Para que a venda de bens de pais para filhos seja válida, é exigida a concordância exclusiva dos descendentes. A decisão da Justiça estadual de Minas Gerais, mantida pela Quarta Turma do STJ, não reconheceu direito do genro do dono de uma fábrica de calçados mineira a pedir anulação de cessão de cotas de sociedade aos cunhados, sem a inclusão de sua mulher.
Casado com a filha adotiva do casal dono da fábrica, J.C. acusa sua sogra de ter simulado a venda de cotas da sociedade a dois cunhados. Após a morte de seu sogro, em setembro de 1995, ele alega que os cunhados e a sogra, “reconhecidos como milionários”, pressionaram sua mulher a renunciar à herança. Em abril de 1997, a mulher – afirmando “dever gratidão” à família – acabou assinando o documento de renúncia, contra a vontade do marido.
Ele entrou na Justiça pedindo a decretação de nulidade da cessão das cotas da sociedade feita pela sogra. A sentença da 26ª Vara Cível de Belo Horizonte extinguiu o processo “por ilegitimidade do autor”, pois o consentimento do genro não é exigido pela lei, que apenas se refere aos descendentes e dispensa a autorização do marido.
Segundo a sentença, “na forma contida no artigo 1.132 do Código Civil exige, para a validade da venda de bens de pais para filhos, a anuência, única e exclusiva, dos descendentes. De forma que só estes podem se opor a eventual transmissão de bens e, para anuírem com a venda, é dispensada a outorga marital”. A sentença conclui que não se pode admitir que o parentesco por afinidade possa conferir direito personalíssimo da esposa a genro – o qual não é descendente.
Ao julgar o recurso do genro, o Tribunal de Alçada de Minas Gerais confirmou que o pedido de anulação da cessão das cotas é um ato personalíssimo da filha. Por outro lado, o tribunal reconheceu que genro poderia entrar com ação de colação, a qual restituiria à massa da herança os bens recebidos antecipadamente pelos herdeiros, quando o pai estava vivo, com o objetivo de se obter igualdade na partilha. O genro recorreu mais uma vez.
No STJ, a primeira decisão da Justiça mineira – determinando a extinção do processo – foi restabelecida. De acordo com o relator do recurso, ministro Ruy Rosado de Aguiar, a decisão do Tribunal de Alçada “causou ofensa ao artigo 128 do CPC (Código de Processo Civil), ao receber o pedido de anulação de venda sem o consentimento da herdeira como uma ‘ação de colação’, que necessariamente deveria ter outro fundamento e atender ao disposto no CPC para a situação específica”.
Os nomes dos envolvidos foram preservados porque o processo corre em segredo de Justiça.