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STJ: Doação feita por homem que casou com mais de 60 anos é nula

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve, por unanimidade, a decisão do Tribunal de Justiça do Paraná que considerou nula a doação de metade de um imóvel feita por O.A.O. à sua então esposa, E.A.O. Na época da união, O.A.O. tinha 66 anos e, por lei, o casamento de homem maior de 60 anos e mulher acima dos 50 só pode ser realizado sob o regime de separação total de bens, o que aconteceu. Essa determinação legislativa foi o principal motivo indicado pelo TJ/PR e confirmado pelo STJ para concluir que a doação é nula.

Em janeiro de 1995, O.A.O., então com 66 anos, e E.A.O., com 45, se casaram. A união foi oficializada sob o regime de separação total de bens pelo fato de O.A.O. ser maior de 60 anos, determinação feita pelo artigo 258 do Código Civil – denominado “norma protetiva”, que indica como obrigatório o regime de separação total para o casamento de homem maior de 60 anos ou mulher acima dos 50.

Sabendo que não poderia dividir seus bens com a esposa, O.A.O. simulou, no ato da escritura definitiva de um imóvel na Avenida Visconde de Guarapuava, em Curitiba (PR), uma espécie de doação da metade do bem em favor de E.A.O.. A doação foi, inclusive, declarada no Imposto de Renda de O.A.O. do exercício de1996. Porém, menos de dois anos após o casamento, em dezembro de 1996, E.A.O. entrou com pedido de separação litigiosa, arrolamento de bens, ação de alimentos, e ainda duas notificações contra o marido – “uma para que ele exercesse a preferência na aquisição da metade de seu próprio apartamento e outra para que ele pagasse aluguéis à esposa relativos ao mesmo bem”.

Alegando violação ao regime de separação obrigatória de bens e ingratidão, O.A.O. entrou com um processo pedindo que fosse anulada a escritura do imóvel. O pedido foi acolhido pela primeira instância que decretou nula a doação feita na escritura de compra e venda. Com base nas provas, entre elas a declaração de imposto de renda de O.A.O., o Juízo constatou que todas as prestações teriam sido pagas pelo autor da ação. De acordo com a sentença, isso estaria caracterizando a doação da metade do apartamento.

E.A.O. apelou ao Tribunal de Justiça do Paraná alegando que a doação não poderia ser nula pelo simples fato de nem ter ocorrido – não existindo qualquer documento que a comprovasse. A apelante afirmou que a compra do imóvel teria sido realizada durante o casamento e, mesmo com o regime de separação total de bens, ela teria direito à metade do imóvel. O TJ/PR rejeitou o apelo, confirmando a sentença. E.A.O., então, recorreu ao STJ.

No recurso especial analisado pelos ministros da Terceira Turma, E.A.O. voltou a afirmar que não se pode anular doação se não há prova de sua concretização por escritura pública. A recorrente alegou que a declaração de imposto de renda ou a escritura de compra e venda não serviriam como comprovantes da doação. E.A.O. também destacou que teria participado da compra do imóvel pelo fato de ter ficado sem trabalhar por dois anos e cinco meses a pedido do ex-marido e, por isso, teria direito à partilha do bem, não a título de doação, mas como forma de compensação “por prejuízos materiais e pessoais que lhe adviriam com a cessação de sua atividade remunerada”.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, manteve as decisões anteriores que consideraram a doação nula, sendo seguida pelos demais integrantes da Turma. Para a ministra, de acordo com o artigo 258 do Código Civil, “não importa a forma de alienação, transferência ou disposição patrimonial, sequer a classificação do negócio jurídico que importou em alteração na titularidade do bem”, porque é obrigatório, no casamento de maior de 60 anos, o regime de separação de bens. Dessa forma, estaria faltando um dos requisitos para a validade do ato da doação feita por O.A.O. – a autorização para o sexagenário poder realizar a transferência gratuita da metade do imóvel. Quanto à validade da declaração de imposto de renda como prova da doação, Nancy Andrighi entendeu que a recorrente não teria discutido a questão nas instâncias anteriores. Assim, não teria havido o prequestionamento do assunto, motivo que impossibilita a discussão da matéria no STJ.

“Nada impede que o casal submetido ao regime de separação de bens partilhe os bens que tenha adquirido com esforço comum após a união, ainda que se presuma esta contribuição”, enfatizou a ministra lembrando que, no entanto, no caso em questão, as instâncias anteriores reconheceram que, quando da formalização da escritura do imóvel, o ex-marido já teria pago cinco das sete prestações do contrato, e que as duas últimas também teriam sido quitadas pelo recorrido, sem a utilização do patrimônio da ex-mulher. E, estes fatos já não poderiam ser analisados pelo STJ, pois é proibido o reexame de provas em recurso especial. Para a ministra, essa vedação seria mais um motivo para se rejeitar o recurso de E.A.O.