nem prejuízo para a Administração Pública.